D.E. Publicado em 31/01/2019 |
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EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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RELATÓRIO
Trata-se de apelação criminal interposta por Juvenal Antonio Tedesque Cunha, em face da sentença de fls. 418/434 por meio da qual foi condenado à pena de 2 (dois) anos e 3 (três) meses de reclusão pela prática do delito de formação de quadrilha, previsto no artigo 288 do Código Penal.
Alega, em síntese, que a participação da empresa Machado-Transportes Ltda, entre 2006 e 2007 em vários leilões ocorreu em igualdade de condições com eventuais interessados, dentro das normas legais aplicáveis às arrematações; que após ter rescindido o contrato de prestação de serviços, como advogado, tomou conhecimento de que o Ministério Público passou a duvidar da licitude das arrematações, sendo que até então não havia participado como acusado em nenhum fato relacionado ao referido processo crime envolvendo os sócios da empresa.
Que no afã de se livrarem das acusações, de forma uníssona e orquestrada, no bojo dos depoimentos e pela juntada de documentos pelos acusados sócios empresas no citado processo crime 0001587-76.2007.403.6116 , eles incriminaram o recorrente impingindo ao mesmo a prática de delitos de fraude à arrematação e formação de quadrilha.
Alega, ainda, ocorrência de prescrição tendo em conta a ilegalidade na majoração da pena-base; questiona as agravantes e desconsideração das atenuantes.
Ainda, atipicidade tendo em conta a ausência de autoria e materialidade e ilegalidade das provas.
Pretende, ainda, a suspensão do processo até o julgamento do feito nº 0001587-76.2007.403.6116.
Com contrarrazões (fls. 523/534) vieram os autos a esta Corte Regional.
Parecer da Procuradoria Regional da República pelo desprovimento do recurso defensivo.
É o relatório.
À revisão.
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VOTO
Consta dos autos que o apelante JUVENAL ANTONIO TEDESQUE DA CUNHA foi denunciado pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL pela prática do delito previsto no artigo 288 do Código Penal por ter-se associado a Fernando Machado Schincariol, Caetano Schincariol , Caetano Schincariol Filho, Edna Machado Schincariol Preci e Marcos Antonio Nunes para fraudar arrematações judiciais, por intermédio da pessoa jurídica MACHADO TRANSPORTADORA LTDA - EPP (atual MACHADO LOCADORA DE VEÍCULOS, MÁQUINAS e EQUIPAMENTOS INDUSTRIAIS - EPP), com arrematação dos bens pertencentes à CERVEJARIA MALTA LTDA., que foram leiloados por determinação da Justiça Federal para saldar dívidas da empresa com a Fazenda Nacional.
Ainda segundo a denúncia, a MACHADO TRANSPORTADORA LTDA - EPP foi utilizada para que a CERVEJARIA MALTA reouvesse os bens levados à leilão por condições extremamente mais vantajosas que a remição da execução, já que, ao invés de pagar ou consignar o valor integral da dívida, acrescida de juros, custas e honorários para evitar que os bens não fossem expropriados, pode readquiri-los por preços inferiores ao da avaliação (menos de 60%, no total), que foram ainda parcelados em até 60 (sessenta) vezes. Assim, a CERVEJARIA MALTA manteve-se na posse de todos os bens levados à hasta pública, que foram supostamente locados pela empresa MACHADO TRANSPORTADORA LTDA - EPP a ela, sendo os valores pagos a título de aluguel direcionados aos pagamentos das parcelas da arrematação. A empresa MACHADO TRANSPORTADORA LTDA - EPP não existia de fato, tendo sido criada pelos administradores da CERVEJARIA MALTA tão somente para servir a esta. Edna Machado Schincariol Preci, sócia majoritária da empresa MACHADO TRANSPORTADORA LTDA - EPP, era irmã de Fernando Machado Schincariol e Caetano Schincariol Filho, e filha de Caetano Schincariol, únicos sócios-administradores da CERVEJARIA MALTA LTDA. Já os sócios minoritários, como Marcos Antonio Nunes, Maria Aparecida Keiko Sacurai Sekiya e Carlos Alberto Bittencourt Salvi, haviam sido empregados da CERVEJARIA MALTA LTDA. anteriormente. Em diligência realizada junto ao endereço da sede da empresa, verificou-se que se tratava de um terreno, com uma pequena construção e um único ônibus, identificado como pertencente à CERVEJARIA MALTA LTDA. O imóvel era de propriedade de Caetano Schincariol Filho, sócio-gerente da CERVEJARIA MALTA LTDA. e era utilizado para o estacionamento de caminhões desta empresa. Apurou-se, ainda, que, com exceção de três contratos celebrados com a Transportadora RR, a empresa MACHADO TRANSPORTADORA LTDA - EPP havia prestado serviços somente à CERVEJARIA MALTALTDA. O capital social da empresa MACHADO TRANSPORTADORA LTDA - EPP à época da arrematação do caminhão Mercedes Benz por R$ 36.000,00 (trinta e seis mil reais) era de apenas R$ 20.000,00 (vinte mil reais) e, em 16 de agosto de 2006, data da segunda arrematação, foi elevado para R$ 375.000,00 (trezentos e setenta e cinco reais), sem que tenha sido comprovado o aporte do referido valor na empresa MACHADO TRANSPORTADORA LTDA - EPP. O aumento do capital social da MACHADO TRANSPORTES LTDA. foi integralizado, em parte, com dinheiro que saiu da conta conjunta da denunciada Edna com sua mãe, esposa de Caetano Schincariol, um dos sócios da CERVEJARIA MALTA LTDA., e em parte com dinheiro "emprestado" pelo próprio Caetano Schincariol, pai de Edna Machado Schincariol Preci, que confirmou ter "doado" o dinheiro a ela. A empresa não possuía condições econômicas para a aquisição dos bens, tendo apresentado movimentação financeira irrisória em 2006. Conforme restou demonstrado pelos depoimentos colhidos no curso da Autos nº 2002.61.16.001025-0, a utilização da pessoa jurídica MACHADO TRANSPORTADORA LTDA - EPP para a arrematação dos bens da CERVEJARIA MALTA LTDA. foi arquitetada por JUVENAL TEDESQUE DA CUNHA, advogado e consultor jurídico das duas empresa, que participou de toda a trama. Assim, JUVENAL TEDESQUE DA CUNHA e os demais agentes, já denunciados nos Autos nº 2002.61.16.001025-0, associaram-se, de forma permanente e estável, para o fim de fraudar arrematações judiciais.
Processado o feito, sobreveio condenação do apelante à pena de 2 (dois) anos e 3 (três) meses de reclusão pela prática do delito de formação de quadrilha, previsto no artigo 288 do Código Penal.
Alega o apelante, em síntese, que a participação da empresa Machado-Transportes Ltda, entre 2006 e 2007 em vários leilões ocorreu em igualdade de condições com eventuais interessados, dentro das normas legais aplicáveis às arrematações; que após ter rescindido o contrato de prestação de serviços, como advogado, tomou conhecimento de que o Ministério Público passou a duvidar da licitude das arrematações, sendo que até então não havia participado como acusado em nenhum fato relacionado ao referido processo crime envolvendo os sócios da empresa.
Que no afã de se livrarem das acusações, de forma uníssona e orquestrada, no bojo dos depoimentos e pela juntada de documentos pelos acusados sócios empresas no citado processo crime 0001587-76.2007.403.6116 , eles incriminaram o recorrente impingindo ao mesmo a prática de delitos de fraude à arrematação e formação de quadrilha.
Alega, ainda, ocorrência de prescrição tendo em conta a ilegalidade na majoração da pena-base; questiona as agravantes e desconsideração das atenuantes.
Ainda, atipicidade tendo em conta a ausência de autoria e materialidade e ilegalidade das provas. Pretende, ainda, a suspensão do processo até o julgamento do feito nº 0001587-76.2007.403.6116.
De início, afasto a pretensão de suspensão do processo até o julgamento do feito nº 0001587-76.2007.403.6116 uma vez que referido feito já foi julgado, consoante consulta ao sistema processual desta Corte.
No mérito, a sentença recorrida é de ser mantida.
O delito de formação de quadrilha requer a demonstração da prática estável e permanente de crimes.
No caso dos autos, segundo a denúncia, o ora apelante e os denunciados nos autos nº 2002.61.16.001025-0 associaram-se, de forma permanente e estável, para o fim de fraudar arrematações judiciais.
Prevê o artigo 358 do Código Penal:
- Impedir, perturbar ou fraudar arrematação judicial; afastar ou procurar afastar concorrente ou licitante, por meio de violência, grave ameaça, fraude ou oferecimento de vantagem:
Pena - detenção, de dois meses a um ano, ou multa, além da pena correspondente à violência.
O apelante JUVENAL ANTONIO TEDESQUE DA CUNHA, teria juntamente com Fernando Machado Schincariol e Caetano Schincariol Filho, incorrido na conduta típica de formação de quadrilha para "fraudar arrematação judicial".
As arrematações ocorriam apenas na aparência uma vez que os bens leiloados sequer saíam da Cervejaria Malta que, com tal artifício, conseguia não só prosseguir nas suas atividades industriais, como também se livrar das demais constrições existentes em outras execuções fiscais contra ela propostas.
No tocante à apuração da fraude, destacou o sentenciante:
" A bem da verdade, as provas são robustas no sentido de que a empresa arrematante agia como longa manus da executada. Em outras palavras, tratava-se de empresa de fachada constituída exclusivamente para atUar na defesa dos interesses daquela última (CERVEJARIA MALTA LTDA.)
À época dos fatos, EDNA MACHADO SCHINCARIOL PRECI, filha de CAETANO SCHINCARIOL e irmã de FERNANDO MACHADO SCHINCARIOL e de CAETANO SCHINCARIOL FILHO - únicos sócios da CERVEJARIA, era proprietária majoritária da empresa MACHADO, detendo cerca de 97,333% do seu capital social (fl. 333, apenso I do volume II).
Apenas para evitar a unipessoalidade no quadro social da empresa MACHADO, conforme relatado pelo corréu FERNANDO MACHADO nos autos do proc. penal 001587+76+2007+403.6116 , ROQUE DOMINGOS, CARLOS ALBERTO BITENCOURT e MARIA APARECIDA KEIKO SCURAI SEKIYA também constaram, cada qual em épocas diferentes e sucessivas, como sócios-proprietários daquela.
No entanto, a parcela de capital social que lhes cabia era diminuta (2,777% - f. 333 do apenso I do volume II). Além disso, nenhum dos sócios minoritários dispendeu qualquer importância para a aquisição de tais quotas, tampouco recebeu por elas quando das respectivas sucessões, além de que, enquanto sócios-proprietários, não percebiam pro labore ou qualquer outra forma de rendimento. Nesse sentido, os depoimentos de CARLOS ALBERTO e MARIA APARECIDA, bem como o interrogatório do corréu FERNANDO MACHADO SCHINCARIOL, todos realizados nos autos da ação penal nº 0001587-76.2007.403.6116 e colacionados no dispositivo de mídia de fls. 1187.
CARLOS ALBERTO também confirmou que, com certeza, foram os corréus FERNANDO e CAETANO quem pagaram todas as quotas de todos os sócios da MACHADO, inclusive as da EDNA, da MARIA APARECIDA e do MARCOS NUNES, tal como fizeram com ele (dispositivo de fls. 1187). Esse fato revela com claridade solar que os sócios da executada, CERVEJARIA MALTA LTDA, também estavam à frente da administração da arrematante (MACHADO).
Como se isso não bastasse, é preciso consignar que vultosa importância de dinheiro, cerca de R$ 100.000,00 (cem mil reais), utilizada para majorar o capital social da empresa MACHADO, originou-se de doação feita a EDNA por seu pai, que à época era sócio da CERVEJARIA MALTA LTDA., e que outro aporte, de aproximadamente R$ 66.000,00 (sessenta e seis mil reais), saiu da conta conjunta que EDNA mantinha com sua mãe, conforme revelam as provas colacionadas aos autos.
Vêm também ao encontro dessas constatações as provas de que a empresa MACHADO voltava-se à prestação de serviços quase que exclusivamente à CERVEJARIA MALTA, além do fato de o local indicado como sua sede (Av. Otto Ribeiro, nº 963) ter pertencido, pelo menos à época dos fatos, ao corréu CAETANO SCHINCARIOL FILHO, e ter servido de estacionamento aos caminhões da CERVEJARIA, conforme ilustrado às fls. 165 (apenso I, vol. I). Inclusive, o laudo de vistoria do Corpo de Bombeiros, juntado às fls. 363 (apenso I, vol. II), indica que o local era utilizado como garagem."
Em relação a autoria, de fato o réu atuava como advogado da Cervejaria Malta Ltda e orientou, quando do leilão dos bens penhorados, que poderiam ser adquiridos pela Machado Transportadora e, posteriormente, locados à CERVEJARIA MALTA.
As testemunhas MARIA APARECIDA KEIKO SACURAI SEKIYA e ELIANI BUZZO afirmaram o réu JUVENAL ANTONIO TEDESQUE DA CUNHA participava ativamente das reuniões não apenas como advogado , mas também orientando o procedimento a ser adotado . Nesse mesmo sentido os depoimentos de FERNANDO e CAETANO FILHO (mídia, fl. 317).
Também nesse sentido o apurado a ação penal 0001587-76.2007.4036116, conforme consignou o sentenciante:
"Por fim, os corréus FERNANDO MACHADO SCHINCARIOL e CAETANO SCHINCARIOL FILHO, quando inquirido judicialmente nos autos da ação penal nº 0001587-76.2007.403.6116 (dispositivo de fls. 1187), prova reiterada neste processo (f. 997/998), confessaram que JUVENAL, alertando-os de que a CERVEJARIA corria o risco de ter todos os bens leiloados, os aconselhou a pedir a EDNA, sua irmã e então sócia-proprietária da MACHADO, que os arrematasse e os arrendasse logo em seguida, nem que para tanto fosse preciso solicitar empréstimo ao corréu CAETANO SCHINCARIOL (pai de ambos).
A vontade livre e consciente do réu JUVENAL ANTONIO TEDESQUE DA CUNHA extrai-se do comportamento de instruir, orientar, seus clientes a fraudar as arrematações, os quais, sabedores da ilegitimidade da CERVEJARIA para ofertar lanços, e que tampouco se dispunham a remir a execução, valeram-se de interposta pessoa para assim o fazer. Consequentemente, lograram livrar os bens das penhoras e demais constrições judiciais sem que para tanto fosse necessário adimplir o valor integral das execuções, burlando flagrantemente a ordem jurídica.
Como se observa, dúvida não paira no sentido de que JUVENAL ANTONIO TEDESQUE DA CUNHA uniu-se aos corréus FERNANDO MACHADO SCHINCARIOL, CAETANO SCHINCARIOL FILHO, MARCOS ANTÔNIO NUNES, EDNA MACHADO SCHINCARIOL PRECI e CAETANO SCHINCARIOL, orientando e dirigindo as atividade desses, para fraudarem dolosamente as arrematações judiciais realizadas nos autos das execuções fiscais nº 1999.61.16.001465-4 (POR DUAS VEZES), nº 2002.61.16.001025-0, nº 2003.61.16.000045-4, nº 2003.61.16.00232-3 e nº 2003.61.16.001182-8".
Resta assim, confirmado o esquema arquitetado pelo apelante, com vistas à fraudes em arrematações judiciais, com associação permanente e estável, tendo em conta os reiterados processos de execução onde o esquema foi utilizado.
Materialidade e autoria comprovadas, mantem-se o decreto condenatório.
No tocante à dosimetria, procedeu o sentenciante nos seguintes moldes:
2.3 DA DOSIMETRIA DA PENA
Das circunstâncias judiciais.
A culpabilidade deve ser sopesada em desfavor do acusado porque se valeu do conhecimento jurídico que detinha por ser advogado e da ampla visão jurídica que tal situação lhe possibilitava para, dessa forma, arquitetar juridicamente toda a estratagema criminosa colocada em prática pela quadrilha da qual participante.
Com conhecimento jurídico específico, mormente na seara do direito penal tributário, o réu não apenas alardeou aos demais corréus a possibilidade de alienação judicial de todos os bens da sociedade empresária CERVEJARIA MALTA LTDA como, também, apresentou-os um novo horizonte a aclarar a situação profissional, processual e criminal deles - que, à essa altura, já estava judicialmente nebulosa -, uma oportunidade de permanecerem nos bens já constritos e com leilões designados, evitando a transferência forçada desses bens a terceiros e, consequentemente, a paralisação das atividades empresariais.
O réu não registra antecedentes criminais, além de inexistirem meios para aferir sua personalidade, e, ademais, não há provas de que seu comportamento social seja merecedor de apontamento negativo.
Os motivos não foram além de unir esforços para praticar crimes reiterada e permanentemente.
As circunstâncias pesam em contrário ao acusado porque a quadrilha praticara os delitos mediante a constituição de empresa informal, ou seja, de "fachada" (MACHADO TRANSPORTADORA LTDA - EPP), fitada exclusivamente para concretizar os desideratos criminosos.
A audácia foi tamanha que a empresa foi forjada mantendo o mesmo endereço da CERVEJARIA MALTA LTDA, numa clara demonstração de que os agentes, incluindo o réu, estavam certos da impunidade do crime, tanto que somente alteraram o endereço quando o Ministério Público Federal questionou a identidade com o daquela.
Paralelo a isso, notou-se alteração contratual na empresa MACHADO TRANSPORTADORA LTDA - EPP, mediante injeção fictícia de aumento de capital social, na exata medida em que também se aumentava a ganância do bando na arrematação de bens de altos valores, ou seja, para lastrear formalmente a arrematação milionária, tudo para dificultar sobremaneira a punição ou garantir a vantagem da ação fraudulenta.
Nota-se, ainda, que o engenho criminoso foi bem orquestrado no sentido de entabular-se, também ficticiamente, contratos de locação nos quais a empresa MACHADO TRANSPORTE LTDA (denominação alterada posteriormente para MACHADO LOCADORA DE VEÍCULOS, MÁQUINAS E EQUIPAMENTOS - EPP) figurava como locadora, em contratos igualmente fictícios, à CERVEJARIA MALTA LTDA dos bens arrematados fraudulentamente, tudo a possibilitar que essa permanecesse nos bens cujas alienações buscava-se.
As consequências, igualmente, são dignas de maior reprovabilidade, porquanto beneficiou sobremaneira a CERVEJARIA MALTA LTDA que, até hoje - e a despeito de manter dívida bilionária com o fisco e ostentarem seus sócios um cabedal de condenações pelo cometimento de crimes tributários (algumas, inclusive, já transitadas em julgado), está na disposição dos bens e os utiliza na continuidade do processo industrial. Assim, não fosse a atuação exitosa da quadrilha na fraude à arrematação, já não deveriam tais bens estar sobre seus cuidados e, fatalmente, o fechamento da unidade empresarial seria certo.
A rigor, portanto, a CERVEJARIA MALTA LTDA, através de esquema criminoso em apreço, foi premiada na manutenção da livre disposição desses bens cuja fraude à arrematação frustrou a alienação forçada, estando nessa situação até então.
Essas consequências vão além, pois, perpassam à sociedade a imagem de descrédito com relação à Justiça Federal, pois, empresa notoriamente sonegadora de tributos, cujos sócios já foram reiteradas vezes condenados criminalmente por delitos desse jaez, continua explorando normalmente sua atividade como se intocável fosse, e tudo isso graças às nulidades das arrematações causadas pelas fraudes perpetradas pelos agentes, cuja consequência foi a sempre almejada pelo bando: manter a CERVEJARIA MALTA LTDA na disposição dos bens judicialmente constritos pelo maior tempo possível. A perenidade desse lapso temporal demonstra, a um só tempo, o sucesso da empreitada criminosa e o fracasso do Estado na repressão aos crimes cometidos.
O comportamento da vítima - UNIÃO - não é influente.
Havendo 3 (três) circunstâncias judiciais desfavoráveis, fixo a pena-base em 1 (um) ano e 9 (nove) meses de reclusão, esclarecendo que cada circunstância judicial desfavorável fora fixada em 3 (três) meses mediante cálculo matemático consubstanciado na divisão da diferença entre as penas mínima e máxima cominadas (24 meses) por 8 (número de circunstâncias judiciais), desprezando-se eventuais frações.
Das causas agravantes e atenuantes.
Faz-se presente a agravante arrolada na alínea "g" do inciso II do artigo 61 do Código Penal, eis que o réu agiu com violação de dever inerente à profissão de advogado, ofendendo o disposto no artigo 33, caput, da Lei nº 8.906/94, cumulado com o artigo 2º, parágrafo único, inciso I e II, do Código de Ética e Disciplina da Ordem dos Advogados do Brasil.
Também está nitente a presença da causa agravante prevista no artigo 62, I, d Código Penal, porquanto as provas subjetivas demonstraram inequivocamente que o réu dirigiu as atividades dos demais agentes, traçando a estratégia criminosa e orientando-os a segui-la, como admitido pelo próprio réu nos documentos de fls. 997/998 (Volume IV).
Esclareço, ademais, que a ausência de tal agravante na denúncia não obsta seu reconhecimento de ofício pelo Juiz, consoante previsão expressa no artigo 385 do Código de Processo Penal.
Não há circunstância atenuante.
Assim sendo, e adotando o mesmo produto matemático oriundo do método já referido, agravo a pena em 6 (seis) meses em razão das 2 (duas) circunstâncias agravantes para perfazê-la, por ora, em 2 (dois) anos e 3 (três) meses de reclusão.
Das causas de aumento e de diminuição.
Não há.
Da pena definitiva Fica a pena definitiva estabelecida em 2 (dois) anos e 3 (três) de reclusão.
2.4 Das disposições processuais
O réu poderá apelar em liberdade porque assim permaneceu durante todo o curso do processo.
O regime inicial de cumprimento de pena será o aberto, nos termos do artigo 33, 2º, "c", do CP. Presentes os requisitos do artigo 44 do CP, substituo a pena privativa de liberdade por duas restritivas de direito, sendo uma de prestação de serviço comunitário e outra pecuniária, ambas a serem definidas pelo juízo da execução.
Alega o apelante que as circunstâncias judiciais não são desfavoráveis ao apelante, tendo em conta que não houve nenhuma circunstância demonstrativa de que o acusado teria agido com intuito de arquitetar suposta fraude ou dirigido os atos dos demais acusados e tal questão sequer foi ventilada na denúncia.
Alega ainda que não foram consideradas como atenuantes o passado exemplar do recorrente e sua conduta escorreita.
Sem razão o apelante.
De fato, pode o sentenciante reconhecer circunstância agravante, ainda que não tenha sido alegada, consoante dispõe o artigo 385 do CPP.
No que se refere ao "passado exemplar do recorrente e sua conduta escorreita", à falta de previsão legal, não se constituem em circunstâncias atenuantes.
Ante o exposto, nego provimento à apelação, mantendo integralmente a sentença recorrida.
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Data e Hora: | 23/01/2019 15:46:59 |