D.E. Publicado em 19/02/2019 |
|
|
|
|
|
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação do INSS para fixar a DIB do benefício assistencial na data da citação, observando-se o período em que o autor percebeu o benefício de aposentadoria por invalidez, bem como para estabelecer que os valores em atraso sejam corrigidos monetariamente na forma da fundamentação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | CARLOS EDUARDO DELGADO:10083 |
Nº de Série do Certificado: | 11A217031744F093 |
Data e Hora: | 12/02/2019 16:45:25 |
|
|
|
|
|
RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, em ação ajuizada por RONALDO DA ROCHA, representado por MARIA JOSÉ DA SILVA ROCHA, objetivando a concessão do benefício assistencial previsto no art. 203, V, da Constituição Federal.
A r. sentença, de fls. 111/114, julgou procedente o pedido deduzido na inicial, condenando o INSS na concessão e no pagamento dos atrasados de benefício assistencial, desde a data da apresentação do requerimento administrativo (23/01/2013 - fl. 38). Fixou juros de mora conforme o art. 1º-F da Lei 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, e correção monetária segundo a mesma legislação, porém, somente até 25/03/2015, quando deverá será ser calculada com base no IPCA-E. Condenou o INSS, ainda, no pagamento de honorários advocatícios, arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor das parcelas em atraso, contabilizadas até a data da sua prolação. Por fim, determinou a imediata implantação do benefício, deferindo o pedido de tutela antecipada.
Em razões recursais de fls. 123/125-verso, o INSS pugna pela reforma da sentença, ao fundamento de que a parte autora não demonstrou ser hipossuficiente economicamente para fins de concessão de benefício assistencial. Subsidiariamente, pleiteia a fixação da DIB na data da citação, bem como a alteração dos critérios de aplicação da correção monetária e dos juros de mora.
Contrarrazões da parte autora às fls. 131/138.
Devidamente processado o recurso, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
Parecer do Ministério Público Federal (fls. 150/152-verso), no sentido desprovimento do recurso.
É o relatório.
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
A República Federativa do Brasil, conforme disposto no art. 1º, III, da Constituição Federal, tem como um de seus fundamentos a dignidade da pessoa humana que, segundo José Afonso da Silva, consiste em:
Para tornar efetivo este fundamento, diversos dispositivos foram contemplados na elaboração da Carta Magna, dentre eles, o art. 7º, IV, que dispõe sobre as necessidades vitais básicas como moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social e o art. 203, que instituiu o benefício do amparo social, com a seguinte redação:
Entretanto, o supracitado inciso, por ser uma norma constitucional de eficácia limitada, dependia da edição de uma norma posterior para produzir os seus efeitos, qual seja, a Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993, regulamentada pelo Decreto nº 1.744, de 8 de dezembro de 1995 e, posteriormente, pelo Decreto nº 6.214, de 26 de setembro de 2007.
O art. 20 da Lei Assistencial, com redação fornecida pela Lei nº 12.435/2011, e o art. 1º de seu decreto regulamentar estabeleceram os requisitos para a concessão do benefício, quais sejam: ser o requerente deficiente ou idoso, com 70 anos ou mais e que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção e nem tê-la provida por sua família. A idade mínima de 70 anos foi reduzida para 67 anos, a partir de 1º de janeiro de 1998, pelo art. 1º da Lei nº 9.720/98 e, posteriormente, para 65 anos, através do art. 34 da Lei nº 10.741 de 01 de outubro de 2003, mantida, inclusive, por ocasião da edição da Lei nº 12.435, de 6 de julho de 2011.
Os mesmos dispositivos legais disciplinaram o que consideram como pessoa com deficiência, família e ausência de condições de se manter ou de tê-la provida pela sua família.
Pessoa com deficiência é aquela incapacitada para o trabalho, em decorrência de impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com uma ou mais barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, na dicção do art. 20, §2º, com a redação dada pela Lei nº 13.146, de 06 de julho de 2015.
O impedimento de longo prazo, a seu turno, é aquele que produz seus efeitos pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos (§10º).
A incapacidade exigida, por sua vez, não há que ser entendida como aquela que impeça a execução de todos os atos da vida diária, para os quais se faria necessário o auxílio permanente de terceiros, mas a impossibilidade de prover o seu sustento por meio do exercício de trabalho ou ocupação remunerada.
Neste sentido, o entendimento do C. Superior Tribunal de Justiça, em julgado da lavra do Ministro Relator Gilson Dipp (5ª Turma, REsp nº 360.202, 04.06.2002, DJU 01.07.2002, p. 377), oportunidade em que se consignou: "O laudo pericial que atesta a incapacidade para a vida laboral e a capacidade para a vida independente, pelo simples fato da pessoa não necessitar da ajuda de outros para se alimentar, fazer sua higiene ou se vestir, não pode obstar a percepção do benefício, pois, se esta fosse a conceituação de vida independente, o benefício de prestação continuada só seria devido aos portadores de deficiência tal, que suprimisse a capacidade de locomoção do indivíduo - o que não parece ser o intuito do legislador".
No que se refere à hipossuficiência econômica, a Medida Provisória nº 1.473-34, de 11.08.97, transformada na Lei nº 9.720, em 30.11.98, alterou o conceito de família para considerar o conjunto de pessoas elencadas no art. 16 da Lei nº 8.213/91, desde que vivendo sob o mesmo teto. Com a superveniência da Lei nº 12.435/11, definiu-se, expressamente para os fins do art. 20, caput, da Lei Assistencial, ser a família composta pelo requerente, cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto (art. 20, §1º).
Já no que diz respeito ao limite de ¼ do salário mínimo per capita como critério objetivo para comprovar a condição de miserabilidade, anoto que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento da Reclamação nº 4374/PE, reapreciou a decisão proferida em sede de controle concentrado de constitucionalidade (ADI nº 1.232-1/DF), declarando a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/93.
O v. acórdão, cuja ementa ora transcrevo, transitou em julgado em 19.09.2013:
Entretanto, interpretando tal decisão, chega-se à conclusão de que a Lei Assistencial, ao fixar a renda per capita, estabeleceu uma presunção da condição de miserabilidade, não sendo vedado comprovar a insuficiência de recursos para prover a manutenção do deficiente ou idoso por outros meios de prova.
Tal entendimento descortina a possibilidade do exame do requisito atinente à hipossuficiência econômica pelos já referidos "outros meios de prova".
A questão, inclusive, levou o Colendo Superior Tribunal de Justiça a sacramentar a discussão por meio da apreciação da matéria em âmbito de recurso representativo de controvérsia repetitiva assim ementado:
No que pertine à exclusão, da renda do núcleo familiar, do valor do benefício assistencial percebido pelo idoso, conforme disposto no art. 34, parágrafo único, da Lei nº 10.741/03, referido tema revelou-se polêmico, por levantar a discussão acerca do discrímen em se considerar somente o benefício assistencial para a exclusão referida, e não o benefício previdenciário de qualquer natureza, desde que de igual importe; sustentava-se, então, que a ratio legis do artigo em questão dizia respeito à irrelevância do valor para o cálculo referenciado e, bem por isso, não havia justificativa plausível para a discriminação.
Estabelecido o dissenso inclusive perante o Superior Tribunal de Justiça, o mesmo se resolveu no sentido, enfim, de se excluir do cálculo da renda familiar todo e qualquer benefício de valor mínimo recebido por pessoa maior de 65 anos, em expressa aplicação analógica do contido no art. 34, parágrafo único, do Estatuto do Idoso.
Refiro-me, inicialmente, à Petição nº 7203/PE (Incidente de Uniformização de Jurisprudência), apreciada pela 3ª Seção do STJ em 10 de agosto de 2011 (Rel. Ministra Maria Thereza de Assis Moura) e, mais recentemente, ao Recurso Especial nº 1.355.052/SP, processado segundo o rito do art. 543-C do CPC/73 e que porta a seguinte ementa:
Do caso concreto.
Pleiteia o autor a concessão do benefício assistencial, uma vez que, segundo alega, é incapaz e não possui condições de manter seu próprio sustento ou de tê-lo provido por sua família.
O impedimento de longo prazo restou incontroverso nos autos, na medida em que o INSS não impugnou o capítulo da sentença que o reconheceu, nem esta foi submetida à remessa necessária.
O estudo social, realizado em 06 de abril de 2015 (fls. 79/83), informou ser o núcleo familiar composto tão somente pelo demandante.
Consoante às informações prestadas, o autor reside em imóvel cedido por sua genitora, composto de "três cômodos (quarto, cozinha e banheiro) sendo metade de alvenaria e metade de tábua" (sic).
A renda do requerente era de R$80,00 mensais, por estar inscrito no Programa de Transferência de Renda-Programa Renda Cidadã.
Note-se, portanto, que a renda per capita do núcleo familiar era inferior a ¼ do salário mínimo vigente à época (R$197,00).
Informações extraídas do sistema HISCREWEB - Histórico de Créditos de Benefícios, os quais ora faço anexar aos autos, no entanto, dão conta que o autor recebeu benefício previdenciário de aposentadoria por invalidez entre julho de 2015 e março de 2016 (NB: 168.436.278-1), o que afasta a miserabilidade no interregno, nos moldes do art. 20, §4º, da Lei 8.742/93.
Por outro lado, nos autos, consta notícia que tal beneplácito foi concedido e cessado em virtude de outra demanda proposta pelo requerente (fl. 130).
Pois bem, a partir de abril de 2016, mantidas as condições descritas no estudo social, se mostra inegável que, sem os proventos de aposentadoria por invalidez, o autor vivia em situação de miséria absoluta.
Cumpre destacar que a assistente social, ainda, relatou que o requerente, na ocasião, "apresentou documentos onde constam vários registros de suas internações. No ano de 2008/2009 e 2010 esteve internado na Casa de Repouso no município de Adamantina, em 2011/2012 e 2013 esteve internado no IPT no município de Tupã" (sic). Frisa-se que, segundo o laudo pericial, de fls. 68/71, o autor é portador de "esquizofrenia residual (CID10 - F.20.5)".
A despeito de afirmar que sua genitora lhe prestava auxílio, esta recebia 2 (dois) salários mínimos por mês, decorrentes de benefícios previdenciários, tendo contraído, inclusive, nos termos do estudo socioeconômico, "empréstimo no valor de R$900,00/mês, utilizado para a construção de dois cômodos para seu irmão Vicente da Silva Rocha de 43 anos, alcoolista e com problemas psiquiátricos, ficando a renda total de sua genitora comprometida com o empréstimo e com as despesas fixas de água, luz e alimentação no valor mensal de R$600,00 (seiscentos reais)" (sic).
Alie-se, por fim, como elemento de convicção, que o juiz de primeiro grau, em contato direto com a prova produzida (partes, perícia médica e estudo social), concluiu pela concessão do benefício assistencial. Nestes termos, consignou na decisão, verbis:
"(...) Já no estudo social realizado (fl. 83), a Sra. Assistente Social constatou que o autor 'possui condições mínimas para sua sobrevivência', encontrando-se em uma 'situação demasiadamente vulnerável, pois conta com a insegurança financeira de sua genitora'.
Dessa forma, conforme se verifica do estudo social e laudo pericial, está comprovado o requisito de incapacidade total e permanente, bem como a hipossuficiência (...)" (fl. 112).
Por todo o exposto, em minuciosa análise do conjunto fático probatório, verifico que autor se enquadra na concepção legal de hipossuficiência econômica, fazendo, portanto, jus à concessão de benefício assistencial, que seria devido tão somente a partir de abril de 2016.
Entretanto, fixo a DIB na data da citação. Explico.
Acerca do termo inicial do benefício, firmou-se consenso na jurisprudência que este se dá na data do requerimento administrativo, se houver, ou na data da citação, na sua inexistência. Nessa esteira, confira-se o entendimento do Superior Tribunal de Justiça:
É bem verdade que, em hipóteses excepcionais, o termo inicial do benefício pode ser fixado nas datas dos laudos, ou até em outra data, nos casos, por exemplo, em que a data do início da miserabilidade ou incapacidade não são especificadas pelo estudo social e pela perícia médica, respectivamente, até porque, entender o contrário, seria conceder o benefício ao arrepio da lei, isto é, antes da presença dos requisitos autorizadores para a concessão, o que configuraria inclusive enriquecimento ilícito do postulante.
No caso dos autos, a miserabilidade do requerente somente restou comprovada após a cessação do benefício de aposentadoria por invalidez de NB: 168.436.278-1, que se deu em 01º/04/2016 (fl. 130), data em que deveria ser fixada a DIB do benefício assistencial.
Entretanto, como o INSS apenas requereu em seu apelo a determinação da DIB na data da citação, fixo o termo inicial neste momento.
A correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal vigente quando da elaboração da conta, aplicando-se o IPCA-E nos moldes do julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), com efeitos prospectivos.
Ressalto que os embargos de declaração opostos contra referido acórdão tem por escopo a modulação dos seus efeitos - atribuição de eficácia prospectiva -, sendo que a concessão de efeito suspensivo não impede o julgamento do presente recurso, haja vista que o quanto lá decidido deverá ser observado apenas no momento da liquidação deste julgado.
Os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, devem ser fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante.
Saliento que, não obstante tratar-se de benefício assistencial, deve ser observado o tópico do Manual atinente aos benefícios previdenciários, a teor do disposto no parágrafo único do art. 37 da Lei nº 8.742/93.
É como voto.
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | CARLOS EDUARDO DELGADO:10083 |
Nº de Série do Certificado: | 11A217031744F093 |
Data e Hora: | 12/02/2019 16:45:22 |