Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 27/06/2019
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0000794-21.2014.4.03.6140/SP
2014.61.40.000794-0/SP
RELATOR : Desembargador Federal NELSON PORFIRIO
APELANTE : Instituto Nacional do Seguro Social - INSS
APELADO(A) : EDSON FRAZAO DE MELO
ADVOGADO : SP345099 MATHEUS MARTINS SANT ANNA e outro(a)
No. ORIG. : 00007942120144036140 1 Vr MAUA/SP

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. DEFICIÊNCIA. RETORNO AO TRABALHO. AUSÊNCIA DE COMUNICAÇÃO. PAGAMENTO INDEVIDO. MÁ-FÉ. OCORRÊNCIA. DEVOLUÇÃO DE VALORES. POSSIBILIDADE. PRESCRIÇÃO. SUSPENSÃO. PROCESSO ADMINISTRATIVO. OCORRÊNCIA PARCIAL. CONSECTÁRIOS LEGAIS.
1. O benefício assistencial de prestação continuada ou amparo social encontra assento no art. 203, V, da Constituição Federal, tendo por objetivo primordial a garantia de renda à pessoa deficiente e ao idoso com idade igual ou superior a 65 (sessenta e cinco anos) em estado de carência dos recursos indispensáveis à satisfação de suas necessidades elementares, bem assim de condições de tê-las providas pela família.
2. Segundo a Lei 13.146/2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência) "para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas". De acordo com a referida lei, entende-se por longo prazo o impedimento cujos efeitos perduram pelo prazo mínimo de 02 (dois) anos.
3. Benefício assistencial concedido administrativamente tendo em vista sua condição de deficiente, nos termos do art. 20, §2º da Lei nº 8.742/93, aliado à demonstração da hipossuficiência econômica.
4. Dever da autarquia previdenciária em revisar/avaliar a continuidade das condições que lhe garantiram a concessão do benefício, nos termos do art. 21 da Lei nº 8.742/93. Em contrapartida, havendo a cessação das condições que garantiram o direito ao benefício assistencial, cabe ao beneficiário comunicar tal fato ao ente público, sob pena de arcar com os ônus de eventual omissão.
5. Processo administrativo instaurado em razão de existência de vínculo empregatício. Ação judicial de cobrança em que se objetiva a devolução dos valores recebidos indevidamente a título de benefício assistencial.
6. Alegação de que o requerido labora na condição de portador de necessidades especiais, bem como, que lhe foi informado que caberia à autarquia, a cada dois anos, a verificação da manutenção das condições para o recebimento do benefício, não lhe podendo ser imputado má-fé quanto a isso. Por fim, aduz que o benefício tem natureza alimentar, razão pela qual é impossível a sua devolução.
7. Condições do vínculo empregatício do requerido que não se enquadram nas condições excepcionais descritas no art. 21 da Lei nº 8.742/93.
8. Ausente, a manutenção de um dos requisitos, qual seja, a deficiência nos termos da lei, a análise da hipossuficiência econômica torna-se desnecessária.
9. A conduta omissiva do requerido não pode ser caracterizada de boa-fé, porquanto, beneficiário de benefício assistencial por deficiência, passou a trabalhar com frequência/com regularidade/com formal registro por diversos períodos, o que é completamente incompatível com a legislação em vigor, agindo, o requerido, assim, com evidente má-fé. Tal caracterização afasta, portanto, a alegação de afronta ao princípio da irrepetibilidade dos alimentos. A arguição de ignorância não socorre o requerente, nos termos da Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro, em seu artigo 3º, que preceitua que "Ninguém se escusa de cumprir a lei, alegando que não a conhece". Precedentes do c. STJ e desta Corte.
10. Quanto ao prazo prescricional, a jurisprudência deste Tribunal tem ser orientado no sentido de que, ante a inexistência de prazo geral expressamente fixado para as ações movidas pela Fazenda Pública contra o particular, em se tratando de benefícios previdenciários, há que se aplicar por simetria o disposto no parágrafo único do artigo 103 da Lei 8.213/91, sendo considerado, portanto, de cinco anos.
11. Por outro lado, em caso de concessão e/ou manutenção indevida de benefício previdenciário, ocorrendo a notificação do segurado em relação à instauração do processo revisional, não se pode cogitar de curso do prazo prescricional, devendo ser aplicado, por isonomia, o artigo 4º do Decreto 20.910/1932. Suspensão do prazo prescricional.
12. No caso dos autos, o período a que se busca o ressarcimento é de 01.12.2005 a 31.10.2010. O requerido foi devidamente notificado da instauração do Processo Administrativo em 01.11.2010 (fls. 123/125). O Relatório Conclusivo do procedimento administrativo está datado de 26.02.2013 (fl. 168). A presente ação de cobrança foi ajuizada em 14.03.2014.
13. Assim, ajuizada a ação judicial em 14.03.2014, tem-se que decorreu 01 ano e 15 dias desde 26.02.2013, data em que o prazo prescricional de 5 anos retornou a fluir, haja vista estar suspenso desde 01.11.2010. Dessa forma, devem-se contar mais 03 anos, 11 meses e 15 dias retroativos à suspensão, chegando-se, portanto, à data de 17.11.2006. Consequentemente, o crédito anterior a essa data encontra-se prescrito.
14. Os valores deverão ser atualizados monetariamente e acrescidos de juros moratórios, nos termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal.
15. Honorários advocatícios arbitrados em 10% sobre o valor da causa, nos termos do art. 85 do Código de Processo Civil/2015, cuja execução observará o disposto no art. 98, § 3º, do citado diploma legal, em razão da gratuidade da justiça, que ora defiro.
16. Apelação do INSS parcialmente provida.


ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação do INSS para condenar o requerido ao ressarcimento dos valores recebidos indevidamente no período de 17.11.2006 a 31.10.2010, devidamente corrigidos, restando atingidos pela prescrição os créditos do período de 01.12.2005 a 16.11.2006, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 18 de junho de 2019.
NELSON PORFIRIO
Desembargador Federal


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
Signatário (a): NELSON DE FREITAS PORFIRIO JUNIOR:10081
Nº de Série do Certificado: 11DE180529616199
Data e Hora: 18/06/2019 17:41:30



APELAÇÃO CÍVEL Nº 0000794-21.2014.4.03.6140/SP
2014.61.40.000794-0/SP
RELATOR : Desembargador Federal NELSON PORFIRIO
APELANTE : Instituto Nacional do Seguro Social - INSS
APELADO(A) : EDSON FRAZAO DE MELO
ADVOGADO : SP345099 MATHEUS MARTINS SANT ANNA e outro(a)
No. ORIG. : 00007942120144036140 1 Vr MAUA/SP

RELATÓRIO

O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): Trata-se de ação pelo rito ordinário proposta pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS em face de EDSON FRAZÃO DE MELO, em que se objetiva a devolução dos valores recebidos indevidamente a título de benefício assistencial.

Contestação às fls. 179/186.

O pedido foi julgado improcedente (fls. 191/195).

O INSS interpôs apelação (fls. 198/209).

Decorrido o prazo para a oferta das contrarrazões, os autos subiram a esta Corte.

O Ministério Público Federal opinou pelo sobrestamento do feito, em razão da existência do Recurso Repetitivo Resp. 1.381.734/RN.

É o relatório.


VOTO

O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): Pretende o INSS o ressarcimento dos valores pagos a título de Benefício Assistencial ao deficiente, no período de 01.12.2005 a 31.10.2010, tendo em vista a existência de diversos vínculos empregatícios concomitantes ao recebimento do benefício assistencial.

De início, considerando que no presente caso não estamos diante de interpretação errônea, má aplicação da lei ou erro da administração da Previdência Social, questões afetas ao Recurso Especial nº 1.381.734/RN, selecionado como representativo de controvérsia, na forma do art. 1.036, §5º, do CPC/2015 (Tema 979), não há que se falar em sobrestamento do feito.

Consta dos autos que o requerido teve seu benefício nº 87/120.509.509.402-1 deferido administrativamente desde 25.04.2001, em razão do preenchimento dos requisitos de deficiência e hipossuficiência econômica (fls. 82/111).

Posteriormente, verificou-se que o segurado possuía diversos vínculos empregatícios concomitantes ao recebimento do benefício assistencial (fls. 112/122).

Instado a apresentar defesa, o segurado foi notificado em 01.11.2010, apresentando-se pessoalmente em 03.11.2010 e defendendo-se (fls. 123/125). Posteriormente, a autarquia encaminhou nova correspondência informando que o benefício havia sido suspenso, facultando ao segurado prazo para recorrer, bem como, comunicando o valor a ser devolvido (fls. 128/129). O segurado apresentou, então, recurso à Junta de Recursos da Previdência Social, que lhe negou provimento (fls. 1030/144). Irresignado, apresentou, ainda, recurso ao Conselho de Recursos da Previdência Social, ao qual também foi negado provimento (fls. 145/167).

Em suas defesas administrativas e contestação o requerido afirma que laborou na condição de portador de necessidades especiais. Alega, ainda, que lhe foi informado que caberia à autarquia, a cada dois anos, a verificação da manutenção das condições para o recebimento do benefício, não lhe podendo ser imputado má-fé quanto a isso. Por fim, aduz que o benefício tem natureza alimentar, razão pela qual é impossível a sua devolução.

Inicialmente, assinale-se que o benefício em questão é de natureza assistencial e deve ser prestado a quem dele necessitar, independentemente do recolhimento de contribuições.

O benefício assistencial de prestação continuada ou amparo social encontra assento no art. 203, V, da Constituição Federal, tendo por objetivo primordial a garantia de renda à pessoa deficiente e ao idoso com idade igual ou superior a 65 (sessenta e cinco anos) em estado de carência dos recursos indispensáveis à satisfação de suas necessidades elementares, bem assim de condições de tê-las providas pela família:


"Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:
...........................................................
V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.".

Até a regulamentação do citado dispositivo constitucional, ocorrida com a edição da Lei 8.742/1993 (Lei Orgânica da Assistência Social), a proteção ao deficiente e ao idoso hipossuficientes era objeto da Lei 6.179/1974, a qual instituiu o benefício denominado "amparo previdenciário" destinado a pessoas maiores de 70 (setenta) anos ou inválidas, consistente no pagamento mensal de renda vitalícia equivalente à metade do salário mínimo vigente no país. A partir do advento da Constituição de 1988, o valor do benefício foi elevado para 1 (um) salário mínimo, à vista do disposto no art. 139, § 2º, da Lei 8.231/1991.

A renda mensal vitalícia em referência foi extinta pelo art. 40 da Lei 8.742/1993, sendo estabelecido em seu lugar o benefício assistencial de prestação continuada previsto no art. 20 do mesmo diploma legal.

Atualmente, a disciplina legal do instituto encontra-se formatada pelas Leis 9.720/1998 12.435/2011, 12.470/2011 e 13.146/2015, as quais promoveram alterações substanciais nos arts. 20 e 21 da Lei Orgânica da Assistência Social.

No tocante aos beneficiários, dispõe o art. 20 da Lei 8.231/1991:


"Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família."

No que concerne à pessoa com deficiência, as sucessivas alterações legislativas ocorridas na redação do § 2º, do art. 20 da Lei Orgânica da Assistência Social evidenciam tendência evolutiva na consideração da sua conceituação legal. Originariamente, a deficiência encontrava-se relacionada à incapacidade para a vida independente e para o trabalho. Posteriormente, a Lei 12.435/2011 incluiu no dispositivo em análise a definição contida no art. 1º da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência de 30.03.2007, incorporada ao ordenamento jurídico interno pelo Decreto n. 6.949/2009, de acordo com a qual:


"Pessoas com deficiência são aquelas que têm impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdades de condições com as demais pessoas."

Entretanto, ao fixar o entendimento da expressão "impedimentos de longo prazo", a Lei 12.435/2011 optou por restringir a concessão do benefício exclusivamente às pessoas com deficiência que apresentem incapacidade para a vida independente e para o trabalho pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos. Note-se que a jurisprudência já vinha suavizando a interpretação sobre o alcance da aludida incapacidade, como se extrai da seguinte decisão:


"PROCESSUAL CIVIL - BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA - EMBARGOS DE DECLARAÇÃO - AUSÊNCIA DE CONTRADIÇÃO, OBSCURIDADE OU OMISSÃO - EFEITO MODIFICATIVO OU INFRINGENTE - INADMISSIBILIDADE - PREQUESTIONAMENTO.
I - Os embargos servem apenas para esclarecer o obscuro, corrigir a contradição ou integrar o julgado. De regra, não se prestam para modificar o mérito do julgamento em favor da parte.
II - Não consiste no fator determinante do princípio da seletividade e distributividade a incapacidade para a vida independente e para o trabalho. A Constituição Federal é expressa em seu artigo 203, inciso V, que o benefício assistencial será devido à pessoa portadora de deficiência.
III - Os embargos de declaração interpostos com notório propósito de prequestionamento não têm caráter protelatório.
IV - Embargos de declaração rejeitados.
(TRF 3ª Região, DÉCIMA TURMA, AC 0000553-96.2003.4.03.9999, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL SERGIO NASCIMENTO, julgado em 14/12/2004, DJU DATA:21/02/2005) (Grifou-se)

A propósito do tema, confira-se ainda o teor da Súmula n. 29 da Turma Nacional de Uniformização - TNU dos Juizados Especiais:


"Para os efeitos do art. 20, § 2º, da Lei 8.742/93, incapacidade para a vida independente não é só aquela que impede as atividades mais elementares da pessoa, mas também a impossibilita de prover ao próprio sustento."

Em compasso com a evolução interpretativa promovida pela jurisprudência, a Lei 12.470/2011 abandonou o parâmetro consubstanciado na incapacidade para a vida independente e para o trabalho, preservando a definição consagrada na Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência.

Atualmente, o dispositivo em exame encontra-se vigendo com a redação conferida pela Lei 13.146/2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência), a qual explicitou a definição legal de pessoa com deficiência:


"Para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas."

Ademais, cumpre assinalar que o § 10, do mesmo dispositivo, incluído pela Lei 12.470/2011, considera por longo prazo o impedimento cujos efeitos perduram pelo prazo mínimo de 02 (dois) anos.

No tocante à situação socioeconômica do beneficiário, consta do § 3º do art. 20 da Lei Orgânica da Assistência Social, com a redação dada pela Lei 12.435/2001:


"Considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo."

Inicialmente, o dispositivo em referência teve a constitucionalidade afirmada pelo Supremo Tribunal Federal em sede de controle concentrado na ADIn nº 1.232-1 (Rel. Min. Ilmar Galvão, por redistribuição, DJU, 26 maio 1995, p. 15154). Entretanto, a pretexto da ocorrência de processo de inconstitucionalização oriundo de alterações de ordem fática (políticas, econômicas e sociais) e jurídica (estabelecimento de novos patamares normativos para concessão de benefícios assistenciais em geral), o Supremo Tribunal Federal reviu o anterior posicionamento, declarando a inconstitucionalidade parcial do dispositivo, sem pronúncia de nulidade, em julgado assim ementado:


"Benefício assistencial de prestação continuada ao idoso e ao deficiente. Art. 203, V, da Constituição. A Lei de Organização da Assistência Social (LOAS), ao regulamentar o art. 203, V, da Constituição da República, estabeleceu os critérios para que o benefício mensal de um salário mínimo seja concedido aos portadores de deficiência e aos idosos que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família. 2. Art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993 e a declaração de constitucionalidade da norma pelo Supremo Tribunal Federal na ADI 1.232. Dispõe o art. 20, § 3º, da Lei 8.742/93 que "considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa portadora de deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo". O requisito financeiro estabelecido pela lei teve sua constitucionalidade contestada, ao fundamento de que permitiria que situações de patente miserabilidade social fossem consideradas fora do alcance do benefício assistencial previsto constitucionalmente. Ao apreciar a Ação Direta de Inconstitucionalidade 1.232-1/DF, o Supremo Tribunal Federal declarou a constitucionalidade do art. 20, § 3º, da LOAS. 3. Decisões judiciais contrárias aos critérios objetivos preestabelecidos e Processo de inconstitucionalização dos critérios definidos pela Lei 8.742/1993. A decisão do Supremo Tribunal Federal, entretanto, não pôs termo à controvérsia quanto à aplicação em concreto do critério da renda familiar per capita estabelecido pela LOAS. Como a lei permaneceu inalterada, elaboraram-se maneiras de se contornar o critério objetivo e único estipulado pela LOAS e de se avaliar o real estado de miserabilidade social das famílias com entes idosos ou deficientes. Paralelamente, foram editadas leis que estabeleceram critérios mais elásticos para a concessão de outros benefícios assistenciais, tais como: a Lei 10.836/2004, que criou o Bolsa Família; a Lei 10.689/2003, que instituiu o Programa Nacional de Acesso à Alimentação; a Lei 10.219/01, que criou o Bolsa Escola; a Lei 9.533/97, que autoriza o Poder Executivo a conceder apoio financeiro a Municípios que instituírem programas de garantia de renda mínima associados a ações socioeducativas. O Supremo Tribunal Federal, em decisões monocráticas, passou a rever anteriores posicionamentos acerca da intransponibilidade do critérios objetivos. Verificou-se a ocorrência do processo de inconstitucionalização decorrente de notórias mudanças fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios assistenciais por parte do Estado brasileiro). 4. Declaração de inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993. 5. Recurso extraordinário a que se nega provimento."
(RE 567985, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Relator(a) p/ Acórdão: Min. GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 18/04/2013, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-194 DIVULG 02-10-2013 PUBLIC 03-10-2013).

Consequentemente, foi rechaçada a aferição da miserabilidade unicamente pelo critério objetivo previsto no art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993, passando-se a admitir o exame das reais condições sociais e econômicas do postulante ao benefício, como denota a seguinte decisão:


"Agravos regimentais em reclamação. Perfil constitucional da reclamação. Ausência dos requisitos. Recursos não providos. 1. Por atribuição constitucional, presta-se a reclamação para preservar a competência do STF e garantir a autoridade de suas decisões (art. 102, inciso I, alínea l, CF/88), bem como para resguardar a correta aplicação de súmula vinculante (art. 103-A, § 3º, CF/88). 2. A jurisprudência desta Corte desenvolveu parâmetros para a utilização dessa figura jurídica, dentre os quais se destaca a aderência estrita do objeto do ato reclamado ao conteúdo das decisões paradigmáticas do STF. 3. A definição dos critérios a serem observados para a concessão do benefício assistencial depende de apurado estudo e deve ser verificada de acordo com as reais condições sociais e econômicas de cada candidato à beneficiário, não sendo o critério objetivo de renda per capta o único legítimo para se aferir a condição de miserabilidade. Precedente (Rcl nº 4.374/PE) 4. Agravos regimentais não providos."(Rcl 4154 AgR, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, julgado em 19/09/2013, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-229 DIVULG 20-11-2013 PUBLIC 21-11-2013)

É importante destacar que o Superior Tribunal de Justiça já admitia outros meios de prova para aferir a hipossuficiência do postulante ao amparo assistencial, além do montante da renda per capita, reputando a fração estabelecida no § 3º do art. 20 da Lei 8.742/1993 como parâmetro abaixo do qual a miserabilidade deve ser presumida de forma absoluta. Nesse sentido, a seguinte decisão prolatada em sede de recurso especial representativo de controvérsia:


"RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. ART. 105, III, ALÍNEA C DA CF. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. POSSIBILIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DA CONDIÇÃO DE MISERABILIDADE DO BENEFICIÁRIO POR OUTROS MEIOS DE PROVA, QUANDO A RENDA PER CAPITA DO NÚCLEO FAMILIAR FOR SUPERIOR A 1/4 DO SALÁRIO MÍNIMO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. A CF/88 prevê em seu art. 203, caput e inciso V a garantia de um salário mínimo de benefício mensal, independente de contribuição à Seguridade Social, à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.
2. Regulamentando o comando constitucional, a Lei 8.742/93, alterada pela Lei 9.720/98, dispõe que será devida a concessão de benefício assistencial aos idosos e às pessoas portadoras de deficiência que não possuam meios de prover à própria manutenção, ou cuja família possua renda mensal per capita inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo.
3. O egrégio Supremo Tribunal Federal, já declarou, por maioria de votos, a constitucionalidade dessa limitação legal relativa ao requisito econômico, no julgamento da ADI 1.232/DF (Rel. para o acórdão Min. NELSON JOBIM, DJU 1.6.2001).
4. Entretanto, diante do compromisso constitucional com a dignidade da pessoa humana, especialmente no que se refere à garantia das condições básicas de subsistência física, esse dispositivo deve ser interpretado de modo a amparar irrestritamente a o cidadão social e economicamente vulnerável.
5. A limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade, ou seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita inferior a 1/4 do salário mínimo.
6. Além disso, em âmbito judicial vige o princípio do livre convencimento motivado do Juiz (art. 131 do CPC) e não o sistema de tarifação legal de provas, motivo pelo qual essa delimitação do valor da renda familiar per capita não deve ser tida como único meio de prova da condição de miserabilidade do beneficiado. De fato, não se pode admitir a vinculação do Magistrado a determinado elemento probatório, sob pena de cercear o seu direito de julgar.
7. Recurso Especial provido."
(REsp 1112557/MG, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 28/10/2009, DJe 20/11/2009).

No mesmo sentido tem se orientado a jurisprudência desta Corte:


CONSTITUCIONAL. PROCESSO CIVIL. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. AGRAVO (CPC, ART. 557, §1º). REQUISITOS LEGAIS NÃO COMPROVADOS.
I - Ao negar seguimento à apelação da parte autora, a decisão agravada levou em conta que, não obstante o preenchimento do requisito etário, não restou comprovada a sua miserabilidade.
II - Não se olvida que o entendimento predominante na jurisprudência é o de que o limite de renda per capita de um quarto do salário mínimo, previsto no artigo 20, §3º, da Lei 8.742/93, à luz do sistema de proteção social ora consolidado, se mostra inconstitucional, devendo a análise da miserabilidade levar em conta a situação específica do postulante ao benefício assistencial. Todavia, no caso dos autos, observada a situação socioeconômica da parte autora, não restou comprovada a miserabilidade alegada.
III - Agravo (CPC, art. 557, §1º) interposto pela parte autora improvido.
(TRF 3ª Região, DÉCIMA TURMA, AC 0011936-51.2015.4.03.9999, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL SERGIO NASCIMENTO, julgado em 18/08/2015, e-DJF3 Judicial 1 DATA:26/08/2015)

Atualmente encontra-se superada a discussão em torno da renda per capita familiar como único parâmetro de medida do critério socioeconômico, pois, com a inclusão pela Lei 13.146/2015 do § 11 no art. 20 da Lei Orgânica da Assistência Social, passou a constar previsão legal expressa autorizando a utilização de outros elementos probatórios para a verificação da miserabilidade e do contexto de vulnerabilidade do grupo familiar exigidos para a concessão do benefício assistencial de prestação continuada.

Assim, no caso vertente, o requerido teve concedido seu benefício assistencial tendo em vista sua condição de deficiente, nos termos do art. 20, §2º da Lei nº 8.742/93, conforme se verifica da perícia médica administrativa juntada à fl. 91, aliado à demonstração da hipossuficiência econômica.

Por outro lado, cabe à autarquia previdenciária a revisão/avaliação da continuidade das condições que lhe garantiram a concessão do benefício, nos termos do art. 21 da já citada lei:


"Art. 21. O benefício de prestação continuada deve ser revisto a cada 2 (dois) anos para avaliação da continuidade das condições que lhe deram origem.
§ 1º O pagamento do benefício cessa no momento em que forem superadas as condições referidas no caput, ou em caso de morte do beneficiário.
§ 2º O benefício será cancelado quando se constatar irregularidade na sua concessão ou utilização.
§ 3o O desenvolvimento das capacidades cognitivas, motoras ou educacionais e a realização de atividades não remuneradas de habilitação e reabilitação, entre outras, não constituem motivo de suspensão ou cessação do benefício da pessoa com deficiência.
§ 4o A cessação do benefício de prestação continuada concedido à pessoa com deficiência, inclusive em razão do seu ingresso no mercado de trabalho, não impede nova concessão do benefício, desde que atendidos os requisitos definidos em regulamento.
§ 4º A cessação do benefício de prestação continuada concedido à pessoa com deficiência não impede nova concessão do benefício, desde que atendidos os requisitos definidos em regulamento.
Art. 21-A. O benefício de prestação continuada será suspenso pelo órgão concedente quando a pessoa com deficiência exercer atividade remunerada, inclusive na condição de microempreendedor individual.
§ 1o Extinta a relação trabalhista ou a atividade empreendedora de que trata o caput deste artigo e, quando for o caso, encerrado o prazo de pagamento do seguro-desemprego e não tendo o beneficiário adquirido direito a qualquer benefício previdenciário, poderá ser requerida a continuidade do pagamento do benefício suspenso, sem necessidade de realização de perícia médica ou reavaliação da deficiência e do grau de incapacidade para esse fim, respeitado o período de revisão previsto no caput do art. 21.
§ 2o A contratação de pessoa com deficiência como aprendiz não acarreta a suspensão do benefício de prestação continuada, limitado a 2 (dois) anos o recebimento concomitante da remuneração e do benefício".

Em contrapartida, havendo a cessação das condições que garantiram o direito ao benefício assistencial, cabe ao beneficiário comunicar tal fato ao ente público, sob pena de arcar com os ônus de eventual omissão.

Em consulta ao CNIS/PLENUS, na data de hoje, bem como, de acordo com as anotações constantes das CTPS às fls. 140/144, verifica-se que, de fato, o requerido possuiu os seguintes vínculos empregatícios:

- 01.12.2005 a 21.02.2006 - Metalúrgica Quasar Ltda. - operador de máquinas;

- 25.04.2006 a 04.03.2008 - Telecomunicações de São Paulo - assistente de negócios;

- 14.07.2008 a 15.01.2009 - Hospital Ribeirão Pires Ltda. - auxiliar de almoxarifado;

- 08.09.2009 a 28.10.2010 - Sociedade Beneficente São Camilo - auxiliar de escritório.


Note-se, que nas "anotações gerais" da CTPS não há qualquer anotação de que as atividades desenvolvidas pelo autor se deram em condições especiais devido à sua deficiência, razão pela qual se verifica as condições dos vínculos empregatícios do requerido não se enquadram nas condições excepcionais descritas na legislação.

Ausente, portanto, a manutenção de um dos requisitos, qual seja, a deficiência nos termos da lei, a análise da hipossuficiência econômica torna-se desnecessária.

Assim, no caso em apreço, não restaram satisfeitos os requisitos necessários a justificar a manutenção do benefício de prestação continuada contemplado no art. 203, V, do Texto Constitucional, e art. 20, caput, da Lei 8.742/1993.

Não tendo havido, à época própria, a notificação acerca da alteração das condições que ensejaram a concessão do benefício pelo requerido, deverá arcar com as consequências do recebimento indevido.

Passo, dessa forma, à análise da possibilidade de ressarcimento aos cofres públicos dos valores recebidos de forma indevida.

Segundo o art. 876 do Código Civil, "todo aquele que recebeu o que não era devido fica obrigado a restituir". Na mesma linha dispõe o artigo 884 do mesmo código:


"Art. 884. Aquele que, sem justa causa, se enriquecer à custa de outrem, será obrigado a restituir o indevidamente auferido, feita a atualização dos valores monetários
(...)".

Tem-se que a conduta omissiva do requerido não pode ser caracterizada de boa-fé, porquanto, beneficiário de benefício assistencial por deficiência, passou a trabalhar com frequência/com regularidade/com formal registro por diversos períodos, o que é completamente incompatível com a legislação em vigor, agindo, o requerido, assim, com evidente má-fé. Tal caracterização afasta, portanto, a alegação de afronta ao princípio da irrepetibilidade dos alimentos.

Aliás, a arguição de ignorância não socorre o requerente, nos termos da Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro, em seu artigo 3º, que preceitua que "Ninguém se escusa de cumprir a lei, alegando que não a conhece".

Feitas estas considerações, trago à colação entendimento do c. STJ, que trata do retorno ao trabalho por beneficiário de benefício por incapacidade:


"EMENTA
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ENUNCIADO ADMINISTRATIVO 3/STJ. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. EXERCÍCIO DE TRABALHO REMUNERADO. INCOMPATIBILIDADE. REPETIÇÃO DE VALORES. CABIMENTO. AGRAVO CONHECIDO PARA NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO ESPECIAL.
DECISÃO
Trata-se de agravo em recurso especial interposto por Francisco Antonio da Silva Sousa contra decisão proferida pelo Presidente do TRF-5ª Região que negou seguimento ao seu recurso especial ante o óbice da Súmula 7/STJ.
Em suas razões de agravo em recurso especial, sustenta o agravante que não requer o reexame de matéria fática, mas sim de reafirmação da jurisprudência no sentido de que não são passíveis de restituição os valores recebidos por erro da Administração.
Em contrarrazões ao agravo, sustenta-se a manutenção da decisão agravada.
O recurso especial que se pretende o seguimento impugna acórdão assim ementado:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. RETORNO À ATIVIDADE. CANCELAMENTO DO BENEFÍCIO. RESTITUIÇÃO AO ERÁRIO DOS VALORES RECEBIDOS. INÉRCIA DA ADMINISTRAÇÃO. BOA FÉ CONFIGURADA. RESTITUIÇÃO AO ERÁRIO INDEVIDA.
1. A sentença condenou o INSS a excluir a cobrança de quaisquer valores recebidos pelo autor em face da aposentadoria por invalidez, eis que considerados verbas de natureza alimentícia.
2. A Lei nº 8.213/1991, no art. 115, previu que podem ser descontados do benefício o valor pago além do que lhe é devido.
3. Existindo má-fé do segurado/beneficiário, é cabível a devolução ao erário dos valores pagos pela Administração Pública.
4. Apelação provida.
Em suas razões de recurso especial, sustenta o recorrente, ora agravante, que o Tribunal a quo negou vigência ao artigo 115 da Lei 8.213/1991, pois não é cabível a devolução de valores a título de aposentadoria por invalidez, porque o erro na concessão e manutenção do benefício foi da Administração previdenciária.
Em contrarrazões ao recurso especial, sustenta-se a manutenção do acórdão recorrido.
Noticiam os autos que Francisco Antônio da Silva Sousa ajuizou ação em face do Instituto Nacional do Seguro Social, objetivando o restabelecimento de aposentadoria por invalidez, bem como a exclusão de cobrança dos valores recebidos a esse título.
A sentença julgou o pedido procedente em parte, para determinar ao INSS que se abstenha de cobrar valores recebidos a título de aposentadoria por invalidez.
Em sede de apelação interposta pelo INSS, o Tribunal a quo deu provimento ao recurso, nos termos da ementa supratranscrita.
É o relatório, decido.
Inicialmente é necessário consignar que recai ao presente recurso o Enunciado Administrativo 3/STJ.
O agravante impugnou o fundamento adotado na decisão agravada e mostrando-se preenchidos os demais pressupostos de admissibilidade do presente recurso, adentra-se o mérito.
A questão recursal está em saber se são repetíveis os valores recebidos a título de aposentadoria por invalidez, durante o período em que o segurado esteve trabalhando.
O aposentado por invalidez, ao contrário do que ocorre com aquele jubilado espontaneamente, tem afastamento das atividades em caráter compulsório, não podendo permanecer nem retornar às atividades laborais. Neste ponto, não é demais fazer o registro sociológico acerca da força laboral dos mais idosos brasileiros, ainda que cansados das atividades desenvolvidas por longos anos, reacendem a força do trabalho, retornando imediatamente ao mercado de trabalho, para a manutenção da renda que permita um razoável equilíbrio financeiro na família.
Constatada a recuperação da capacidade laboral, a Lei 8.213/1991 traz em seu artigo 47 algumas regras quanto à manutenção do pagamento do benefício, a saber: a condição de filiação do segurado; o tempo em que esteja em benefício por incapacidade; a espécie de recuperação, se total ou parcial.
Caso o próprio segurado entenda ter recuperado sua capacidade laborativa, deverá dirigir-se ao INSS para comunicar esse fato e requerer sua alta médica. Mas, se o INSS evidenciar o retorno à atividade laboral, deve iniciar o devido processo administrativo revisional do benefício por incapacidade, como no presente caso.
Consoante artigo 46 da Lei 8.213/1991, o benefício será cessado a partir da data em que houver o retorno voluntário e sem comunicação ao INSS. Mas, a depender do caso, além da cessação do benefício a partir da data do retorno voluntário ao trabalho, haverá a cobrança administrativa ou judicial de todos os valores que foram pagos de forma indevida. A sanção última e máxima a ser imputada ao segurado, nessas hipóteses, é a denúncia pela prática de crime de estelionato contra a Previdência Social.
A aposentadoria por invalidez está condicionada ao afastamento de todas as atividades, esta é regra máxima de ordem pública. É benefício previdenciário provisório, que será pago enquanto permanecer a incapacidade permanente do aposentado para o labor.
Correto o entendimento do Tribunal a quo ao permitir o procedimento do INSS de cobrar do autor, ora agravante, os valores indevidamente pagos a título de aposentadoria por invalidez, com apoio no artigo 115, II, da Lei 8.213/1991, na medida em que o segurado trabalhava e recebia proventos de invalidez ao mesmo tempo.
É condição indispensável para a concessão deste benefício que o segurado esteja incapaz para o exercício de qualquer atividade laborativa, seja ela de esforço físico ou mental, remunerado ou voluntário.
A Previdência Social, de acordo com o artigo 6º da Constituição, é um dos relevantes direitos sociais e tem por objetivo suprir as necessidades básicas das pessoas nos momentos de maiores necessidades, como a incapacidade para o trabalho.
O recorrente não poderia ter acumulado proventos da aposentadoria por invalidez com salário.
O caráter substitutivo do benefício previdenciário ao salário, quando da incapacidade do trabalhador, portanto, alimentar que a parcela cumpre não deve elidir o dever maior de comunicação do retorno ao trabalho, quando deferida benefício por invalidez.
Deveras, a Constituição Federal de 1988 classifica os salários, os vencimentos, os proventos, as pensões e as suas complementações, os benefícios previdenciários e as indenizações por morte ou por invalidez como verbas de natureza alimentar, atribuindo a eles proteção especial, como se observa através da leitura dos artigos 5º, LXVII, 7º, IV e 100, § 1º. Ainda, em seu artigo 194, IV, elenca dentre os seus princípios a proteção do benefício previdenciário contra a redutibilidade ante sua natureza alimentar.
Confira-se:
PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. PROCEDIMENTO REVISIONAL DA AUTARQUIA PREVIDENCIÁRIA. CONSTATAÇÃO DE RETORNO DO SEGURADO À ATIVIDADE LABORATIVA. DEVOLUÇÃO DE VALORES AO ERÁRIO. CABIMENTO. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E NÃO PROVIDO.
1. Em exame, os efeitos para o segurado, do não cumprimento do dever de comunicação ao Instituto Nacional do Seguro Social de seu retorno ao trabalho, quando em gozo de aposentadoria por invalidez.
2. Em procedimento de revisão do benefício, a Autarquia previdenciária apurou que o segurado trabalhou junto à Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro, no período de 04/04/2001 a 30/09/2007 (fls. 379 e fls. 463), concomitante ao recebimento da aposentadoria por invalidez no período de 26/5/2000 a 27/3/2007, o que denota clara irregularidade.
3. A Lei 8.213/1991 autoriza expressamente em seu artigo 115, II, que valores recebidos indevidamente pelo segurado do INSS sejam descontados da folha de pagamento do benefício em manutenção.
4. Pretensão de ressarcimento da Autarquia plenamente amparada em lei.
5. Recurso conhecido e não provido.
(REsp 1.454.163/RJ, Segunda Turma, de minha Relatoria, DJe 18/12/2015)
Sobrepõe ao caráter alimentar o comportamento de lealdade do segurado para com a Previdência Social. A devolução de valores ao Erário previdenciário é a imposição consequente desse dever de lealdade. Cuida-se, assim, da atuação ética dos interessados nas relações com a Previdência Social.
Cumpre, por fim, asseverar que ao dissídio jurisprudencial sustentado recai o óbice da Súmula 83/STJ.
Ante o exposto, conheço do agravo para negar provimento ao recurso especial. E, quanto ao ônus da sucumbência, em observância ao artigo 85, § 11, do CPC/2015 c/c Enunciado Administrativo 7/STJ, fixo honorários de advogado no valor de R$ 350,00 (trezentos e cinquenta reais).
Publique-se e intimem-se.
Brasília (DF), 20 de setembro de 2017".
(STJ, 2ª Turma, Ministro Mauro Campbell Marques, AREsp nº 1.158.469/CE, DJE 25.09.2017)

No mesmo sentido, jurisprudência desta Corte: AgLegal em AC nº 2013.61.19.005923-7, 9ª Turma, Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias, DJE 01.04.2016; AC nº 2015.61.26.000061-2, 9ª Turma, Juiz Federal Convocado Silva Neto, 17.11.2016.

Sendo devida a devolução de valores, há que se analisar a decadência e/ou prescrição.

Quanto ao prazo prescricional, a jurisprudência deste Tribunal tem ser orientado no sentido de que, ante a inexistência de prazo geral expressamente fixado para as ações movidas pela Fazenda Pública contra o particular, em se tratando de benefícios previdenciários, há que se aplicar por simetria o disposto no parágrafo único do artigo 103 da Lei 8.213/91:


"Art. 103.
Parágrafo único. Prescreve em cinco anos, a contar da data em que deveriam ter sido pagas, toda e qualquer ação para haver prestações vencidas ou quaisquer restituições ou diferenças devidas pela Previdência Social, salvo o direito dos menores, incapazes e ausentes, na forma do Código Civil".

O prazo de prescrição a ser considerado, portanto, é de cinco anos.

Por outro lado, em caso de concessão e/ou manutenção indevida de benefício previdenciário, ocorrendo a notificação do segurado em relação à instauração do processo revisional, não se pode cogitar de curso do prazo prescricional, devendo ser aplicado, por isonomia, o artigo 4º do Decreto 20.910/1932:


"Art. 4º Não corre a prescrição durante a demora que, no estudo, ao reconhecimento ou no pagamento da dívida, considerada líquida, tiverem as repartições ou funcionários encarregados de estudar e apurá-la.
Parágrafo único. A suspensão da prescrição, neste caso, verificar-se-á pela entrada do requerimento do titular do direito ou do credor nos livros ou protocolos das repartições públicas, com designação do dia, mês e ano".

A fluência do prazo prescricional, dessa forma, se inicia com o pagamento indevido, mas não tem curso durante a tramitação do processo administrativo instaurado para apuração da ilegalidade cogitada.

Nesse sentido:


"PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE RESSARCIMENTO AO ERÁRIO. ANULAÇÃO DE ATO CONCESSÓRIO DE BENEFÍCIO. PRESCRIÇÃO. COBRANÇA DE VALORES SUPOSTAMENTE RECEBIDOS DE FORMA INDEVIDA. NECESSIDADE DE PROVA CONTUNDENTE. PRESUNÇÃO DE LEGITIMIDADE DOS ATOS ADMINISTATIVOS.
I - Segundo entendimento consolidado na jurisprudência do STJ, em se tratando de ação que vise ao ressarcimento do erário por dano não decorrente de ato de improbidade administrativa, não se cogita de imprescritibilidade.
II - Quanto ao prazo prescricional, a jurisprudência deste Tribunal tem ser orientado no sentido de que, ante a inexistência de prazo geral expressamente fixado para as ações movidas pela Fazenda Pública contra o particular, em se tratando de benefícios previdenciários, há que se aplicar por simetria o disposto no parágrafo único do artigo 103 da Lei 8.213/91, sendo, portanto, de cinco anos.
III - Em caso de concessão indevida de benefício previdenciário, ocorrendo a notificação do segurado em relação à instauração do processo revisional, não se pode cogitar de curso do prazo prescricional, pois devendo ser aplicado, por isonomia, o artigo 4º do Decreto 20.910/1932. A fluência do prazo prescricional, dessa forma, se inicia com o pagamento indevido, mas não tem curso durante a tramitação do processo administrativo instaurado para apuração da ilegalidade cogitada.
IV - Para que a pretensão do autor pudesse prosperar, seria de rigor estar fundada em elementos consistentes para infirmar o ato concessório, sendo cotejada com outras fontes de informações sobre a efetiva incapacidade laborativa da ré em momento anterior ao reingresso no RGPS, não bastando, para tal fim, mera informação informal prestada pelo filho quando da perícia médica administrativa, inclusive face à presunção de legalidade de que se revestem os atos administrativos.
V - Apelação do INSS parcialmente provida para afastar a prescrição . Pedido julgado improcedente, com abrigo no artigo 1.013, § 4º, do CPC de 2015".
(TRF/3ª Região, 10ª Turma, Desembargador Federal Sergio Nascimento, AC nº 2016.03.99.016499-2, DJE 17/04/2017)

No caso dos autos, o período a que se busca o ressarcimento é de 01.12.2005 a 31.10.2010. O requerido foi devidamente notificado da instauração do Processo Administrativo em 01.11.2010 (fls. 123/125). O Relatório Conclusivo do procedimento administrativo está datado de 26.02.2013 (fl. 168). A presente ação de cobrança foi ajuizada em 14.03.2014.

Assim, ajuizada a ação judicial em 14.03.2014, tem-se que decorreu 01 ano e 15 dias desde 26.02.2013, data em que o prazo prescricional de 5 anos retornou a fluir, haja vista estar suspenso desde 01.11.2010. Dessa forma, devem-se contar mais 03 anos, 11 meses e 15 dias retroativos à suspensão, chegando-se, portanto, à data de 17.11.2006. Consequentemente, o crédito anterior a essa data encontra-se prescrito.

Os valores deverão ser atualizados monetariamente e acrescidos de juros moratórios, nos termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal.

Condeno a parte ré ao pagamento dos honorários advocatícios que arbitro em 10% sobre o valor da causa, nos termos do art. 85 do Código de Processo Civil/2015, cuja execução observará o disposto no art. 98, § 3º, do citado diploma legal, em razão da gratuidade da justiça que ora defiro.

Diante do exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS para condenar o requerido ao ressarcimento dos valores recebidos indevidamente no período de 17.11.2006 a 31.10.2010, devidamente corrigidos, restando atingidos pela prescrição os créditos do período de 01.12.2005 a 16.11.2006, nos termos da fundamentação.


É COMO VOTO.



NELSON PORFIRIO
Desembargador Federal


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
Signatário (a): NELSON DE FREITAS PORFIRIO JUNIOR:10081
Nº de Série do Certificado: 11DE180529616199
Data e Hora: 18/06/2019 17:41:21