Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 26/02/2019
AÇÃO RESCISÓRIA Nº 0003546-19.2015.4.03.0000/SP
2015.03.00.003546-5/SP
RELATOR : Desembargador Federal CARLOS DELGADO
AUTOR(A) : JESUS FERNANDES (= ou > de 60 anos)
ADVOGADO : SP244574 ANGELA MARIA INOCENTE TAKAI
RÉU/RÉ : Instituto Nacional do Seguro Social - INSS
ADVOGADO : SP000030 HERMES ARRAIS ALENCAR
No. ORIG. : 00356850520124039999 Vr SAO PAULO/SP

EMENTA

PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. RESCISÓRIA. VIOLAÇÃO DE LEI (ART. 201, I, CF). PENSÃO. TRABALHADOR RURAL AVULSO (VOLANTE, SAFRISTA, DIARISTA, BOIA-FRIA). AUSÊNCIA DE RECOLHIMENTOS. IMPOSSIBILIDADE DE EXCLUSÃO DA GARANTIA DE COBERTURA PREVIDENCIÁRIA. OBSERVÂNCIA DE CIRCUNSTÂNCIAS VULNERABILIZANTES VIVENCIADAS POR TRABALHADORES RURAIS. IUDICIUM RESCINDENS. PROCEDÊNCIA DA AÇÃO RESCISÓRIA. CONTEMPORANEIDADE DA ATIVIDADE RURAL. COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE CAMPESINA NO PERÍODO IMEDIATAMENTE ANTERIOR AO ÓBITO. BOIA-FRIA. ABRANDAMENTO PROVA. CORRELAÇÃO LÓGICA COM A SITUAÇÃO COMUM. IMPOSSIBILIDADE DE ESTENDER PROVA MATERIAL EM NOME DO CÔNJUGE SUPÉRSTITE EM SITUAÇÃO DE NÃO EXISTÊNCIA DE REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. AUSÊNCIA DE PROVA MATERIAL EM NOME PRÓPRIO NO PERÍODO QUE SE PRETENDE COMPROVAR. PROVA TESTEMUNHAL GENÉRICA. IUDICIUM RESCISORIUM. EXTINÇÃO, DE DA AÇÃO SUBJACENTE, SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO. VERBA HONORÁRIA. CONDENAÇÃO.
1. A viabilidade da ação rescisória por ofensa a literal disposição de lei pressupõe violação frontal e direta da literalidade da norma jurídica, não se admitindo a mera ofensa reflexa ou indireta (confira-se: STJ, S1, AR 4264, relator Ministro Humberto Martins, DJe 02.05.2016). Ressalto que, em 13.12.1963, o e. Supremo Tribunal Federal fixou entendimento, objeto do enunciado de Súmula n.º 343, no sentido de que "não cabe ação rescisória por ofensa a literal disposição de lei, quando a decisão rescindenda se tiver baseado em texto legal de interpretação controvertida nos tribunais".
2. A Constituição da República, de 1988, prevê em seu artigo 6° que a previdência social é um direito social. O direito à previdência social, assim como os demais direitos humanos de segunda geração, caracteriza-se pelo status positivus socialis, ao exigir a ação direta do Estado para sua proteção. Não se trata mais dos clássicos direitos de liberdade (da primeira geração dos direitos do homem) que impõem um status negativus ao Estado, protegendo-os ao não constrangê-los, mas de imperativo social para efetiva fruição de seus direitos.
3. Em seção que é exclusivamente destinada à previdência social, a Carta assegura a cobertura do evento morte aos dependentes de segurados vinculados ao regime geral (artigo 201, I), vedando, expressamente, a adoção de requisitos e critérios diferenciados para a concessão de aposentadoria aos beneficiários do RGPS (§ 1º). Ressalta-se que o regime de previdência tem caráter contributivo, razão pela qual a cobertura dos eventos elencados na Constituição deve observar critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial do sistema, sendo que nenhum benefício ou serviço da seguridade social poderá ser criado, majorado ou estendido sem a correspondente fonte de custeio total (artigo 195, § 5º). Visando assegurar o equilíbrio financeiro e atuarial do regime estabeleceu a legislação ordinária o cumprimento de períodos de carência, para os quais é imprescindível o recolhimento das contribuições previdenciárias, situação que não se verifica, entretanto, no que tange à pensão por morte, a qual demanda tão somente a comprovação da qualidade de segurado (artigo 26, I, da Lei n.º 8.213/91).
3. Especificamente no que tange aos trabalhadores do campo, a legislação previdenciária possui regras diferenciadas para a concessão de benefícios, haja vista o reconhecimento das circunstâncias vulnerabilizantes por eles vivenciadas. Nesse sentido, o artigo 39 da Lei n.º 8.213/91 (LBPS) garante aos segurados especiais, elencados no inciso VII, do artigo 11, do mesmo Diploma Legal, a percepção de benefícios previdenciários no valor de um salário mínimo, quais sejam, aposentadoria por idade ou invalidez, auxílio-doença, auxílio-reclusão, pensão e salário maternidade. Especificamente quanto à aposentadoria por idade, o artigo 143 da LBPS regulamenta a possibilidade de concessão do benefício ao trabalhador rural, seja ele segurado especial, empregado ou autônomo (sem vínculo empregatício).
4. Independentemente de não estarem relacionados no artigo 39 supracitado os trabalhadores rurais avulsos (boias-frias, volantes, safristas, diaristas etc.), mas tão somente no indigitado artigo 143, interpretação contrária à existência de cobertura previdenciária para os demais eventos previstos na Carta fere a própria previsão constitucional do direito social à previdência social para os trabalhadores do campo. Não é demais lembrar que há, inclusive, entendimento de que o trabalhador rural avulso se equipara à situação do empregado rural no que tange à responsabilidade pelos recolhimentos previdenciários, que é atribuída ao empregador rural, de sorte que lhes não seria exigível a contribuição previdenciária. Independentemente da questão relativa à responsabilidade pelos recolhimentos previdenciários do trabalhador rural avulso, fato é que sempre se admitiu a concessão dos benefícios descritos no artigo 39 da LBPS a esses segurados obrigatórios do RGPS e a seus dependentes, haja vista a impossibilidade de simplesmente os excluir da garantia constitucional à cobertura previdenciária em razão das notórias adversidades e irregularidades relativas à contratação da força de trabalho rurícola.
5. O fundamento determinante da improcedência do pedido foi o fato de que não haveria previsão legal para a cobertura previdenciária do evento morte de trabalhadora rural diarista que não vertia contribuições ao Regime. Assim, cabível a desconstituição do julgado rescindendo em decorrência de violação literal ao disposto no artigo 201, I, da Constituição.
6. Encontra-se sedimentado o entendimento de que, por força do princípio tempus regit actum, o direito ao benefício previdenciário decorrente da morte de segurado é regido pela lei vigente à época do óbito (confira-se: Súmula STJ n.º 340).
7. No caso concreto, o direito à pensão se encontrava regulamentado nos artigos 74 e seguintes da Lei n.º 8.213/91 (LBPS), observada a redação dada pela Lei n.º 9.032/95. O benefício independe de carência, sendo percuciente para sua concessão: a) a ocorrência do evento morte; b) a comprovação da condição de dependente do postulante; e c) a manutenção da qualidade de segurado quando do óbito, salvo na hipótese de o de cujus ter preenchido em vida os requisitos necessários ao deferimento de qualquer uma das aposentadorias previstas no Regime Geral de Previdência Social - RGPS.
8. A condição de dependente do autor é presumida e se encontra comprovada pela certidão de casamento de fl. 54 (artigo 16, I e § 4º, da LBPS).
9. A celeuma se cinge em torno do requisito relativo à qualidade de segurada da falecida, haja vista alegação de se tratar de trabalhadora rural volante. Traz-se à baila teses firmadas sobre a comprovação do labor campesino para fins de aposentação, as quais, evidentemente, aplicam-se para os demais casos de cobertura previdenciária, mutatis mutandis.
10. O C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do RESP nº 1.348.633/SP, adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil/1973, assentou o entendimento de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em momento anterior ou posterior àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material, mas desde que tal período venha delineado em prova testemunhal idônea e robusta.
11. Também restou assentado pela 1ª Seção do C. Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp nº 1.321.493/SP, em sede de recurso representativo de controvérsia, que é possível o abrandamento da prova para configurar tempo de serviço rural dos trabalhadores rurais denominados "boias-frias", considerando a inerente dificuldade probatória da condição de trabalhador campesino, sendo, para tanto, imprescindível a apresentação de início de prova material sobre parte do lapso temporal pretendido, a ser complementada por idônea e robusta prova testemunhal.
12. Há remansosa jurisprudência no sentido de ser extensível à mulher a condição de rurícola nos casos em que os documentos apresentados, para fins de comprovação da atividade campesina, indiquem o marido como trabalhador rural.
13. A 1ª Seção do C. Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp nº 1.304.479/SP, sob o rito do artigo 543-C do CPC/1973, entendeu que o trabalho urbano de um dos membros do grupo familiar não descaracteriza, por si só, os demais integrantes como segurados especiais, devendo ser averiguada a dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar, sendo que, em exceção a essa regra geral, tem-se que a extensão de prova material em nome de um integrante do núcleo familiar a outro não é possível quando aquele passa a exercer trabalho incompatível com o labor rurícola, como o de natureza urbana.
14. O C. STJ estabeleceu, no julgamento do REsp autuado sob nº 1.354.908/SP, sob a sistemática dos recursos repetitivos representativos de controvérsia, a necessidade da demonstração do exercício da atividade campesina em período imediatamente anterior ao implemento dos requisitos necessários à concessão do benefício.
15. No caso concreto, cumpria ao autor comprovar a qualidade de segurada da falecida no momento imediatamente anterior ao óbito ou ao início da alegada incapacidade laborativa. Nos autos da demanda subjacente foram juntados documentos em nome do autor, que o qualificavam como lavrador. Verifica-se dos documentos e dos depoimentos das testemunhas que, até os anos 80, o autor exerceu atividade de parceria agrícola, situação que, caso considerada comprovada a existência de regime de economia familiar, poderia ser estendida à sua falecida esposa. Após esse período, o autor passou a exercer atividade rural como empregado até 1997. Já desempregado, foi acometido por incapacidade laborativa que resultou na concessão administrativa de auxílios-doença entre 1997 e 2000, este último convertido administrativamente em aposentadoria por invalidez, com data de início em 06.05.2000.
16. Não há como se estender o valor probatório dos documentos, apresentados em nome exclusivamente do autor, para o fim de validar o exercício de atividade rural pela falecida em período posterior à sua incapacidade laborativa e ao próprio início da atividade exercida como empregado rural.
17. Além do mais, o aproveitamento por extensão de documentos em nome de terceiro deve guardar correlação lógica com a situação que se pressupõe comum. Explico. Razoável a presunção de que, ante a comprovação de que algum dos membros do núcleo familiar trabalhava, em regime de economia familiar, de que os demais também o fizessem, eis que é pressuposto necessário e comum dessa atividade o apoio mútuo e o esforço comum, sem os quais o grupo não conseguiria se manter. A mesma presunção, entretanto, não vale para o diarista, eis que o fato de um dos membros exercer funções laborativas nesta qualidade, não faz presumir que os demais também o façam, ante a inexistência de pressuposto comum ou de caraterística integrativa da parte ao todo. Precedentes.
18. Se fazia imprescindível que o autor tivesse apresentado início de prova material em nome da falecida, em período próximo ao óbito, ou ao do início de eventual incapacidade laborativa, a fim de, em conjunto com outros meios probatórios (como a prova oral), demonstrar sua qualidade de segurada, como trabalhadora rural volante.
19. Em nome da falecida apenas constam os documentos juntados nesta ação rescisória, consistentes na sua carteira de filiação e respectiva ficha de inscrição no Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Iturama - MG, constando data de admissão em 30.10.1995 e pagamento das contribuições sindicais apenas de outubro de 1995 a fevereiro de 1996. Além do curto período a que dizem respeito, não há como olvidar que se tratou de filiação sindical por força de breve período em que a autora esteve em Minas Gerais, já que, conforme constante dos autos e dos depoimentos das testemunhas, a falecida há muito residia em Ouroeste/SP, sendo que as testemunhas sequer citaram sua passagem por Iturama/MG.
20. Toda a prova material constante dos autos é bastante remota (findada em 1996) em relação ao período que se pretende provar a qualidade de segurada da falecida, seja considerando a data do óbito (em 2005), seja se apreciada a data do início de sua suposta incapacidade laborativa (em 2002). É forte o entendimento de que, ainda que não se exija prova material para todo o período de carência, a prova material indiciária deve se referir ao menos à parte desse interregno, isto é, deve haver concomitância temporal entre a prova material inicial e o lapso que se pretende comprovar em juízo, mormente quando verificado significativo decurso de tempo entre um e outro. Precedentes desta Corte, do c. STJ e da TNU.
21. Tal como instruídas as demandas subjacente e rescisória não se entendeu presente prova material indiciária da atividade rurícola exercida pela falecida, na qualidade de diarista, em período próximo àquele que se pretende comprovar, não subsistindo, sozinha, a prova testemunhal para fim de demonstração do labor campesino (Súmula STJ n.º 149).
22. Outrossim, ainda que se pudesse considerar a existência de prova material indiciária no caso concreto, a prova testemunhal não se mostrou robusta o suficiente para comprovar, com efetividade, que a falecida desempenhava atividade como diarista, de sorte que também se encontraria óbice no enunciado de Súmula STJ n.º 577.
23. Em razão do entendimento fixado pela Corte Especial do C. Superior Tribunal de Justiça no julgamento do REsp n.º 1.352.721/SP, na forma do artigo 543-C do CPC/1973, e diante da ausência de conteúdo probatório eficaz, deverá o feito ser extinto, sem resolução de mérito, por carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, de sorte a possibilitar à autora o ajuizamento de novo pedido, administrativo ou judicial, caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa.
24. Por força da rescisão do julgado, condenada a autarquia no pagamento de honorários advocatícios, fixados em R$ 1.000,00 (mil reais), devidamente atualizado e acrescido de juros de mora, conforme estabelecido do Manual de Cálculos e Procedimentos para as dívidas civis, até sua efetiva requisição (juros) e pagamento (correção), conforme prescrevem os §§ 2º, 4º, III, e 8º, do artigo 85 do CPC.
25. Em decorrência do rejulgamento, vedada a compensação na forma do artigo 85, § 14 do CPC, condenada a autora no pagamento de honorários advocatícios, que fixados em igual montante de R$ 1.000,00 (mil reais), devidamente atualizado e acrescido de juros de mora, conforme estabelecido do Manual de Cálculos e Procedimentos para as dívidas civis, até sua efetiva requisição (juros) e pagamento (correção), conforme prescrevem os §§ 2º, 4º, III, e 8º, do artigo 85 do CPC. A exigibilidade das verbas honorárias devidas ficará suspensa por 5 (cinco) anos, desde que inalterada a situação de insuficiência de recursos que fundamentou a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, a teor do disposto no artigo 98, § 3º, do CPC.
26. Rejeitada a matéria preliminar. Em juízo rescindendo, julgada procedente a ação rescisória, para desconstituir o julgado na ação subjacente com fundamento nos artigos 485, V, do CPC/1973 e 966, V, do CPC/2015. Em juízo rescisório, julgada extinta a ação subjacente, sem resolução de mérito, nos termos dos artigos 267, IV, do CPC/1973 e 485, IV, do CPC/2015.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Terceira Seção do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar a matéria preliminar suscitada; em juízo rescindendo, julgar procedente a presente ação rescisória para desconstituir o julgado na ação subjacente; em juízo rescisório, julgar extinta a ação subjacente, sem resolução de mérito; e condenar o autor e o réu, vedada a compensação, no pagamento de honorários advocatícios, fixados em R$ 1.000,00 (mil reais), devidamente atualizado e acrescido de juros de mora, conforme estabelecido do Manual de Cálculos e Procedimentos para as dívidas civis, até sua efetiva requisição (juros) e pagamento (correção), restando suspensa a sua exigibilidade em relação ao autor por 5 (cinco) anos, desde que inalterada a situação de insuficiência de recursos que fundamentou a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 14 de fevereiro de 2019.
CARLOS DELGADO
Desembargador Federal


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
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AÇÃO RESCISÓRIA Nº 0003546-19.2015.4.03.0000/SP
2015.03.00.003546-5/SP
RELATOR : Desembargador Federal CARLOS DELGADO
AUTOR(A) : JESUS FERNANDES (= ou > de 60 anos)
ADVOGADO : SP244574 ANGELA MARIA INOCENTE TAKAI
RÉU/RÉ : Instituto Nacional do Seguro Social - INSS
ADVOGADO : SP000030 HERMES ARRAIS ALENCAR
No. ORIG. : 00356850520124039999 Vr SAO PAULO/SP

RELATÓRIO

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):


Trata-se de ação rescisória proposta por JESUS FERNANDES em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, com fundamento nos artigos 485, V, VII e IX, do CPC/1973, objetivando rescindir decisão monocrática terminativa de mérito, a fim de que lhe seja concedida pensão por morte de sua cônjuge, trabalhadora rural.


Aduziu que o julgado rescindendo violou disposição literal dos artigos 201, I, da Constituição e 143 da Lei n.º 8.213/91, bem como incorreu em erro de fato, haja vista que, no seu entender, a trabalhadora rural volante é equiparada aos segurados especiais para fins da cobertura previdenciária. Ainda, juntou documentos novos para reiterar e complementar o conjunto probatório da ação subjacente para comprovação de seu alegado direito ao benefício.


À fl. 103, foram deferidos ao autor os benefícios da assistência judiciária gratuita, dispensando-o do depósito prévio, e a prioridade na tramitação do feito.


Em atenção à determinação de fl. 103, o autor juntou cópias de peças dos autos da demanda subjacente (fls. 104-154).


Citado (fls. 161), o réu apresentou contestação, às fls. 162-175, alegando, em preliminar, a incidência da Súmula STF n.º 343 e, no mérito, a inexistência de violação à lei, erro de fato ou documento novo.


O autor ofereceu réplica apócrifa (fls. 178-183) e, intimado para regularização da peça processual sob pena de seu não conhecimento (fl. 185), quedou-se inerte (fl. 185v).


O Ministério Público Federal, não vislumbrando interesse público que justificasse sua intervenção, manifestou-se pelo regular processamento do feito (fls. 187-192).


É o relatório.


VOTO

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):


Inicialmente, verifico que a presente demanda foi ajuizada em 23.02.2015, observado o prazo decadencial previsto no artigo 495 do CPC/1973, dado o trânsito em julgado no processo originário ocorrido em 22.03.2013 (fl. 97).


Rejeito a preliminar de carência da ação, relativa à incidência da Súmula STF n.º 343, por se confundir com o mérito da demanda rescisória.


O autor fundamenta a ação rescisória no artigo 485, V e IX, do CPC/1973, sob a alegação de violação ao disposto nos artigos 201, I, da Constituição e 143 da Lei n.º 8.213/91, bem como ocorrência de erro de fato, haja vista que, no seu entender, a trabalhadora rural volante é equiparada aos segurados especiais para fins da cobertura previdenciária. Ainda, juntou documentos novos para reiterar e complementar o conjunto probatório da ação subjacente para comprovação de seu alegado direito à pensão por morte.


O autor postulou na ação subjacente, ajuizada em 03.10.2011, a concessão de pensão decorrente do falecimento de sua esposa, mediante o reconhecimento de sua condição de trabalhadora rural (fl. 107).


Para comprovação da qualidade de segurada da falecida, juntou àqueles autos:


1) certidão de casamento, ocorrido em 02.06.1952, em que o autor constou qualificado como "lavrador" e sua esposa como dedicada a "serviços domésticos" (fl. 23);


2) certidão de nascimento de filhos, ocorridos em 10.01.1956, 26.07.1961, 04.09.1965, em que o autor constou qualificado como "lavrador" e sua esposa como "doméstica" (fls. 24/56, 25, 55);


3) declaração apócrifa da falecida, datada de 10.11.2000, sobre exercício de atividade rural em "parceria familiar" na Fazenda Velloso, de fevereiro de 1981 a outubro de 1984 (fl. 26). Constam assinaturas de testemunhas na declaração.


4) declaração de terceiro, datada de 16.08.2002, sobre o exercício de atividade rural pela falecida em sua propriedade (Fazenda Velloso), na condição de "parceria em conjunto familiar", no período de 1985 a 1992 (fl. 27);


5) contrato de locação anual de imóvel agrícola para exploração, datado de 01.10.1950, em que o autor figurou, em conjunto com terceiros, como locatário (fls. 61-65/75).


6) declaração de terceiro, datada de 10.11.2000, sobre o exercício de atividade rural pela falecida na Fazenda Velloso, na condição de "parceria familiar", no período de fevereiro de 1981 a outubro de 1984 (fl. 27);


7) cópia da contestação à ação judicial, do ano de 2002, em que a falecida requereu sua aposentação por invalidez, na qualidade de trabalhadora rural (fls. 78-87);


8) declaração de terceiro, datada de 21.08.2002, sobre o exercício de atividade rural pela falecida em sua propriedade (Fazenda Santa Elisa), na condição de "arrendatário rural, desenvolvendo seus serviços em regime de economia familiar", no período de 1955 a 1965 (fl. 88);


9) declaração de terceiro, datada de 12.08.2002, sobre o exercício de atividade rural pela falecida em sua propriedade (Fazenda Okajima), na condição de "arrendatário rural, desenvolvendo seus serviços em regime de economia familiar", no período de 1965 a 1980 (fl. 89);


10) extratos do Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS e do Sistema Único de Benefícios em relação ao autor, constando o recebimento de benefícios por incapacidade (auxílios-doença e aposentadoria por invalidez) na qualidade de trabalhador rural, empregado e desempregado (fls. 29-45).


Embora não conste destes autos da ação rescisória cópia da certidão de óbito, é possível extrair de outros documentos dos autos que o passamento se deu em 22.06.2005 (contestação autárquica - fl. 117), por força de infarto agudo do miocárdio (sentença - fl. 53).


Foram ouvidas testemunhas, em 08.02.2012, conforme depoimentos gravados em mídia digital (fl. 154). Em suma afirmaram que após os trabalhos realizados em parceria agrícola, nos idos de 1980, a falecida passou a exercer a atividade de diarista até 2002, quando se afastou das atividades por problemas de saúde (pressão alta), até seu falecimento em decorrência de infarto.


Em 1ª Instância, o pedido foi julgado procedente (fls. 52-53), sentença reformada em 2º grau de jurisdição, dando-se provimento à apelação autárquica para julgar improcedente o pedido, nos termos da decisão monocrática proferida pelo Juiz Federal em auxílio Rodrigo Zacharias (fls. 91-95), da qual destaco o seguinte:


"[...] no presente caso, os requisitos para a concessão do benefício não foram satisfeitos.
A falecida jamais trabalhou como segurado especial, mas como empregada e boia-fria.
Ausente a comprovação de exercício de atividade rural na forma do inciso I do artigo 39 da Lei nº 8.213/91, não se pode conceder o benefício de pensão por morte.
O artigo 143 da Lei nº 8.213/91, que permite a concessão de benefício sem o recolhimento de contribuições - norma de duvidosa constitucionalidade, aliás - refere-se somente à aposentadoria por idade.
De igual modo, não restou demonstrado nos autos o preenchimento, pela falecida, dos requisitos necessários à concessão de aposentadoria, seja por idade, seja por invalidez ou tempo de serviço, o que lhe garantiria a aplicação do artigo 102 da Lei n. 8.213/91. [...]" (grifo nosso)

Sem interposição de recurso pelas partes, foi certificado o trânsito em julgado ocorrido em 22.03.2013 (fl. 97).


A viabilidade da ação rescisória por ofensa a literal disposição de lei pressupõe violação frontal e direta da literalidade da norma jurídica, não se admitindo a mera ofensa reflexa ou indireta (confira-se: STJ, S1, AR 4264, relator Ministro Humberto Martins, DJe 02.05.2016).


Ressalto que, em 13.12.1963, o e. Supremo Tribunal Federal fixou entendimento, objeto do enunciado de Súmula n.º 343, no sentido de que "não cabe ação rescisória por ofensa a literal disposição de lei, quando a decisão rescindenda se tiver baseado em texto legal de interpretação controvertida nos tribunais".


O fundamento determinante da improcedência do pedido foi o fato de que não haveria previsão legal para a cobertura previdenciária do evento morte de trabalhadora rural diarista que não vertia contribuições ao Regime.


A Constituição da República, de 1988, prevê em seu artigo 6° que a previdência social é um direito social. O direito à previdência social, assim como os demais direitos humanos de segunda geração, caracteriza-se pelo status positivus socialis, ao exigir a ação direta do Estado para sua proteção. Não se trata mais dos clássicos direitos de liberdade (da primeira geração dos direitos do homem) que impõem um status negativus ao Estado, protegendo-os ao não constrangê-los, mas de imperativo social para efetiva fruição de seus direitos.


Em seção que é exclusivamente destinada à previdência social, a Carta assegura a cobertura do evento morte aos dependentes de segurados vinculados ao regime geral (artigo 201, I), vedando, expressamente, a adoção de requisitos e critérios diferenciados para a concessão de aposentadoria aos beneficiários do RGPS (§ 1º).


Ressalta-se que o regime de previdência tem caráter contributivo, razão pela qual a cobertura dos eventos elencados na Constituição deve observar critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial do sistema, sendo que nenhum benefício ou serviço da seguridade social poderá ser criado, majorado ou estendido sem a correspondente fonte de custeio total (artigo 195, § 5º).


Visando assegurar o equilíbrio financeiro e atuarial do regime estabeleceu a legislação ordinária o cumprimento de períodos de carência, para os quais é imprescindível o recolhimento das contribuições previdenciárias, situação que não se verifica, entretanto, no que tange à pensão por morte, a qual demanda tão somente a comprovação da qualidade de segurado (artigo 26, I, da Lei n.º 8.213/91).


Ademais, especificamente no que tange aos trabalhadores do campo, a legislação previdenciária possui regras diferenciadas para a concessão de benefícios, haja vista o reconhecimento das circunstâncias vulnerabilizantes por eles vivenciadas.


Nesse sentido, o artigo 39 da Lei n.º 8.213/91 (LBPS) garante aos segurados especiais, elencados no inciso VII, do artigo 11, do mesmo Diploma Legal, a percepção de benefícios previdenciários no valor de um salário mínimo, quais sejam, aposentadoria por idade ou invalidez, auxílio-doença, auxílio-reclusão, pensão e salário maternidade.


Especificamente quanto à aposentadoria por idade, o artigo 143 da LBPS regulamenta a possibilidade de concessão do benefício ao trabalhador rural, seja ele segurado especial, empregado ou autônomo (sem vínculo empregatício).


Independentemente de não estarem relacionados no artigo 39 supracitado os trabalhadores rurais avulsos (boias-frias, volantes, safristas, diaristas etc.), mas tão somente no indigitado artigo 143, interpretação contrária à existência de cobertura previdenciária para os demais eventos previstos na Carta fere a própria previsão constitucional do direito social à previdência social para os trabalhadores do campo.


Não é demais lembrar que há, inclusive, entendimento de que o trabalhador rural avulso se equipara à situação do empregado rural no que tange à responsabilidade pelos recolhimentos previdenciários, que é atribuída ao empregador rural, de sorte que lhes não seria exigível a contribuição previdenciária.


Independentemente da questão relativa à responsabilidade pelos recolhimentos previdenciários do trabalhador rural avulso, fato é que sempre se admitiu a concessão dos benefícios descritos no artigo 39 da LBPS a esses segurados obrigatórios do RGPS e a seus dependentes, haja vista a impossibilidade de simplesmente os excluir da garantia constitucional à cobertura previdenciária em razão das notórias adversidades e irregularidades relativas à contratação da força de trabalho rurícola.


Nesse sentido, cito os seguintes precedentes ao longo dos anos:


"PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. VALOR DA CONDENAÇÃO INFERIOR A 1000 SALÁRIOS MÍNIMOS. REMESSA OFICIAL NÃO CONHECIDA. TRABALHADOR DIARISTA/BOIA-FRIA/VOLANTE. EQUIPARAÇÃO AO EMPREGADO RURAL. BENEFÍCIO DEVIDO. 1. A sentença foi proferida já na vigência do novo Código de Processo Civil - Lei 13.105/2015 -, razão pela qual se deve observar o disposto no art. 496, §3º, I. No caso dos autos, não obstante a sentença ser ilíquida, é certo que o valor da condenação não supera 1.000 salários mínimos, sendo incabível, portanto, a remessa oficial. 2. Considerando as condições em que o diarista/boia-fria/volante exerce seu trabalho, com inegável relação de subordinação, em caráter não eventual e mediante remuneração, mostra-se indevido tratá-lo como contribuinte individual, devendo-se equipará-lo, na verdade, ao segurado empregado rural. 3. Comprovado o exercício de atividade rural na condição de diarista, o falecido deve ser enquadrado como segurado empregado rural, possibilitando à parte autora o recebimento do benefício de pensão por morte. 4. Remessa oficial não conhecida. Apelação do INSS desprovida." (TRF3, 10ª Turma, ApReeNec 00412272820174039999, Desembargador Federal Nelson Porfírio, DJe 04.05.2018)

"PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO LEGAL. ART. 557, § 1º, CPC. PENSÃO POR MORTE. TRABALHADOR RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CORROBORADO POR PROVA TESTEMUNHAL. DIARISTA. VÍNCULO URBANO. ATIVIDADE PREDOMINANTE COMO RURÍCOLA. TERMO INICIAL. MENOR. DATA DO ÓBITO. AFASTAMENTO DA PRESCRIÇÃO DE OFÍCIO. QUALIDADE DE DEPENDENTE. MATÉRIA NÃO SUSCITADA NAS RAZÕES DE APELAÇÃO. PRECLUSÃO. DECISÃO EM CONSONÂNCIA COM JURISPRUDÊNCIA CONSOLIDADA DO C. STJ E DESTA CORTE. AGRAVO DESPROVIDO. - A decisão agravada está em consonância com o disposto no artigo 557 do Código de Processo Civil, visto que supedaneada em jurisprudência consolidada do Colendo Superior Tribunal de Justiça e desta Corte. - Presente início de prova material corroborado pela prova testemunhal a ensejar a concessão do benefício de pensão por morte. - Ressalte-se que não há como afastar do bóia-fria, diarista ou safrista a qualidade de rurícola e segurado obrigatório da Previdência Social na condição de empregado, nos termos do disposto no artigo 11, I, a, da Lei nº 8.213/91. [...]" (TRF3, 7ª Turma, Ap 00122934120094039999, Desembargadora Federal Diva Malerbi, DJe 19.11.2013)

"PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. ESPOSA. CONDIÇÃO DE DEPENDENTE. COMPROVAÇÃO DA CONDIÇÃO DE RURÍCOLA DO FALECIDO. QUALIDADE DE SEGURADO. DIARISTA. RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÕES. RESPONSABILIDADE DOS EMPREGADORES. TERMO INICIAL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. TUTELA. 1 - Restando comprovada nos autos a condição de esposa, a dependência econômica é presumida, nos termos do art. 16, § 4º, da Lei nº 8.213/91. 2 - Havendo nos autos início razoável de prova material corroborada por testemunhas, deve ser reconhecida a qualidade de rurícola do falecido, para fins de pensão previdenciária. 3 - A responsabilidade pelo recolhimento das contribuições previdenciárias relativa à atividade rural exercida pelo falecido, na condição de empregado (diarista), cabia aos seus empregadores, não podendo recair tal ônus sobre seus dependentes. [...]" (TRF3, 10ª Turma, Ap 00075647420064039999, Juiz Federal Nino Toldo, DJ 08.08.2007)

"PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. REMESSA OFICIAL. CONDIÇÃO DE DEPENDENTE. COMPROVAÇÃO DA CONDIÇÃO DE RURÍCOLA DO "DE CUJUS". QUALIDADE DE SEGURADO. DIARISTA. RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÕES. RESPONSABILIDADE DOS EMPREGADORES. TERMO INICIAL. CORREÇÃO MONETÁRIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. CUSTAS. ISENÇÃO. IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO. I - Remessa oficial tida por interposta em observância ao artigo 10 da Lei 9469/97, não se aplicando, no caso em tela, o disposto no artigo 475, §2º, do CPC, com a redação dada pela Lei nº 10.352/2001. II - Restando comprovada nos autos a condição de esposa e de filhos menores à época do óbito, a dependência econômica é presumida, nos termos do § 4º, do artigo 16, da Lei nº 8.213/91. III - Havendo nos autos início razoável de prova material corroborada por testemunhas, deve ser reconhecida a qualidade de rurícola do falecido, para fins de pensão previdenciária. IV - A responsabilidade pelo recolhimento das contribuições previdenciárias relativa à atividade rural exercida pelo "de cujus", na condição de empregado (diarista), cabia aos seus empregadores, não podendo recair tal ônus sobre seus dependentes. [...]" (TRF3, 10ª Turma, Ap 00120200420054039999, Desembargador Federal Sérgio Nascimento, DJ 17.01.2007)

"PREVIDENCIÁRIO - PENSÃO POR MORTE - LEGISLAÇÃO APLICÁVEL - CÔNJUGE - RURAL - PRESENTES TODOS OS REQUISITOS - TERMO INICIAL - HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS - CUSTAS PROCESSUAIS - REMESSA OFICIAL - SENTENÇA MANTIDA. 1. Não está sujeita ao duplo grau de jurisdição a sentença na qual o valor da condenação for inferior a 60 (sessenta) salários mínimos, nos termos do § 2º do Art. 475, do Código de Processo Civil. 2. A legislação aplicada na concessão do benefício pensão por morte é aquela vigente na época do evento morte. Assim, a fruição da pensão por morte, em análise, tem como pressupostos a implementação de todos os requisitos previstos na legislação previdenciária para a concessão do benefício, quais sejam, a existência de um vínculo jurídico entre o segurado mantenedor do dependente e a instituição previdenciária, a dependência econômica entre a pessoa beneficiária e o segurado e a morte do segurado. 3. A autora demonstra, conforme a presunção legal do artigo 13 da Lei nº 3.807/60, aplicável no tempo do óbito, que era dependente do falecido, decorrente do vínculo conjugal (certidões de casamento e de óbito). 4. A prova documental - certidões de óbito e de nascimento de seu filho, afiançando como profissão do falecido a de lavrador acostada aos autos, corroborada pelos unânimes depoimentos testemunhais, demonstra, de modo veemente, a qualidade de segurado previdenciário do de cujus, posto que restou demonstrado se tratar de trabalho rural exercido como empregado - diarista. [...]" (TRF3, 7ª Turma, Ap 00343055920034039999, Desembargadora Federal Leide Polo, DJ 14.04.2004)

"PREVIDENCIÁRIO - PENSÃO POR MORTE - CÔNJUGE E FILHOS - ÓBITO APÓS O ADVENTO DAS LEIS 8.212/91 E 8.213/91 - TRABALHADOR RURAL SEGURADO OBRIGATÓRIO DO REGIME GERAL DA PREVIDÊNCIA SOCIAL -COMPROVADA A QUALIDADE DE SEGURADO, NA DATA DO ÓBITO - RECURSO DO INSS IMPROVIDO. REMESSA OFICIAL PARCIALMENTE PROVIDA. 1. Com o advento das Leis 8.212 e 8.213 de 24 de julho de 1991 que dispõem, respectivamente, sob o Plano de Custeio da Seguridade Social e sobre o Plano de Benefícios da Previdência Social, trabalhador rural foi equiparado ao segurado urbano. 2.Para efeito de concessão da pensão por morte, após o advento das referidas leis tem o dependente que comprovar não só o exercício da atividade rural, mas também a condição de segurado (contribuinte) do falecido, quando de seu passamento. 3. E esta imposição existe para todas as classes de trabalhadores rurais, hoje segurados obrigatórios da previdência social que são, segundo o artigo 11 da Lei 8.213/91: o empregado (entre eles o bóia-fria ou volante), contribuinte individual, titular de firma individual rural, o sócio solidário, o sócio de indústria, o sócio gerente e o sócio cotista que recebam remuneração decorrente de seu trabalho em empresa rural ou quem presta serviço de natureza rural, em caráter eventual, a uma ou mais empresas, sem relação de emprego e o trabalhador avulso. 4. Se a atividade rural for exercida sob a proteção de relação de emprego ou como avulso, a responsabilidade pelo recolhimento será do empregador ( artigo 30, incisos I e II da Lei 8.212/91 ). 5. As Leis 8.213/91 e 8.212/91 dão tratamento especial aos segurados especiais( artigo 11, VII da Lei 8.213/91 e artigo 12, VII da Lei 8.212/91).Os dependentes destes segurados têm garantida a pensão por morte, no valor de um salário mínimo, desde que comprovem o exercício de atividade rural do falecido, ainda que de forma descontínua, no período, imediatamente anterior ao requerimento do benefício. [...]" (TRF3, 5ª Turma, Ap 00357254119994039999, Juíza Federal em auxílio Eva Regina, DJ 23.09.2002)

Registro que o entendimento monocrático do ilustre Relator da demanda subjacente não foi encampado pela Turma julgadora em caso semelhante, objeto de agravo:


"PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO LEGAL. DECISÃO MONOCRÁTICA. PENSÃO POR MORTE. TRABALHADOR RURAL. DIARISTA. QUALIDADE DE SEGURADO COMPROVADA. 1- O início de prova material da atividade rural desempenhada pelo de cujus foi corroborado por prova testemunhal, que comprovaram sua qualidade de segurado no momento do óbito. 2- Dependência econômica presumida, nos moldes preconizados pelo artigo 16, I da Lei de Benefícios. 3- Agravo provido." (TRF3, 9ª Turma, Ap 00012889020124036127, relator Juiz Federal convocado Rodrigo Zacharias, relator para o acórdão Juiz Federal convocado Fernando Gonçalves, DJe 05.02.2014)

Assim, em iudicium rescindens, entendo cabível a desconstituição do julgado rescindendo em decorrência de violação literal ao disposto no artigo 201, I, da Constituição.


Passo à análise de mérito, em iudicium rescisorium,


Encontra-se sedimentado o entendimento de que, por força do princípio tempus regit actum, o direito ao benefício previdenciário decorrente da morte de segurado é regido pela lei vigente à época do óbito (confira-se: Súmula STJ n.º 340).


Tendo em vista o óbito ocorrido em 22.06.2005, o direito à pensão se encontrava regulamentado nos artigos 74 e seguintes da Lei n.º 8.213/91 (LBPS), observada a redação dada pela Lei n.º 9.032/95.


O benefício independe de carência, sendo percuciente para sua concessão: a) a ocorrência do evento morte; b) a comprovação da condição de dependente do postulante; e c) a manutenção da qualidade de segurado quando do óbito, salvo na hipótese de o de cujus ter preenchido em vida os requisitos necessários ao deferimento de qualquer uma das aposentadorias previstas no Regime Geral de Previdência Social - RGPS.


A condição de dependente do autor é presumida e se encontra comprovada pela certidão de casamento de fl. 54 (artigo 16, I e § 4º, da LBPS).


A celeuma se cinge em torno do requisito relativo à qualidade de segurada da falecida, haja vista alegação de se tratar de trabalhadora rural volante.


Quanto ao ponto, trago à baila teses firmadas sobre a comprovação do labor campesino para fins de aposentação, as quais, evidentemente, aplicam-se para os demais casos de cobertura previdenciária, mutatis mutandis.


Ressalto o entendimento firmado pela 1ª Seção do C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do REsp nº 1.348.633/SP, adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil de 1973, inclusive objeto do enunciado de Súmula n.º 577, no sentido de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em momento anterior ou posterior àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material, mas desde que tal período venha delineado em prova testemunhal idônea e robusta.


Quanto ao ponto, também restou assentado pela 1ª Seção do C. Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp nº 1.321.493/SP, em sede de recurso representativo de controvérsia, que é possível o abrandamento da prova para configurar tempo de serviço rural dos trabalhadores rurais denominados "boias-frias", considerando a inerente dificuldade probatória da condição de trabalhador campesino, sendo, para tanto, imprescindível a apresentação de início de prova material sobre parte do lapso temporal pretendido, a ser complementada por idônea e robusta prova testemunhal.


Ainda, há remansosa jurisprudência no sentido de ser extensível à mulher a condição de rurícola nos casos em que os documentos apresentados, para fins de comprovação da atividade campesina, indiquem o marido como trabalhador rural (confira-se: STJ, 3ª Seção, EREsp 1171565, relator Ministro Nefi Cordeiro, DJe 05.03.2015).


Em complementação ao tema, a 1ª Seção do C. Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp nº 1.304.479/SP, sob o rito do artigo 543-C do CPC/1973, entendeu que o trabalho urbano de um dos membros do grupo familiar não descaracteriza, por si só, os demais integrantes como segurados especiais, devendo ser averiguada a dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar, sendo que, em exceção a essa regra geral, tem-se que a extensão de prova material em nome de um integrante do núcleo familiar a outro não é possível quando aquele passa a exercer trabalho incompatível com o labor rurícola, como o de natureza urbana.


Além do mais, o C. STJ estabeleceu, no julgamento do REsp autuado sob nº 1.354.908/SP, sob a sistemática dos recursos repetitivos representativos de controvérsia, a necessidade da demonstração do exercício da atividade campesina em período imediatamente anterior ao implemento dos requisitos necessários à concessão do benefício, verbis:


"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE RURAL NO PERÍODO IMEDIATAMENTE ANTERIOR AO REQUERIMENTO. REGRA DE TRANSIÇÃO PREVISTA NO ARTIGO 143 DA LEI 8.213/1991. REQUISITOS QUE DEVEM SER PREENCHIDOS DE FORMA CONCOMITANTE. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. 1. Tese delimitada em sede de representativo da controvérsia, sob a exegese do artigo 55, § 3º combinado com o artigo 143 da Lei 8.213/1991, no sentido de que o segurado especial tem que estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural, momento em que poderá requerer seu benefício. Se, ao alcançar a faixa etária exigida no artigo 48, § 1º, da Lei 8.213/1991, o segurado especial deixar de exercer atividade rural, sem ter atendido a regra transitória da carência, não fará jus à aposentadoria por idade rural pelo descumprimento de um dos dois únicos critérios legalmente previstos para a aquisição do direito. Ressalvada a hipótese do direito adquirido em que o segurado especial preencheu ambos os requisitos de forma concomitante, mas não requereu o benefício. 2. Recurso especial do INSS conhecido e provido, invertendo-se o ônus da sucumbência. Observância do art. 543-C do Código de Processo Civil." (STJ, 1ª Seção, REsp 1354908, relator Ministro Campbell Marques, DJe 10.02.2016) [grifos nossos]

Pois bem, cumpria ao autor comprovar a qualidade de segurada da falecida no momento imediatamente anterior ao óbito.


Nos autos da demanda subjacente foram juntados documentos em nome do autor, que o qualificavam como lavrador. Verifica-se dos documentos e dos depoimentos das testemunhas que, até os anos 80, o autor exerceu atividade de parceria agrícola, situação que, caso considerada comprovada a existência de regime de economia familiar, poderia ser estendida à sua falecida esposa.


Após esse período, o autor passou a exercer atividade rural como empregado até 1997. Já desempregado, foi acometido por incapacidade laborativa que resultou na concessão administrativa de auxílios-doença de 28.02.1997 a 17.08.1998 e de 03.11.1998 a 05.05.2000, este último convertido administrativamente em aposentadoria por invalidez, com data de início em 06.05.2000.


Quanto ao ponto, registro que não há como se estender o valor probatório dos documentos, apresentados em nome exclusivamente do autor, para o fim de validar o exercício de atividade rural pela falecida em período posterior à sua incapacidade laborativa e ao próprio início da atividade exercida como empregado rural.


Além do mais, o aproveitamento por extensão de documentos em nome de terceiro deve guardar correlação lógica com a situação que se pressupõe comum. Explico. Razoável a presunção de que, ante a comprovação de que algum dos membros do núcleo familiar trabalhava em regime de economia familiar, os demais também o fizessem, eis que é pressuposto necessário e comum dessa atividade o apoio mútuo e o esforço comum, sem os quais o grupo não conseguiria se manter. A mesma presunção, entretanto, não vale para o diarista, eis que o fato de um dos membros exercer funções laborativas nesta qualidade, não faz presumir que os demais também o façam, ante a inexistência de pressuposto comum ou de caraterística integrativa da parte ao todo.


Por oportuno, destaco trecho do voto condutor da relatora Desembargadora Federal Marisa Santos, no julgamento proferido, em 22.06.2017, à unanimidade desta 3ª Seção, com relação à Ação Rescisória n.º 2015.03.00.004818-6:


"[...] O trabalho rural em regime de economia familiar permite o aproveitamento do início de prova material em reciprocidade entre os membros da entidade familiar, sendo permitida a comunicação da qualificação profissional de um membro para outro, como ocorre entre os cônjuges, entre pais e filhos, e em outras hipóteses nas quais presente o parentesco.
No reconhecimento do trabalho rural do diarista não se permite, em regra, o aproveitamento da prova material, que não em nome próprio, em razão do caráter solitário e avulso do trabalho desempenhado.
Assim, o diarista só poderá aproveitar o início de prova material produzida em nome de outrem, mesmo que de algum familiar, se devidamente amparado pelas demais provas dos autos. [...]"

Nesse sentido e especificamente quanto à extensão da eficácia probatória de documento do cônjuge supérstite para comprovação de suposta qualidade de trabalhadora rural diarista da falecida, assim já se pronunciou esta 3ª Seção:


"PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO RESCISÓRIA. PENSÃO POR MORTE. PRELIMINAR DE CARÊCIA DE AÇÃO. INOCORRÊNCIA. ATIVIDADE RURAL DESEMPENHADA PELA DE CUJUS. INÍCIO DE PROVA MATERIAL DO LABOR RURAL. CÓDIGO DE OCUPAÇÃO. EQUÍVOCO NÃO FACILMENTE PERCEPTÍVEL. ERRO DE FATO NÃO CARACTERIZADO. DOCUMENTOS NOVOS. ANOTAÇÕES EM CTPS. VÍNCULOS EMPREGATÍCIOS RURAIS OSTENTADOS PELO AUTOR. INÍCIO DE PROVA MATERIAL QUE NÃO FOI CORROBORADO PELA PROVA TESTEMUNHAL. FORÇA PROBATÓRIA FRAGILIZADA. VIOLAÇÃO A DISPOSITIVO LEGAL. INTERPRETAÇÃO CONSENTÂNEA COM A LEGISLAÇÃO REGENTE. JUSTIÇA GRATUITA. [...] IX - Adentrando ao juízo rescisório, penso que o pedido formulado na ação subjacente não merece, igualmente, acolhimento, uma vez que não é possível a extensão da profissão do marido à sua esposa falecida, quando se tratar de benefício de pensão por morte, onde não restar demonstrado o regime de economia familiar, o que se evidencia no caso vertente, tendo em vista a narrativa da inicial indicando o labor da de cujus como bóia-fria ou volante. [...]" (TRF3, 3ª Seção, AR 00184695020154030000, relator Desembargador Federal Sérgio Nascimento, DJe 03.02.2017"

No caso concreto se fazia imprescindível que o autor tivesse apresentado início de prova material em nome da falecida, em período próximo ao óbito, ou ao do início de eventual incapacidade laborativa, a fim de, em conjunto com outros meios probatórios (como a prova oral), demonstrar sua qualidade de segurada, como trabalhadora rural volante.


Em nome da falecida apenas constam os documentos juntados nesta ação rescisória, consistentes na sua carteira de filiação e respectiva ficha de inscrição no Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Iturama - MG, constando data de admissão em 30.10.1995 e pagamento das contribuições sindicais apenas de outubro de 1995 a fevereiro de 1996.


Além do curto período a que dizem respeito, não há como olvidar que se tratou de filiação sindical por força de breve período em que a autora esteve em Minas Gerais, já que, conforme constante dos autos e dos depoimentos das testemunhas, a falecida há muito residia em Ouroeste/SP, sendo que as testemunhas sequer citaram sua passagem por Iturama/MG.


Toda a prova material constante dos autos é bastante remota (findada em 1996) em relação ao período que se pretende provar a qualidade de segurada da falecida, seja considerando a data do óbito (em 2005), seja se apreciada a data do início de sua suposta incapacidade laborativa (em 2002).


É forte o entendimento de que, ainda que não se exija prova material para todo o período de carência, a prova material indiciária deve se referir ao menos à parte desse interregno, isto é, deve haver concomitância temporal entre a prova material inicial e o lapso que se pretende comprovar em juízo, mormente quando verificado significativo decurso de tempo entre um e outro.


Nesse sentido, tem-se o enunciado de Súmula n.º 34 da Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais - TNU ("Para fins de comprovação do tempo de labor rural, o início de prova material deve ser contemporâneo à época dos fatos a provar."), bem como os seguintes precedentes do c. Superior Tribunal de Justiça e desta Corte:


"AÇÃO RESCISÓRIA. PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. TRABALHADOR RURAL. APOSENTADORIA POR IDADE. PERÍODO LEGAL DE CARÊNCIA. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CONTEMPORÂNEA. INEXISTÊNCIA. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 149/STJ. AÇÃO IMPROCEDENTE. 1. Nenhum dos documentos apresentados comprova o exercício da atividade rural no período de carência (138 meses - artigos 142 e 143 da Lei nº 8213/91) imediatamente anterior ao requerimento do benefício (2004), havendo apenas a prova testemunhal colhida. 2. A jurisprudência desta Corte Superior de Justiça é no sentido de que "conquanto não se exija a contemporaneidade da prova material durante todo o período que se pretende comprovar o exercício de atividade rural, deve haver ao menos um início razoável de prova material contemporânea aos fatos alegados, admitida a complementação da prova mediante depoimentos de testemunhas" (AgRg no REsp 1150825/SP, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 07/10/2014, DJe 23/10/2014). 3. Incide a Súmula 149/STJ ("A prova exclusivamente testemunhal não basta a comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de beneficio previdenciário"), cuja orientação foi confirmada no julgamento do REsp n. 1.133.863/RN, Rel. Ministro Celso Limongi (Desembargador Convocado do TJ/SP), Terceira Seção, julgado em 13/12/2010, DJe 15/04/2011, submetido ao rito do art. 543-C do Código de Processo Civil, uma vez que, no presente caso, a prova testemunhal não se fez acompanhar de qualquer documento contemporâneo ao tempo de atividade reclamado. 4. Ação rescisória improcedente." (STJ, 3ª Seção, AR 3994, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, v.u., DJe 23.09.2015)

"PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS INFRINGENTES. APOSENTADORIA POR IDADE DE TRABALHADOR RURAL. ÓBITO DO CÔNJUGE. INÍCIO MATERIAL DE PROVA. AUSÊNCIA. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. RESP 1.352.721/SP. - A aposentadoria por idade de rurícola exige idade mínima de 60 anos (homem) e 55 anos (mulher), bem assim comprovação do exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência da benesse, conforme tabela progressiva, de cunho transitório, inserta no art. 142 da Lei nº 8.213/91, a ser manejada conforme o ano de implementação do requisito etário, ficando afastada a obrigatoriedade de contribuições. - Possibilidade de demonstração do labor campesino, mediante utilização de princípios de provas em nome do cônjuge da postulante da aposentadoria por idade, mesmo após o falecimento deste. - Nessa circunstância, os documentos indiciários devem guardar proximidade ao lapso de carência, exigindo-se, ainda, prova testemunhal robusta, no sentido de que a solicitante persistiu a labutar nas lides rurais, até completar a idade mínima à aposentação postulada. - In casu, muito embora as testemunhas tenham afirmado que a parte autora exerceu labor rural pelo interregno de carência, os elementos havidos como princípios de prova documental desservem à finalidade probante, à falta de contemporaneidade com o lapso no âmbito do qual haveria de ser demonstrada a faina campestre. - Precedente do STJ submetido à sistemática dos recursos representativos de controvérsia (REsp nº 1.352.721/SP), no qual se deliberou que a falta de eficaz princípio de prova material do labor campesino traduz-se em ausência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, abrindo ensejo à extinção do processo sem resolução de mérito. - Embargos infringentes desprovidos. - Extinção do processo, de ofício, sem resolução do mérito.(TRF3, 3ª Seção, EI 00330343420114039999, relatora Desembargadora Federal Ana Pezarini, v.u., DJe 01.12.2017)

Tal como instruídas as demandas subjacente e rescisória não entendo presente prova material indiciária da atividade rurícola exercida pela falecida, na qualidade de diarista, em período próximo àquele que se pretende comprovar, não subsistindo, sozinha, a prova testemunhal para fim de demonstração do labor campesino (Súmula STJ n.º 149).


Outrossim, ainda que se pudesse considerar a existência de prova material indiciária no caso concreto, a prova testemunhal não se mostrou robusta o suficiente para comprovar, com efetividade, que a falecida desempenhava atividade como diarista. Enquanto as testemunhas se mostram firmes ao afirmarem o exercício do mourejo campesino nos idos de 1980, por força dos contratos de parceria agrícola, não souberam precisar lapsos temporais, empregadores, atividades exercidas etc. em relação ao trabalho rural volante. Desta sorte, também encontraria óbice no enunciado de Súmula STJ n.º 577 ("É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório").


Ademais, caberia ainda ao falecido comprovar a existência de incapacidade laborativa desde 2002, já que as testemunhas afirmam que desde então aquela se encontrava afastada da lida rural e, portanto, não detinha qualidade de segurada na data do óbito. Embora tenham sido juntados atestados médicos nos autos da demanda subjacente (fls. 57-59), seria imprescindível a realização de prova pericial médica.


Por todo o exposto, considerando que a atividade rural supostamente exercida pela falecida está baseada em prova exclusivamente testemunhal, sem início de prova material para o período exigido, não reconheço a comprovação do exercício de atividade rural no período imediatamente anterior ao óbito.


Em razão do entendimento fixado pela Corte Especial do C. Superior Tribunal de Justiça no julgamento do REsp n.º 1.352.721/SP, na forma do artigo 543-C do CPC/1973, e diante da ausência de conteúdo probatório eficaz, deverá, ainda que contrariamente ao entendimento deste Relator, o feito ser extinto, sem resolução de mérito, por carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, de sorte a possibilitar à parte autora o ajuizamento de novo pedido, administrativo ou judicial, caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa.


Ante o exposto, rejeito a matéria preliminar suscitada; em iudicium rescindens, com fundamento nos artigos 485, V, do CPC/1973 e 966, V, do CPC/2015, julgo procedente a presente ação rescisória para desconstituir o julgado na ação subjacente; e, em iudicium rescisorium, nos termos dos artigos 267, IV, do CPC/1973 e 485, IV, do CPC/2015, julgo extinta a ação subjacente, sem resolução de mérito.


Custas na forma da lei.


Por força da rescisão do julgado, condeno a autarquia no pagamento de honorários advocatícios, que fixo em R$ 1.000,00 (mil reais), devidamente atualizado e acrescido de juros de mora, conforme estabelecido do Manual de Cálculos e Procedimentos para as dívidas civis, até sua efetiva requisição (juros) e pagamento (correção), conforme prescrevem os §§ 2º, 4º, III, e 8º, do artigo 85 do CPC.

Em decorrência do rejulgamento, vedada a compensação na forma do artigo 85, § 14 do CPC, condeno a autora no pagamento de honorários advocatícios, que fixo em igual montante de R$ 1.000,00 (mil reais), devidamente atualizado e acrescido de juros de mora, conforme estabelecido do Manual de Cálculos e Procedimentos para as dívidas civis, até sua efetiva requisição (juros) e pagamento (correção), conforme prescrevem os §§ 2º, 4º, III, e 8º, do artigo 85 do CPC. A exigibilidade das verbas honorárias devidas ficará suspensa por 5 (cinco) anos, desde que inalterada a situação de insuficiência de recursos que fundamentou a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, a teor do disposto no artigo 98, § 3º, do CPC.


É como voto.


CARLOS DELGADO
Desembargador Federal


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