Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 14/03/2019
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0008309-12.2010.4.03.6120/SP
2010.61.20.008309-6/SP
RELATOR : Desembargador Federal ANDRE NABARRETE
APELANTE : SYSTECH EQUIPAMENTOS ELETRONICOS LTDA
ADVOGADO : SP098393 ANTONIO CLAUDIO BRUNETTI e outro(a)
APELADO(A) : Uniao Federal (FAZENDA NACIONAL)
ADVOGADO : SP000004 RAQUEL VIEIRA MENDES E LÍGIA SCAFF VIANNA
No. ORIG. : 00083091220104036120 2 Vr ARARAQUARA/SP

EMENTA

AÇÃO ANULATÓRIA. ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO. AUSÊNCIA DE NULIDADE DA SENTENÇA. FISCALIZAÇÃO PELA RECEITA FEDERAL. ATO QUE ENSEJOU O REQUERIMENTO DE MANDADO DE BUSCA E APREENSÃO DE MERCADORIAS. INEXISTÊNCIA DE ILEGALIDADE. RECURSO DESPROVIDO.
- O entendimento de que se cuida de matéria de direito que não demanda dilação probatória, em princípio, não consubstancia cerceamento de defesa, já que o magistrado é o destinatário final da prova e pode repelir sua realização de maneira fundamentada, bem assim indeferir aquelas que considerar protelatórias, desnecessárias ou impertinentes, consoante firme jurisprudência pátria. Por outro lado, exsurge da fundamentação da sentença robusta incursão no acervo probatório, cujas conclusões podem ser infirmadas com o exame deste apelo. A declaração de nulidade de um ato tem que ser fundamentada na existência de prejuízo às partes, circunstância não demonstrada.
- Não há ilegalidade em relação ao ato que ensejou o requerimento de mandado de busca e apreensão apresentado pelo Ministério Público Federal no procedimento cautelar criminal, o qual, aliás, foi deferido e legitimou as medidas realizadas no âmbito daquele feito que resultaram na apreensão de mercadorias e documentos, cujo eventual vício deve ser dirimido naquela sede, de forma a evitar decisões conflitantes sobre o mesmo tema.
- No âmbito penal foram reconhecidos o fumus boni juris e o periculum in mora, de forma fundamentada, conforme ressaltado na decisão apelada, os quais autorizaram a deflagração da medida cautelar, de maneira que os elementos então colhidos e sua utilização para esclarecimento de eventuais ilícitos não constitui, em princípio, nenhum ilegalidade apta a inquinar de nulidade os eventuais procedimentos de apuração dela decorrentes.
- Não obstante sua incompetência para deflagrar eventual apuração repressiva, tipicamente policial, o que se extrai dos autos é que optou por encaminhar as informações em questão ao Parquet para que empreendesse o que julgasse pertinente, conforme se infere do ofício já mencionado, bem como os de nº 66/2004, de 22/09/2004 e 133/2005, de 24/08/2005. O órgão da fazenda não tomou iniciativa de requerer judicialmente a apreensão cautelar, a qual, frise-se, não se confunde com a medida prevista no artigo 83 da Lei 9.430/96 que versa sobre a representação fiscal para fins penais relativa aos crimes contra a ordem tributária previstos nos artigos 1º e 2º da Lei no 8.137/90. Conforme explicitou o juízo a quo, somente em 11/09/2008 teve início a ação penal, ou seja, três anos depois da busca e apreensão (01/09/2005) e após o trâmite do respectivo processo administrativo instaurado, conforme se infere dos documentos de fls. 207/214. Assim, incialmente, a fazenda cingiu-se a fornecer elementos que detinha ao Ministério Público Federal e solicitar que este tomasse as medidas que reputasse necessárias. Tal ato não se revela, a meu juízo, ilegal e com aptidão de inquinar de nulidade todos os demais que se seguiram, já que, conforme bem explicitou a sentença recorrida, se de um lado o Código Tributário Nacional autoriza as autoridades administrativas federais a requisitar o auxílio da força pública, e reciprocamente, quando vítimas de embaraço ou desacato no exercício de suas funções, ou quando necessário à efetivação de medida prevista na legislação tributária, ainda que não se configure fato definido em lei como crime ou contravenção, de outro, o Código de Processo Penal diz que qualquer pessoa do povo que tiver conhecimento da existência de infração penal em que caiba ação pública poderá, verbalmente ou por escrito, comunicá-la à autoridade policial.
- A apelante invoca eventual prejuízo decorrente da discriminação das mercadorias no Termo de Apreensão e Guarda Fiscal e no correspondente auto de infração, à vista de que não se observaram as normas pertinentes, especialmente o artigo 2º da Instrução Normativa nº 370/2003, o qual exigiria descrição detalhada. Ao contrário do que sustenta, tal circunstância não consubstanciou prejuízo em relação ao exame pericial realizado nem foi determinante para a conclusão dos peritos, porquanto ainda que o laudo contábil tenha explicitado a ausência de especificação minuciosa dos produtos no TAGF a impossibilitar precisa confrontação com as notas fiscais, outros elementos afastam qualquer assertiva no sentido de que os documentos comprovariam a regular obtenção das mercadorias no mercado interno, já que não propiciam a aferição de origem ou procedência das mercadorias apreendidas nem as individualiza por número de série, ao passo que o TAGF discrimina como estrangeiras todas as que puderam ter sua origem determinada.
- Preceitua o artigo 339, inciso IV, letra b, do Decreto nº 4.544/2002, então vigente, a descrição dos produtos, compreende nome, marca, tipo, modelo, série, espécie, qualidade e demais elementos que permitam sua perfeita identificação.
- Afigura-se escorreito o argumento explicitado na fundamentação da decisão administrativa, no sentido de que a perfeita individualização das mercadorias se faz necessária, sob pena de se permitir que com uma simples nota fiscal que descreva somente o produto, modelo, qualidade e quantidade, seja apto a regularizar todo um estoque de um determinado estabelecimento comercial, razão pela qual se afasta o argumento de que os documentos apresentados comprovariam aquisição no mercado interno.
- Assim, são inaptos os documentos apresentados para o fim de comprovar a regularidade da aquisição da mercadoria. Precedente.
- Sem razão para discrepar da conclusão de que a situação não se equipara à de ausência de descrição minuciosa de fatos que invalidou lançamento tributário por cerceamento de defesa, bem assim de que não se pode dizer que o Auto de Infração lavrado seja totalmente genérico já que indica qualitativa e quantitativamente as mercadorias apreendidas e a forma como lavrado não se revelou fator prejudicial à comprovação da regularidade da mercadoria. Ademais, o argumento de que dificultaria a localização dos respectivos documentos comprobatórios da regularidade por falta de discriminação detalhada dos itens apreendidos e, por conseguinte, obstar a amplitude do direito de defesa e contraditório, não se sustenta, porquanto não se afigura verossímil que não tivesse controle de seu estoque. O TAGF de fls. 139/141 enumera os itens por marca, origem e quantidade, de maneira que não havia dificuldade em o proprietário ter apresentado os respectivos documentos comprobatórios da aludida aquisição no mercado interno ou da regular importação. Consoante consignou a decisão recorrida, cuida-se de procedimento bem simples: eram 10 mercadorias importadas, bastava apresentar os dez comprovantes da importação regular. Eram 100 mercadorias, que se apresentassem os 100 comprovantes, de modo que a documentação comprobatória da regularidade das mercadorias deveria corresponder aos bens enumerados.
- Igualmente não é de ser acolhido o argumento de que padece de nulidade a decisão exarada no PAF nº 13851.001303/2005-93, em razão de invocado impedimento do agente que a proferiu. O E. S.T.J. já se posicionou no sentido de que não configura o impedimento previsto no artigo 18 da Lei nº 9.784/1999 quando a atuação de quem se tem por impedido decorre do estrito cumprimento de um dever legal e não evidencia qualquer interesse direto ou indireto no deslinde da matéria.
- Não se constata, portanto, os aludidos vícios atinentes à invocada parcialidade do agente, bem assim existência de interesse direto ou indireto dele para a decretação da pena de perdimento sobre as mercadorias objeto do APF nº 13851.001303/2005-93 para o fim de justificar seus atos, já que agiu em comprimento de um dever legal, razão pela qual também não há que se falar em violação dos princípios da impessoalidade e moralidade administrativa.
- Considerado o todo consignado - elementos probatórios dos autos apontados, legislação norteadora do tema e correlata doutrina, verifica-se comprovada a atuação legítima da Receita Federal, de maneira que os argumentos alusivos à exegese proposta pela recorrente, relativamente aos artigos 65 da Lei nº 10.833/03, 3º e 142, § único, do CTN, 6º, inciso I, letra "c", da lei nº 10.593/02, 37 e 145, § 1º, da Constituição Federal, 53 da Lei nº 9.784/99, o Decreto-lei nº 37/1966 combinado com os artigos 119, inciso I, letra "a", e 11 da portaria/MF nº 271/76 e 2º da IN/SRF nº 370/03, 2º e 18, inciso I, da Lei nº 9.784/99 e 19, inciso I, da Portaria/MF nº 58/06 não têm o condão de alterar o entendimento ora explicitado, em razão dos fundamentos expostos.
- Preliminar rejeitada. Apelação desprovida.


ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar a preliminar e negar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 21 de fevereiro de 2019.
FERREIRA DA ROCHA
Juiz Federal Convocado


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
Signatário (a): SILVIO LUIS FERREIRA DA ROCHA:10091
Nº de Série do Certificado: 10A516071152AEA1
Data e Hora: 28/02/2019 15:21:12



APELAÇÃO CÍVEL Nº 0008309-12.2010.4.03.6120/SP
2010.61.20.008309-6/SP
RELATOR : Desembargador Federal ANDRE NABARRETE
APELANTE : SYSTECH EQUIPAMENTOS ELETRONICOS LTDA
ADVOGADO : SP098393 ANTONIO CLAUDIO BRUNETTI e outro(a)
APELADO(A) : Uniao Federal (FAZENDA NACIONAL)
ADVOGADO : SP000004 RAQUEL VIEIRA MENDES E LÍGIA SCAFF VIANNA
No. ORIG. : 00083091220104036120 2 Vr ARARAQUARA/SP

RELATÓRIO

Apelação interposta por Systech Equipamentos Eletrônicos Ltda. contra sentença que julgou improcedente a ação ordinária ajuizada para obter a declaração de nulidade do auto de infração nº 0812200/00352/05 e da decisão final que determinou a aplicação de pena de perdimento no processo administrativo nº 13851.001303/2005-93. Condenação da autora ao pagamento de honorários advocatícios fixados em 10 % do valor da causa atualizado.


Sustenta-se:


a) nulidade da sentença, à vista dos seguintes motivos:


a.1) a decisão recorrida considerou um fato controvertido em suas razões de decidir e, de outro lado, não permitiu que a parte produzisse a respectiva prova em contrário, já que indeferiu as provas periciais e testemunhais, as quais demonstrariam os prejuízos causados pelos atos viciados, razão pela qual deve ser reconhecida a violação à ampla defesa e ao contraditório, sob pena de se negar vigência aos artigos 330, inciso I, e 331, § 2º, do CPC/1973, porquanto não teve oportunidade de comprovar a aquisição lícita das mercadorias mediante a produção das provas requeridas;


a.2) houve contradição consubstanciada pelo indeferimento fundado na assertiva de que seria irrelevante a comprovação de prejuízos já que depois julgou improcedente o pedido sob o argumento de que o ato não seria nulo por não haver acarretado prejuízo à parte;


a.3) a exata compreensão acerca da ocorrência ou não do prejuízo seria matéria controvertida ligada à prova de fatos a serem esclarecidos, os quais impediriam o julgamento antecipado da lide;


a.4) afigura-se ilegal o indeferimento do pedido de complementação ou renovação da prova pericial, sob o argumento de que a valoração fica reservada para o momento em que proferida a sentença, já que deve fixar os pontos controvertidos no saneamento (artigo 331, § 2º, do CPC/1973) e não tardiamente quando já houve cerceamento de defesa;


b) nulidade do auto de infração, em razão do modo genérico como foi confeccionado, pois não discriminou as mercadorias de forma suficiente, detalhada, de modo que a contribuinte pudesse exercitar com a devida amplitude o seu direito de defesa e contraditório, a teor dos artigo 65 da Lei nº 10.833/03;


c) consoante artigos 3º e 142, § único, do CTN, 6º, inciso I, letra "c", da lei nº 10.593/02 e 145, § 1º, da Constituição Federal, os procedimentos fiscais tributários submetem-se à máxima vinculação e mínima discricionariedade;


d) a Instrução Normativa SRF nº 370/03, artigo 2º, dispõe que a única exceção é para apreensão de mercadoria de valor inferior a R$ 50,00 por quilograma, o que não se enquadra ao caso dos autos, de modo que a discriminação genérica nos TAGFs nº 99/05 e nº 100/05, bem como no correspondente auto de infração nº 0812200/00352/05 não observou as normas em questão, no entanto as mesmas mercadorias estão descritas nas diversas notas fiscais apresentadas na impugnação administrativa e indicam precisamente o produto, marca, modelo e código do modelo;


e) a discriminação genérica causa dificuldade para a contribuinte localizar todas as documentações fiscais pertinentes e não permite a aferição no âmbito processual;


f) a única perícia realizada deu-se por avaliação indireta e não permitiu confronto documental;


g) as notas fiscais apresentadas comprovaram a aquisição da mercadoria apreendida no mercado interno, as quais foram refutadas pelo fisco sob o argumento de que não indicavam a perfeita individualização de cada um dos itens nelas descritos;


h) o Auto de Infração nº 0812200/00352/05 deve ser declarado nulo, sobretudo porque o artigo 53 da Lei nº 9.784/99 é expresso em determinar que a administração deve anular seus próprios atos quanto eivados de vício de legalidade, bem assim dispõem a Súmula nº 473 do S.T.F. e o Decreto-lei nº 37/1966 combinado com os artigos 119, inciso I, letra "a", e 11 da portaria/MF nº 271/76 e 2º da IN/SRF nº 370/03;


i) nulidade da decisão exarada no PAF nº 13851.001303/2005-93, porquanto o agente fiscal que julgou o feito em questão é o mesmo que lavrou o Auto de Infração nº 0812200/00352/05 e que participou da apreensão das mercadorias nele relacionadas, bem como requereu o mandado de busca e apreensão que ensejou a diligência, de modo que não há dúvidas quanto ao impedimento para proferi-la, nos termos do inciso I do artigo 18 da Lei nº 9.784/99;


j) o interesse direto ou indireto do agente pela decretação da pena de perdimento dos objetos decorre de ter sido ele quem os apreendeu, mediante precipitadas acusações previamente tecidas contra a autora;


k) o julgamento do PAF nº 13851.001303/2005-93 permaneceu pendente de decisão por quase 02 anos, todavia foi julgado 34 dias depois de o mencionado servidor ser nomeado Delegado da Receita Federal em Araraquara;


l) à vista das normas reguladoras dos princípios gerais de direito, da moralidade e da impessoalidade administrativa (artigo 37 da CF e 2º da Lei nº 9.784/99) impõe-se acolher o argumento da apelante;


m) a Súmula nº 361 do S.T.F. tem regra no mesmo sentido em relação ao invocado impedimento;


n) consoante o inciso II do artigo 485 do CPC o decisum padece de nulidade absoluta, posto que se sujeita à presunção legal absoluta da ocorrência de vícios de parcialidade, conforme prevê a regra legal do artigo 18, inciso I, da Lei nº 9.784/99 e artigo 19, inciso I, da Portaria/MF nº 58/06 e não resta dúvida que violou os princípios da impessoalidade e moralidade administrativa.


A União, nas contrarrazões de fls. 524/544, refuta a arguição de nulidade da sentença e pleiteia o desprovimento do recurso.


É o relatório.


VOTO

Inicialmente, decreto o sigilo de documentos nos presentes autos.


Cuida-se de ação ordinária anulatória de ato administrativo.


Em suma, alega-se na exordial que o fisco, em vez de promover o devido processo administrativo-fiscal, como exige a legislação tributária e os princípios constitucionais da ampla defesa administrativa, encaminhou ofícios ao Ministério Público Federal instruídos com informações fiscais, bancárias e de cartões de crédito, as quais teriam sido utilizadas sem amparo em autorização judicial, para o fim de o Parquet apresentar pedido de ordem de busca e apreensão criminal. Sustenta-se que a nulidade dos atos administrativos consubstanciados nos Auto de Infração e Termo de Apreensão de Guarda Fiscal nº 0812200/00352/05 decorre dos vícios atinentes à ausência de descrição detalhada dos bens apreendidos, à decisão final proferida por agente impedido no processo administrativo e à remessa da Representação Fiscal Para Fins Penais nº 13851.001307/2005-71, autuada pelo Ministério Público Federal sob nº 1.34.017.000083/2007-07, em virtude de que somente poderia ser enviada após encerrado o processo administrativo fiscal.


DA NULIDADE DA SENTENÇA


A apelante aduz que o juízo a quo considerou um fato controvertido em suas razões de decidir e, de outro lado, não permitiu que a parte produzisse a respectiva prova em contrário, já que indeferiu as provas periciais e testemunhais, as quais demonstrariam os prejuízos causados pelos atos viciados, razão pela qual deve ser reconhecida a violação à ampla defesa e ao contraditório, sob pena de se negar vigência aos artigos 330, inciso I, e 331, § 2º, do CPC/1973, porquanto não teve oportunidade de comprovar a aquisição lícita das mercadorias mediante a produção das provas requeridas. Sustenta, ainda, que a matéria controvertida impediria o julgamento antecipado da lide e que o indeferimento e valoração probatória somente na sentença sem prévia fixação dos pontos controvertidos afigura-se ilegal. Não prosperam as arguições. O juiz a quo indeferiu motivadamente as provas requeridas (fls. 388/395) na decisão de fls. 401/402 e, à fl. 412, consignou a desnecessidade de dilação probatória, porquanto entendeu que se cuida de matéria de direito. Confiram-se os seguintes trechos:


Indefiro, em parte, a produção da prova testemunhal. O auditor fiscal Fábio Eduardo Boschi já foi ouvido nos autos da ação penal n. 0006266-78.2005. 403.6120 sobre os mesmos fatos que são objeto da prova requerida, em audiência que presidi, dispensando a repetição. Pondero a desnecessidade da reprodução tendo em vista a participação ativa do autor na aquisição desta prova, realizada em âmbito penal, muito menos restritiva que a esfera cível, já que contextualizada nos Princípios da Ampla Defesa e da Busca da Verdade Real e a preservação do contraditório, embora diferido, para a União, que poderá produzir contraprova e impugnar conteúdo e formalidades ulteriormente. A legitimidade da prova emprestada depende da efetividade do contraditório, que deverá ter a mesma eficácia do processo primitivo e se justifica para prevenir a repetição e permitir o aproveitamento de provas produzidas perante a jurisdição e, no caso concreto, restam indenes o contraditório e a ampla defesa. Assim, por questão de economia processual e racionalização da prática dos atos processuais, traslade-se o depoimento prestado na ação penal indicada para estes autos. Destaco, ainda, que estes fatos também se encontram demonstrados por documentos, o que torna despropositada a oitiva do auditor fiscal João Pires Martins. Neste sentido, somente a título de exemplo, verifica-se que foi iniciativa do auditor fiscal Fábio Eduardo Boschi a provocação do Ministério Público Federal para que se instaurasse procedimento investigatório para apuração de pretensa prática de descaminho/contrabando e sonegação fiscal (fls. 60/61, 75/76, 81/83). Posteriormente, participou da busca e apreensão, da lacração da empresa (fls. 113/114) e lavrou o auto de infração e o termo de apreensão e guarda das mercadorias encontradas (fls. 122/123). Finalmente, proferiu decisão no processo administrativo (fls. 207/213). O ponto controvertido sobre a ilegalidade ou não do julgamento do processo administrativo que culminou com a aplicação da pena de perdimento, decorrente do alegado impedimento do agente fazendário que participou da ação fiscal, é matéria de direito e não demanda prova. Indefiro o pedido de expedição de ofício à Receita Federal. Não há evidência de recusa administrativa em fornecer as informações indicadas a justificar a intervenção judicial. Indefiro, também a complementação ou renovação da prova pericial, reservando sua valoração para o momento em que será prolatada sentença. A prova técnica juntada foi relatada e encerrada com a conclusão dos técnicos que confeccionaram o laudo, não demandando os esclarecimentos indicados pelo autor às fls. 406/407, relacionados a questões de metodologia de trabalho e interpretação. No entanto, tendo em vista que a impugnação desta pode ser respaldada em documentos que confrontem a conclusão apresentada, faculto ao autor a juntada de outros documentos que julgue pertinentes a amparar a sua tese. Observo, ainda, que o autor ajuizou nova ação (autos n. 0007752-25.2010.403.6120), com pedido e causa de pedir conexos aos desta ação. Assim, tendo em vista a prejudicialidade entre estas demandas e a compatibilidade de fases, determino o apensamento destes autos aos da ação 0007752-25.2010.403.6120 para julgamento conjunto.. (401/402)

CHAMO O FEITO A ORDEM: Reconsidero a parte final da decisão de fl. 375 e a decisão de fl. 411/412 tendo em vista que as questões postas nos autos são matérias de direito que não demandam dilação probatória (art. 330, I, CPC). Assim, intimem-se as partes e tornem os autos conclusos para sentença. (fl. 412)

Conforme já consignado, entendeu-se que se cuida de matéria de direito que não demanda dilação probatória, o que, em princípio, não consubstancia cerceamento de defesa, já que o magistrado é o destinatário final da prova e pode repelir sua realização de maneira fundamentada, bem assim indeferir aquelas que considerar protelatórias, desnecessárias ou impertinentes, consoante firme jurisprudência pátria. Por outro lado, exsurge da fundamentação da sentença robusta incursão no acervo probatório, cujas conclusões podem ser infirmadas com o exame deste apelo. A declaração de nulidade de um ato tem que ser fundamentada na existência de prejuízo às partes, o que não ocorreu no presente pleito, eis que a recorrente não o demonstrou, porquanto sequer apresentou agravo de instrumento contra o decisum de fls. 401/402, de maneira que não há se falar em violação dos artigos 330, inciso I, e 331, § 2º, do CPC/1973. Nesse sentido: de acordo com a moderna ciência processual, que coloca em evidência o princípio da instrumentalidade e o da ausência de nulidade sem prejuízo (pas de nullité sans grief), antes de se anular todo o processo ou determinados atos, atrasando, muitas vezes em anos, a prestação jurisdicional, deve-se perquirir se a alegada nulidade causou efetivo prejuízo às partes (RESP 201100475006, NANCY ANDRIGHI, STJ - TERCEIRA TURMA, DJE DATA:10/04/2013 ..DTPB:.). Confira-se também: AC 200481000096181, Desembargador Federal Rubens de Mendonça Canuto, TRF5 - Segunda Turma, DJE - Data::16/06/2011 - Página::499.


Rejeitada a preliminar, passo ao exame das demais alegações invocadas no apelo.


Após análise do conjunto probatório, constata-se que não há ilegalidade em relação ao ato que ensejou o requerimento de mandado de busca e apreensão apresentado pelo Ministério Público Federal no procedimento cautelar criminal, o qual, aliás, foi deferido (fl. 112) e legitimou as medidas realizadas no âmbito daquele feito que resultaram na apreensão de mercadorias e documentos, cujo eventual vício deve ser dirimido naquela sede, de forma a evitar decisões conflitantes sobre o mesmo tema.


Por outro lado, destaque-se que no âmbito penal foram reconhecidos o fumus boni juris e o periculum in mora, de forma fundamentada, conforme ressaltado na decisão apelada, os quais autorizaram a deflagração da medida cautelar, de maneira que os elementos então colhidos e sua utilização para esclarecimento de eventuais ilícitos não constitui, em princípio, nenhum ilegalidade apta a inquinar de nulidade os eventuais procedimentos de apuração dela decorrentes.


Reporto-me, neste sentido, aos fundamentos expostos na r. sentença:


"Julgo antecipadamente o pedido nos termos do artigo 330, I, do Código de Processo Civil.
A autora vem a juízo pleitear a declaração de nulidade do auto de infração e da consequente pena de perdimento de bens argumentando que o ato é nulo porque os TAGF não descreveram adequadamente as mercadorias apreendidas e que a pena de perdimento foi aplicada por agente impedido.
Instrui a inicial com comprovante de inscrição e situação cadastral na Receita Federal onde consta como comerciante de equipamentos e suprimentos de informática (fl. 50), alteração contratual (fls. 51/55), peças dos autos do Proc. nº 2005.61.20.006198-6 (fls. 56/119) e do Proc. nº 13851.001303/2005-93 contendo, em especial, a impugnação administrativa (fls. 146/151), a relação de objetos pessoais adquiridos em viagens e comprovantes (fls. 154/164) a relação de equipamentos de clientes e declarações (fls. 165/168) relação de materiais novos e "amostra parcial/aleatória" das Notas Fiscais das Mercadorias (fls. 169/197) decisão no procedimento administrativo fiscal (fls. 207/213); laudo de exame contábil realizado em inquérito policial (fls. 236/240); ofício informando o valor do tributo sonegado (fl. 243); documentos referentes ao bloqueio dos cartões de crédito internacional de seu sócio Ricardo Martins Pereira (fls. 246/252); cópias dos Mandados de Procedimentos Fiscais e Termos de Início de Fiscalização (fls. 256/262); cópias dos termos lavrados na diligência de busca e apreensão (fls. 264/271); cópia da representação fiscal para fins penais (fls. 273/286).
Quanto à alegação de que a Receita Federal não poderia ter se utilizado de ação cautelar criminal como sucedâneo de procedimento fiscal, dispõe a Lei 10.593/01 que, dentre as atribuições do Auditor Fiscal da Receita Federal está a de executar procedimentos de fiscalização, praticando os atos definidos na legislação específica, inclusive os relacionados com o controle aduaneiro, apreensão de mercadorias, livros, documentos, materiais, equipamentos e assemelhados (art. 6º, I, c).
Ocorre que, vislumbrando a necessidade de realizar apreensão de mercadorias sobre as quais suspeita serem objeto de infração penal, dentro do sistema de garantias constitucionais, o Auditor não tinha outro caminho a seguir senão provocar as autoridades competentes para a realização da persecução penal.
Com efeito, preceitua o artigo 240, 1º, letra d, do Código de Processo Penal, que se procederá à busca domiciliar, na hipótese de, entre outras, haver fundadas razões a autorizarem a apreensão de instrumentos utilizados na prática de crime ou destinados a fim delituoso.
No caso, a medida foi requerida para apurar a prática de crime de descaminho (art. 334, CP) pela empresa autora, em virtude de supostamente ter importado ilegalmente equipamentos de informática.
Por outro lado, as fundadas razões exigíveis para a busca e apreensão com mandado judicial e o risco da demora foram reconhecidos na decisão que deferiu a medida, nos seguintes termos:
"1. (...)
2. É o relatório que basta. Aprecio o pedido.
3. Primeiro, considero que embora os autos do procedimento 2003.61.20.006933-2 tenham sido encaminhados à 2ª Vara Federal de São Paulo, especializada em crime de Lavagem de Dinheiro e de Colarinho Branco (Provimento 238/04, do Conselho da Justiça Federal da 3ª Região), tenho o caso em questão como diverso, uma vez que objetiva o presente à realização de busca e apreensão, ante a suspeita da prática do delito de contrabando ou de descaminho. Assim, em princípio, dou-me por competente para apreciar o pedido ora deduzido. É evidente que caso haja, "a posteriori", demonstração de liame entre eventual delito de contrabando ou descaminho com os crimes de competência da vara especializada, remeterei o feito à mesma.
Pois bem, verifico a presença dos requisitos necessários à concessão da Busca e Apreensão pleiteada.
Com efeito, há "fumus boni juris" no fato dos suspeitos (RICARDO PEREIRA MARTINS e LUCIANA PEREIRA MARTINS), proprietários da empresa SYSTECH LTDA, com sede em Taquaritinga/SP, nessa subseção federal, estarem a internar mercadorias no país ilicitamente. Como se pode ver pelas informações constantes de seu sítio na "internet" (fls. 81/117), a empresa diz comercializar vários equipamentos eletrônicos ("notebooks; televisores de plasma; monitores de microcomputador; projetores; impressoras, entre outros). E o faz mediante pagamento via depósito, sem comparecimento pessoal, com envio da mercadoria adquirida pelo correio (fls. 119/127).
Acontece, segundo informação da Delegacia da Receita Federal de Araraquara (fls. 34/36), que apesar dessa intensa atividade empresarial, não consta que a mesma tenha efetuado a importação de qualquer equipamento, segundo sistema SISCOMEX. Nesse diapasão, é de se notar que o suspeito RICARDO MARTINS PEREIRA, sócio-gerente da empresa por deter 90% do seu capital social, efetuou gastos em cartão de crédito internacional, nos anos-calendários de 2000 e 2002, no montante de US$ 676.797,28 - equivalente, hoje, a mais de um milhão e meio de reais (fls. 34/36).
Acresça-se a isso um outro dado importante, que contribui, sem dúvida alguma, para o aumento da suspeita: a de que a empresa dos suspeitos estava a comercializar produtos Semp-Toshiba sem a devida autorização da empresa (fls. 49). Segundo tal missiva, somente a própria Semp-Toshiba é que pode fabricar, distribuir e comercializar, com exclusividade, os produtos eletrônicos com a marca "Toshiba" no Brasil. Ou seja, se a empresa dos suspeitos não detinha tal autorização, donde viriam tais equipamentos (Semp-Toshiba) que disponibiliza(va) a seus clientes? É de lembrar, como já dito, que não há qualquer informação no sistema SISCOMEX de importação de produtos por parta da empresa SYSTECH (fls. 34/36).
Verificado o "fumus boni juris", é de se analisar a presença do "periculum in mora": dados os indícios mencionado, de provável internação ilícita de produtos no país, à guisa de essa suposta violação perdure, é de se procurar bem elucidar tal suspeita. Mesmo porque, a apuração fiscal a ser feita pela Receita Federal poderá alertar ou compelir a uma ocultação da prática de internação ilícita de mercadorias no país.
ISTO CONSIDERADO, em face das razões expendidas, presentes o "fumus boni juris" e o "periculum in mora", e com base nos arts. 240, alíneas "a", "e", "f" e "h" e 242, ambos do CPP, DETERMINO à Polícia Federal local que faça a BUSCA e APREENSÃO de eventuais mercadorias que estejam em depósito, de internação ilícita no país; além de documentos, objetos, pedidos, e relação de clientes, CDs e disquetes utilizados pela referida empresa, que tenham relação com a suposta prática delituosa, estejam eles situados na sede da SYSTECH, localizada na rua São José, 1126, centro, em Taquaritinga/SP, como na residência/local de trabalho dos suspeitos RICARDO MARTINS PEREIRA e LUCIANA MARTINS PEREIRA, sito na rua Emílio Menon, 101, Laranjeiras, também em Taquaritinga/SP. AUTORIZO, ainda, a Autoridade Policial a realização a apreensão dos microcomputadores utilizados pela empresa e/ou pelos suspeitos, nos referidos locais, salvo se houver outro meio obter as informações necessárias ao objeto investigado.
OUTROSSIM, fica ainda a Autoridade Policial Federal obrigada a observar os termos dos art. 247, 246 e 248 do CPP e demais dispositivos legais aplicáveis e, também, necessariamente, o art. 5º, inc. XI, da CF/88. FIXO o prazo de SETENTA E DUAS HORAS (72 h) para a duração deste mandado de Busca e Apreensão, a contar da retirada ou recebimento do mesmo pela Autoridade Policial, podendo, a pedido fundamentado, ser prorrogado. Cumprida a diligência, junte a digna Autoridade Policial Federal a estes autos o bastante termo circunstanciado de todo o teor da mesma, no prazo de cinco dias após o término do prazo fixado para a sua realização.
(...)".
Como se vê, a busca foi realizada com base em decisão judicial devidamente fundamentada, o que atente ao comando constitucional que ressalva o direito à intimidade que dispõe que:
XI - a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial;
E também ao comando constitucional que impõe o respeito aos direitos individuais do contribuinte:
Art. 145 (...).
1º - Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente para conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte.
O questionamento feito pela autora, porém, remete ao pedido de busca e apreensão que entende extrapolar as atribuições dos agentes da Receita Federal que, no seu entender, tinham o dever de notificá-la antes de proceder ao que denominou "devassa".
Pois bem.
Antes de tudo, é preciso ter claro que não se confunde a mero descumprimento de obrigações tributárias com a prática de delitos contra a ordem tributária ou o delito de descaminho.
Tais hipóteses jurídicas (ilícito tributário e o ilícito penal) têm elementos comuns, é certo, mas contém também pressupostos e conseqüências jurídicas distintas tendo em vista a ofensa diferentemente graduada do ordenamento jurídico.
Em outras palavras, ainda que haja quem considere que não existe diferença ontológica entre a infração administrativa e o crime (Luiz Flávio Gomes, Responsabilidade penal objetiva e culpabilidade nos crimes contra a ordem tributária apud Direito Penal Empresarial Editora Dialética, 1995), o regime jurídico aplicável ao mero descumprimento de obrigações tributárias não é exatamente o mesmo do aplicável às supostas infrações penais ainda pendentes de decisão condenatória transitada em julgado.
Tanto é que Luiz Flávio Gomes apresenta tese de que, por serem hipóteses ontologicamente iguais, as garantias do Direito Penal devem valer para as infrações administrativas (opus cit. p. 95).
O que pretende a autora, porém, não é a aplicação das garantias do Direito Penal aos atos administrativos praticados pelos agentes do fisco, mas o contrário.
Argumenta, então, que a ciência prévia do procedimento fiscal (ampla defesa) a que o contribuinte tem direito antes do lançamento do tributo, deva ser aplicada à persecução criminal.
De fato, mesmo na seara do processo penal, no que diz respeito ao direito de vista do inquérito, nos termos da Súmula Vinculante nª 14, do Supremo Tribunal Federal, é direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo aos elementos de prova que, já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com competência de polícia judiciária, digam respeito ao exercício do direito de defesa (Sessão Plenária de 02/02/2009).
Também o Supremo Tribunal Federal já havia decidido que o indiciado tem direito de obter "informações já introduzidas nos autos do inquérito, não as relativas à decretação e às vicissitudes da execução de diligências em curso (cf. L. 9296, atinente às interceptações telefônicas, de possível extensão a outras diligências); dispõe, em consequência a autoridade policial de meios legítimos para obviar inconvenientes que o conhecimento pelo indiciado e seu defensor dos autos do inquérito policial possa acarretar à eficácia do procedimento investigatório. (5.) Habeas corpus deferido para que os advogados constituídos pelo paciente se faculte a consulta aos autos do inquérito policial, antes da data designada para a sua inquirição." (HC 82.354/PR, Min. Sepúlveda Pertence, 10/08/2004).
O próprio julgado, porém, deixa claro que a autoridade policial dispõe (e portanto pode dispor) de meios legítimos para obviar inconvenientes que o conhecimento pelo indiciado dos autos do inquérito policial possa acarretar à eficácia do procedimento investigatório.
Logo, se, de ordinário, não há lugar para ciência prévia de procedimento investigatório criminal (art. 20, CPP), ainda que as garantias do Direito Penal devam valer para as infrações administrativo-tributárias, a recíproca não é verdadeira de forma (como pretende a autora) a impedir que o fisco provoque as autoridades policiais sem antes dar ciência disso ao contribuinte.
Acontece que, se de um lado o Código Tributário Nacional autoriza as autoridades administrativas federais a requisitar o auxílio da força pública, e reciprocamente, quando vítimas de embaraço ou desacato no exercício de suas funções, ou quando necessário à efetivação dê medida prevista na legislação tributária, ainda que não se configure fato definido em lei como crime ou contravenção (art. 200), de outro, o Código de Processo Penal diz que qualquer pessoa do povo que tiver conhecimento da existência de infração penal em que caiba ação pública poderá, verbalmente ou por escrito, comunicá-la à autoridade policial (art. 5º, 3º).
E a autoridade policial, por sua vez, deve tomar providências tão logo tenha conhecimento da prática da infração penal (art. 6º, CPP), sob pena de incorrer em prevaricação (art. 319, CP).
Sob o aspecto tributário, cabe observar que o artigo 7º, do Decreto 70.235/73 diz que o procedimento fiscal tem início:
I - o primeiro ato de ofício, escrito, praticado por servidor competente, cientificado o sujeito passivo da obrigação tributária ou seu preposto;
II - a apreensão de mercadorias, documentos ou livros;
III - o começo de despacho aduaneiro de mercadoria importada.
Veja-se que tal dispositivo tem por finalidade definir o momento a partir de quando fica afastada a espontaneidade do contribuinte em regularizar suas atividades, como expressamente conta do 1º desse artigo 7º ( 1 O início do procedimento exclui a espontaneidade do sujeito passivo em relação aos atos anteriores e, independentemente de intimação a dos demais envolvidos nas infrações verificadas.), assim como no CTN (Art. 138. A responsabilidade é excluída pela denúncia espontânea da infração, acompanhada, se for o caso, do pagamento do tributo devido e dos juros de mora, ou do depósito da importância arbitrada pela autoridade administrativa, quando o montante do tributo dependa de apuração. Parágrafo único. Não se considera espontânea a denúncia apresentada após o início de qualquer procedimento administrativo ou medida de fiscalização, relacionados com a infração.)
Portanto, o fisco tem a discricionariedade para iniciar o procedimento fiscal (1) notificando o contribuinte OU (2) com a apreensão de mercadores OU (3) com o despacho aduaneiro, conforme a situação verificada.
Em outras palavras, realmente é possível o início do procedimento pela apreensão de mercadorias especialmente, em se suspeitando de possível infração penal, se observadas as garantias da lei processual penal.
No que diz respeito à forma genérica como foi elaborado o Termo de Apreensão prejudicial a si e da não aceitação da documentação que apresentou por não conter o número de série dos produtos há que se observar o seguinte:
"A ilegalidade da busca, com ofensa a preceitos de ordem constitucional ou com violação ao direito assegurado ao defensor do acusado, torna ilícita a prova obtida, seja esta resultante da apreensão da coisa procurada ou de outra que eventualmente tenha sido encontrada. Não se cuida aqui de nulidade, mas de impossibilidade de a sentença se sustentar na prova obtida por meios ilícitos, porque, segundo a Constituição Federal, não pode ser ela admitida no processo (art. 5º, LVI).
Quanto às irregularidades advindas da inobservância de regras processuais, tais como as omissões na elaboração do mandado ou a falta de sua leitura, influirão na maior ou menor confiabilidade da prova colhida na diligência, mas não a tornarão inválida." (Grinover, Scarance e Magalhães Gomes, op.cit., pp. 170/171).
Assim, somente há nulidade no caso de ofensa a preceito constitucional.
Pois bem.
Consoante já referido na apreciação da antecipação da tutela, a Instrução Normativa 370/2003 da Secretaria da Receita Federal dispõe que:
Art. 2º Nas operações de vigilância e repressão aduaneiras, quando houver apreensão de mercadorias diferentes, classificadas no mesmo código da tabela referida no art. 1º, e cujo valor, por quilograma, for inferior a R$ 50,00 (cinqüenta reais), a descrição detalhada de cada item poderá ser dispensada na lavratura do correspondente Auto de Infração.
§ 1º Na hipótese deste artigo, as mercadorias apreendidas serão acondicionadas e lacradas em volumes específicos, a descrição no Auto de Infração será a correspondente designação do código da tabela CSM, e a valoração será estabelecida com base no peso bruto total por quilograma.
§ 2º O disposto neste artigo não impede que a unidade da SRF responsável pela guarda das mercadorias, após a apreensão, efetue as correspondentes descrições detalhadas ou adote as Regras Especiais de Classificação do Capítulo 46 da CSM, com a finalidade de facilitar o gerenciamento dos estoques de mercadorias apreendidas.
Como se pode ver, embora o caput do dispositivo dê a entender que a descrição detalhada de cada item só seja dispensada nas hipóteses em que indica, o parágrafo segundo deixa claro que é possível que a descrição detalhada seja efetuada após a apreensão.
No caso, observo que o Termo de Apreensão e Guarda Fiscal 99/2005, detalha os bens apreendidos em 72 itens (fls. 227/229).
Assim, conquanto que alguns desses itens contenham a expressão "diversos" (por exemplo: 04 "Placa de rede diversas" ou 20 "cabos diversos"), isso não enseja nulidade da ato administrativo.
Acontece que o argumento de que foi tal generalização que impediu que o laudo de exame contábil pudesse considerar regular a importação quando diz que "No TAGF não existem especificações detalhadas dos produtos impossibilitando a precisa confrontação com as Notas Fiscais" (fl. 239) tem por escopo transferir à autoridade fiscal o ônus de demonstrar tal regularidade.
Aliás, as próprias notas fiscais apresentadas na defesa administrativa não indicam a procedência das mercadorias, sendo que todas as mercadorias apreendidas são estrangeiras (fl. 240).
De outra parte, note-se que a ação penal (Proc. 0006266-78.2005.403.6120) só teve início em 11/09/2008 (protocolo da denúncia recebida em 26/09/2008), ou seja, três anos depois da busca e apreensão (01/09/2005) de forma que nesse ínterim a autora teve oportunidade para comprovar a regularidade das importações.
Há que se convir que tal procedimento é muito simples: eram 10 mercadorias importadas, bastava apresentar os dez comprovantes da importação regular. Eram 100 mercadorias, que se apresentassem os 100 comprovantes.
Sem prejuízo da análise a ser feita no âmbito criminal, sob o aspecto administrativo não há que se falar em dificuldade (prejudicial à defesa) de demonstrar a regularidade das mercadorias, pois ainda que não tenham sido indicados todos os detalhes dos produtos, a quantidade destes foi consignada, como segue na tabela abaixo (exemplificativa) contendo itens discriminados no TAGF de fl. 228/229:
(...)
Logo, a documentação comprobatória da regularidade das mercadorias deveria incluir 14 Notebooks marca SONY VAIO, 20 cabos, 18 coolers, 09 teclados, 09 monitores de Notebook e assim por diante.
Vale observar que o fato de o laudo pericial realizado pelo Departamento da Polícia Federal ter sido feito de forma indireta significa dizer que os peritos não compararam as mercadorias indicadas nas notas ficais apresentadas pela autora com as próprias mercadorias, mas com o rol indicado no TAGF ("Os exames consistiram na análise das cópias dos documentos contidos no Apenso III, apresentados pelo investigado e descritos no item "II - Documentos Examinados" acima, bem como confrontação destes com as mercadorias apreendidas pela Receita Federal do Brasil, unidade de Araraquara, constantes no "Auto de Infração e Termo de Apreensão e Guarda Fiscal nº 0812200/00352/05" - fl. 237).
A conclusão do laudo, ademais, não decorre somente da parte grifada pela autora ("No TAGF não existem especificações detalhadas dos produtos impossibilitando a precisa confrontação com as Notas Fiscais"), mas nisso e nas duas premissas seguintes, ou seja, de que "o Relatório de Materiais Novos menciona Notas Fiscais, cujas cópias não foram encaminhadas para exame (...)" e que "pelo confornto de Materiais Novos com as Notas Fiscais e com o TAGF, verificou-se que o Relatório de Materiais Novos não apresenta (parcial ou totalmente) as mercadorias relacionadas no TAGF (...)" (fl. 239).
Então, questionados os peritos sobre se "observando-se a quantidade dos bens descritos nas notas fiscais há perfeita sintonia com o montante dos produtos apreendidos (por exemplo, existem notais fiscais que representam a compra de 14 NOTEBOOK SONY VAYO?" respondem conclusivamente que "não foi verificada perfeita sintonia entre as Notas Fiscais apresentadas e as mercadorias apreendidas (...)" (fls. 236 e 240).
Ademais, observo que situação não se equipara à de ausência de descrição minuciosa de fatos que invalidou lançamento tributário por cerceamento de defesa já que, repito, a questão aqui é de não-comprovação de regularidade das mercadorias apreendidas.
Resumindo, não se pode dizer que o Auto de Infração lavrado seja totalmente genérico já que indica qualitativa e quantitativamente as mercadorias apreendidas e a forma como lavrado não foi o fator prejudicial à comprovação da regularidade da mercadoria.
Logo, os TAGF são válidos assim como o Auto de Infração.
No tocante à impossibilidade de ser dada voz de prisão já que tinha prazo de 24 horas para apresentar documentos e 20 dias para impugnar o Termo de Apreensão e o Auto de Infração, passados seis anos da prisão, trata-se de questão superada e, ainda que fosse ilegal a prisão (o que não foi reconhecido pelo juízo na ocasião já que não houve relaxamento do flagrante) não invalidaria o ato administrativo fiscal de apreensão de mercadoria.
Por fim, quanto ao argumento de impedimento do Auditor Fiscal Fábio Boschi, como já referido na decisão de antecipação da tutela, a Portaria do Ministério da Fazenda nº 258/2001, que disciplina a constituição das turmas e o funcionamento das Delegacias da Receita Federal de Julgamento, dispõe:
Art. 19. Os julgadores estão impedidos de participar do julgamento de processos em que tenham:
I - participado da ação fiscal;
II - cônjuge ou parentes, consangüíneos ou afins, até o terceiro grau, inclusive, interessados no litígio.
Nesse passo, cabe retificar o que disse naquela decisão quanto à Lei 9.784/99 já que não tem disposição "no mesmo sentido", mas de conteúdo diferente. Diz a Lei:
Art. 18. É impedido de atuar em processo administrativo o servidor ou autoridade que:
I - tenha interesse direto ou indireto na matéria;
II - tenha participado ou venha a participar como perito, testemunha ou representante, ou se tais situações ocorrem quanto ao cônjuge, companheiro ou parente e afins até o terceiro grau;
Como se pode ver, enquanto a Portaria MF declara impedido quem quer que tenha participado da ação fiscal, a Lei do processo administrativo declara impedidos somente os peritos, as testemunhas ou representantes, o cônjuge/companheiro e parentes e afins até o terceiro grau.
Por outro lado, corrijo o que disse naquela decisão eis que o impedimento de que trata a Portaria do Ministério da Fazenda nº 258/2001 refere-se ao julgamento de recurso administrativo (à segunda instância) e não às impugnações administrativas (decididas na primeira instância).
A decisão proferida pelo Delegado Fábio, portanto, como constou expressamente da mesma, tem por fundamento a atribuição que lhe confere a Portaria MF nº 95/2007, que diz:
Art. 238. Aos Delegados da Receita Federal do Brasil e Inspetores-Chefes da Receita Federal do Brasil incumbe, no âmbito da respectiva jurisdição, as atividades relacionadas com a gerência e a modernização da administração tributária e aduaneira e, especificamente:
IV - aplicar pena de perdimento de mercadorias e valores;
De resto, há que se convir que ajuizar demanda em setembro de 2010 e pedir a suspensão dos efeitos de decisão aplicando pena de perdimento proferida em junho de 2007, pedir que a autoridade se abstenha (três anos depois) de leiloar, alienar ou de outra forma destinar a mercadoria, se não trata de pretensão prescrita, é certamente inócua (o que talvez comportasse o reconhecimento da carência de ação).
Isso porque, se não houve recurso administrativo da decisão que aplicou a pena de perdimento em junho de 2007 (e o Mandado de Segurança impetrado mais de cento e vinte dias depois da mesma, por isso, foi negado com base na decadência), é evidente que o fisco não tem o dever de esperar o prazo prescricional (para reconhecimento de eventual nulidade dos próprios atos) para poder cumprir sua própria decisão, no caso, destinando as mercadorias perdidas pela autora.
Mormente em se tratando de equipamentos de informática que a essa altura têm seu valor (econômico e útil) completamente reduzido.
Por tais razões, o pedido não merece acolhimento." (fls. 419/424 vº)

A r. sentença deve ser mantida.


À vista da especificidade das circunstâncias atinentes ao caso dos autos, esclareça-se que, após ter recebido notícia sobre possíveis operações comerciais ilegais efetuadas pela empresa, ora apelante, e efetuado levantamentos preliminares que consubstanciaram possíveis indícios de crimes de descaminho e sonegação fiscal, a Delegacia da Receita Federal em Araraquara encaminhou o ofício nº 064/2004, datado de 16/09/2004, para solicitar ao Ministério Público Federal, caso o órgão entendesse pertinente, que se empreendessem as ações que julgasse necessárias, notadamente a realização de diligências policiais com vistas à descoberta de possível depósito de mercadorias estrangeiras introduzidas irregularmente no País, bem como autorizações judiciais para busca e apreensão (fls. 60/61). Note-se que o fisco recebeu informações da empresa SEMP TOSHIBA acerca de comercialização de equipamentos de sua marca sem autorização e com características de fabricação fora do território nacional (fl. 63).


Não obstante sua incompetência para deflagrar eventual apuração repressiva, tipicamente policial, o que se extrai dos autos é que optou por encaminhar as informações em questão ao Parquet para que empreendesse o que julgasse pertinente, conforme se infere do ofício já mencionado (64/2004), bem como os de nº 66/2004, de 22/09/2004 (fls. 75/76) e 133/2005, de 24/08/2005 (fls. 79/83). Destaque-se que o órgão da fazenda não tomou iniciativa de requerer judicialmente a apreensão cautelar, a qual, frise-se, não se confunde com a medida prevista no artigo 83 da Lei 9.430/96 que versa sobre a representação fiscal para fins penais relativa aos crimes contra a ordem tributária previstos nos artigos 1º e 2º da Lei no 8.137/90. Conforme explicitou o juízo a quo, somente em 11/09/2008 teve início a ação penal, ou seja, três anos depois da busca e apreensão (01/09/2005) e após o trâmite do respectivo processo administrativo instaurado, conforme se infere dos documentos de fls. 207/214. Assim, incialmente, a fazenda cingiu-se a fornecer elementos que detinha ao Ministério Público Federal e solicitar que este tomasse as medidas que reputasse necessárias. Tal ato não se revela, a meu juízo, ilegal e com aptidão de inquinar de nulidade todos os demais que se seguiram, já que, conforme bem explicitou a sentença recorrida, se de um lado o Código Tributário Nacional autoriza as autoridades administrativas federais a requisitar o auxílio da força pública, e reciprocamente, quando vítimas de embaraço ou desacato no exercício de suas funções, ou quando necessário à efetivação de medida prevista na legislação tributária, ainda que não se configure fato definido em lei como crime ou contravenção, de outro, o Código de Processo Penal diz que qualquer pessoa do povo que tiver conhecimento da existência de infração penal em que caiba ação pública poderá, verbalmente ou por escrito, comunicá-la à autoridade policial.


A apelante invoca eventual prejuízo decorrente da discriminação das mercadorias no Termo de Apreensão e Guarda Fiscal e no correspondente auto de infração, à vista de que não se observaram as normas pertinentes, especialmente o artigo 2º da Instrução Normativa nº 370/2003, o qual exigiria descrição detalhada. Ao contrário do que sustenta, tal circunstância não consubstanciou prejuízo em relação ao exame pericial realizado nem foi determinante para a conclusão dos peritos, porquanto ainda que o laudo contábil tenha explicitado a ausência de especificação minuciosa dos produtos no TAGF a impossibilitar precisa confrontação com as notas fiscais, outros elementos afastam qualquer assertiva no sentido de que os documentos comprovariam a regular obtenção das mercadorias no mercado interno, já que não propiciam a aferição de origem ou procedência das mercadorias apreendidas nem as individualiza por número de série, ao passo que o TAGF discrimina como estrangeiras todas as que puderam ter sua origem determinada, in verbis:


Ao 4º - As Notas Fiscais apresentam descrição dos produtos, algumas contêm códigos dos produtos, mas não há menção a números de série (vide subitens 2 e 3 do item "IV-Exames").
(...)
Ao 6º - Pela análise das Notas Fiscais constantes do Apenso III não é possível a aferição de origem ou procedência das mercadorias apreendidas. Entretanto, no TAGF elaborado pela Receita Federal do Brasil, todas as mercadorias que puderam ter sua origem determinada são estrangeiras (Japão, Taiwan, China, Filipinas, Cingapura, Indonésia, Finlândia, República da Coréia, Malásia e Índia). (fl. 240)

Conforme preceitua o artigo 339, inciso IV, letra b, do Decreto nº 4.544/2002, então vigente, a descrição dos produtos, compreende nome, marca, tipo, modelo, série, espécie, qualidade e demais elementos que permitam sua perfeita identificação, in verbis:


"Art. 339. A Nota Fiscal, nos quadros e campos próprios, observada a disposição gráfica dos modelos 1 ou 1-A, conterá:
(...)
IV - no quadro "Dados do Produto":
(...)
b) a descrição dos produtos, compreendendo: nome, marca, tipo, modelo, série, espécie, qualidade e demais elementos que permitam sua perfeita identificação;"

Afigura-se escorreito o argumento explicitado na fundamentação da decisão administrativa (fl. 212), no sentido de que a perfeita individualização das mercadorias se faz necessária, sob pena de se permitir que com uma simples nota fiscal que descreva somente o produto, modelo, qualidade e quantidade, seja apto a regularizar todo um estoque de um determinado estabelecimento comercial, razão pela qual se afasta o argumento de que os documentos apresentados comprovariam aquisição no mercado interno.


Assim, são inaptos os documentos apresentados para o fim de comprovar a regularidade da aquisição da mercadoria. Confira-se julgado esta E. Turma:


ADMINISTRATIVO E TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE AQUISIÇÃO DE MERCADORIA REGULARMENTE IMPORTADA. PENA DE PERDIMENTO. CABIMENTO. 1. Aduziu que em 18/10/2007 foi visitada por equipe da Receita Federal para fiscalização e quando requisitada documentação correspondente aos bens mantidos em seu estoque, teria apresentado as notas fiscais de compra emitidas pela empresa João Paulo Martins Informática EPP, seu fornecedor interno, ressaltando ser adquirente de boa-fé. 2. Foram apreendidos: 4 projetores Sony VPL ES4, 2 projetores Epson EMP S5 e 1vprojetor Epson EMP S3 (fl. 19). Pugnou a nulidade do auto de infração nº 0815500/01503/2007 que culminou em pena de perdimento dos bens. 3. De acordo com documentação apresentada não há nos autos prova inequívoca de que os bens apreendidos são os mesmos que constam das notas fiscais apresentadas pelo apelante. 4. Verifica-se que as notas fiscais não apresentam números de série dos equipamentos, nem qualquer prova da real aquisição e pagamento dos bens. A documentação apresentada não comprova a regular introdução dos produtos no território nacional, não indicando o importador dos bens. 5. Ainda de acordo com a cópia do relatório fiscal elaborado pela Delegacia da Receita Federal de Maringá (fls. 72/76) no endereço em que suspostamente funcionaria a empresa João Paulo Martins Informática Ltda.(emissora das referidas notas fiscais apresentadas pelo apelante) funciona um escritório de contabilidade, sendo lá informados que o proprietário da empresa importadora Sr. João Paulo Martins estaria no Paraguai realizando aquisição de mercadorias para posterior revenda. 6. Constatou-se, ainda, que o suposto fornecedor do impetrante não consta do sistema SISCOMEX, assim, não restou comprovada a regular introdução das mercadorias no território nacional. 7. Correto o procedimento do Fisco, com atuação estrita nos limites legais do exercício de suas funções e atribuições, uma vez que a situação fática enquadra-se na hipótese legal prevista como passível da pena de perdimento, sem qualquer ilegalidade ou inconstitucionalidade nessa sanção, já que os direitos fundamentais, onde se inclui o direito de propriedade, não são absolutos, podendo ser restringidos pelo legislador. 8. Apelo desprovido. Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por maioria, negar provimento à apelação, nos termos do voto do Desembargador Federal Marcelo Saraiva (Relator), com quem votaram a Des. Fed. Mônica Nobre e, na forma dos artigos 53 e 260, §1.º do RITRF3, o Des. Fed. Johonsom Di Salvo e a Juíza Fed. Conv. Giselle França. Vencido o Des. Fed. André Nabarrete, que dava provimento ao apelo para conceder a segurança pleiteada. (Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 323792 0003800-69.2008.4.03.6100, DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO SARAIVA, TRF3 - QUARTA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:06/11/2017 ..FONTE_REPUBLICACAO:.grifei)

Andou bem a sentença ao consignar que o Termo de Apreensão e Guarda Fiscal 99/2005 detalha os bens apreendidos em 72 itens (fls. 227/229). Ainda que alguns desses itens contenham a expressão "diversos" (por exemplo: 04 "Placa de rede diversas" ou 20 "cabos diversos"), bem assim de que tal circunstância não enseja nulidade da ato administrativo, tampouco prospera o argumento de que tal generalização impediu que o laudo de exame contábil pudesse considerar regular a importação, o qual objetiva transferir à autoridade fiscal o ônus de demonstrar tal regularidade.

Destaquem-se, ainda as assertivas do juízo a quo de que a conclusão do laudo não decorre somente da parte grifada pela autora ("No TAGF não existem especificações detalhadas dos produtos impossibilitando a precisa confrontação com as Notas Fiscais"), mas nisso e nas duas premissas seguintes, ou seja, de que "o Relatório de Materiais Novos menciona Notas Fiscais, cujas cópias não foram encaminhadas para exame (...)" e que "pelo confornto de Materiais Novos com as Notas Fiscais e com o TAGF, verificou-se que o Relatório de Materiais Novos não apresenta (parcial ou totalmente) as mercadorias relacionadas no TAGF (...)" (fl. 239).


Asseverou também que, questionados os peritos sobre se "observando-se a quantidade dos bens descritos nas notas fiscais há perfeita sintonia com o montante dos produtos apreendidos (por exemplo, existem notais fiscais que representam a compra de 14 NOTEBOOK SONY VAYO?" respondem conclusivamente que "não foi verificada perfeita sintonia entre as Notas Fiscais apresentadas e as mercadorias apreendidas (...)".


Sem razão para discrepar da conclusão de que a situação não se equipara à de ausência de descrição minuciosa de fatos que invalidou lançamento tributário por cerceamento de defesa, bem assim de que não se pode dizer que o Auto de Infração lavrado seja totalmente genérico já que indica qualitativa e quantitativamente as mercadorias apreendidas e a forma como lavrado não se revelou fator prejudicial à comprovação da regularidade da mercadoria (fls. 122/132). Ademais, o argumento de que dificultaria a localização dos respectivos documentos comprobatórios da regularidade por falta de discriminação detalhada dos itens apreendidos e, por conseguinte, obstar a amplitude do direito de defesa e contraditório, não se sustenta, porquanto não se afigura verossímil que não tivesse controle de seu estoque. O TAGF de fls. 139/141 enumera os itens por marca, origem e quantidade, de maneira que não havia dificuldade em o proprietário ter apresentado os respectivos documentos comprobatórios da aludida aquisição no mercado interno ou da regular importação. Consoante consignou a decisão recorrida, cuida-se de procedimento bem simples: eram 10 mercadorias importadas, bastava apresentar os dez comprovantes da importação regular. Eram 100 mercadorias, que se apresentassem os 100 comprovantes, de modo que a documentação comprobatória da regularidade das mercadorias deveria corresponder aos bens enumerados.


Igualmente não é de ser acolhido o argumento de que padece de nulidade a decisão exarada no PAF nº 13851.001303/2005-93, em razão de invocado impedimento do agente que a proferiu. O E. S.T.J. já se posicionou no sentido de que não configura o impedimento previsto no artigo 18 da Lei nº 9.784/1999 quando a atuação de quem se tem por impedido decorre do estrito cumprimento de um dever legal e não evidencia qualquer interesse direto ou indireto no deslinde da matéria, in verbis:


EMEN: ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. DEMISSÃO. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. NULIDADES. NÃO OCORRÊNCIA. 1. No exame de recurso especial, não se conhece de matéria que não foi objeto de apreciação pelo Tribunal de origem, inexistente, assim, o necessário prequestionamento. 2. A jurisprudência desta Corte é firme no sentido de que a portaria inaugural do procedimento administrativo prescinde da descrição detalhada de fatos, da acusação imputada e da menção aos dispositivos legais considerados violados. 3. Assentando-se o acórdão recorrido em mais de um fundamento, suficiente, por si só, para manter a decisão, inviável o conhecimento do recurso se a parte deixar de infirmar um deles. (Súmula nº 283/STF) 4. A ultrapassagem do prazo para a conclusão do processo administrativo disciplinar não caracteriza nulidade capaz de invalidar o procedimento, principalmente porque não demonstrado o prejuízo. Precedentes. 5. "O art. 168 da Lei nº 8.112/1990 exige motivação para a aplicação da penalidade disciplinar a servidor público. Se a autoridade julgadora acolhe o relatório da comissão processante, devidamente fundamentado, encontra-se preenchida a exigência legal" (MS nº 10.470/DF). 6. Não configura o impedimento previsto no artigo 18 da Lei nº 9.784/1999 quando a atuação de quem se tem por impedido decorre do estrito cumprimento de um dever legal e não evidencia qualquer interesse direto ou indireto no deslinde da matéria. 7. Recurso especial a que se nega provimento. ..EMEN:Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, negar provimento ao recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. A Sra. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, o Sr. Ministro Og Fernandes, a Sra. Ministra Jane Silva (Desembargadora convocada do TJ/MG) e o Sr. Ministro Nilson Naves votaram com o Sr. Ministro Relator. Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Nilson Naves. (RESP - RECURSO ESPECIAL - 585156 2003.01.58109-3, PAULO GALLOTTI, STJ - SEXTA TURMA, DJE DATA:24/11/2008 ..DTPB:.)

Também afasta a circunstância em razão de o agente ter participado de procedimento anterior. Confira-se:

..EMEN: ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. PAD. DEMISSÃO. ALEGAÇÃO DE NULIDADE DO PAD NÃO EVIDENCIADAS. RAZOABILIDADE DA PENA. AUSÊNCIA DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO. PARECER DO MPF PELA DENEGAÇÃO DA ORDEM. ORDEM DENEGADA. 1. O simples fato de um membro designado para a Comissão Processante ter participado de um procedimento anterior não implica a sua suspeição ou impedimento, à luz do art. 18 da Lei n. 9.784/1999. Suposições não são suficientes para o acolhimento da alegação de suspeição. 2. Ao contrário do alegado, a conduta faltosa foi descrita no Termo de Indiciamento de forma detalhada, com a indicação das respectivas provas, a tipificação das infrações disciplinares e a formulação do indiciamento, de modo a viabilizar a defesa dos acusados. 3. Conforme orientação jurisprudencial do STJ, "considerando que não se faz necessária a presença de advogado no processo administrativo disciplinar, bem como que o servidor foi intimado da oitiva das testemunhas, não há falar em nulidade pela falta de intimação do defensor constituído para a oitiva de testemunhas" (MS n. 13.955/DF, relatora Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, DJe 1°/8/2011). 4. Não merece prosperar a alegação de nulidade em razão de a intimação dos impetrantes para a oitiva de 4 testemunhas (de um total de 25) não ter sido efetuada com antecedência mínima de três dias úteis, nos termos do art. 26, § 2º, da Lei n. 9.784/1999, por conta dos seguintes motivos: a) a intimação se deu com dois dias de antecedência; b) as declarações das testemunhas ouvidas naquela data não constaram das razões do relatório final da comissão nem do parecer final da Consultoria Jurídica do Ministério da Saúde acolhido pela decisão de demissão; c) mesmo intimados com antecedência mínima de três dias da data da audiência para oitiva das demais testemunhas, a elas não compareceram; d) os impetrantes não demonstraram a ocorrência de efetivo prejuízo à defesa, à luz do princípio pas de nullité sans grief. 5. O material probatório colhido no decorrer do processo administrativo disciplinar (oitiva de 25 testemunhas, diligências in loco, perícias, apreciação dos quesitos e da defesa escrita dos impetrantes) e a motivação das razões da punição autorizam a aplicação da sanção de demissão, sendo certo que o procedimento punitivo aparenta regularidade procedimental. Além disso, não se evidencia desproporcional ou despida de razoabilidade a punição aplicada, já que a conduta praticada (sucateamento de viaturas da FUNASA e desvio de combustível) enquadra-se nas hipóteses puníveis com demissão. 6. Segundo o princípio pas de nullité sans grief, a nulidade do processo administrativo disciplinar somente pode ser declarada quando houver efetiva demonstração de prejuízo à defesa do servidor acusado, o que, contudo, não se configura na hipótese dos autos. 7. Ordem denegada, em consonância com o parecer ministerial. ..EMEN:Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, denegar a ordem nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Joel Ilan Paciornik, Felix Fischer, Laurita Vaz, Jorge Mussi, Nefi Cordeiro, Reynaldo Soares da Fonseca e Ribeiro Dantas votaram com o Sr. Ministro Relator. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Sebastião Reis Júnior. Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Rogerio Schietti Cruz. (MS - MANDADO DE SEGURANÇA - 10239 2004.01.80172-1, ANTONIO SALDANHA PALHEIRO, STJ - TERCEIRA SEÇÃO, DJE DATA:23/11/2018 ..DTPB:.)

Assim, afigura-se irretocável a sentença, a qual refutou a alegação da autora no seguinte ponto:


Por fim, quanto ao argumento de impedimento do Auditor Fiscal Fábio Boschi, como já referido na decisão de antecipação da tutela, a Portaria do Ministério da Fazenda nº 258/2001, que disciplina a constituição das turmas e o funcionamento das Delegacias da Receita Federal de Julgamento, dispõe:

Art. 19. Os julgadores estão impedidos de participar do julgamento de processos em que tenham:
I - participado da ação fiscal;
II - cônjuge ou parentes, consangüíneos ou afins, até o terceiro grau, inclusive, interessados no litígio.
Nesse passo, cabe retificar o que disse naquela decisão quanto à Lei 9.784/99 já que não tem disposição "no mesmo sentido", mas de conteúdo diferente. Diz a Lei:
Art. 18. É impedido de atuar em processo administrativo o servidor ou autoridade que:
I - tenha interesse direto ou indireto na matéria;
II - tenha participado ou venha a participar como perito, testemunha ou representante, ou se tais situações ocorrem quanto ao cônjuge, companheiro ou parente e afins até o terceiro grau;
Como se pode ver, enquanto a Portaria MF declara impedido quem quer que tenha participado da ação fiscal, a Lei do processo administrativo declara impedidos somente os peritos, as testemunhas ou representantes, o cônjuge/companheiro e parentes e afins até o terceiro grau.
Por outro lado, corrijo o que disse naquela decisão eis que o impedimento de que trata a Portaria do Ministério da Fazenda nº 258/2001 refere-se ao julgamento de recurso administrativo (à segunda instância) e não às impugnações administrativas (decididas na primeira instância).
A decisão proferida pelo Delegado Fábio, portanto, como constou expressamente da mesma, tem por fundamento a atribuição que lhe confere a Portaria MF nº 95/2007, que diz:
Art. 238. Aos Delegados da Receita Federal do Brasil e Inspetores-Chefes da Receita Federal do Brasil incumbe, no âmbito da respectiva jurisdição, as atividades relacionadas com a gerência e a modernização da administração tributária e aduaneira e, especificamente:
IV - aplicar pena de perdimento de mercadorias e valores; (fl. 424)

Não se constata, portanto, os aludidos vícios atinentes à invocada parcialidade do agente, bem assim existência de interesse direto ou indireto dele para a decretação da pena de perdimento sobre as mercadorias objeto do APF nº 13851.001303/2005-93 para o fim de justificar seus atos, já que agiu em comprimento de um dever legal, razão pela qual também não há que se falar em violação dos princípios da impessoalidade e moralidade administrativa.


Considerado o todo consignado - elementos probatórios dos autos apontados, legislação norteadora do tema e correlata doutrina, verifica-se comprovada a atuação legítima da Receita Federal, de maneira que os argumentos alusivos à exegese proposta pela recorrente, relativamente aos artigos 65 da Lei nº 10.833/03, 3º e 142, § único, do CTN, 6º, inciso I, letra "c", da lei nº 10.593/02, 37 e 145, § 1º, da Constituição Federal, 53 da Lei nº 9.784/99, o Decreto-lei nº 37/1966 combinado com os artigos 119, inciso I, letra "a", e 11 da portaria/MF nº 271/76 e 2º da IN/SRF nº 370/03, 2º e 18, inciso I, da Lei nº 9.784/99 e 19, inciso I, da Portaria/MF nº 58/06 não têm o condão de alterar o entendimento ora explicitado, em razão dos fundamentos expostos..


Ante o exposto, rejeito a preliminar e nego provimento ao apelo.


É o voto.



FERREIRA DA ROCHA
Juiz Federal Convocado


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
Signatário (a): SILVIO LUIS FERREIRA DA ROCHA:10091
Nº de Série do Certificado: 10A516071152AEA1
Data e Hora: 28/02/2019 15:21:09