Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 30/08/2021
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0005392-42.2018.4.03.9999/SP
2018.03.99.005392-3/SP
RELATOR : Desembargador Federal PAULO DOMINGUES
APELANTE : Instituto Nacional do Seguro Social - INSS
APELADO(A) : MARIA DAS GRACAS OTOBONI BRIGATTO
ADVOGADO : SP169162 ERICA APARECIDA MARTINI BEZERRA PEREIRA
REMETENTE : JUIZO DE DIREITO DA 1 VARA DE PITANGUEIRAS SP
No. ORIG. : 00024259320148260459 1 Vr PITANGUEIRAS/SP

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. REMESSA NECESSÁRIA NÃO CONHECIDA. APELAÇÃO CÍVEL. APOSENTADORIA POR IDADE. TRABALHADOR RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL SUFICIENTE. PROVA TESTEMUNHAL CONCRETA. APELAÇÃO DA AUTARQUIA NÃO PROVIDA.
I. Valor da condenação inferior a 1.000 salários mínimos. Remessa necessária não conhecida.
II. Implemento do requisito etário em 26/01/2014.
III. Apresentação de documentos. Início de prova material. Anotações de vínculos empregatícios na CTPS do segurado, não infirmadas pelo INSS.
IV. Prova testemunhal robusta e coesa a comprovar a atividade campesina exercida pela autora.
V. Remessa necessária não conhecida. Apelação da autarquia não provida.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, não conhecer da remessa necessária e, por maioria, negar provimento à Apelação da autarquia, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

São Paulo, 09 de agosto de 2021.
LEILA PAIVA
Juíza Federal Convocada


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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0005392-42.2018.4.03.9999/SP
2018.03.99.005392-3/SP
RELATOR : Desembargador Federal PAULO DOMINGUES
APELANTE : Instituto Nacional do Seguro Social - INSS
APELADO(A) : MARIA DAS GRACAS OTOBONI BRIGATTO
ADVOGADO : SP169162 ERICA APARECIDA MARTINI BEZERRA PEREIRA
REMETENTE : JUIZO DE DIREITO DA 1 VARA DE PITANGUEIRAS SP
No. ORIG. : 00024259320148260459 1 Vr PITANGUEIRAS/SP

DECLARAÇÃO DE VOTO


A EXMA. SRA. JUÍZA FEDERAL CONVOCADA LEILA PAIVA: A parte autora pleiteia a concessão de aposentadoria por idade rural, prevista no artigo 48, §§1º e 2º da Lei nº 8.213/91, verbis:


"Art. 48. A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se mulher.

§ 1º Os limites fixados no caput são reduzidos para sessenta e cinquenta e cinco anos no caso de trabalhadores rurais, respectivamente homens e mulheres, referidos na alínea a do inciso I, na alínea g do inciso V e nos incisos VI e VII do art. 11.

§ 2º Para os efeitos do disposto no § 1º deste artigo, o trabalhador rural deve comprovar o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido, computado o período a que se referem os incisos III a VIII do § 9º do art. 11 desta Lei."


Em síntese, para a obtenção da aposentadoria por idade, deve o requerente comprovar o preenchimento dos seguintes requisitos: (i) idade mínima e (ii) efetivo exercício da atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao da carência exigida para a sua concessão.

No que tange à carência, considerando o ano em que o rurícola implementou todas as condições necessárias à obtenção do benefício, o artigo 142 da Lei nº 8.213/91 estabelece regra de transição a ser observada pelos segurados inscritos na Previdência Social até 24/07/91.

Por sua vez, a regra de transição prevista na Lei nº 8.213/91, em seu artigo 143, estabelece que "O trabalhador rural ora enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de Previdência Social, na forma da alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do art. 11 desta Lei, pode requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante 15 (quinze) anos, contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência do referido benefício."

Em outras palavras, facultou-se aos trabalhadores rurais, atualmente enquadrados como segurados obrigatórios, que requeressem até o ano de 2006 (15 anos da data de vigência da Lei n.º 8.213/91) aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, bastando apenas a comprovação do exercício de trabalho rural em número de meses idêntico à carência do benefício, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao implemento do requisito etário ou ao seu requerimento.

Com o advento da Lei nº 11.718/2008, referido prazo foi prorrogado, exaurindo-se em 31/12/2010, a partir de quando se tornou exigível o recolhimento de contribuições, na forma estabelecida em seu art. 3º.

Portanto, em se tratando de segurado filiado ao Regime Geral de Previdência Social até 24/07/91, deve ser considerada a tabela progressiva inserta no artigo 142 da Lei de Benefícios, não havendo que se falar em exigência de contribuição ao trabalhador rural, bastando a comprovação do efetivo exercício da atividade rural, ainda que de forma descontínua, em número de meses idêntico à carência do referido benefício.

Aos que ingressaram no sistema após essa data, aplica-se a regra prevista no art. 25, inc. II, da Lei de Benefícios que exige a comprovação de 180 contribuições mensais.


COMPROVAÇÃO DO LABOR RURAL


A comprovação do tempo de serviço em atividade rural, seja para fins de concessão de benefício previdenciário ou para averbação de tempo de serviço, deve ser feita mediante a apresentação de início de prova material, conforme preceitua o artigo 55, § 3º, da Lei de Benefícios, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, entendimento cristalizado na Súmula nº 149, do C. STJ: "A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito de obtenção do benefício previdenciário".

Diante das precárias condições em que se desenvolve o trabalho do lavrador e as dificuldades na obtenção de prova material do seu labor, quando do julgamento do REsp. 1.321.493/PR, realizado segundo a sistemática de recurso representativo da controvérsia (CPC, art. 543-C), abrandou-se a exigência da prova admitindo-se início de prova material sobre parte do lapso temporal pretendido, a ser complementada por idônea e robusta prova testemunhal.

Importante dizer que a necessidade da demonstração do exercício da atividade campesina em período imediatamente anterior ao implemento do requisito etário, restou sedimentada pelo C. STJ, no julgamento do REsp nº 1.354.908/SP, sob a sistemática dos recursos representativos de controvérsia repetitiva.

Destaca-se, ainda, que, diante da dificuldade do trabalhador rural na obtenção da prova escrita, o Eg. STJ vem admitindo outros documentos além daqueles previstos no artigo 106, parágrafo único, da Lei nº 8.213/91, cujo rol não é taxativo, mas sim, exemplificativo (AgRg no REsp nº 1362145/SP, 2ª Turma, Relator Ministro Mauro Campell Marques, DJe 01/04/2013; AgRg no Ag nº 1419422/MG, 6ª Turma, Relatora Ministra Assussete Magalhães, DJe 03/06/2013; AgRg no AREsp nº 324.476/SE, 2ª Turma, Relator Ministro Humberto Martins, DJe 28/06/2013).

Conforme entendimento jurisprudencial sedimentado, a prova testemunhal possui aptidão para ampliar a eficácia probatória da prova material trazida aos autos, sendo desnecessária a sua contemporaneidade para todo o período de carência que se pretende comprovar (Recurso Especial Repetitivo 1.348.633/SP, (Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Primeira Seção, DJe 5/12/2014) e Súmula 577 do Eg. STJ.


CASO CONCRETO

O e. Relator, Desembargador Federal Paulo Domingues, em seu judicioso voto, não conheceu da remessa necessária e, de ofício, julgou extinto o processo sem resolução de mérito, nos termos do artigo 485, iv, do cpc/2015, ante a insuficiência de início de prova material do labor rural (resp 1352721/sp), restando prejudicada a apelação.

Acompanho o e. Relator para não conhecer da remessa oficial, dele divergindo, com a devida vênia, para negar provimento ao recurso do INSS pelos fundamentos que passo a expor:

A idade mínima exigida para obtenção do benefício restou comprovada, tendo a parte autora nascido em 26/01/59.

Com o implemento do requisito etário em 26/01/2014, a parte autora deve comprovar o exercício do labor rural no período imediatamente anterior a 2014, mesmo que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício requerido (180), não tendo o Instituto-réu conseguido infirmar a validade dos depoimentos prestados e dos documentos trazidos.

Para comprovar suas alegações, a parte autora apresentou os seguintes documentos: a) certidão de casamento celebrado no ano 1974 onde seu marido está qualificado como lavrador; b) cópia da sua CTPS, na qual constam vínculos rurais descontínuos de 1980 a 2005.

A certidão de casamento apresentada constitui início de prova material da atividade rural, admitindo-se a extensão da qualificação do cônjuge à esposa.

Doutra parte, as anotações de vínculos empregatícios constantes da CTPS do segurado tem presunção de veracidade relativa, cabendo ao INSS o ônus de provar seu desacerto, caso contrário, representam início de prova material, mesmo que não constem do Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS.

Nesse sentido a Súmula 75 da TNU: "A Carteira de Trabalho e Previdência social (CTPS) em relação à qual não se aponta defeito formal que lhe comprometa a fidedignidade goza de presunção relativa de veracidade, formando prova suficiente de tempo de serviço para fins previdenciários, ainda que a anotação de vínculo de emprego não conste no Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS)".

Em outras palavras, nos casos em que o INSS não trouxer aos autos qualquer prova que infirme as anotações constantes na CTPS da parte autora, tais períodos devem ser considerados como tempo de contribuição/serviço, até porque eventual não recolhimento das contribuições previdenciárias devidas nesse período não pode ser atribuído ao segurado, nos termos do artigo 30, inciso I da Lei 8.212/1991. Precedentes desta C. Turma (TRF 3ª Região, SÉTIMA TURMA, ApReeNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 1344300 - 0005016-55.2005.4.03.6105, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO, julgado em 27/11/2017, e-DJF3 Judicial 1 DATA:06/12/2017).

Insta dizer, ainda, que os períodos constantes no CNIS devem ser considerados como tempo de trabalho incontroverso.

Neste sentido:

"Decreto 3.048/99, Art. 19. Os dados constantes do Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS relativos a vínculos, remunerações e contribuições valem como prova de filiação à previdência social, tempo de contribuição e salários-de-contribuição."
IN 77/2015, Art. 58. A partir de 31 de dezembro de 2008, data da publicação do Decreto nº 6.722, de 30 de dezembro de 2008, os dados constantes do CNIS relativos a atividade, vínculos, remunerações e contribuições valem, a qualquer tempo, como prova de filiação à Previdência Social, tempo de contribuição e salários de contribuição.

Os documentos colacionados pela parte autora constituem início razoável de prova material de que ela trabalhava nas lides campesinas.

Por sua vez, a prova testemunhal produzida nos autos (audiência realizada em 01/06/2016) evidenciou de forma segura e induvidosa o labor rural da parte autora, sendo que os depoentes, que a conhecem há muitos anos, foram unânimes em suas declarações, confirmando que ela sempre trabalhou na lavoura.

Deolinda Jacinto Leão afirmou que conhece a autora desde criança e ela já trabalhava como lavradora. Ela deixou de trabalhar há 03 anos, aproximadamente, por problemas de saúde (problemas no joelho). Trabalharam juntos na Fazenda Capim Verde ou Cutrale, Fazenda Santa Maria, Fazenda Santo António, assim como para os empreiteiros João Antonio Beloti, Brigatti, Jesus Prestes, Albertino Fernandes, entre outros lugares e empreiteiros. O período em que trabalharam juntas teve início há 35 anos aproximadamente e terminou há 10 anos aproximadamente, quando a testemunha parou de trabalhar e a autora continuou trabalhando na roça. A testemunha sempre manteve contato com a autora. O trabalho era de forma continua e ininterrupta. Trabalhavam de segunda a sábado, folgando aos domingos. A remuneração era paga geralmente por semana ou quinzena ou mês, ou seja, dependia para quem trabalhavam. Trabalhavam ora com registro, ora sem registro. A autora trabalhou nas lavouras de algodão, milho, laranja, etc., carpindo, colhendo, plantando, dentre outras atividades. Não se recorda com qual empreiteiro a autora trabalhou pela ultima vez, mas foi para o empreiteiro Belotti com quem a autora e a depoente trabalharam juntas pela última vez. Conheceu o marido da autora, Sr. Benedito, cujo apelido é "Minhocão", e pode afirmar que ele também era lavrador, tendo trabalhado junto com a autora e com a depoente.

Leiko Shilomai Dias conhece a autora há 50 anos, aproximadamente. Desde quando conheceu a autora ela já trabalhava como lavradora. A autora parou de trabalhar há 03 anos, aproximadamente, por problemas de saúde. Trabalharam juntas na Faz. Capim Verde ou Cutrale, Faz. Santa Maria, Faz. Santo Antônio, assim como para os empreiteiros João Antonio Beloti, Jesus Prestes, Turiba, entre outros lugares e empreiteiros. O período em que trabalharam juntas teve inicio quando se conheceram e foi até há 07 anos aproximadamente, quando a depoente parou de trabalhar e a autora continuou trabalhando na roça. A testemunha sempre manteve contato com a autora e pelo que sabe, ela também trabalhou em lugares sem a companhia da depoente, notadamente na Fazenda Santa Maria. O trabalho era de forma continua e ininterrupta. Trabalhavam de segunda à sábado, folgando aos domingos. A remuneração era paga geralmente por semana. Trabalhavam sem registro, geralmente. A autora trabalhou nas lavouras de algodão, milho, laranja, etc., desempenhando as seguintes atividades: carpia, colhia, dentre outras atividades. O último trabalho da autora foi para o empreiteiro Albertino Fernandes e foi na Fazenda Santa Maria onde a autora e a testemunha trabalharam juntas pela última vez. Conhece o marido da autora, cujo apelido é "minhocão", e pode afirmar que ele também é lavrador, tendo trabalhado junto com a autora e com a testemunha.

Assim sendo, o início de prova material, corroborado por robusta e coesa prova testemunhal, comprova a atividade campesina exercida pela parte autora.

CONCLUSÃO

Desse modo, presentes os pressupostos legais para a concessão do benefício, vez que implementado o requisito da idade e demonstrado o exercício da atividade rural, por período equivalente ao da carência exigida pelo artigo 142 da Lei nº 8213/91, a procedência do pedido era de rigor.

Ante o exposto, não conheço da remessa oficial e nego provimento ao recurso.

É o voto.



LEILA PAIVA
Juíza Federal Convocada


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
Signatário (a): LEILA PAIVA MORRISON:10143
Nº de Série do Certificado: 11DE1803204B1559
Data e Hora: 09/10/2020 17:42:58