Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 20/08/2019
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0003001-17.2018.4.03.6119/SP
2018.61.19.003001-4/SP
RELATOR : Desembargador Federal ANDRÉ NEKATSCHALOW
APELANTE : HORTENCIA ARMANDO NHACUME reu/ré preso(a)
ADVOGADO : SP0000DPU DEFENSORIA PUBLICA DA UNIAO (Int.Pessoal)
APELADO(A) : Justica Publica
No. ORIG. : 00030011720184036119 1 Vr GUARULHOS/SP

EMENTA

PENAL. PROCESSUAL PENAL. TRÁFICO DE DROGA. DIREITO DE RECORRER EM LIBERDADE. INEXIGIBILIDADE DE CONDUTA ADVERSA. ATENUANTE DA CONFISSÃO. CAUSA DE DIMINUIÇÃO DO ART. 33, § 4º DA LEI 11.343/06. ALTERAÇÃO DE REGIME.
1. Não é razoável alegar a falta de recursos financeiros como justificativa para que praticasse a conduta delituosa, muito menos meras afirmações a respeito de supostas ameaças sofridas, a inexigibilidade de conduta diversa apenas se aplica a casos em que há provas de haver um perigo atual e inevitável, ou seja, não pode ser algo abstrato, sem fortes convicções, sendo, portanto ônus da defesa provar sua existência, não cabendo, portanto, no caso em questão a referida alegação de ter sido conduta prática em situação excepcional.
2. Reconheço a atenuante da confissão, mas em razão de a pena-base ter sido fixada em patamar mínimo legal e conforme a Súmula 231 do Superior Tribunal de Justiça circunstância atenuante não pode reduzir a pena para abaixo do mínimo legal.
3. Aplico o aumento previsto no art. 40, I, da Lei 11.344/06, pois foi comprovada a transnacionalidade do delito, sendo fixado o aumento em 1/6 e reconheço a causa de diminuição do art. 33, § 4º, da Lei 11.343/06, porém em seu patamar mínimo, tendo em vista que a ré colaborou com organização criminosa na tentativa de transportar grande quantidade de droga, além de ter confessado já ter vindo ao Brasil outra vez com o mesmo intuito, transportar entorpecente. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que o conhecimento pelo agente de estar a serviço do crime organizado para o tráfico transnacional de entorpecentes constitui fundamento concreto e idôneo a ser valorado para fins de estabelecimento da incidência da causa de diminuição de pena do art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/06 no mínimo legal, ante a gravidade da conduta perpetrada (STJ, HC n. 387.077, Rel. Min. Ribeiro Dantas, j. 06.04.17).
4. Mantido o regime inicial semiaberto, haja vista as circunstancias desfavoráveis e quantidade da pena.
5. O direito de apelar em liberdade para os delitos da Lei n. 11.343/06 é excepcional, desafiando fundamentação própria, não havendo ilegalidade em manter a prisão do réu que nessa condição respondeu a ação penal (STF, HC n. 92612, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 11.03.08; HC n. 101817, Rel. Min. Dias Toffoli, j. 24.08.10; HC n. 98428, Rel. Min. Eros Grau, j. 18.08.09).
6. Apelação não provida.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação de Hortencia Armando Nhacume, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 12 de agosto de 2019.
Andre Nekatschalow
Desembargador Federal Relator


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0003001-17.2018.4.03.6119/SP
2018.61.19.003001-4/SP
RELATOR : Desembargador Federal ANDRÉ NEKATSCHALOW
APELANTE : HORTENCIA ARMANDO NHACUME reu/ré preso(a)
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No. ORIG. : 00030011720184036119 1 Vr GUARULHOS/SP

RELATÓRIO

Trata-se de apelação criminal interposta por Hortencia Armando Nhacume contra a sentença de fls. 184/190v., que a condenou à pena de 4 (quatro) anos, 10 (dez) meses de reclusão e 486 (quatrocentos e oitenta e seis) dias-multa, calculados à razão de 1/30 (um trigésimo) do valor do salário mínimo vigente à época dos fatos, em regime inicial semiaberto, pelo cometimento do crime previsto no art. 33, caput, c. c. art. 40, I, ambos da Lei n. 11.343/06.

Alega-se, em síntese, o seguinte:

a) absolvição pela incidência da excludente de inexigibilidade de conduta diversa, em razão de se tratar de situação, excepcional, pois se encontrava sendo ameaçada por traficantes em razão de dívidas e precisava proteger sua vida e de sua família;
b) em preservação dos princípios da isonomia e da individualização da pena, a atenuante da confissão, prevista no art. 65, III, "d", do Código Penal, deve ser reconhecida ainda que implique levar a pena para abaixo do mínimo legal;
c) aplicação da diminuição de pena prevista no art. 33, § 4º, da Lei 11.343/06 em seu patamar máximo, haja vista todos os requisitos preenchidos;
d) deve ser alterado o regime inicial de cumprimento da pena para o aberto, em virtude da aplicação da diminuição da pena imposta;
e) que deve ser assegurado o direito de recorrer em liberdade (fls. 213/218).

O Ministério Público Federal apresentou as contrarrazões (fls. 220/225v.).

O Ilustre Procurador Regional da República, Dr. Orlando Martello, manifestou-se pelo desprovimento do recurso defensivo (fls. 228/231).

É o relatório.
Encaminhem-se os autos à revisão, nos termos regimentais.
Andre Nekatschalow
Desembargador Federal Relator


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0003001-17.2018.4.03.6119/SP
2018.61.19.003001-4/SP
RELATOR : Desembargador Federal ANDRÉ NEKATSCHALOW
APELANTE : HORTENCIA ARMANDO NHACUME reu/ré preso(a)
ADVOGADO : SP0000DPU DEFENSORIA PUBLICA DA UNIAO (Int.Pessoal)
APELADO(A) : Justica Publica
No. ORIG. : 00030011720184036119 1 Vr GUARULHOS/SP

VOTO

Imputação. Hortencia Armando Nhacume foi denunciada pela prática do crime previsto no art. 33, caput, c. c. o art. 40, I, da Lei n. 11.343/06, porque, em 13.09.18, nas dependências do Aeroporto de Guarulhos (SP), foi presa em flagrante por trazer consigo a quantidade de 2.572g (dois mil quinhentos e setenta e dois gramas) de cocaína.
Narra a denúncia que, em inspeção rotineira da Polícia Federal, um agente observou que a ré apresentava atitude suspeita, haja vista estar muito nervosa, o que o levou a fazer alguns questionamentos a respeito da viagem que ela faria, após a abordagem, solicitou que o acompanhasse até uma cabine de revista. A mala que estava com a ré foi aberta e dentro foi encontrado um volume suspeito, o qual ao ser furado mostrou conter um pó branco semelhante a cocaína. Em virtude da substância encontrada, a ré foi encaminhada a delegacia, onde foi possível através de exame pericial obter a confirmação de que o pó branco era cocaína.
Materialidade. Está satisfatoriamente comprovada a materialidade delitiva diante dos seguintes elementos de convicção:
a) Auto de Prisão em Flagrante (fls. 02/08);
b) Auto de Apresentação e Apreensão (fl. 07/08);
c) Laudo de Perícia Criminal Federal (preliminar de constatação), com resultado positivo para 2.572g (dois mil quinhentos e setenta e dois gramas) de cocaína (fls. 11/13);
d) Laudo de Perícia Criminal Federal (química forense) apresentou resultado positivo para 2.572g (dois mil quinhentos e setenta e dois gramas) de cocaína (fls. 129/132).
Autoria. Está demonstrada a autoria delitiva.
A testemunha Marcos de Morais, Policial Federal, informou que, na data dos fatos, a ré foi abordada por ele e outros policiais enquanto ela pretendia realizar check-in na empresa South África, com escala em Johanesburgo. Disse que a abordou e pediu para revistá-la pelo fato de estar muito nervosa e agitada. Foram revistadas uma mala e uma mochila. Na mala, nada foi encontrado, porém a mochila apresentava estar muito pesada e ao abri-la foi encontrado em seu interior um fundo falso, que ao ser perfurado fez surgir um pó branco semelhante a cocaína. Levaram-na até a delegacia, onde a substância encontrada foi submetida a exame pericial pelo qual foi possível contatar se tratar de cocaína (fl. 185).
A testemunha Maria Aparecida Silva Barbosa informou que trabalha na empresa Bravasc e que foi chamada pelos agentes da Policia Federal para que acompanhasse a revista das bagagens. Disse que foi aberta uma mochila e que dentro dela havia um pacote com um pó branco, que foi encaminhado até a delegacia para que fosse feito exame pericial e, nesse exame, o resultado obtido foi positivo para cocaína (mídia, fl. 185).
Em seu interrogatório, Hortencia Armando Nhacume confessou os fatos que lhe foram imputados, afirmando que trabalhava vendendo amendoim e castanha na cidade onde conheceu o dono de uma loja, que lhe fez a proposta de levar a droga e que pelo serviço receberia $ 3.000 (três mil dólares). Depois de pensar muito na condição financeira que se encontrava, resolveu aceitar fazer o transporte da droga, mas recebeu apenas $ 500 (quinhentos dólares). Não sabe quem é o dono da droga, mas provavelmente dever ser um nigeriano. Contou que chegou no Brasil e foi para um hotel chamado De La Rosa que fica localizado perto da Praça da República, onde ficou durante mais ou menos um mês antes de mudar para outro. Sobre a mochila com a droga, disse que recebeu dentro do metrô no dia da viagem. Contou que já viajou outra vez, com o intuito de transportar drogas, mas em decorrência de adquirir malária mandaram que ela voltasse para seu país sem que realizasse o serviço e, em razão disso, adquiriu uma dívida de $2.000 (dois mil dólares), valor referente as passagens e passaportes para a primeira viagem. Em razão da dívida, os traficantes a teriam ameaçado para que voltasse ao Brasil e transportasse a droga, conforme era para ter sido durante a outra viagem (mídia, fl. 185).
Requer a defesa que haja absolvição pela incidência da excludente de inexigibilidade de conduta diversa, em razão de estar sendo ameaçada por traficantes e precisava proteger sua vida e de sua família.
Não lhe assiste razão.
Não é razoável alegar a falta de recursos financeiros como justificativa para que praticasse a conduta delituosa, muito menos meras afirmações a respeito de supostas ameaças sofridas. A inexigibilidade de conduta diversa apenas se aplica a casos em que há provas de haver um perigo atual e inevitável, ou seja, não pode ser algo abstrato, sem fortes convicções. Sendo, portanto, ônus da defesa provar sua existência.
Passo a análise da dosimetria.
Dosimetria. Na primeira fase, o Juízo a quo fixou a pena-base em 5 (cinco) anos de reclusão e 500 (quinhentos).
Na segunda fase, sem agravantes, mas com a atenuante da confissão espontânea (art. 65, III, d, Código Penal), a qual restou prejudicada em razão de a pena base ter sido aplicada em seu mínimo legal.
Na terceira fase, aplicou aumento previsto no art. 40, I, da Lei 11.344/06, pois foi comprovada a transnacionalidade do delito, sendo fixado o aumento em 1/6. Considerou causa de diminuição de pena prevista no art. 33, § 4º, da Lei 11.343/06, reduzindo-a em 1/6.
Assim, tornou a pena definitiva em 4 (quatro) anos, 10 (dez) meses e 10 (dez) dias de reclusão.
Observada a pena privativa de liberdade, condenou o réu ao pagamento de 486 (quatrocentos e oitenta e seis) dias-multa, arbitrados em 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos.
Fixou o regime inicial em semiaberto para o cumprimento da pena, em virtude da quantidade da pena e condições desfavoráveis.

A defesa requer a revisão da dosimetria para que haja o reconhecimento da atenuante da confissão prevista no art. 65, III, "d", do Código Penal, ainda que isso implique levar a pena para abaixo do mínimo legal e também a aplicação da diminuição prevista no art. 33, § 4º, da Lei 11.343/06 em seu patamar máximo, haja vista tenha todos os requisitos preenchidos, e em decorrência disso o regime inicial de cumprimento deve ser alterado para o aberto, tendo também assegurado o direito de poder recorrer em liberdade.

Não lhe assiste razão.

Na primeira fase, mantenho fixada a pena base em 5 (cinco) anos de reclusão e 500 (quinhentos) dias-multa.
Na segunda fase, reconheço a atenuante da confissão, mas em razão de a pena-base ter sido fixada em patamar mínimo legal e, conforme a Súmula 231 do Superior Tribunal de Justiça, circunstância atenuante não pode reduzir a pena para abaixo do mínimo legal.
Na terceira fase, aplico o aumento previsto no art. 40, I, da Lei 11.344/06, pois foi comprovada a transnacionalidade do delito, sendo fixado o aumento em 1/6 e reconheço a causa de diminuição do art. 33, § 4º, da Lei 11.343/06, porém em seu patamar mínimo, tendo em vista que a ré colaborou com organização criminosa na tentativa de transportar grande quantidade de droga, além de ter confessado já ter vindo ao Brasil outra vez com o mesmo intuito, transportar entorpecente. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que o conhecimento pelo agente de estar a serviço do crime organizado para o tráfico transnacional de entorpecentes constitui fundamento concreto e idôneo a ser valorado para fins de estabelecimento da incidência da causa de diminuição de pena do art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/06 no mínimo legal, ante a gravidade da conduta perpetrada (STJ, HC n. 387.077, Rel. Min. Ribeiro Dantas, j. 06.04.17).
Portanto, torno a pena definitiva em 4 (quatro) anos, 10 (dez) meses de reclusão e 486 (quatrocentos e oitenta e seis) dias-multa.
Mantido o regime inicial semiaberto, haja vista as circunstâncias desfavoráveis e quantidade da pena.
O direito de apelar em liberdade para os delitos da Lei n. 11.343/06 é excepcional, desafiando fundamentação própria, não havendo ilegalidade em manter a prisão do réu que nessa condição respondeu a ação penal (STF, HC n. 92612, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 11.03.08; HC n. 101817, Rel. Min. Dias Toffoli, j. 24.08.10; HC n. 98428, Rel. Min. Eros Grau, j. 18.08.09).
Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO à apelação.
É o voto.

Andre Nekatschalow
Desembargador Federal


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
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Nº de Série do Certificado: 11A21704266A748F
Data e Hora: 13/08/2019 10:51:42