Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 09/10/2019
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0015716-61.2012.4.03.6100/SP
2012.61.00.015716-0/SP
RELATORA : Desembargadora Federal MARLI FERREIRA
APELANTE : Superintendencia de Seguros Privados SUSEP
ADVOGADO : SP220000 ANA CLAUDIA FERREIRA PASTORE e outro(a)
ASSISTENTE : CONFEDERACAO NACIONAL DAS EMPRESAS DE SEGUROS GERAIS PREVIDENCIA PRIVADA E VIDA SAUDE SUPLEMENTAR E CAPITALIZACAO CNSEG
ADVOGADO : RJ179757 FELIPE MENDONCA TERRA
APELADO(A) : MERCHO COSTA e outro(a)
: ANDRESSA MANOELA DE OLIVEIRA RIBAS
ADVOGADO : SP193192 RENATA REZENDE DE OLIVEIRA
APELADO(A) : ASSOCIACAO IMPERIAL PAULISTA DE PROTECAO MATERIAL AOS PROPRIETARIOS DE VEICULOS AUTOMOTORES AIPESP e outros(as)
: ANDRE RICARDO COSTA
: MARCIA CRISTINA COSTA
: JOAO GABRIEL ANUNCIO DO COUTO
ADVOGADO : SP219432 WASHINGTON HUMBERTO ANDRADE DE OLIVEIRA e outro(a)
REMETENTE : JUIZO FEDERAL DA 24 VARA SAO PAULO Sec Jud SP
No. ORIG. : 00157166120124036100 24 Vr SAO PAULO/SP

EMENTA

DIREITO CIVIL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ASSOCIAÇÃO DE PROTEÇÃO MATERIAL DE VEÍCULOS AUTOMOTORES. SUPERINTENDÊNCIA DE SEGUROS PRIVADOS - SUSEP. PRÁTICA SECURITÁRIA CONFIGURADA. AUSÊNCIA DE PRÉVIA AUTORIZAÇÃO. ART. 24 DO DECRETO-LEI Nº 73/66. ART. 757 DO CÓDIGO CIVIL. APELAÇÃO E REMESSA OFICIAL PROVIDAS.
1. O objetivo da associação em questão entre outros é amparar os seus associados quanto a danos em seus veículos, causados por colisão, incêndio, roubo ou furto.
2. Uma das características do contrato de seguro é no que pertine à universalidade de suas propostas. Ou seja, é importante para distinguir o grupo de auxílio mútuo por autogestão do denominado contrato de seguro, deve-se analisar quem são os sujeitos de direito aos quais se dirige a proposta.
3. Verifica-se no site da AIPESP (www.imperialpaulista.com.br) constar a oferta a grupo indeterminado de pessoas, de proteção patrimonial, que seria uma alternativa para proprietários de carros ou frotas que procuram uma proteção para seu bem, com valor acessível. E, mais adiante elenca quais as proteções oferecidas: roubo, furto qualificado, acidentes, incêndios e assistência 24h.
4. Portanto, o que ressalta dos autos é que a apelada, sem forma ou figura legal, exerce ilegalmente a atividade de seguradora, sem atentar para as exigências legais que envolvem essa prestação de serviço.
5. Configurada violação ao disposto no artigo 757 do Código Civil/2002, bem como nos artigos 24, 78 e 113 do Decreto-Lei n. 73/1996. Precedentes.
6. Remessa Oficial e apelação providas.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento à remessa oficial e à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 26 de setembro de 2019.
MARLI FERREIRA
Desembargadora Federal


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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0015716-61.2012.4.03.6100/SP
2012.61.00.015716-0/SP
RELATORA : Desembargadora Federal MARLI FERREIRA
APELANTE : Superintendencia de Seguros Privados SUSEP
ADVOGADO : SP220000 ANA CLAUDIA FERREIRA PASTORE e outro(a)
ASSISTENTE : CONFEDERACAO NACIONAL DAS EMPRESAS DE SEGUROS GERAIS PREVIDENCIA PRIVADA E VIDA SAUDE SUPLEMENTAR E CAPITALIZACAO CNSEG
ADVOGADO : RJ179757 FELIPE MENDONCA TERRA
APELADO(A) : MERCHO COSTA e outro(a)
: ANDRESSA MANOELA DE OLIVEIRA RIBAS
ADVOGADO : SP193192 RENATA REZENDE DE OLIVEIRA
APELADO(A) : ASSOCIACAO IMPERIAL PAULISTA DE PROTECAO MATERIAL AOS PROPRIETARIOS DE VEICULOS AUTOMOTORES AIPESP e outros(as)
: ANDRE RICARDO COSTA
: MARCIA CRISTINA COSTA
: JOAO GABRIEL ANUNCIO DO COUTO
ADVOGADO : SP219432 WASHINGTON HUMBERTO ANDRADE DE OLIVEIRA e outro(a)
REMETENTE : JUIZO FEDERAL DA 24 VARA SAO PAULO Sec Jud SP
No. ORIG. : 00157166120124036100 24 Vr SAO PAULO/SP

RELATÓRIO

A Excelentíssima Senhora Desembargadora Federal MARLI FERREIRA (Relatora):


Trata-se de apelação em ação civil pública ajuizada pela SUPERINTENDÊNCIA DE SEGUROS PRIVADOS - SUSEP em face de Associação Imperial Paulista de Proteção Material aos Proprietários de Veículos Automotores- AIPESP, Mercho Costa, Andressa Manoela de Oliveira Ribas, Marcia Cristina Costa e João Gabriel do Couto, objetivando que seja declarada ilícita a atuação da Associação no mercado de seguros, proibindo-a permanentemente de realizar a oferta e/ou a comercialização de qualquer modalidade contratual de seguro em todo território nacional.

Indeferido o pedido liminar (fls. 449/452), a autora interpôs o Agravo de Instrumento 0005918-72.2014.4.03.0000/SP, ao qual foi negado provimento (fls. 719/722).

A r. sentença consignou: "... por não visualizar ilegalidade no exercício da atividade da Associação Ré em ressarcir prejuízos decorrentes de acidentes automotivos em veículos de seus associados, mediante mutualismo dos próprios associados, o que, embora assemelhado ao seguro automotivo com este não se confunde, o que fica claro na publicidade da Associação-Ré, JULGO IMPROCEDENTES OS PEDIDOS e extinto o processo com resolução do mérito, nos termos do Artigo 269, inciso I, do código de Processo Civil."

Houve submissão ao reexame necessário.

Em 10/08/2016, a SUSEP apelou, pleiteando a reforma da sentença (fls. 728/744).

Os requeridos Merchó Costa e Andressa Manoela de Oliveira Ribas apresentaram contrarrazões, afirmando que o assunto é tratado pelo artigo 53 do Novo Código Civil, bem como consignaram que "... dentre os objetivos da Associação, encontra-se o atinente a amparar, proteger e beneficiar seus entes associados, quanto à utilização do veículo, através do RATEIO, que consiste na repartição entre os associados de eventuais prejuízos materiais sofridos nestes bens causados por furto, roubo, colisão e incêncio devendo ser observadas as normas estabelecidas no Estatudo; além do que não possui fins lucrativos e os seus dirigentes NÃO recebem nada pela autuação em prol da entidade."

Sustentaram que, nos moldes do Enunciado n. 185 do conselho da Justiça Federal, provado pela III Jornada de Direito Civil, não existe qualquer impedimento à atuação da Associação.

Igualmente, a Associação Imperial Paulista de Proteção Material aos Proprietários de Veículos Automotores- AIPESP apresentou contrarrazões, sustentando que o assunto é tratado pelo artigo 53 do Novo Código Civil, noticiando que "... recentemente, a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado Federal aprovou, o Projeto de Lei n. 356/2012 e o Projeto de Lei n. 4844/2012, através dos quais se busca consagrar o Enunciado 185 e introduzir, no Código Civil, e alterar o art. 53 do Código Civil:..."

Alegou que o seu objetivo "... é amparar, proteger e beneficiar seus entes associados quanto à utilização do veículo, simplesmente, denominado de equipamento pelo Regulamento Interno, através da repartição entre os associados de eventuais prejuízos materiais sofridos nestes bens."

Neste Tribunal, o Ministério Público Federal manifestou-se pelo desprovimento do recurso (fls. 776/778).

Nesta instância, habilitou-se como assistente da apelante a Confederação Nacional das Empresas de Seguros Gerais, Previdência Privada e Vida, Saúde Suplementar e Capitalização - CNSeg, requerendo o provimento da apelação com o fim de julgar procedente a ação.

É o relatório.


VOTO

Por ocasião do julgamento do agravo de instrumento, externei posicionamento no sentido de que a associação é uma organização resultante da reunião legal entre duas ou mais pessoas, com ou sem personalidade jurídica, sem fins lucrativos para a realização de um objetivo comum.

Conforme estatuto, a Associação Imperial Paulista de Proteção Material aos Proprietários de Veículos Automotores - Imperial Paulista Proteção Automotiva tem por objetivo entre outros amparar os seus associados quanto a danos em seus veículos, causados por colisão, incêndio, roubo ou furto.

Constou, ainda, que na consecução de seus objetivos a Associação aplicará integralmente suas rendas, recursos e eventual resultado operacional, assim como subvenções e doações recebidas na manutenção e desenvolvimento das finalidades institucionais.

Como se vê, pareceu-me à primeira vista, tratar-se de serviço de proteção por autogestão, que não poderia vir a ser confundido com seguros.

Estes serviços de proteção por autogestão têm natureza jurídica de contratos de comunhão de objetivos destinados a partilhar riscos entre os contratantes.

Os contratos de serviços de proteção por autogestão revelam mutualismo em si próprios, seja porque estabelecem o simples rateio entre os participantes, ou porque estipulam fundo de reserva a partir de contribuições periódicas.

Na verdade, importa para a solução da hipótese dos autos, examinar com maior acuidade o art. 757, CC, que vem assim expresso:


"Art. 757. Pelo contrato de seguro, o segurador se obriga, mediante o pagamento de prêmio, a garantir interesse legítimo do segurado, relativo a pessoa ou a coisa, contra riscos predeterminados.
Parágrafo Único. Somente pode ser parte, no contrato de seguro, como segurador, entidade para tal fim legalmente autorizada."

Uma das características do contrato de seguro é no que pertine à universalidade de suas propostas. Ou seja, é importante para distinguir o grupo de auxílio mútuo por autogestão do denominado contrato de seguro, devemos analisar quem são os sujeitos de direito aos quais se dirige a proposta.

Nesse sentido verifico que no site da AIPESP (www.imperialpaulista.com.br) consta a oferta a grupo indeterminado de pessoas, de proteção patrimonial, que seria uma alternativa para proprietários de carros ou frotas que procuram uma proteção para seu bem, com valor acessível. E, mais adiante elenca quais as proteções oferecidas: roubo, furto qualificado, acidentes, incêndios e assistência 24h.

Típico contrato de seguro nos termos da Lei, bem assim no quanto preceitua a legislação que rege a matéria disposta no Decreto-Lei nº 73/66 (arts. 24, 78 e 113), tanto assim que tal como ocorre no contrato de seguro, nenhuma prova foi acostada aos autos, que na ausência da sinistralidade as contribuições dos associados, não foram aos mesmos revertidas.

Vejamos qual as exigências que se impõe às empresas de seguros, como previsto no Decreto-Lei nº 73/66:


"Art. 24. Poderão operar em seguros privados apenas Sociedades Anônimas ou Cooperativas, devidamente autorizadas.
Parágrafo único. As Sociedades Cooperativas operarão unicamente em seguros agrícolas, de saúde e de acidentes do trabalho.
Art. 78. As Sociedades Seguradoras só poderão operar em seguros para os quais tenham a necessária autorização, segundo os planos, tarifas e normas aprovadas pelo CNSP.
Art. 113. As pessoas físicas ou jurídicas que realizarem operações de seguro, cosseguro ou resseguro sem a devida autorização no País ou no exterior, ficam sujeitas à pena de multa igual ao valor da importância segurada ou resseguradas.
Art. 113. As pessoas naturais ou jurídicas que realizarem operações de capitalização, seguro, cosseguro ou resseguro sem a devida autorização estão sujeitas às penalidades administrativas previstas no art. 108, aplicadas pelo órgão fiscalizador de seguros, aumentadas até o triplo." (Redação dada pela Lei nº 13.195/2015)

Portanto o que ressalta dos autos é que a apelada, sem forma ou figura legal exerce ilegalmente a atividade de seguradora, sem atentar para as exigências legais que envolvem essa prestação de serviço.

Nesse sentido, decidiu recentemente o C. STJ, afastando a aplicação do Enunciado 185, da III Jornada de Direito Civil do CJF, como se lê do precedente, in verbis:


"CIVIL E ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. PODER FISCALIZATÓRIO DA SUPERINTENDÊNCIA DE SEGUROS PRIVADOS - SUSEP. PEDIDO DE INTERVENÇÃO DA CONFEDERAÇÃO NACIONAL DAS EMPRESAS DE SEGUROS GERAIS, PREVIDÊNCIA PRIVADA E VIDA, SAÚDE SUPLEMENTAR E CAPITALIZAÇÃO - CNSEG, COMO TERCEIRO PREJUDICADO. INDEFERIMENTO. PRELIMINAR DE NÃO CONHECIMENTO DO RECURSO INTERPOSTO PELA SUSEP. ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO E DE AUSÊNCIA DE FUNDAMENTO SOBRE A PARTE DO RECURSO QUE SUSCITA A VIOLAÇÃO DO DISPOSITIVO DO ART. 535, II, DO CPC/1973. REJEIÇÃO. ALEGAÇÃO DA RECORRENTE - SUSEP DE OFENSA AO DISPOSITIVO DO ART. 535, II, DO CPC/1973. NÃO OCORRÊNCIA. ATIVIDADES DA ASSOCIAÇÃO MINEIRA DE PROTEÇÃO E ASSISTÊNCIA AUTOMOTIVA. CARACTERIZAÇÃO COMO PRÁTICA SECURITÁRIA. ARESTO RECORRIDO QUE CONCLUIU PELA OCORRÊNCIA DE UM "GRUPO RESTRITO DE AJUDA MÚTUA". ENUNCIADO N. 185 DA III JORNADA DE DIREITO CIVIL DO CONSELHO DA JUSTIÇA FEDERAL. INAPLICABILIDADE. VIOLAÇÃO DOS DISPOSITIVOS DOS ARTS. 757 DO CÓDIGO CIVIL/2002 E DOS ARTS. 24, 78 e 113 DO DECRETO-LEI N. 73/1966. RECURSO ESPECIAL INTERPOSTO PELA CONFEDERAÇÃO NACIONAL DAS EMPRESAS DE SEGUROS GERAIS, PREVIDÊNCIA PRIVADA E VIDA, SAÚDE SUPLEMENTAR E CAPITALIZAÇÃO - CNSEG PREJUDICADO. RECURSO ESPECIAL INTERPOSTO PELA SUPERINTENDÊNCIA DE SEGUROS PRIVADOS - SUSEP CONHECIDO E PROVIDO.
1. O objeto desta lide não comporta alegação de "concorrência desleal", visto que o pleito originário foi interposto pela Superintendência de Seguros Privados - SUSEP e, por óbvio, tal questão não integra a perspectiva regulatória que compreende os objetivos institucionais dessa autarquia federal na fiscalização do mercado privado de seguros. De outra parte, no que concerne à perspectiva econômica - sobre eventuais prejuízos que as associadas da recorrente poderão sofrer -, tal se revela irrelevante para efeito de integração a esta lide como terceiro prejudicado.
2. Não se encontra dentre as finalidades estatutárias da Associação recorrente - e nem poderia - qualquer atuação na fiscalização regulatória do mercado de seguros privados, já que isso é atividade privativa da União, que a exerce através da autarquia federal, Superintendência de Seguros Privados - SUSEP. Eventual consequência da atuação dessa autarquia federal, em relação às associadas da recorrente, ocorre no campo meramente do interesse econômico, não do interesse jurídico em si.
3. A jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça é clara ao afirmar que o interesse jurídico a ser demonstrado, para efeito de intervenção na ação com fundamento no § 1º do art. 499 do CPC/1973, deve guardar relação de "interesse tido por análogo ao do assistente que atua em primeiro grau ao auxiliar a parte principal na demanda". Precedentes: REsp 1.356.151/SP, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 21/9/2017, DJe 23/10/2017; REsp 1.121.709/PR, Rel. Ministro João Otávio de Noronha, Terceira Turma, julgado em 5/11/2013, DJe 11/11/2013.
4. Assim, se no caso em exame a relação jurídica submetida à apreciação judicial concerne ao exercício do poder regulatório cometido ao órgão público sobre o mercado privado de seguros, descabe falar em interesse jurídico de uma associação privada, por mais relevante que o seja, por ausente comunhão de interesses nesse sentido.
5. No que diz respeito à ausência de prequestionamento dos dispositivos dos arts. 24, 78 e 113 do Decreto-Lei n. 73/1966 e do art. 757 do Código Civil/2002, não tem qualquer razão a recorrida, uma vez que a eg. Corte de origem debateu a matéria sob o enfoque de tais dispositivos legais. 6. O argumento da parte recorrida de que a pretensão da insurgente, quando alega violação do dispositivo do art. 535, II, do CPC/1973, é meramente suscitar irresignação que se reporta ao mérito em si será examinado no momento adequado, porque diz respeito ao mérito dessa parte da postulação recursal da Superintendência de Seguros Privados - SUSEP.
7. Com a rejeição da preliminar suscitada pela recorrida quanto ao prequestionamento dos dispositivos arts. 24, 78 e 113 do Decreto-Lei n. 73/1966 e do art. 757 do Código Civil/2002, por via oblíqua, rejeita-se a alegação da recorrente de nulidade do aresto impugnado. É que, ao considerar que as questões jurídicas que se reportam a tais dispositivos legais foram examinadas pelo eg. Tribunal de origem, descabe a alegação da recorrente de que houve omissão, nesse particular. O fato de a decisão ser contrária aos interesses da parte - ou mesmo de estar equivocada, ou não, o que será analisado a seguir - não autoriza afirmar a ocorrência de omissão e a consequente afronta ao art. 535, II, do CPC/1973.
8. Assim, não viola o art. 535 do CPC/1973 nem importa omissão o acórdão que adota, para a resolução da causa, fundamentação suficiente, porém diversa da pretendida pela recorrente.
9. O Enunciado n. 185 da III Jornada de Direito Civil do Conselho da Justiça Federal, no que concerne à interpretação atribuída ao art.
757 do Código Civil/2002, assenta que "a disciplina dos seguros do Código Civil e as normas da previdência privada que impõem a contratação exclusivamente por meio de entidades legalmente autorizadas não impedem a formação de grupos restritos de ajuda mútua, caracterizados pela autogestão".
10. A questão desta demanda é que, pela própria descrição contida no aresto impugnado, verifica-se que a recorrida não pode se qualificar como "grupo restrito de ajuda mútua", dadas as características de típico contrato de seguro, além de que o serviço intitulado de "proteção automotiva" é aberto a um grupo indiscriminado e indistinto de interessados, o que resulta em violação do dispositivo do art. 757 do Código Civil/2002, bem como dos arts. 24, 78 e 113 do Decreto-Lei n. 73/1966.
11. Aliás, tanto se trata de atividade que não encontra amparo na legislação atualmente vigente que a própria parte recorrida fez acostar aos autos diversos informes a título de projetos de lei que estariam tramitando no Poder Legislativo, a fim de alterar o art. 53 do Código Civil/2002, para permitir a atividade questionada neste feito. Ora, tratasse de ponto consolidado na legislação pátria, não haveria necessidade de qualquer alteração legislativa, a demonstrar que o produto veiculado e oferecido pela recorrida, por se constituir em atividade securitária, não possui amparo na liberdade associativa em geral e depende da intervenção reguladora a ser exercida pela recorrente.
12. Não se está afirmando que a requerida não possa se constituir em "grupo restrito de ajuda mútua", mas tal somente pode ocorrer se a parte se constituir em conformidade com o disposto no Decreto-Lei n. 2.063/1940 e legislação correlata, obedecidas às restrições que constam de tal diploma legal e nos termos estritos do Enunciado n. 185 da III Jornada de Direito Civil do Conselho da Justiça Federal.
13. Recurso especial interposto pela Confederação Nacional das Empresas de Seguros Gerais, Previdência Privada e Vida, Saúde Suplementar e Capitalização - CNSEG prejudicado. Recurso especial interposto pela Superintendência de Seguros Privados - SUSEP conhecido e provido."
(REsp 1616359/RJ, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEGUNDA TURMA, julgado em 21/06/2018, DJe 27/06/2018)

No mesmo sentido já se manifestou esta Corte, acerca da impossibilidade de funcionamento de associação civil com escopo de ofertar serviços de cobertura de riscos, próprios do ramo securitário, sem autorização prévia da SUSEP. Vejamos:


"CIVIL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. REMESSA OFICIAL. ASSOCIAÇÃO CIVIL. SEGURO PRIVADO DE AUTOMÓVEL. ILEGALIDADE. SUPERINTENDÊNCIA DE SEGUROS PRIVADOS - SUSEP. AUSÊNCIA DE PRÉVIA AUTORIZAÇÃO. ART. 24 DO DECRETO-LEI Nº 73/66. ART. 757 DO CÓDIGO CIVIL. RISCO AO MERCADO CONSUMERISTA. DANOS MORAIS COLETIVOS. NÃO VERIFICAÇÃO. DESPROVIMENTO.
1. Ação civil pública proposta por ente legitimado (SUSEP - Autarquia Federal) com o intuito de defesa do mercado consumerista (Lei 7.347/85, artigos 1º, II e 5º, IV).
2. Cinge-se a questão em averiguar se os serviços oferecidos pela associação-ré no denominado "Programa de Proteção do Patrimônio dos Associados", configuram atividades privativas de sociedades securitárias, sendo permitidas somente àquelas legalmente constituídas e autorizadas.
3. Nos termos do art. 757, caput e parágrafo único do Código Civil, no contrato de seguro, o segurador se obriga, mediante pagamento do prêmio, a garantir interesse legítimo do segurado, relativo a pessoa ou a coisa, contra riscos predeterminados, sendo que somente pode ser parte, no contrato de seguro, como segurador, entidade para tal fim legalmente autorizada.
4. O Decreto-lei 73 de 21.11.1966 prevê no seu art. 24 que poderão operar em seguros privados apenas sociedades anônimas ou cooperativas devidamente autorizadas; por sinal, essa prévia autorização é de atribuição da SUSEP, que também exerce as atividades fiscalizadoras do ramo (DL 73/66, artigos 35 e 36).
5. No caso dos autos, conforme largamente demonstrado pelos procedimentos administrativos e demais documentos colacionados, o serviço de proteção veicular oferecido pela ré no âmbito do "Programa de Proteção do Patrimônio" proporciona aos associados o pagamento de indenizações em caso de sinistro de automóveis, exigindo, como contraprestação, pagamento de "taxa de adesão".
6. Conquanto haja utilização de terminologias impróprias ou diferenciadas, a implementação do referido programa prevê, dentre outras, cláusulas de pagamento de franquia, realização de vistoria, inspeção de riscos e sinistros, descrição de riscos cobertos e não cobertos pela avença, bem como obrigações e direitos dos contratantes.
7. É certo, portanto, estar-se diante de programa cujo escopo é o oferecimento de cobertura de riscos automotivos ao mercado consumidor, atividade que, nos termos dos dispositivos legais supracitados, é típica e privativa de entidade seguradora.
8. Não sendo a ré uma entidade legalmente constituída e autorizada para a realização de atividades securitárias (bastando lembrar que se trata de uma associação civil), a manutenção de tal atuação consubstancia, além de concorrência desleal, cenário de potencial dano ao mercado consumidor, uma vez que as sociedades de seguro legalmente instituídas se submetem a rígido padrão de controle e fiscalização pelo Poder Público. Precedente.
9. A pretendida condenação por danos morais coletivos se mostra descabida no caso, pois não se demonstrou que a atividade da ré, embora desautorizada, causou sofrimentos, intranquilidade social e alterações relevantes na ordem extrapatrimonial coletiva, conforme exige a jurisprudência do C. Superior Tribunal de Justiça (REsp 1221756/RJ, Rel. Min. Massami Uyeda, 3ªT, DJe 10/02/2012; REsp 1291213/SC, Rel. Min. Sidnei Beneti, 3ªT, DJe 25/09/2012).
10. Nega-se provimento à remessa oficial."
(ReeNec nº 0016965-47.2012.4.03.6100, Rel. Des. Federal DIVA MALERBI, Sexta Turma, j. 07/06/2018, e-DJF3 Judicial 1 DATA:15/06/2018 - destaquei)

Assim considerando, dou provimento à apelação e à remessa oficial nos termos expostos.

É como voto.


MARLI FERREIRA
Desembargadora Federal


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
Signatário (a): MARLI MARQUES FERREIRA:24
Nº de Série do Certificado: 11DE18040360FF75
Data e Hora: 01/10/2019 18:29:40