Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 18/10/2019
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0001980-43.2012.4.03.6110/SP
2012.61.10.001980-0/SP
RELATOR : Desembargador Federal SOUZA RIBEIRO
APELANTE : Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuaria EMBRAPA
ADVOGADO : SP145112 SANTA FATIMA CANOVA GRANJA FALCAO e outro(a)
APELADO(A) : MARCIO MARCHESIN
ADVOGADO : SP223468 LUIZ FERNANDO FAMA e outro(a)
No. ORIG. : 00019804320124036110 3 Vr SOROCABA/SP

EMENTA

PROCESSO CIVIL. MONITÓRIA. EMBARGOS MONITÓRIOS. CONTRATO DE LICENCIAMENTO E MULTIPLICAÇÃO DE SEMENTES. INICIO DE PROVA MATERIAL. NOTA FISCAL ASSINADA POR TERCEIRO ESTRANHO AO CONTRATO. ARTIGO 1.102-A DO CPC/73 E 700 DO NCPC. NÃO COMPROVAÇÃO DA ENTREGA DAS SEMENTES. ÔNUS DO AUTOR. HONORÁRIOS RECURSAIS. APELAÇÃO NÃO PROVIDA.
1. A interposição de ação monitória para obtenção de pagamento de soma em dinheiro, entrega de coisa fungível ou de determinado bem móvel, depende apenas de prova escrita, nos termos do artigo 1.102-A do CPC/73, atual artigo 700 do novo CPC, sendo um dos intuitos da própria ação a constituição de título com estas características.
2. Na hipótese, o embargante requerido não reconhece a assinatura aposta na nota fiscal emitida em 23/02/2010, relativa à entrega de sementes de sorgo decorrente do contrato nº 25.200.10.0078-9.
3. A prova testemunhal corrobora com a tese trazida em sede de embargos monitórios de que as sementes não foram entregues à empresa ré, porquanto a pessoa que assinou a referida Nota Fiscal é estranha ao depoente (sócio do embargante/apelado) e ao contratante. Foi ainda declarado pela testemunha que as sementes fornecidas pela Embrapa só poderiam ser retiradas pela pessoa licenciada ou por pessoa autorizada por este, o que não restou demonstrado.
4. Não há documento hábil, assinado pelo réu, com autorização para que terceiros retirassem as referidas mercadorias.

5. Há entendimento jurisprudencial e doutrinário de que documento escrito que prove de forma razoável a obrigação é título hábil para cobrança. Todavia, nestes autos, embora haja o contrato escrito e assinado, este é suficiente apenas a indicar a probabilidade de existência do direito, mas é insuficiente à caracterização da materialização do débito. Isto porque a apelante não conseguiu demonstrar a efetiva entrega das sementes objeto do contrato.
6. Nos termos do artigo 333, I do CPC/73, atual 373, I, cabe ao autor comprovar os fatos constitutivos de seu direito, não tendo a apelante/embargada se desincumbindo de seu ônus, não há como imputar ao réu o débito relativo às sementes de sorgo, pois não há prova efetiva da entrega da mercadoria, nem prova da efetiva utilização ou multiplicação das referidas sementes.
7. Rechaçada a tese trazida pela apelante no sentido de que o pagamento dos royalties independe da comercialização das sementes, ao argumento de se tratar de contrato de licenciamento, posto que a discussão travada aqui diz respeito à não entrega da mercadoria, sendo despicienda qualquer discussão acerca da comercialização dos grãos.
8. Eventuais outros argumentos trazidos nos autos ficam superados e não são suficientes para modificar a conclusão baseada nos fundamentos ora expostos.
9. Majoração dos honorários advocatícios, nos termos do artigo 85, § 11º, do NCPC, devidos pela apelante, em 1% (um por cento) do valor da condenação, em favor do causídico da parte contrária.
10. Apelação da embargada desprovida.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação da Embrapa, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 08 de outubro de 2019.
SOUZA RIBEIRO
Desembargador Federal


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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0001980-43.2012.4.03.6110/SP
2012.61.10.001980-0/SP
RELATOR : Desembargador Federal SOUZA RIBEIRO
APELANTE : Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuaria EMBRAPA
ADVOGADO : SP145112 SANTA FATIMA CANOVA GRANJA FALCAO e outro(a)
APELADO(A) : MARCIO MARCHESIN
ADVOGADO : SP223468 LUIZ FERNANDO FAMA e outro(a)
No. ORIG. : 00019804320124036110 3 Vr SOROCABA/SP

RELATÓRIO

O Exmo. Sr. Desembargador Federal SOUZA RIBEIRO (Relator): Trata-se de apelação interposta por EMBRAPA-EMPRESA BRASILEIRA DE PESQUISA AGROPECUÁRIA, contra sentença proferida nos autos da ação monitória, promovida por esta, em face de MÁRCIO MARCHESIN, com o objetivo de converter em título executivo os contratos nº 25.200.10.0072-2, nº 25200.10.0073-0, nº 25200.10.0076-3, nº 25.200.10.0078-9, de licença para multiplicar e comercializar sementes de milho e sorgo.


A r. sentença julgou parcialmente procedente os Embargos Monitórios opostos, nos termos do art. 487, I, do Código de Processo Civil, para reconhecer o direito da autora aos créditos a serem apurados, correspondentes à impontualidade de pagamentos dos contratos nº 25.200.10.0072-2, nº 25200.10.0073-0, nº 25200.10.0076-3, com exclusão do contrato nº 25200.10.0078-9. Condenação do réu/embargante, em honorários advocatícios, arbitrados no percentual de 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, desde a sentença até a data do efetivo pagamento e condenação da autora/embargada a pagar ao advogado do réu/embargante no mesmo percentual, ambos nos termos do artigo 85, § 14, do NCPC e devidamente atualizados nos termos da Resolução CJF 267/2013. Custas ex lege, (fls. 161/170).


Em suas razões de apelação a EMBRAPA, postula pela procedência da ação monitória, também com relação ao contrato nº 25200.10.0078-9, por se tratar de contrato de licenciamento, independente de comercialização ou não das sementes, (fls. 173/188).


Com as contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.


É o relatório. Decido.



VOTO

O Exmo. Sr. Desembargador Federal SOUZA RIBEIRO (Relator):

O presente recurso não merece prosperar.


A interposição de ação monitória para obtenção de pagamento de soma em dinheiro, entrega de coisa fungível ou de determinado bem móvel, depende apenas de prova escrita, nos termos do artigo 1.102-A do CPC/73, atual artigo 700 do novo CPC, sendo um dos intuitos da própria ação a constituição de título com estas características.


Neste sentido:

RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO MONITÓRIA. INSTRUÇÃO DA INICIAL COM NOTAS FISCAIS E COMPROVANTES DE ENTREGA ASSINADOS. ADMISSIBILIDADE. COGNIÇÃO PLENA COM O OFERECIMENTO DOS EMBARGOS. - A nota fiscal, acompanhada do respectivo comprovante de entrega e recebimento da mercadoria ou do serviço, devidamente assinado pelo adquirente, pode servir de prova escrita para aparelhar a ação monitória. - O processo monitório possibilita a cognição plena, desde que sejam oferecidos embargos. Recurso especial conhecido e provido. (RESP - RECURSO ESPECIAL - 778852 2005.01.46102-7, NANCY ANDRIGHI, STJ - TERCEIRA TURMA, DJ DATA:04/09/2006 PG:00269 ..DTPB:.)

No entanto, no caso colocado em desate, o embargante requerido não reconhece a assinatura aposta na nota fiscal emitida em 23/02/2010, relativa à entrega de sementes de sorgo decorrente do contrato nº 25.200.10.0078-9.


Com efeito, compulsando os autos, em cotejo com a prova testemunhal e tudo o mais constante nos autos, verifica-se que, não obstante haver pacto de "Licenciamento para multiplicação e exploração comercial de sementes de Sorgo - cultivar BRS 802", devidamente assinado entre as partes, com previsão de pagamento de royalties por parte do apelado, não há prova efetiva da entrega das mercadorias.


Com efeito, na Nota Fiscal relativa à entrega das sementes de sorgo, não consta a assinatura do réu ou de seu sócio Rafael Ávila Pereira, ouvido como testemunha, sendo que a assinatura aposta no documento de fls. 85 é de terceiro estranho ao contrato.


Ademais, ao que se depreende das informações constantes do contrato, o local declinado para a produção das referidas sementes foi apontado como Fazenda Primavera do Leste - MT, sendo que o local da entrega constante na nota fiscal foi em Fazenda diversa, qual seja, Fazenda Três Rios - Rodovia SP 250, Km 13, em localidade distante, no Município de São Miguel Arcanjo - Estado de São Paulo.


Destarte, na Cláusula Terceira do contrato pactuado, há previsão de permissão à Embrapa de avaliação dos campos e fiscalização dos documentos de produção, bem como da comercialização das sementes da qual detinha a da patente, sendo, portanto, de fácil demonstração por parte da apelante da efetiva entrega, bastando para tanto trazer dados da referida inspeção, com o croqui da localização da área de plantação do sorgo, sendo que nada foi trazido neste sentido, (fl.34).


A prova testemunhal corrobora com a tese trazida em sede de embargos monitórios de que as sementes não foram entregues à empresa ré, porquanto a pessoa que assinou a referida Nota Fiscal (Luis Otávio) é estranha ao depoente (sócio do embargante/apelado) e ao contratante. Foi declarado pela testemunha que as sementes fornecidas pela Embrapa só poderiam ser retiradas pela pessoa licenciada ou por pessoa autorizada por este, (fl. 123).


Na hipótese, a apelante não apresentou aos autos documento hábil, assinado pelo réu, com autorização para que terceiros retirassem as referidas mercadorias.


Há entendimento jurisprudencial e doutrinário de que documento escrito que prove de forma razoável a obrigação é título hábil para cobrança. Todavia, nestes autos, embora haja o contrato escrito e assinado, este é suficiente apenas a indicar a probabilidade de existência do direito, mas é insuficiente à caracterização da materialização do débito. Isto porque a apelante não conseguiu demonstrar a efetiva entrega das sementes objeto do contrato, razão pela qual correta a decisão do juízo a quo em excluir do total da dívida a quantia relativa ao contrato nº 25.200.10.0078-9.


Neste sentido, em casos similares:


AÇÃO MONITÓRIA. DUPLICATA SEM ACEITE, ACOMPANHADA DA NOTA FISCAL E DO INSTRUMENTO DE PROTESTO. COMPROVANTE DA ENTREGA DA MERCADORIA, PORÉM, A TERCEIRO. ACÓRDÃO QUE, APRECIANDO O MERITUM CAUSAE EXCLUI DA DÍVIDA A QUANTIA CORRESPONDENTE A ESSA DUPLICATA. INEXISTÊNCIA NO CASO DE AFRONTA AO ART. 1.102a, DO CPC. Não há ofensa ao art. 1.102a, do Código de Processo Civil quando o julgador, apreciando o mérito da ação monitória, exclui parte da dívida ajuizada por considerar que a ré embargante não é a devedora da quantia correspondente à duplicata em questão, e sim um terceiro. Recurso especial não conhecido. ..EMEN:
(RESP - RECURSO ESPECIAL - 494123 2002.01.68995-2, BARROS MONTEIRO, STJ - QUARTA TURMA, DJ DATA:27/06/2005 PG:00398 RSTJ VOL.:00202 PG:00350 ..DTPB:.)
PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO MONITÓRIA. PROVA PRÉ-CONSTITUÍDA. INSUFICIÊNCIA. EXTINÇÃO DO FEITO. ART. 267, I, DO CPC. 1. A sentença apelada indeferiu a petição inicial e extinguiu o processo sem resolução de mérito com fundamento no art. 267, inciso I, do CPC. O provimento jurisdicional de primeira instância considerou os documentos insuficientes para formar a idoneidade e plausibilidade mínima do crédito pleiteado em face do demandado, aptas a justificar a Ação Monitória. 2. Sabe-se que a ação monitória foi introduzida no Código de Processo Civil, com vistas a dar uma maior efetividade aos processos, nos quais, apesar de não ter um titulo executivo, o credor apresenta prova da existência da dívida e da obrigação contraída pelo devedor. 3. Desse modo, além dos requisitos estipulados pelos artigos 282 e 283, do CPC, a petição inicial da ação monitória deve ser instruída com provas da existência de uma relação creditícia entre as partes. O Código de Processo Civil estabelece que o instrumento deva ser escrito, mas não restringe quais são os documentos hábeis a atestar a existência da dívida e instruir a ação monitória. 4. O Superior Tribunal de Justiça reconhece que "A prova hábil a instruir a ação monitória, a que alude o artigo 1.102-A do CPC, não precisa, necessariamente, ser robusta, podendo vir aparelhada por documento idôneo, ainda que emitido pelo próprio credor, contanto que, por meio do prudente exame do magistrado, exsurja o juízo de probabilidade acerca do direito afirmado" (AgRg no AREsp 349071 / SE, Rel.: Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, DJe 01/06/2015) (grifo nosso). 5. Na análise dos documentos que instruem a inicial da Ação Monitória, o magistrado deve exercer um juízo razoável de plausibilidade. Na verdade, o documento escrito a que se refere o legislador não precisa ser obrigatoriamente emanado do devedor, sendo suficiente, para a admissibilidade da ação monitória, a prova escrita que revele razoavelmente a existência da obrigação. Precedente: (STJ, RESP 200500462561, Luiz Fux, Primeira Turma, DJ: 23/08/2007) 6. Compulsando os autos, verifica-se que, apesar de a apelante haver anexado notas fiscais e os respectivos comprovantes de entrega de materiais, não restou consignado em nenhum dos documentos uma comprovação mínima de que o ente apelado tomou conhecimento das entregas de materiais que originaram a alegada dívida vindicada. Não há, portanto, indícios de constituição de dívida. 7. Sentença que deve ser mantida por não restar devidamente instruída a inicial. 8. Apelação improvida.
(AC - Apelação Civel - 0800080-11.2014.4.05.8003, Desembargador Federal Manoel Erhardt, TRF5 - Primeira Turma.)

Nos termos do artigo 333, I do CPC/73, atual 373, I, cabe ao autor comprovar os fatos constitutivos de seu direito, não tendo a apelante/embargada se desincumbindo de seu ônus, não há como imputar ao réu o débito relativo às sementes de sorgo, pois não há prova efetiva da entrega da mercadoria, nem prova da efetiva utilização ou multiplicação das referidas sementes.


Rechaço a tese trazida pela apelante no sentido de que o pagamento dos royalties independe da comercialização das sementes, ao argumento de se tratar de contrato de licenciamento, posto que a discussão travada aqui diz respeito à não entrega da mercadoria, sendo despicienda qualquer discussão acerca da comercialização dos grãos.


Por fim, anoto que eventuais outros argumentos trazidos nos autos ficam superados e não são suficientes para modificar a conclusão baseada nos fundamentos ora expostos.


Nos termos do artigo 85, § 11º, do NCPC, majoro os honorários advocatícios devidos pela apelante, em 1% (um por cento) do valor da condenação, em favor do causídico da parte contrária.


Ante o exposto, nego provimento à apelação da Embrapa, mantendo na íntegra a r. sentença de 1º grau de jurisdição.


É como voto.


SOUZA RIBEIRO
Desembargador Federal


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
Signatário (a): LUIZ ALBERTO DE SOUZA RIBEIRO:10073
Nº de Série do Certificado: 11DE190723530485
Data e Hora: 09/10/2019 13:55:00