Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 14/02/2020
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0001749-09.2015.4.03.6143/SP
2015.61.43.001749-6/SP
RELATOR : Desembargador Federal JOSÉ LUNARDELLI
APELANTE : Justica Publica
APELANTE : GUILHERME MARCO LEO
ADVOGADO : SP196109 RODRIGO CORREA GODOY e outro(a)
APELADO(A) : Justica Publica
APELADO(A) : GUILHERME MARCO LEO
ADVOGADO : SP196109 RODRIGO CORREA GODOY
CO-REU : DANIEL FERNANDO FURLAN LEITE
: LEANDRO FURLAN
: MATHEUS FAHL VIEIRA
: LEONARDO GUSTAVO LOPES
: DANILO SANTOS DE OLIVEIRA
: GLAUCIO ROGERIO ONISHI SERINOLI
: JULIANO STORER
: RODRIGO FELICIO
: JOAO GRANDE JUNIOR
No. ORIG. : 00017490920154036143 1 Vr LIMEIRA/SP

EMENTA

PENAL. PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO INTERNACIONAL DE DROGAS. ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. CITRA PETITA. NULIDADE. SENTENÇA ANULADA.
1. Ao réu foram imputados 04 crimes, agrupados em 03 eventos delitivos: Fato 01 - (organização criminosa - art 2°, §§2° e 4°, IV e V da Lei n° 12.850/2013). Fato 02 - (DOIS CRIMES: associação para o tráfico e tráfico transnacional de drogas - art. 33 e 35, c/c 40, I e V da Lei n° 11.343/2006). Fato 03 - denunciado por associação para o tráfico e tráfico transnacional de drogas - art. 33 e 35, c/c 40, I e V da Lei n° 11.343/2006, respondendo nestes autos somente pela associação para o tráfico, pois fora julgado e condenado pelo tráfico transnacional de entorpecentes em outros autos.
2. O magistrado "a quo" fundamentou sua sentença considerando que restaram provadas a materialidade "dos três delitos imputados ao acusado (organização criminosa e dois delitos de associação para o tráfico de drogas)" e, ao final, julgou parcialmente procedente a pretensão punitiva e condenou o acusado à pena privativa de liberdade de 07 anos de reclusão, em regime semiaberto, e 1.633 dias-multa, pela prática dos crimes previstos nos arts.35 c/c art.40, inciso I, ambos da Lei nº.11.343/06, por duas vezes, na forma do art.69 do CP, bem como declarou a inépcia da denúncia relativamente à imputação de integração de organização criminosa prevista no art.2º, §4º, incisos IV e V, da Lei nº.12.850/2013.
3. O crime de tráfico transnacional de entorpecentes descrito no Fato nº 02 (apreensão de 7,7 toneladas de maconha e 500kgs de cocaína, no dia 18/06/2013, em Bocaina/SP) não foi analisado pelo juízo de primeiro grau, apesar de ter sido expressamente imputado na denúncia 15v/19 e fl.26v e reiterado nos memoriais finais do MPF com requerimento expresso de sua condenação para "o fim de condenar o réu GUILHERME MARCO LEO, como incurso nos artigos 35, 33 e 40, I e V, da Lei nº.11.343/2006, e no artigo 2º, §2º e 4º, IV e V, da Lei 12.850/2013", conforme fls.1118. Em decorrência, a sentença restou citra petita, pois julgou aquém do pedido inicial, isto é, não analisou integralmente a pretensão punitiva deduzida em Juízo.
4. A apreciação judicial da autoria de um fato expressamente imputado na denúncia é requisito essencial na sentença e sua ausência configura nulidade insanável que não é passível de convalidação, pois não contém os requisitos básicos da sentença penal, conforme dicção dos art.381, incisos II e III, e art.564, inciso III, alínea "m" e inciso IV, do CPP.
5. A sentença deve ser integralmente anulada, com o retorno dos autos à origem para a prolação de outra.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, acolher a preliminar suscitada na apelação da acusação, para anular a sentença e determinar o retorno dos autos à primeira instância, para que outra seja proferida e dar por prejudicada a apelação da defesa de GUILHERME MARCO LEO, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 30 de janeiro de 2020.
JOSÉ LUNARDELLI
Desembargador Federal


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0001749-09.2015.4.03.6143/SP
2015.61.43.001749-6/SP
RELATOR : Desembargador Federal JOSÉ LUNARDELLI
APELANTE : Justica Publica
APELANTE : GUILHERME MARCO LEO
ADVOGADO : SP196109 RODRIGO CORREA GODOY e outro(a)
APELADO(A) : Justica Publica
APELADO(A) : GUILHERME MARCO LEO
ADVOGADO : SP196109 RODRIGO CORREA GODOY
CO-REU : DANIEL FERNANDO FURLAN LEITE
: LEANDRO FURLAN
: MATHEUS FAHL VIEIRA
: LEONARDO GUSTAVO LOPES
: DANILO SANTOS DE OLIVEIRA
: GLAUCIO ROGERIO ONISHI SERINOLI
: JULIANO STORER
: RODRIGO FELICIO
: JOAO GRANDE JUNIOR
No. ORIG. : 00017490920154036143 1 Vr LIMEIRA/SP

RELATÓRIO

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI:

Trata-se de apelações criminais interpostas pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e pelo Réu GUILHERME MARCO LEO em face da r. sentença de fls.1256/1282v, a qual julgou parcialmente procedente a pretensão punitiva e condenou o acusado à pena privativa de liberdade de 07 anos de reclusão, em regime semiaberto, e 1.633 dias-multa, pela prática dos crimes previstos nos arts.35 c/c art.40, inciso I, ambos da Lei nº.11.343/06, por duas vezes, na forma do art.69 do CP, bem como declarou a inépcia da denúncia relativamente à imputação de integração de organização criminosa prevista no art.2º, §4º, incisos IV e V, da Lei nº.12.850/2013.

O presente processo resulta de desmembramento dos autos nº 0001091-19.2014.403.6143 e aqui o réu é apenas GUILHERME MARCO LEO.

Segundo a denúncia, ocorreram os seguintes fatos:

Fato 01 (organização criminosa - art 2°, §§2° e 4°, IV e V da Lei n° 12.850/2013). Consta dos autos que DANIEL FERNANDO FURLAN LEITE, LEANDRO FURLAN, LEONARDO GUSTAVO LOPES, MATHEUS FAHL VIEIRA, GLÁUCIO ROGÉRIO ONISHI SERINOLI, GUILHERME MARCO LEO e JULIANO STORER compõem organização criminosa voltada notadamente ao tráfico internacional de drogas, pois, ao menos entre janeiro/2014 a abril/2014, em Piracicaba/SP, se associaram, com estabilidade, permanência e divisão de tarefas, com o intuito de obterem vantagem patrimonial indevida, mediante a perpetração de graves infrações penais, tais como o tráfico internacional de drogas, mediante o uso de armas de fogo, razão pela qual estavam incursos nas penas do art.2º, §4º, incisos IV e V, da Lei nº.12.850/2013, sendo as funções dos acusados distribuídas da seguinte forma:

a) DANIEL FERNANDO FURLAN LEITE era o líder desta ORCRIM, pois, liderando a guarda, venda e transporte de grandes quantidades de drogas, as quais eram revendidas para traficantes do interior paulista, bem como o uso de armas de fogo e ameaças a pessoas;

b) LEANDRO FURLAN era o gerente, "braço direito" de Daniel, executando suas ordens de guarda e distribuição do entorpecente comercializado, bem como a contabilidade de tráfico de drogas;

c) LEONARDO GUSTAVO LOPES exercia a função de guarda e distribuição das drogas comercializadas por Daniel;

d) MATHEUS FAHL VIEIRA tinha a incumbência de guardar e comercializar drogas variadas e armas de fogo, sendo que usava seu lava jato chamado Pit Stop, estabelecido Piracicaba/SP;

e) DANILO SANTOS DE OLIVEIRA exercia a função de motorista (boy), transportando drogas e dinheiro a mando de Daniel;

f) GLAUCIO ROGERIO ONISHI SERINOLI recebia as ordens do grupo criminoso e as praticava na guarda no intuito de guardar drogas e exercer a contabilidade da traficância;

g) JULIANO STORER integrava a ORCRIM preparando veículos para o transporte de drogas;

h) GUILHERME MARCO LEO exercia funções logísticas no interesse da ORCRIM, seja cuidando dos veículos para o transporte de drogas, seja a guarda dos entorpecentes na sua empresa Sondágua, em Piracicaba/SP.

Fato 02 (associação para o tráfico e tráfico transnacional de drogas - art. 33 e 35, c/c 40, I e V da Lei n° 11.343/2006). A denúncia dá conta de que DANIEL FERNANDO FURLAN LEITE, RODRIGO FELÍCIO, GUILHERME MARCO LEO e JULIANO STORER associaram-se para adquirir e transportar 7.710 quilos de maconha e 500 quilos de cocaína, que foram apreendidos em 17/06/2013, em Bocaina-SP. Os entorpecentes estavam embalados em forma de tabletes e acondicionados em grandes caixas de som.

Fato 03 (associação para o tráfico e tráfico transnacional de drogas - art. 33 e 35, c/c 40, I e V da Lei n° 11.343/2006). O terceiro fato narrado na denúncia refere-se à associação de DANIEL FERNANDO FURLAN LEITE e GUILHERME MARCO LEO na aquisição, transporte e guarda de 1.780 quilos de maconha oriunda do Paraguai e apreendidos em 28/09/2014, nas instalações da empresa Sondágua, em Piracicaba.

Fato 04 (tráfico de drogas - art. 33 da Lei n° 11.343/2006). O MPF alega que DANIEL FERNANDO FURLAN LEITE é responsável pelo tráfico de drogas apreendidas em poder de Matheus Fahl Vieira e a esposa em 25/02/2014, em Piracicaba. DANIEL, em mensagens interceptadas pela Polícia Federal, teria comentado a apreensão e a perda da droga juntamente com armas, prensa, dinheiro e telefones.

Fato 05 (associação para o tráfico e tráfico transnacional de drogas art. 33 e 35, c/c 40, I e V da Lei n° 11.343/2006). Refere-se à associação de RODRIGO FELÍCIO, DANIEL FERNANDO FURLAN LEITE, LEANDRO FURLAN e JOÃO GRANDE JÚNIOR para o tráfico de 16 quilos de cocaína, que foram apreendidos em 26/03/2014, em Sorocaba.

Houve aditamento da denúncia às fls. 29/30.

A denúncia foi recebida em 11/06/2014 (fl. 31).

Às fls. 298/306 houve o desmembramento da ação, restando o presente processo a tratar apenas dos fatos do ora apelante.

Regularmente processado o feito, sobreveio a sentença de fls.1526/1282v, que julgou parcialmente procedente a pretensão punitiva e condenou o réu GUILHERME MARCO LEO à pena de 07 anos de reclusão, em regime semiaberto, e pagamento de 1.633 dias-multa, pela prática dos crimes previstos nos arts.35 c/c art.40, inciso I, ambos da Lei nº.11.343/06, por duas vezes, na forma do art.69 do CP, bem como declarou a inépcia da denúncia pela ausência de descrição suficiente da autoria de GUILHERME com relação à conduta prevista no art.2º, §4º, IV e V, da Lei nº.12.850/2013.

Sentença publicada em Secretaria no dia 01/10/2018 (fl. 1.283).

A acusação apelou (fl. 1.289) e em suas razões (fls. 1.309/1.321) pede a anulação da sentença em razão de ter não ter sido apreciada a imputação de tráfico internacional de drogas (art.33 c/c art.40, I, da Lei nº.11.343/06) relativamente ao Fato nº.02, ou, caso assim não se entenda, requer a reforma para que o réu seja condenado pela prática desse crime, eis que provadas a materialidade, autoria e dolo delitivos. Pediu, ainda, a reforma da sentença para que o réu seja condenado pelo Fato nº.01 (organização criminosa), sustentando que, além da exordial acusatória ter descrito cabalmente a conduta, há provas da materialidade, autoria e dolo delitivos, e, ainda, pela reforma da sentença para que GUILHERME MARCO LEO seja condenado pelos dois delitos de associação criminosa, ou para que as penas-base sejam aumentadas no máximo legal em razão da grande periculosidade do apelado e enorme quantidade de entorpecentes, conforme razões de fls.1309/1321.

A defesa de GUILHERME MARCO LEO também apelou, requerendo a anulação do processo por ilicitude da interceptação telefônica, em razão de: a.1) ausência da indispensável cooperação jurídica internacional entre Brasil e Canadá, pois, sendo a empresa RIM domiciliada neste País estrangeiro, deveria ter sido seguido o trâmite previsto no Decreto nº.6.747/2009, que rege os pedidos de cooperação jurídica internacional entre Brasil e Canadá; a.2) inexistência de demonstração de que interceptação telemática não extrapolou o prazo legal de 15 dias entre cada período de monitoramento, devendo ser expedidos ofícios às operadoras de telefonia com tal indagação; a.3) quebra da cadeia de custódia de provas, pois a PF pode ter editado os diálogos BBM, pois foram apresentados no formato HDML, que é editável pelas forças policiais. Caso assim não se entenda, pugnou pela reforma da sentença a fim de ser absolvido do delito de associação para o tráfico de drogas, referente ao Fato nº.02, pois, além de não haver prova da estabilidade e permanência aos demais agentes, também não existe prova da participação do réu, eis que não haveria qualquer ligação concreta, alegando que o acusado não é o GORDECO mencionado nas mensagens BBM. Pediu, ainda, a absolvição do delito de associação para o tráfico imputado no Fato nº.03, pois não há provas da sua participação e estabilidade a demais corréus. Caso mantida a condenação, na dosimetria da pena, requereu a exclusão de uma condenação dos delitos de associação criminosa, pois são crimes permanentes e a sua dupla configuração traduz-se em odioso bis in idem, ou, caso assim não se entenda, que seja aplicada a continuidade delitiva, ao invés do concurso material de crimes, conforme razões de fls. 1.399/1.388.

Em contrarrazões, a defesa de GUILHERME MARCO LEO pugnou pelo não conhecimento parcial da apelação da acusação, relativamente ao Fato nº.01, pois, como a sentença declarou a inépcia da denúncia, deveria ter sido atacada via recurso em sentido estrito, na forma do art.581, inciso I, do CPP, sendo inadequada a apelação criminal. Quanto ao pleito recursal do Ministério Público Federal, consistente na condenação do réu pelos dois delitos de associação criminosa, pediu não seja conhecido por falta de interesse de recursal, pois o acusado já foi condenado por ambos os delitos, conforme fls.1332/1338.

A acusação ofereceu contrarrazões pugnando pelo desprovimento do apelo defensivo, conforme fls.1399/1411.

Nesta Corte, a Procuradoria Regional da República, em seu parecer (fls. 1.416/1.433v), opina pelo desprovimento do apelo defensivo, no que tange a preliminar de nulidade da interceptação telefônica, bem como pelo integral conhecimento e provimento do apelo ministerial a fim de anular a sentença, por ser citra petita, com remessa dos autos à origem para a prolação de novo ato judicial completo, com o prejuízo dos demais temas ventilados pelas partes, conforme fundamentação supra. Contudo, caso assim não se entenda, requereu nova vista para apresentação da sua opinião acerca dos demais temas ventilados nos autos.

É o relatório.

À revisão.


JOSÉ LUNARDELLI
Desembargador Federal


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0001749-09.2015.4.03.6143/SP
2015.61.43.001749-6/SP
RELATOR : Desembargador Federal JOSÉ LUNARDELLI
APELANTE : Justica Publica
APELANTE : GUILHERME MARCO LEO
ADVOGADO : SP196109 RODRIGO CORREA GODOY e outro(a)
APELADO(A) : Justica Publica
APELADO(A) : GUILHERME MARCO LEO
ADVOGADO : SP196109 RODRIGO CORREA GODOY
CO-REU : DANIEL FERNANDO FURLAN LEITE
: LEANDRO FURLAN
: MATHEUS FAHL VIEIRA
: LEONARDO GUSTAVO LOPES
: DANILO SANTOS DE OLIVEIRA
: GLAUCIO ROGERIO ONISHI SERINOLI
: JULIANO STORER
: RODRIGO FELICIO
: JOAO GRANDE JUNIOR
No. ORIG. : 00017490920154036143 1 Vr LIMEIRA/SP

VOTO

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI:


Preliminarmente, requer o MPF a anulação da sentença, em razão de ter não ter apreciado a imputação de tráfico internacional de drogas (art.33 c/c art.40, I, da Lei nº.11.343/06) relativamente ao Fato nº 02.

Como consta do relatório, ao réu foram imputados 04 crimes, agrupados em 03 eventos delitivos:

Fato 01 - (organização criminosa - art 2°, §§2° e 4°, IV e V da Lei n° 12.850/2013). Consta dos autos que DANIEL FERNANDO FURLAN LEITE, LEANDRO FURLAN, LEONARDO GUSTAVO LOPES, MATHEUS FAHL VIEIRA, GLÁUCIO ROGÉRIO ONISHI SERINOLI, GUILHERME MARCO LEO e JULIANO STORER compõem organização criminosa voltada notadamente ao tráfico internacional de drogas;

Fato 02 - (DOIS CRIMES: associação para o tráfico e tráfico transnacional de drogas - art. 33 e 35, c/c 40, I e V da Lei n° 11.343/2006). A denúncia dá conta de que DANIEL FERNANDO FURLAN LEITE, RODRIGO FELÍCIO, GUILHERME MARCO LEO e JULIANO STORER associaram-se para adquirir e transportar 7.710 quilos de maconha e 500 quilos de cocaína, que foram apreendidos em 17/06/2013, em Bocaina-SP.

Fato 03 - Quanto ao fato 03, o réu foi denunciado por associação para o tráfico e tráfico transnacional de drogas - art. 33 e 35, c/c 40, I e V da Lei n° 11.343/2006. Segundo a inicial, houve a associação de DANIEL FERNANDO FURLAN LEITE e GUILHERME MARCO LEO na aquisição, transporte e guarda de 1.780 quilos de maconha oriunda do Paraguai e apreendidos em 28/09/2014, nas instalações da empresa Sondágua, em Piracicaba.

Destaco que, relativamente ao tráfico transnacional de entorpecentes descrito no Fato 3, Guilherme Marco Leo foi condenado nesta Corte, na apelação criminal n° 0000585-48.2014.4.03.6109/SP. Naquela ação, a denúncia foi parcialmente recebida apenas com relação ao delito do art. 33 c/c art.40, I, da Lei nº 11.343/06, sendo rejeitada com relação à imputação do art. 35 da Lei de Drogas por falta de justa causa. Neste Tribunal, Guilherme restou condenado a 9 (nove) anos, 8 (oito) meses e 20 (vinte) dias, e 971 (novecentos e setenta e um) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo, vigente na data dos fatos, pela prática do crime previsto no art. 33 c/c art.40, I, ambos da Lei nº.11.343/06.

Retornando a estes autos, integralmente recebida a denúncia e seu aditamento em 05/06/2014 (fls.31), e desmembrado o processo originário nº 0001091-19.2014.4.03.6143, com relação ao réu GUILHERME MARCO LEO (fls.299/307), sobreveio a prolação da sentença de fls.1526/1282v, que julgou parcialmente procedente a pretensão punitiva e condenou GUILHERME à pena definitiva de 07 anos de reclusão, em regime semiaberto, e ao pagamento de 1.633 dias-multa, pela prática dos crimes previstos nos arts.35 c/c art.40, inciso I, ambos da Lei nº.11.343/06, por duas vezes, na forma do art.69 do CP, bem como declarou a inépcia da denúncia pela ausência de descrição suficiente da autoria de GUILHERME com relação ao crime tipificado no art.2º, §4º, IV e V, da Lei nº.12.850/2013.

Pois bem, o magistrado "a quo" fundamentou sua sentença considerando que restaram provadas a materialidade "dos três delitos imputados ao acusado (organização criminosa e dois delitos de associação para o tráfico de drogas)", conforme último parágrafo de fls.1274, tendo concluído assertivamente, ainda, pela transnacionalidade das condutas, conforme fls.1274v/1278.

Na sequência, passou a examinar a autoria "dos três delitos" (quarto parágrafo de fls.1278), tendo iniciado pela "associação para o tráfico de 1.780 kg de maconha apreendidos na Sondágua" (último parágrafo de fls.1278, com grifos do original).

Em seguida, passou a analisar a autoria "Quanto à associação para o tráfico das drogas que foram apreendidas em Bocaina" (segundo parágrafo de fls.1279v, com grifos do original).

Na sequência, seguiu para a análise da autoria "Quanto ao crime de organização criminosa" (quarto parágrafo de fls.1280), delito para o qual entendeu presente a inépcia da denúncia pela ausência de descrição suficiente da conduta de GUILHERME MARCO LEO na integração da ORCRIM chefiada por Daniel Fernando Furlan Leite, conforme fls.1280/1280.

Após a fundamentação, o Juízo "a quo" concluiu: "À vista desse quadro, a autoria resta inconteste em relação às duas associações para o tráfico" (penúltimo parágrafo de fls.1281), tendo finalizado com o seguinte dispositivo:

"Posto isso, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados na denúncia, para condenar GUILHERME MARCO LEO, qualificado nos autos, nas penas do art.35 c/c art.40, I, da Lei 11.343/06 e c/c art. 69 do Código Penal.
(...)
À vista de tais diretrizes, e considerando que o artigo 42 da Lei de Drogas considera preponderantes, dentre outras, a quantidade de entorpecentes e a conduta social do agente, fixo a pena-base no mínimo legal para cada crime de associação para o tráfico, resultando numa soma de 6 anos de reclusão e 1.400 dias-multa no valor unitário equivalente a 1/10 do salário mínimo vigente ao tempo do fato delituoso, considerando a existência de patrimônio em nome do réu (os imóveis sequestrados)" (fls.1282, grifos do original).

Verifica-se, portanto, que o crime de tráfico transnacional de entorpecentes descrito no Fato nº 02 (apreensão de 7,7 toneladas de maconha e 500kgs de cocaína, no dia 18/06/2013, em Bocaina/SP) não foi analisado pelo juízo de primeiro grau, apesar de ter sido expressamente imputado na denúncia 15v/19 e fl.26v e reiterado nos memoriais finais do MPF com requerimento expresso de sua condenação para "o fim de condenar o réu GUILHERME MARCO LEO, como incurso nos artigos 35, 33 e 40, I e V, da Lei nº.11.343/2006, e no artigo 2º, §2º e 4º, IV e V, da Lei 12.850/2013", conforme fls.1118.

Em decorrência, a sentença restou citra petita, pois julgou aquém do pedido inicial, isto é, não analisou integralmente a pretensão punitiva deduzida em Juízo.

A apreciação judicial da autoria de um fato expressamente imputado na denúncia é requisito essencial na sentença e sua ausência configura nulidade insanável que não é passível de convalidação, pois não contém os requisitos básicos da sentença penal, conforme dicção dos art.381, incisos II e III, e art.564, inciso III, alínea "m" e inciso IV, do CPP, abaixo transcritos, verbis:

"Art. 381. A sentença conterá:
II - a exposição sucinta da acusação e da defesa;
III - a indicação dos motivos de fato e de direito em que se fundar a decisão;
Art. 564. A nulidade ocorrerá nos seguintes casos:
III - por falta das fórmulas ou dos termos seguintes:
m) a sentença;
IV - por omissão de formalidade que constitua elemento essencial do ato."

Em decorrência, a sentença deve ser integralmente anulada, com o retorno dos autos à origem para a prolação de outra.

Nesse sentido:

"PENAL. PROCESSUAL PENA. SENTENÇA CITRA PETITA. NULIDADE. RETORNO DOS AUTOS À VARA DE ORIGEM.
1. A sentença é citra petita, pois o Juízo a quo não apreciou a pretensão punitiva quanto ao crime de resistência. Considero inadmissível a decretação de nulidade apenas parcial da sentença, pois as condutas delitivas imputadas ao réu teriam ocorrido por ocasião de um mesmo contexto fático, cumprindo, portanto, a apreciação conjunta das provas. Assim, deve ser declarada a nulidade integral da sentença, para que o órgão jurisdicional de primeiro grau tenha a oportunidade de apreciar integralmente a demanda.
2. Declarada, de ofício, a nulidade da sentença e determinado o retorno dos autos à Vara de origem para prolação de nova sentença. Prejudicada a apelação da acusação." (ApCrim nº.78.546/SP, TRF3, 5ª Turma, Desembargador Federal Relator André Nekatschalow, julgado em 19/08/2019).
PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO. ESTELIONATO CONTRA PARTICULAR EM CONCURSO MATERIAL COM USO DE DOCUMENTO FALSO PERANTE AUTÁRQUIA FEDERAL. SENTENÇA CITRA-PETITA. NULIDADE RECONHECIDA DE OFÍCIO. DEMAIS ALEGAÇÕES PREJUDICADAS.
1. A denúncia de fls. 2/4 imputa aos acusados as condutas tipificadas nos art. 171, "caput", e no art. 304, em concurso material, nos termos do art. 69, todos do Código Penal brasileiro - CP.
2. Observe-se que a primeira conduta imputada aos acusados decorreu do fato de ambos, mediante fraude, terem ludibriado segurado da previdência social, apresentando-se como "despachantes" junto ao órgão previdenciário respectivo, a fim de providenciar certidão de aposentadoria por tempo de serviço, para tanto tendo auferido vantagem ilícita obtida diretamente da vítima.
3. No que tange à imputação de uso de documentos falso, narrou o órgão de acusação que os réus praticaram-no contra a autarquia previdenciária, na medida que, a fito de obterem certidão de tempo de serviço, empregaram documento materialmente falsificado.
4. Esse preâmbulo é indispensável, na medida em que a decisão que recebe a denúncia não faz nenhuma ressalva (fls. 152/153), admitindo a imputação contra os acusados tanto no tocante ao estelionato contra particular quanto acerca do uso de documento falso perante a autarquia federal.
5. Não obstante o teor da denúncia, a sentença condenatória de fls. 581/587 não decide sobre a conduta tipificada no artigo 304 do CP, isto é, não a julga subsumida na estrutura do delito do art. 171, "caput", do CP, não inocenta os acusados acerca daquela imputação e nem tampouco os condena no fato típico do uso de documento falso, nada consignando no dispositivo do decisum acerca deste crime, sendo, por óbvio, citra-petita e, logo, nula.
6. Mesmo não tendo os recurso da acusação e da defesa impugnado especificamente esse ponto, a matéria pode ser qualificada como de ordem pública, sendo devolvida à cognição desse órgão jurisdicional, por força do efeito translativo de recurso de apelação criminal.
7. Logo, torna-se imprescindível conhecer ex officio da nulidade.
8. Há uma objetividade e autonomia relativas entre as condutas de estelionato contra particular e uso de documento falso contra a autarquia federal, as quais não podem ser desprezadas e que demandam, sobre todos os aspectos, a apreciação do juízo a quo, em cognição exauriente, de toda a extensão e complexidade do conjunto probatório carreado aos autos pela acusação.
9. A ofensa a interesse da autarquia federal e as imbricações entre as condutas de estelionato e uso de documento falso não podem ser afastados sem que o juízo a quo avalie a conexão entre as ações e dimane, mediante fundamentação idônea, quais os reflexos de uma e de outra, de modo a atrair a competência da Justiça Federal, nos moldes do artigo 109, IV, da Constituição Federal.
10. Ficam prejudicadas as demais alegações deduzidas em ambas as razões recursais.
11. Declarada, ex officio, a nulidade da sentença." (Ap 17.463/SP, TRF3, 5 ª Turma, Juiz Federal Convocado Relator Hélio Nogueira, julgado em 06/11/2009).

Por todo o exposto, ACOLHO A PRELIMINAR suscitada na apelação da acusação, para anular a sentença e determinar o retorno dos autos à primeira instância, para que outra seja proferida e DOU POR PREJUDICADA a apelação da defesa de GUILHERME MARCO LEO.



É o voto.




JOSÉ LUNARDELLI
Desembargador Federal


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