D.E. Publicado em 16/07/2021 |
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EMENTA
PENAL. PROCESSUAL PENAL. ART. 297 DO CÓDIGO PENAL. FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO PÚBLICO. USO DE DOCUMENTO FALSO. ART. 297 C.C. ART. 304, AMBOS DO CÓDIGO PENAL. EMENDATIO LIBELLI POSSÍVEL, MESMO EM SEGUNDA INSTÂNCIA. AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS. ELEMENTO SUBJETIVO NÃO COMPROVADO. ABSOLVIÇÃO. IN DUBIO PRO REO. DELITO REMANESCENTE. ART. 38-A DA LEI DE CRIMES AMBIENTAIS. CRIME DE MENOR POTENCIAL OFENSIVO. PROPOSTA DE SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO. ART. 89 DA LEI 9.099/1995. CONVERSÃO EM DILIGÊNCIAS. REMESSA AO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL.
- Mostra-se imperioso rememorar ser possível (porque contemplada a hipótese pelo ordenamento jurídico pátrio) a adequação da capitulação jurídica do fato narrado na denúncia ao tipo penal pertinente mediante a aplicação do instituto da emendatio libelli, cuja previsão encontra-se no art. 383 do Código de Processo Penal (O juiz, sem modificar a descrição do fato contida na denúncia ou queixa, poderá atribuir-lhe definição jurídica diversa, ainda que, em consequência, tenha de aplicar pena mais grave). Isto porque, o acusado se defende dos fatos a ele irrogados (e não da capitulação jurídica propriamente dita), o que tem o condão de espancar qualquer ilação no sentido de que tal proceder ofenderia o devido processo legal (e seus corolários: ampla defesa e contraditório) a culminar em defeso cerceamento de defesa.
- Ainda com o escopo de bem aquilatar a questão, cumpre trazer à colação julgados que sufragam a possibilidade de que a emendatio libelli ocorra em 2º grau de jurisdição (julgados estes que apenas impõem o limitativo de que a situação do acusado não reste piorada quando tiver havido o manejo de recurso de Apelação apenas pela defesa em decorrência da aplicação do disposto no art. 617 do Código de Processo Penal, o que, entretanto, sequer socorre o embargante à luz de que foi o Ministério Público Federal quem manifestou inconformismo com a r. sentença monocrática).
- Vê-se, portanto, que a conduta relacionada ao delito de uso de documento falso foi descrita na denúncia implícita e explicitamente na denúncia ao restar evidente que, de fato, SÉRGIO foi a pessoa que forneceu o documento falsificado aos compradores de seus lotes, incluindo o terreno pertencente à pessoa de nome Paulo Nunes Alves, que foi autuada em 20 de dezembro de 2010 por danificar vegetação nativa em estágio médio de regeneração nativa do bioma da Mata Atlântica, em Zona de Amortecimento da FLONA de Ipanema, sem autorização de órgão ambiental competente.
- Inclusive, é de se ressaltar também que a instrução probatória, os memoriais e a sentença monocrática debruçaram-se não só acerca de esmiuçar quem havia sido o responsável pela falsificação do documento em questão, mas também sobre o potencial conhecimento, ou não, de SÉRGIO acerca de tal falsidade quando do uso de referido documento, o que amoldar-se-ia, assim, ao delito de uso de documento falso (art. 304 c.c. art. 297, ambos do Código Penal), e não ao de falsificação de documento público (art. 297 do Código Penal), tal como capitulado na denúncia. Diante disso, mostra-se plenamente possível a emendatio libelli em razões de Apelação ministerial pleiteando a condenação do réu no delito do art. 304 c.c. art. 297, ambos do Código Penal.
- A materialidade do delito restou comprovada especialmente pelo Laudo de Perícia Criminal Federal (Documentoscopia) (fls. 284/291), que atesta a falsidade do documento apresentado pelo acusado quando da venda dos lotes do empreendimento "Chácara Dias Martins" (fls. 175/176), certificando que este não foi emitido pela Secretaria do Meio Ambiente e a assinatura aposta em tal documento não corresponde à assinatura do engenheiro agrônomo, tratando-se, portanto, de documento FALSO.
- Com relação à autoria, da mesma forma, a instrução probatória demonstrou de maneira suficiente que o acusado SÉRGIO, de fato, entregou o documento falso autorizativo da limpeza da área de supressão de vegetação nativa, datado de 13.08.2007, aos promitentes compradores dos imóveis do loteamento de propriedade de sua família. O próprio acusado, tanto em sede policial como em seu interrogatório judicial (fls. 81/82, 245/246, e fl. 382- mídia), confirmou tal afirmação, inclusive, no que se refere em específico ao comprador Paulo.
- Por outro lado, o conjunto probatório não logrou evidenciar o elemento subjetivo do dolo de que o acusado SÉRGIO efetivamente tinha conhecimento acerca da falsidade do documento em questão.
- Afigura-se plausível a versão apresentada pelo réu de que recebeu o documento falsificado da pessoa de José Carlos Caramez, versão esta que foi ratificada de maneira coesa e harmônica por várias das testemunhas de defesa e da acusação, e que se mostra coerente com a própria qualidade de advogado contratado para tal serviço, o que conferiria segurança e confiança aos documentos por ele apresentados.
- Diante disso, ainda que haja um contexto indiciário que pesa em desfavor de SÉRGIO que, como proprietário do terreno, deveria diligenciar acerca da documentação apresentada antes de proceder sua venda, mantenho o entendimento proferido pelo r. juízo sentenciante de que o conhecimento do acusado acerca da falsidade do documento não se mostrou devidamente demonstrada.
- A prova indiciária quando indicativa de mera probabilidade, como ocorre in casu, não serve como prova substitutiva e suficiente não apurada de forma concludente no curso da instrução criminal.
- Os elementos de persuasão racional coletados no bojo do caderno processual são insuficientes no que se refere ao elemento subjetivo do dolo para embasar o guerreado édito condenatório, razão pela qual, confirma-se a r. sentença nesse aspecto, absolvendo-se SÉRGIO quanto ao delito do art. 297 c.c. art. 304, ambos do Código Penal.
- Diante da absolvição quanto ao delito do art. 297 c.c. art. 304, ambos do Código Penal, remanesce contra o acusado tão somente a condenação procedida pelo r. juízo sentenciante referente ao delito do art. 38-A da Lei de Crimes Ambientais, cuja pena mínima prescrita é de 01 (um) ano de detenção, configurando, portanto, crime de menor potencial ofensivo.
- E, em se tratando de acusado primário, mostra-se de rigor que, antes de proferir decreto condenatório definitivo, seja oportunizada a manifestação do Ministério Público sobre o eventual cabimento dos benefícios despenalizadores previstos na Lei Federal nº 9.099/1995.
- Nesse sentido, diversos precedentes, inclusive das C. Cortes Superiores, já se manifestaram para declarar a nulidade das sentenças que, ao mudar a classificação jurídica da denúncia ou absolver parcialmente o réu da imputação inicialmente prevista, deixaram de dar vista dos autos ao Ministério Público Federal passando diretamente à condenação e dosimetria da pena de delitos que, em tese, fazem jus aos benefícios da Lei nº 9.099/1995.
- Diante disso, deve ser SUSPENSO o julgamento das razões do apelo no que se refere ao exame da dosimetria da pena do delito previsto no art. 38-A da Lei de Crimes Ambientais, convertendo-se o julgamento em diligências para remeter os autos ao r. juízo de origem, com posterior encaminhamento ao Ministério Público Federal, para que se manifeste acerca da eventual possibilidade de oferecimento da suspensão condicional do processo acerca do delito remanescente (art. 38-A da Lei 9.605/1998). Caso frustrada a tentativa de efetiva suspensão condicional do processo, o juízo deverá remeter os autos a este Tribunal para que haja o julgamento do recurso na parte faltante referente à dosimetria da pena do delito ambiental.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, apreciar parcialmente o recurso do Ministério Público Federal e, na parte apreciada, NEGAR PROVIMENTO no que tange ao delito de uso de documento falso (art. 297 c.c. art. 304, ambos do Código Penal), absolvendo o acusado de tal imputação, uma vez que ausente a comprovação do elemento subjetivo do dolo. No que tange à insurgência da acusação quanto à dosimetria art. 38-A da Lei 9.605/1998, DE OFÍCIO, SUSPENDER o julgamento das razões do apelo quanto a este ponto, convertendo-se o julgamento em diligências para determinar a remessa dos autos ao r. juízo de origem, com posterior encaminhamento ao Ministério Público Federal, para que se manifeste acerca da eventual possibilidade de oferecimento da suspensão condicional do processo acerca do delito remanescente (art. 38-A da Lei 9.605/1998), nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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RELATÓRIO
O DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS:
Trata-se de recurso de Apelação interposto pelo Ministério Público Federal contra a r. sentença (fls. 407/421), proferida pela Exma. Juíza Federal Sylvia Marlene de Castro Figueiredo (1ª Vara Federal de Barretos/SP), que julgou PARCIALMENTE PROCEDENTE a Ação Penal Pública Incondicionada para:
a) ABSOLVER o réu SÉRGIO DIAS MARTINS da prática do delito previsto no art. 297 do Código Penal, com fulcro no artigo 386, inciso VII, do Código de Processo Penal;
b) CONDENAR o réu SÉRGIO DIAS MARTINS como incurso no art. 38-A da Lei 9.605/1998 à pena de 01 (um) ano de detenção, em regime inicial ABERTO, e pagamento de multa equivalente a 10 (dez) dias-multa, substituída a pena privativa de liberdade por uma pena restritiva de direito consistente na prestação de serviços à comunidade, nos termos do art. 44, § 2º, do Código Penal.
Consta da r. denúncia (fls. 274/280):
Diante disso, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL denunciou SÉRGIO DIAS MARTINS como incurso nas sanções dos crimes previstos nos artigos 297 do Código Penal e 38-A da Lei 9.605/1998.
A r. denúncia foi recebida em 30.06.2015 (fl. 292).
Processado regularmente o feito, sobreveio a r. sentença, cuja baixa em secretaria deu-se em 28.08.2017 (fl. 422).
Em razões de Apelação, o Ministério Público Federal pleiteia a reforma parcial da r. sentença parcialmente condenatória a fim de que o acusado SÉRGIO DIAS MARTINS seja também condenado nas penas do art. 304 c.c. art. 297, ambos do Código Penal, mediante emendatio libelli (art. 383 do Código de Processo Penal), pois restou descrito na denúncia e provado nos autos que SÉRGIO fora a pessoa quem efetivamente utilizou o documento público falso (fls. 425/439).
Contrarrazões defensiva acostada às fls. 436/439 pugnando pelo desprovimento do recurso.
A Procuradoria Regional da República, em seu parecer, manifestou-se pelo parcial provimento do recurso ministerial apenas para que a pena do crime do art. 38-A da Lei nº 9.605/1998 seja aumentada pelas agravantes do art. 15, II, alíneas "a" e "n", da mesma Lei, mantendo-se, no mais, a r. sentença a quo (fls. 445/451).
É o relatório.
À revisão.
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VOTO
O DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS:
DA IMPUTAÇÃO
Consta da r. denúncia (fls. 274/280):
Diante disso, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL denunciou SÉRGIO DIAS MARTINS como incurso nas sanções dos crimes previstos nos artigos 197 do Código Penal e 38-A da Lei 9.605/1998.
DA EMENDATIO LIBELLI
Em razões de Apelação, o Ministério Público Federal pleiteia a reforma parcial da r. sentença parcialmente condenatória, a fim de que o acusado SÉRGIO DIAS MARTINS seja condenado nas penas do art. 304 c.c. art. 297, ambos do Código Penal, mediante emendatio libelli (art. 383 do Código de Processo Penal), pois, apesar de a denúncia ter capitulado a conduta de SÉRGIO como falsificação de documento público (art. 297 do Código Penal), restou descrito na denúncia e provado nos autos que SÉRGIO fora a pessoa quem efetivamente utilizou-se do referido documento público falso.
Primeiramente, mostra-se imperioso rememorar ser possível (porque contemplada a hipótese pelo ordenamento jurídico pátrio) a adequação da capitulação jurídica do fato narrado na denúncia ao tipo penal pertinente mediante a aplicação do instituto da emendatio libelli, cuja previsão encontra-se no art. 383 do Código de Processo Penal (O juiz, sem modificar a descrição do fato contida na denúncia ou queixa, poderá atribuir-lhe definição jurídica diversa, ainda que, em consequência, tenha de aplicar pena mais grave).
Isto porque, o acusado se defende dos fatos a ele irrogados (e não da capitulação jurídica propriamente dita), o que tem o condão de espancar qualquer ilação no sentido de que tal proceder ofenderia o devido processo legal (e seus corolários: ampla defesa e contraditório) a culminar em defeso cerceamento de defesa.
Nesse sentido:
Ainda com o escopo de bem aquilatar a questão, cumpre trazer à colação julgados que sufragam a possibilidade de que a emendatio libelli ocorra em 2º grau de jurisdição (julgados estes que apenas impõem o limitativo de que a situação do acusado não reste piorada quando tiver havido o manejo de recurso de Apelação apenas pela defesa em decorrência da aplicação do disposto no art. 617 do Código de Processo Penal, o que, entretanto, sequer socorre o embargante à luz de que foi o Ministério Público Federal quem manifestou inconformismo com a r. sentença monocrática):
Cabe perquirir, então, se, no caso em concreto, a denúncia efetivamente descreveu a conduta de utilização de documento público falso, valendo, dessa forma, a transcrição da r. denúncia quanto a este ponto, in verbis (destaque nosso):
Vê-se, portanto, que a conduta relacionada ao delito de uso de documento falso foi descrita na denúncia implícita e explicitamente na denúncia ao restar evidente que, de fato, SÉRGIO DIAS MARTINS foi a pessoa que forneceu o documento falsificado aos compradores de seus lotes, incluindo o terreno pertencente à pessoa de nome Paulo Nunes Alves, que foi autuada em 20 de dezembro de 2010 por danificar vegetação nativa em estágio médio de regeneração nativa do bioma da Mata Atlântica, em Zona de Amortecimento da FLONA de Ipanema, sem autorização de órgão ambiental competente.
Inclusive, é de se ressaltar também que a instrução probatória, os memoriais e a sentença monocrática debruçaram-se não só acerca de esmiuçar quem havia sido o responsável pela falsificação do documento em questão, mas também sobre o potencial conhecimento, ou não, de SÉRGIO DIAS MARTINS acerca de tal falsidade quando do uso de referido documento, o que amoldar-se-ia, assim, ao delito de uso de documento falso (art. 304 c.c. art. 297, ambos do Código Penal), e não ao de falsificação de documento público (art. 297 do Código Penal), tal como capitulado na denúncia.
Diante disso, mostra-se plenamente possível a emendatio libelli em razões de Apelação ministerial pleiteando a condenação do réu no delito do art. 304 c.c. art. 297, ambos do Código Penal.
Nesse mesmo sentido, precedente do E. Tribunal Regional da 4ª Região em situação fática semelhante acerca dos delitos de falsificação de documento público e uso de documento falso, in verbis:
Portanto, mostrando-se adequado ao caso em concreto a aplicação do instituto da emendatio libelli, passo, então à análise meritória da Apelação ministerial considerando o delito de uso de documento falso previsto no art. 304 c.c. art. 297, ambos do Código Penal.
DA MATERIALIDADE, AUTORIA E ELEMENTO SUBJETIVO DO DELITO DE USO DE DOCUMENTO FALSO
O crime de uso de documento público falso vem assim tipificado no Código Penal:
Art. 304 - Fazer uso de qualquer dos papéis falsificados ou alterados, a que se referem os arts. 297 a 302:
Pena - a cominada à falsificação ou à alteração.
(...)
Art. 297 - Falsificar, no todo ou em parte, documento público, ou alterar documento público verdadeiro:
Pena - reclusão, de dois a seis anos, e multa.
O delito em questão classifica-se como crime comum, podendo ser praticado por qualquer pessoa, e consuma-se com o efetivo uso do documento falsificado, independentemente da obtenção de qualquer vantagem. O sujeito passivo do delito é o Estado, podendo eventualmente prejudicar terceiro, de forma secundária. O objeto material é qualquer dos papéis falsificados ou alterados, a que se referem os arts. 297 a 302, todos do Código Penal. O tipo penal não tem pena própria, por ser crime acessório, sendo apenado com a sanção atinente ao crime de documento falso respectivo.
Registre-se que a falsificação deve ter aptidão para enganar o homem médio, sob pena de configurar conduta atípica. No mesmo sentido a sua reprodução, sem autenticação, pois não há a figura do documento para fins penais.
Vale acrescentar que, para a caracterização do crime do art. 304 do Código Penal, exige-se como elemento subjetivo do tipo penal a demonstração do dolo genérico, consistente no conhecimento da falsidade do documento, a despeito da vontade livre e consciente de fazer uso, não havendo previsão para a modalidade culposa.
A materialidade do delito restou comprovada especialmente pelo Laudo de Perícia Criminal Federal (Documentoscopia) (fls. 284/291), que atesta a falsidade do documento apresentado pelo acusado quando da venda dos lotes do empreendimento "Chácara Dias Martins" (fls. 175/176), certificando que este não foi emitido pela Secretaria do Meio Ambiente e a assinatura aposta em tal documento não corresponde à assinatura do engenheiro agrônomo Minoru Iwakami Beltrão, tratando-se, portanto, de documento FALSO.
Também reafirma a materialidade do delito o depoimento da testemunha de acusação Minoru Iwakami Beltrão, engenheiro agrônomo, que confirmou que o documento não foi assinado por ele, e aponta diversos erros constantes em referida certidão, conforme transcrição retirada da r. sentença monocrática: "que não foi responsável por assinar o documento que autorizava o corte de vegetação rasteira; que tem conhecimento do documento e trabalhou no DEPRN, sendo que, em 2006, era de fato o Diretor Regional Sudoeste Paulista e não Sudeste; que o documento apresenta uma série de erros, que normalmente não seriam cometidos; que a assinatura constante do documento de fls. 175/176 não é depoente, tendo sido feito exame grafotécnico na Polícia Federal em 2013 ou 2014, confirmando que a assinatura não era sua; que a administração pública não teria feito a abreviação de processo como 'pros'; que nunca erraria seu nome, o qual constou como 'Minoro Iwakami Beltra', sendo que o correto é 'Minoru Iwakami Beltrão'; que o depoente é engenheiro agrônomo e não engenheiro agrícola como constou; que o papel timbrado parece ser da Secretaria (folha de informação), mas a autorização tinha um outro padrão, por preenchimento de campos e não por texto corrido; que isso foi observado pela Polícia Federal também; que se recorda dos casos em que atuou, embora tenham sido em número bastante grande mas não se lembra desse caso em específico nem do Sr. Sérgio; que em 2006 o depoente exerceu o cargo de diretoria e, em geral, isso é tratado numa equipe técnica, então quem faria o atendimento seria um supervisor ou um técnico e não o diretor regional do departamento, que era o depoente na época; que a numeração era feita por estado e, em geral, na região de Sorocaba, a numeração era em torno de 65.000 ou 70.000, portanto 13.000 era uma numeração que deveria ter sido usada pelo extinto DAIA, Departamento de Avaliação de Impacto Ambiental; que não conhece o advogado Dr. José Carlos Caramez; que o carimbo constante de fls. 175 é semelhante ao do depoente, pois o seu nome está correto, o seu CREA também e a estrutura do carimbo é idêntica, mas não tem ideia de quem possa ter feito esse documento; que ratifica o teor do seu depoimento de fls. 193/194; que tem conhecimento de que o documento de fls. 175 foi apresentado em dois inquéritos nos quais foi convocado pela Polícia Federal para prestar depoimento".
Com relação à autoria, da mesma forma, a instrução probatória demonstrou de maneira suficiente que o acusado SÉRGIO DIAS MARTINS, de fato, entregou o documento falso autorizativo da limpeza da área de supressão de vegetação nativa, datado de 13.08.2007, aos promitentes compradores dos imóveis do loteamento de propriedade de sua família. O próprio acusado, tanto em sede policial como em seu interrogatório judicial (fls. 81/82, 245/246, e fl. 382- mídia), confirmou tal afirmação, inclusive, no que se refere em específico ao comprador Paulo Nunes Alves.
Por outro lado, entendo que o conjunto probatório não logrou evidenciar o elemento subjetivo do dolo de que o acusado SÉRGIO DIAS efetivamente tinha conhecimento acerca da falsidade do documento em questão.
Como bem apontou a sentença a quo a esse respeito, durante seus interrogatórios em sede policial e judicial, o acusado afirmou que não tinha consciência da natureza espúria do documento, alegando que este lhe teria sido entregue pelo advogado José Carlos Caramez, que havia sido constituído para realizar o inventário do genitor do acusado e cuidava das documentações referentes aos lotes. Inclusive, a esse respeito, o réu narrou especificamente que o advogado teria recebido, como pagamento por seus serviços, 16 dos lotes em questão, os quais foram vendidos pelo advogado, razão pela qual não desconfiou que os documentos a ele fornecidos pudessem ser falsos, uma vez que confiou na palavra do patrono, e no fato deste ter realizado a venda dos referidos terrenos em seu próprio benefício.
Tal versão do acusado apresenta verossimilhança com os fatos apurados no decorrer da investigação criminal. Como bem fundamento pelo r. juízo sentenciante, em que pese José Carlos Caramez tenha afirmado, por ocasião de sua oitiva na qualidade de testemunha do Juízo (fl. 373- mídia), que desconhecia a existência do documento em questão e que não intermediava a venda dos lotes do empreendimento "Chácara Dias Martins", sendo que sua ligação com a família teria sido exclusivamente de prestação de serviços enquanto advogado responsável pelo inventário do pai do acusado SÉRGIO, tal afirmação mostrou-se inverídica ao longo da instrução processual.
A informante Sueli Globo, ex-esposa do acusado SÉRGIO, confirmou que, além de ter sido contratado para cuidar do inventário do pai do réu, o Dr. José Carlos Caramez também foi contratado para regularizar o loteamento da área e que, a título de honorários, teriam sido-lhe entregues 16 (dezesseis) lotes, os quais foram posteriormente vendidos por ele. Confirmou, ainda, que o suposto documento falsificado de fls. 175/176 foi entregue a SÉRGIO por José Carlos Caramez e que o acusado desconhecia a falsidade de tal documento (fl. 353- mídia).
Valdir Credo Negrelli, engenheiro que trabalhou diretamente nos lotes da "Chácara Dias Martins", igualmente, confirmou que foi contratado por José Carlos Caramez para prestação de seus serviços como engenheiro e para tentar a regularização dos lotes perante a Prefeitura, tendo recebido, em troca de seu trabalho, 01 (um) dos 16 (dezesseis) lotes de propriedade do advogado José Carlos Camarez, afirmando, ademais, ter ciência de que o advogado vendeu os outros 15 (quinze) lotes restantes de forma irregular, sendo que, atualmente, já havia moradia e residências no local. Ainda sobre os fatos, a testemunha afirmou que quem insistiu e convenceu o pai do acusado SÉRGIO para fazer o loteamento foi o Dr. Caramez, sendo que foi feito um contrato entre eles acordando que o advogado faria o loteamento, topografia, projeto, etc, e, em troca, pegaria 40% do terreno do pai de Sérgio, daí, por isso, o recebimento dos 16 lotes pelo Dr. Caramez.
Ademais, o depoimento das testemunhas de defesa José Carlos Quirino, Maria Odete Gagliardi, Santina Dias Martins e Florinda Aparecida Vieira também confirmaram a intermediação do advogado José Carlos Caramez na venda dos lotes do empreendimento em questão (fls. 373 e 382- mídias).
Vê-se, portanto, que se afigura plausível a versão apresentada pelo réu de que recebeu o documento falsificado da pessoa de José Carlos Caramez, versão esta que foi ratificada de maneira coesa e harmônica por várias das testemunhas de defesa e da acusação, e que se mostra coerente com a própria qualidade de advogado contratado para tal serviço, o que conferiria segurança e confiança aos documentos por ele apresentados.
Diante disso, ainda que haja um contexto indiciário que pesa em desfavor de SÉRGIO DIAS MARTINS que, como proprietário do terreno, deveria diligenciar acerca da documentação apresentada antes de proceder sua venda, mantenho o entendimento proferido pelo r. juízo sentenciante de que o conhecimento do acusado acerca da falsidade do documento não se mostrou devidamente demonstrada.
A prova indiciária quando indicativa de mera probabilidade, como ocorre in casu, não serve como prova substitutiva e suficiente não apurada de forma concludente no curso da instrução criminal.
A doutrina é firme a respeito da certeza na convicção do julgador ao emitir decreto condenatório. Confira-se sobre o assunto, os comentários de Guilherme de Souza Nucci ao artigo 386 do Código de Processo Penal (in Código de Processo Penal Comentado", 15ª Edição, ano 2016, Editora Revista dos Tribunais, pág. 857):
Nesse sentido, precedente de reconhecimento da ausência de dolo no uso de documento falso extraído deste E. Tribunal Regional Federal da 3ª Região, in verbis:
Portanto, os elementos de persuasão racional coletados no bojo do caderno processual são insuficientes no que se refere ao elemento subjetivo do dolo para embasar o guerreado édito condenatório, razão pela qual, confirma-se a r. sentença nesse aspecto, absolvendo-se SÉRGIO DIAS MARTINS quanto ao delito do art. 297 c.c. art. 304, ambos do Código Penal.
Vale consignar, por fim, que, como bem apontado pela sentença a quo, no que concerne ao possível envolvimento de José Carlos Camarez no caso, que ensejaria a instauração de investigação criminal em seu desfavor, tem-se que, para tal fato, já houve a prescrição da pretensão punitiva estatal.
DO OFERECIMENTO DOS BENEFÍCIOS DESPENALIZADORES DA LEI Nº 9.099/1995
Diante da absolvição quanto ao delito do art. 297 c.c. art. 304, ambos do Código Penal, remanesce contra o acusado tão somente a condenação procedida pelo r. juízo sentenciante referente ao delito do art. 38-A da Lei de Crimes Ambientais, cuja pena mínima prescrita é de 01 (um) ano de detenção, configurando, portanto, crime de menor potencial ofensivo.
E, em se tratando SÉRGIO DIAS MARTINS de acusado primário, mostra-se de rigor que, antes de proferir decreto condenatório definitivo, seja oportunizada a manifestação do Ministério Público sobre o eventual cabimento dos benefícios despenalizadores previstos na Lei Federal nº 9.099/1995.
Nesse sentido, diversos precedentes, inclusive das C. Cortes Superiores, já se manifestaram para declarar a nulidade das sentenças que, ao mudar a classificação jurídica da denúncia ou absolver parcialmente o réu da imputação inicialmente prevista, deixaram de dar vista dos autos ao Ministério Público Federal passando diretamente à condenação e dosimetria da pena de delitos que, em tese, fazem jus aos benefícios da Lei nº 9.099/1995. Veja-se, in verbis:
Inclusive, a esse respeito, a Súmula 337 do C. Superior Tribunal de Justiça é expressa ao prever a possibilidade de oferecimento dos benefícios da Lei 9.099/1995 ao crime remanescente ao prever que é cabível a suspensão condicional do processo na desclassificação do crime e na procedência parcial da pretensão punitiva, o que se amolda ao caso ora em questão.
Ressalte-se que, ainda que no caso concreto a condenação do réu tenha permitido a conversão da pena privativa de liberdade em uma pena restritiva de direitos, é importante apontar que a condenação penal gera efeitos outros, como a reincidência e os antecedentes criminais, e, portanto, deve ser oportunizada ao menos a possibilidade de que o Ministério Público Federal analise a eventual propositura de tais benefícios despenalizadores, o que pode, ou não, ser aceito pelo acusado.
Assim, deve ser SUSPENSO o julgamento das razões do apelo no que se refere ao exame da dosimetria da pena do delito previsto no art. 38-A da Lei de Crimes Ambientais, convertendo-se o julgamento em diligências para remeter os autos ao r. juízo de origem, com posterior encaminhamento ao Ministério Público Federal, para que se manifeste acerca da eventual possibilidade de oferecimento da suspensão condicional do processo acerca do delito remanescente (art. 38-A da Lei 9.605/1998).
Efetuando-se a proposta de suspensão condicional do processo e aceitas suas condições, o processo deverá ser suspenso, permanecendo os autos no juízo de primeiro grau, que acompanhará o cumprimento das condições pelo período devido. Findo tal prazo e tendo sido devidamente cumpridas todas as condições, caberá ao juízo de primeiro grau extinguir a punibilidade do réu, nos termos do art. 89, § 5º, da Lei nº 9.099/95, não sendo necessário o envio dos autos a este Tribunal para esse fim.
Em caso contrário, caso frustrada a tentativa de efetiva suspensão condicional do processo, o juízo deverá remeter os autos a este Tribunal para que haja o julgamento do recurso na parte faltante referente à dosimetria da pena do delito ambiental.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por apreciar parcialmente o recurso do Ministério Público Federal e, na parte apreciada, NEGAR PROVIMENTO no que tange ao delito de uso de documento falso (art. 297 c.c. art. 304, ambos do Código Penal), absolvendo o acusado de tal imputação, uma vez que ausente a comprovação do elemento subjetivo do dolo. No que tange à insurgência da acusação quanto à dosimetria art. 38-A da Lei 9.605/1998, DE OFÍCIO, voto por SUSPENDER o julgamento das razões do apelo quanto a este ponto, convertendo-se o julgamento em diligências para determinar a remessa dos autos ao r. juízo de origem, com posterior encaminhamento ao Ministério Público Federal, para que se manifeste acerca da eventual possibilidade de oferecimento da suspensão condicional do processo acerca do delito remanescente (art. 38-A da Lei 9.605/1998), nos termos do voto acima proferido.
É o voto.
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