Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 16/07/2021
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0007659-58.2011.4.03.6110/SP
2011.61.10.007659-1/SP
RELATOR : Desembargador Federal FAUSTO DE SANCTIS
APELANTE : Justica Publica
APELADO(A) : SERGIO DIAS MARTINS
ADVOGADO : SP108016 ENZO JOSE BAPTISTA DUO e outro(a)
NÃO OFERECIDA DENÚNCIA : PAULO NUNES ALVES
: ROSILENE DOS SANTOS ALVES
No. ORIG. : 00076595820114036110 3 Vr SOROCABA/SP

EMENTA

PENAL. PROCESSUAL PENAL. ART. 297 DO CÓDIGO PENAL. FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO PÚBLICO. USO DE DOCUMENTO FALSO. ART. 297 C.C. ART. 304, AMBOS DO CÓDIGO PENAL. EMENDATIO LIBELLI POSSÍVEL, MESMO EM SEGUNDA INSTÂNCIA. AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS. ELEMENTO SUBJETIVO NÃO COMPROVADO. ABSOLVIÇÃO. IN DUBIO PRO REO. DELITO REMANESCENTE. ART. 38-A DA LEI DE CRIMES AMBIENTAIS. CRIME DE MENOR POTENCIAL OFENSIVO. PROPOSTA DE SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO. ART. 89 DA LEI 9.099/1995. CONVERSÃO EM DILIGÊNCIAS. REMESSA AO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL.

- Mostra-se imperioso rememorar ser possível (porque contemplada a hipótese pelo ordenamento jurídico pátrio) a adequação da capitulação jurídica do fato narrado na denúncia ao tipo penal pertinente mediante a aplicação do instituto da emendatio libelli, cuja previsão encontra-se no art. 383 do Código de Processo Penal (O juiz, sem modificar a descrição do fato contida na denúncia ou queixa, poderá atribuir-lhe definição jurídica diversa, ainda que, em consequência, tenha de aplicar pena mais grave). Isto porque, o acusado se defende dos fatos a ele irrogados (e não da capitulação jurídica propriamente dita), o que tem o condão de espancar qualquer ilação no sentido de que tal proceder ofenderia o devido processo legal (e seus corolários: ampla defesa e contraditório) a culminar em defeso cerceamento de defesa.

- Ainda com o escopo de bem aquilatar a questão, cumpre trazer à colação julgados que sufragam a possibilidade de que a emendatio libelli ocorra em 2º grau de jurisdição (julgados estes que apenas impõem o limitativo de que a situação do acusado não reste piorada quando tiver havido o manejo de recurso de Apelação apenas pela defesa em decorrência da aplicação do disposto no art. 617 do Código de Processo Penal, o que, entretanto, sequer socorre o embargante à luz de que foi o Ministério Público Federal quem manifestou inconformismo com a r. sentença monocrática).

- Vê-se, portanto, que a conduta relacionada ao delito de uso de documento falso foi descrita na denúncia implícita e explicitamente na denúncia ao restar evidente que, de fato, SÉRGIO foi a pessoa que forneceu o documento falsificado aos compradores de seus lotes, incluindo o terreno pertencente à pessoa de nome Paulo Nunes Alves, que foi autuada em 20 de dezembro de 2010 por danificar vegetação nativa em estágio médio de regeneração nativa do bioma da Mata Atlântica, em Zona de Amortecimento da FLONA de Ipanema, sem autorização de órgão ambiental competente.

- Inclusive, é de se ressaltar também que a instrução probatória, os memoriais e a sentença monocrática debruçaram-se não só acerca de esmiuçar quem havia sido o responsável pela falsificação do documento em questão, mas também sobre o potencial conhecimento, ou não, de SÉRGIO acerca de tal falsidade quando do uso de referido documento, o que amoldar-se-ia, assim, ao delito de uso de documento falso (art. 304 c.c. art. 297, ambos do Código Penal), e não ao de falsificação de documento público (art. 297 do Código Penal), tal como capitulado na denúncia. Diante disso, mostra-se plenamente possível a emendatio libelli em razões de Apelação ministerial pleiteando a condenação do réu no delito do art. 304 c.c. art. 297, ambos do Código Penal.

- A materialidade do delito restou comprovada especialmente pelo Laudo de Perícia Criminal Federal (Documentoscopia) (fls. 284/291), que atesta a falsidade do documento apresentado pelo acusado quando da venda dos lotes do empreendimento "Chácara Dias Martins" (fls. 175/176), certificando que este não foi emitido pela Secretaria do Meio Ambiente e a assinatura aposta em tal documento não corresponde à assinatura do engenheiro agrônomo, tratando-se, portanto, de documento FALSO.

- Com relação à autoria, da mesma forma, a instrução probatória demonstrou de maneira suficiente que o acusado SÉRGIO, de fato, entregou o documento falso autorizativo da limpeza da área de supressão de vegetação nativa, datado de 13.08.2007, aos promitentes compradores dos imóveis do loteamento de propriedade de sua família. O próprio acusado, tanto em sede policial como em seu interrogatório judicial (fls. 81/82, 245/246, e fl. 382- mídia), confirmou tal afirmação, inclusive, no que se refere em específico ao comprador Paulo.

- Por outro lado, o conjunto probatório não logrou evidenciar o elemento subjetivo do dolo de que o acusado SÉRGIO efetivamente tinha conhecimento acerca da falsidade do documento em questão.

- Afigura-se plausível a versão apresentada pelo réu de que recebeu o documento falsificado da pessoa de José Carlos Caramez, versão esta que foi ratificada de maneira coesa e harmônica por várias das testemunhas de defesa e da acusação, e que se mostra coerente com a própria qualidade de advogado contratado para tal serviço, o que conferiria segurança e confiança aos documentos por ele apresentados.

- Diante disso, ainda que haja um contexto indiciário que pesa em desfavor de SÉRGIO que, como proprietário do terreno, deveria diligenciar acerca da documentação apresentada antes de proceder sua venda, mantenho o entendimento proferido pelo r. juízo sentenciante de que o conhecimento do acusado acerca da falsidade do documento não se mostrou devidamente demonstrada.

- A prova indiciária quando indicativa de mera probabilidade, como ocorre in casu, não serve como prova substitutiva e suficiente não apurada de forma concludente no curso da instrução criminal.

- Os elementos de persuasão racional coletados no bojo do caderno processual são insuficientes no que se refere ao elemento subjetivo do dolo para embasar o guerreado édito condenatório, razão pela qual, confirma-se a r. sentença nesse aspecto, absolvendo-se SÉRGIO quanto ao delito do art. 297 c.c. art. 304, ambos do Código Penal.

- Diante da absolvição quanto ao delito do art. 297 c.c. art. 304, ambos do Código Penal, remanesce contra o acusado tão somente a condenação procedida pelo r. juízo sentenciante referente ao delito do art. 38-A da Lei de Crimes Ambientais, cuja pena mínima prescrita é de 01 (um) ano de detenção, configurando, portanto, crime de menor potencial ofensivo.

- E, em se tratando de acusado primário, mostra-se de rigor que, antes de proferir decreto condenatório definitivo, seja oportunizada a manifestação do Ministério Público sobre o eventual cabimento dos benefícios despenalizadores previstos na Lei Federal nº 9.099/1995.

- Nesse sentido, diversos precedentes, inclusive das C. Cortes Superiores, já se manifestaram para declarar a nulidade das sentenças que, ao mudar a classificação jurídica da denúncia ou absolver parcialmente o réu da imputação inicialmente prevista, deixaram de dar vista dos autos ao Ministério Público Federal passando diretamente à condenação e dosimetria da pena de delitos que, em tese, fazem jus aos benefícios da Lei nº 9.099/1995.

- Diante disso, deve ser SUSPENSO o julgamento das razões do apelo no que se refere ao exame da dosimetria da pena do delito previsto no art. 38-A da Lei de Crimes Ambientais, convertendo-se o julgamento em diligências para remeter os autos ao r. juízo de origem, com posterior encaminhamento ao Ministério Público Federal, para que se manifeste acerca da eventual possibilidade de oferecimento da suspensão condicional do processo acerca do delito remanescente (art. 38-A da Lei 9.605/1998). Caso frustrada a tentativa de efetiva suspensão condicional do processo, o juízo deverá remeter os autos a este Tribunal para que haja o julgamento do recurso na parte faltante referente à dosimetria da pena do delito ambiental.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, apreciar parcialmente o recurso do Ministério Público Federal e, na parte apreciada, NEGAR PROVIMENTO no que tange ao delito de uso de documento falso (art. 297 c.c. art. 304, ambos do Código Penal), absolvendo o acusado de tal imputação, uma vez que ausente a comprovação do elemento subjetivo do dolo. No que tange à insurgência da acusação quanto à dosimetria art. 38-A da Lei 9.605/1998, DE OFÍCIO, SUSPENDER o julgamento das razões do apelo quanto a este ponto, convertendo-se o julgamento em diligências para determinar a remessa dos autos ao r. juízo de origem, com posterior encaminhamento ao Ministério Público Federal, para que se manifeste acerca da eventual possibilidade de oferecimento da suspensão condicional do processo acerca do delito remanescente (art. 38-A da Lei 9.605/1998), nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

São Paulo, 24 de junho de 2021.
FAUSTO DE SANCTIS
Desembargador Federal


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0007659-58.2011.4.03.6110/SP
2011.61.10.007659-1/SP
RELATOR : Desembargador Federal FAUSTO DE SANCTIS
APELANTE : Justica Publica
APELADO(A) : SERGIO DIAS MARTINS
ADVOGADO : SP108016 ENZO JOSE BAPTISTA DUO e outro(a)
NÃO OFERECIDA DENÚNCIA : PAULO NUNES ALVES
: ROSILENE DOS SANTOS ALVES
No. ORIG. : 00076595820114036110 3 Vr SOROCABA/SP

RELATÓRIO

O DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS:

Trata-se de recurso de Apelação interposto pelo Ministério Público Federal contra a r. sentença (fls. 407/421), proferida pela Exma. Juíza Federal Sylvia Marlene de Castro Figueiredo (1ª Vara Federal de Barretos/SP), que julgou PARCIALMENTE PROCEDENTE a Ação Penal Pública Incondicionada para:

a) ABSOLVER o réu SÉRGIO DIAS MARTINS da prática do delito previsto no art. 297 do Código Penal, com fulcro no artigo 386, inciso VII, do Código de Processo Penal;

b) CONDENAR o réu SÉRGIO DIAS MARTINS como incurso no art. 38-A da Lei 9.605/1998 à pena de 01 (um) ano de detenção, em regime inicial ABERTO, e pagamento de multa equivalente a 10 (dez) dias-multa, substituída a pena privativa de liberdade por uma pena restritiva de direito consistente na prestação de serviços à comunidade, nos termos do art. 44, § 2º, do Código Penal.

Consta da r. denúncia (fls. 274/280):

Consta nos autos que em 20 de dezembro de 2010, Paulo Nunes Alves foi autuado por danificar vegetação nativa em estágio médio de regeneração nativa em estágio média de regeneração do bioma da Mata Atlântica, em Zona de Amortecimento da FLONA de Ipanema, sem autorização de órgão ambiental competente. Acontece que Paulo adquiriu o terreno do denunciado Sérgio Dias Martins, afirmando que, quando da comprova, a área já estava limpa. Além disso, na transação referida Paulo e todos os outros que adquiriram lotes de Sérgio receberam um documento da Secretaria do Meio Ambiente, assinado pelo engenheiro agrônomo Minoru Iwakami Beltrão "autorizando a limpeza da área de supressão da vegetação nativa", documento este que se constatou ser falso durante este procedimento. Assim, denuncia-se Sérgio pela falsificação de documento público, tipificada no caput do art. 297 do Código Penal, além do dano ambiental causado no bioma Mata Atlântica, conforme exposto no art. 38-A da Lei 9.605/1998.
Como dito, aos 20 dias de dezembro de 2010, Paulo nunes Alves foi autuado pelo fiscal do ICMbio Moisés de Souza por danificar vegetação nativa em estágio médio de conservação no bioma da Mata Atlântica, em zona de amortecimento competente, conforme Auto de Infração 04686-A (fl. 03), sendo constatado danos em área de 852m², segundo o Relatório de Fiscalização nº 13 de fls. 04 a 13. O Ofício nº 080/2013 (fls.156) encaminhado pelo ICMBio informa dois processos administrativos instaurados por Paulo Nunes Alves, ambos em fase de instrução e sem solução, gerados pelo auto de infração 04686-A.
O Laudo de Vistoria Técnica (fls. 11/14) esclarece que a área analisada pertence ao Loteamento 'Chácara Dias Martins', com 7,312ha, que não possui licença ou autorização de implantação pelos órgãos competentes, tratando-se de um loteamento clandestino, com 43 lotes cobertos com vegetação nativa em estágio médio de regeneração vendidos, sendo que os moradores (em vista do suposto documento autorizativo), gradativamente, estão desmatando e implantando chácaras de lazer. O auto de infração aqui abordado (fl. 03) recaiu sobre Paulo Nunes Alves, contudo o empreendedor do Loteamento Clandestino 'Chácara Dias Martins' é Sérgio Dias Martins. O referido laudo conclui, às fls. 13 e 14, que ocorreram fortes impactos ambientais sobre a mata nativa existente no imóvel, realizados por compradores dos lotes vendidos pelo Sr. Sérgio.
O Laudo nº 169/2011 UTEC/DPF/SOD/SP (fls. 53/68) esclarece que 'houve danos no local dos fatos, entre os quais se destaca o corte de vegetação arbórea e arbustiva, uso de fogo/queimada para limpeza da área, destoca, enleiramento do material proveniente do corte e posterior queima da biomassa. Houve a construção de cerca de arame farpado com oito fios, o que impede a circulação da fauna de maior porte pela área (fls. 66/67). Sendo que a área impactada é de, aproximadamente, 1200m², sendo possível recuperar tal dano (fl. 67).
Em seu termo de declarações, às fls. 40, Paulo Nunes Alves informa que adquiriu o terreno de Sérgio Dias Martins já limpo, mediante o corte de mata lá existente, que acredita ter sido feito por roço, e já cercado com cerca, ressaltando que foram vendidos, por Sérgio, diversos terrenos no local, todos com problemas para a regularização. Paulo forneceu, ainda, cópia do contrato de compra e venda do terreno (fls. 42/44), cuja cláusula sexta (fl. 43) ressalta que benfeitorias só poderiam ser feitas após liberação definitiva do DPRN e IBAMA. Já em seu auto de qualificação e interrogatório, à fl. 110, Paulo Nunes Alves esclarece que é casado há 24 anos com Rosilene dos Santos Alves, em nome de quem está celebrado o contrato de compra e venda.
Rosilene dos Santos Alves ( fl. 113) afirma que não efetuou a limpeza no terreno, assim como não contratou ninguém para fazê-lo.
Já Sérgio Dias Martins, em seu termo de declarações (fls. 81/82), informa que o terreno começa a ser loteado em 2000, por seu genitor Emilio Lopes Martins, falecido, sem inventário encerrado. Com a morte, Sérgio passou a administrar os bens deixados, uma vez que é procurador de sua genitora e das irmãs de Emilio, com quem concorre no inventário, uma vez que sucedeu o pai no inventário de seus avós paternos. Afirma que, antes de comercializar os lotes, realizou uma consulta junto ao IBAMA para saber se a comercialização poderia ser feita, tendo sido orientado pelo Senhor Delcídio, engenheiro agrônomo da instituição, que a alienação poderia ocorrer, desde que uma cláusula contratual alertasse o comprador da necessidade de obter junto ao DPRN e IBAMA a autorização necessária para a implantação de qualquer benfeitoria do imóvel adquirido, o que o fez inserir a referida cláusula sexta nos contratos de compra e venda. Refutou, ainda, as declarações de Paulo, sugerindo a oitiva de Márcia Turato e Marcos José Lopes Florido de Oliveira como testemunhas de que não foi o responsável pelo desmatamento ocorrido no terreno.
Marcia Regina Turato Leite foi ouvida às fls. 87, e afirma que é proprietária de dois lotes do mesmo logradouro, adquiridos de Sérgio Dias Martins, sendo que Paulo Nunes Alves não chegou a cortar árvores nativas, realizando, pelo contrário, o plantio de árvores frutíferas ao redor de seu terreno. Ressalta, ainda, que tem conhecimento de um documento assinado pelo engenheiro 'Minoru', autorizando a limpeza rasteira dos referidos terrenos, datado de 2006, embora não esteja autorizada, ainda, a construção nos lotes. Quando de sua reinquerição, às fls. 224, Márcia esclarece que, na compra dos lotes, recebeu uma cópia do documento assinado pelo engenheiro Minoru o qual autorizava a limpeza dos lotes, e era comum a todos os proprietários, entendendo, portanto, que estava autorizada a limpar os terrenos que adquirira.
Marcos José Lopes Florido de Oliveira, por sua vez, afirmou que é primo de Sérgio Dias Martins, sabendo do loteamento e da presença de árvores nativas no local, não podendo afirmar, contudo, que fora o próprio Paulo Nunes Alves quem cortou as árvores nativas que existiam no terreno adquirido (fls. 102).
Em que pese o relatório apresentado pela autoridade policial às fls. 160 a 162, o Ministério Público Federal se manifestou, às fls. 165 e 166 entendendo que alguns itens da investigação ainda não estavam elucidados, solicitando, para tanto, a oitiva do fiscal Moisés de Souza e a identificação e oitiva do engenheiro 'Minoru'.
Assim, Moisés de Souza esclareceu, em seu termo de depoimento às fls. 173, que 'o desmatamento verificado no lote objeto da referida autuação, tratava-se de dano recente (cerca de um mês), a contar da data da visita em 20 de dezembro de 2010'. Ressalta, ainda, que conheceu pessoalmente o sr. Minoru Iwakami Beltrão, que prestava serviço à DEPRN, e que a suposta autorização de limpeza de supressão de vegetação nativa, supostamente assinada pelo engenheiro 1minoru1, não possui idoneidade, uma vez que ainda que o DEPRM possuísse poderes para emitir tais documentos, ainda seria preciso contar com a anuência da FLONA, à época gerenciada pelo IBAMA.
Às fls. 175 foi juntado a autorização favorável ao pedido de limpeza de área de supressão de vegetação nativa de sub bosque do processo 13229, solicitado por Sérgio dias Martins e outros ao diretor regional da sudeste paulista, o senhor minoru (grafado no documento como Iwakami Beltra, vindo do Departamento Estadual de Proteção de Recursos Naturais- DEPRN, de 13 de agosto e 2007, e assinado, inclusive, por Sérgio Dias Martins.
Em seu termo de declarações, Minoru Iwakami Beltrão (grafia correta comprovada pelo documento de identidade às fls. 195) às fls. 193 e 194, esclarece que foi funcionário do DEPRN entre 1994 e 2009, quando o departamento foi extinto e ele realocado na CETESB. Em 2006 exercia a atividade de Diretor da Regional Sudoeste Paulista, refutando peremptoriamente o documento às fls. 175, posto que não reconhece a assinatura como sua, bem como a própria formatação do referido documento que não se coaduna com o modelo utilizado à época, salientando que as autorizações para limpeza eram expedidas em formulário padrão totalmente diferente do documento apresentado. Ressalta, ainda, que no documento a palavra processo está grafada com 's' e a numeração 13229, que não chega nem perto da numeração de processos de sua diretoria, que giram em torno de 70.000. Foi feito auto de colheita de material gráfico do Sr. Minoru, entre as fls. 196 e 200, o que comprova que a assinatura do documento acoplado às fls. 175 em nada se parece com a real assinatura do engenheiro agrônomo.
Em seu auto de qualificação e interrogatório, ás fls. 245 e 246, Sérgio dias Martins admite que forneceu uma cópia da autorização aos compradores dos imóveis que estavam sendo adquiridos no loteamento de propriedade da família, afirmando que tal documento lhe foi entregue pelo advogado Jpsé \carlos Caramez, que havia sido constituído para realizar o inventário do seu genitor, tendo renunciado aos poderes no decorrer do processo (cópia da renúncia autuada às fls. 250).
Já José Carlos Caramez, às fls. 266, que de fato foi o advogado constituído para proceder o inventário de Emilio Lopes Martins, cujo inventariante foi Sérgio Dias Martins, e que, devido à morosidade provocada pelo próprio inventariante, renunciou à causa, desconhecimento o documento de fls. 175.

Diante disso, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL denunciou SÉRGIO DIAS MARTINS como incurso nas sanções dos crimes previstos nos artigos 297 do Código Penal e 38-A da Lei 9.605/1998.

A r. denúncia foi recebida em 30.06.2015 (fl. 292).

Processado regularmente o feito, sobreveio a r. sentença, cuja baixa em secretaria deu-se em 28.08.2017 (fl. 422).

Em razões de Apelação, o Ministério Público Federal pleiteia a reforma parcial da r. sentença parcialmente condenatória a fim de que o acusado SÉRGIO DIAS MARTINS seja também condenado nas penas do art. 304 c.c. art. 297, ambos do Código Penal, mediante emendatio libelli (art. 383 do Código de Processo Penal), pois restou descrito na denúncia e provado nos autos que SÉRGIO fora a pessoa quem efetivamente utilizou o documento público falso (fls. 425/439).

Contrarrazões defensiva acostada às fls. 436/439 pugnando pelo desprovimento do recurso.

A Procuradoria Regional da República, em seu parecer, manifestou-se pelo parcial provimento do recurso ministerial apenas para que a pena do crime do art. 38-A da Lei nº 9.605/1998 seja aumentada pelas agravantes do art. 15, II, alíneas "a" e "n", da mesma Lei, mantendo-se, no mais, a r. sentença a quo (fls. 445/451).

É o relatório.

À revisão.

FAUSTO DE SANCTIS
Desembargador Federal Relator


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Data e Hora: 13/07/2021 16:24:28



APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0007659-58.2011.4.03.6110/SP
2011.61.10.007659-1/SP
RELATOR : Desembargador Federal FAUSTO DE SANCTIS
APELANTE : Justica Publica
APELADO(A) : SERGIO DIAS MARTINS
ADVOGADO : SP108016 ENZO JOSE BAPTISTA DUO e outro(a)
NÃO OFERECIDA DENÚNCIA : PAULO NUNES ALVES
: ROSILENE DOS SANTOS ALVES
No. ORIG. : 00076595820114036110 3 Vr SOROCABA/SP

VOTO

O DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS:

DA IMPUTAÇÃO

Consta da r. denúncia (fls. 274/280):

Consta nos autos que em 20 de dezembro de 2010, Paulo Nunes Alves foi autuado por danificar vegetação nativa em estágio médio de regeneração nativa em estágio média de regeneração do bioma da Mata Atlântica, em Zona de Amortecimento da FLONA de Ipanema, sem autorização de órgão ambiental competente. Acontece que Paulo adquiriu o terreno do denunciado Sérgio Dias Martins, afirmando que, quando da comprova, a área já estava limpa. Além disso, na transação referida Paulo e todos os outros que adquiriram lotes de Sérgio receberam um documento da Secretaria do Meio Ambiente, assinado pelo engenheiro agrônomo Minoru Iwakami Beltrão "autorizando a limpeza da área de supressão da vegetação nativa", documento este que se constatou ser falso durante este procedimento. Assim, denuncia-se Sérgio pela falsificação de documento público, tipificada no caput do art. 297 do Código Penal, além do dano ambiental causado no bioma Mata Atlântica, conforme exposto no art. 38-A da Lei 9.605/1998.
Como dito, aos 20 dias de dezembro de 2010, Paulo nunes Alves foi autuado pelo fiscal do ICMbio Moisés de Souza por danificar vegetação nativa em estágio médio de conservação no bioma da Mata Atlântica, em zona de amortecimento competente, conforme Auto de Infração 04686-A (fl. 03), sendo constatado danos em área de 852m², segundo o Relatório de Fiscalização nº 13 de fls. 04 a 13. O Ofício nº 080/2013 (fls.156) encaminhado pelo ICMBio informa dois processos administrativos instaurados por Paulo Nunes Alves, ambos em fase de instrução e sem solução, gerados pelo auto de infração 04686-A.
O Laudo de Vistoria Técnica (fls. 11/14) esclarece que a área analisada pertence ao Loteamento 'Chácara Dias Martins', com 7,312ha, que não possui licença ou autorização de implantação pelos órgãos competentes, tratando-se de um loteamento clandestino, com 43 lotes cobertos com vegetação nativa em estágio médio de regeneração vendidos, sendo que os moradores (em vista do suposto documento autorizativo), gradativamente, estão desmatando e implantando chácaras de lazer. O auto de infração aqui abordado (fl. 03) recaiu sobre Paulo Nunes Alves, contudo o empreendedor do Loteamento Clandestino 'Chácara Dias Martins' é Sérgio Dias Martins. O referido laudo conclui, às fls. 13 e 14, que ocorreram fortes impactos ambientais sobre a mata nativa existente no imóvel, realizados por compradores dos lotes vendidos pelo Sr. Sérgio.
O Laudo nº 169/2011 UTEC/DPF/SOD/SP (fls. 53/68) esclarece que 'houve danos no local dos fatos, entre os quais se destaca o corte de vegetação arbórea e arbustiva, uso de fogo/queimada para limpeza da área, destoca, enleiramento do material proveniente do corte e posterior queima da biomassa. Houve a construção de cerca de arame farpado com oito fios, o que impede a circulação da fauna de maior porte pela área (fls. 66/67). Sendo que a área impactada é de, aproximadamente, 1200m², sendo possível recuperar tal dano (fl. 67).
Em seu termo de declarações, às fls. 40, Paulo Nunes Alves informa que adquiriu o terreno de Sérgio Dias Martins já limpo, mediante o corte de mata lá existente, que acredita ter sido feito por roço, e já cercado com cerca, ressaltando que foram vendidos, por Sérgio, diversos terrenos no local, todos com problemas para a regularização. Paulo forneceu, ainda, cópia do contrato de compra e venda do terreno (fls. 42/44), cuja cláusula sexta (fl. 43) ressalta que benfeitorias só poderiam ser feitas após liberação definitiva do DPRN e IBAMA. Já em seu auto de qualificação e interrogatório, à fl. 110, Paulo Nunes Alves esclarece que é casado há 24 anos com Rosilene dos Santos Alves, em nome de quem está celebrado o contrato de compra e venda.
Rosilene dos Santos Alves ( fl. 113) afirma que não efetuou a limpeza no terreno, assim como não contratou ninguém para fazê-lo.
Já Sérgio Dias Martins, em seu termo de declarações (fls. 81/82), informa que o terreno começa a ser loteado em 2000, por seu genitor Emilio Lopes Martins, falecido, sem inventário encerrado. Com a morte, Sérgio passou a administrar os bens deixados, uma vez que é procurador de sua genitora e das irmãs de Emilio, com quem concorre no inventário, uma vez que sucedeu o pai no inventário de seus avós paternos. Afirma que, antes de comercializar os lotes, realizou uma consulta junto ao IBAMA para saber se a comercialização poderia ser feita, tendo sido orientado pelo Senhor Delcídio, engenheiro agrônomo da instituição, que a alienação poderia ocorrer, desde que uma cláusula contratual alertasse o comprador da necessidade de obter junto ao DPRN e IBAMA a autorização necessária para a implantação de qualquer benfeitoria do imóvel adquirido, o que o fez inserir a referida cláusula sexta nos contratos de compra e venda. Refutou, ainda, as declarações de Paulo, sugerindo a oitiva de Márcia Turato e Marcos José Lopes Florido de Oliveira como testemunhas de que não foi o responsável pelo desmatamento ocorrido no terreno.
Marcia Regina Turato Leite foi ouvida às fls. 87, e afirma que é proprietária de dois lotes do mesmo logradouro, adquiridos de Sérgio Dias Martins, sendo que Paulo Nunes Alves não chegou a cortar árvores nativas, realizando, pelo contrário, o plantio de árvores frutíferas ao redor de seu terreno. Ressalta, ainda, que tem conhecimento de um documento assinado pelo engenheiro 'Minoru', autorizando a limpeza rasteira dos referidos terrenos, datado de 2006, embora não esteja autorizada, ainda, a construção nos lotes. Quando de sua reinquerição, às fls. 224, Márcia esclarece que, na compra dos lotes, recebeu uma cópia do documento assinado pelo engenheiro Minoru o qual autorizava a limpeza dos lotes, e era comum a todos os proprietários, entendendo, portanto, que estava autorizada a limpar os terrenos que adquirira.
Marcos José Lopes Florido de Oliveira, por sua vez, afirmou que é primo de Sérgio Dias Martins, sabendo do loteamento e da presença de árvores nativas no local, não podendo afirmar, contudo, que fora o próprio Paulo Nunes Alves quem cortou as árvores nativas que existiam no terreno adquirido (fls. 102).
Em que pese o relatório apresentado pela autoridade policial às fls. 160 a 162, o Ministério Público Federal se manifestou, às fls. 165 e 166 entendendo que alguns itens da investigação ainda não estavam elucidados, solicitando, para tanto, a oitiva do fiscal Moisés de Souza e a identificação e oitiva do engenheiro 'Minoru'.
Assim, Moisés de Souza esclareceu, em seu termo de depoimento às fls. 173, que 'o desmatamento verificado no lote objeto da referida autuação, tratava-se de dano recente (cerca de um mês), a contar da data da visita em 20 de dezembro de 2010'. Ressalta, ainda, que conheceu pessoalmente o sr. Minoru Iwakami Beltrão, que prestava serviço à DEPRN, e que a suposta autorização de limpeza de supressão de vegetação nativa, supostamente assinada pelo engenheiro 1minoru1, não possui idoneidade, uma vez que ainda que o DEPRM possuísse poderes para emitir tais documentos, ainda seria preciso contar com a anuência da FLONA, à época gerenciada pelo IBAMA.
Às fls. 175 foi juntado a autorização favorável ao pedido de limpeza de área de supressão de vegetação nativa de sub bosque do processo 13229, solicitado por Sérgio dias Martins e outros ao diretor regional da sudeste paulista, o senhor minoru (grafado no documento como Iwakami Beltra, vindo do Departamento Estadual de Proteção de Recursos Naturais- DEPRN, de 13 de agosto e 2007, e assinado, inclusive, por Sérgio Dias Martins.
Em seu termo de declarações, Minoru Iwakami Beltrão (grafia correta comprovada pelo documento de identidade às fls. 195) às fls. 193 e 194, esclarece que foi funcionário do DEPRN entre 1994 e 2009, quando o departamento foi extinto e ele realocado na CETESB. Em 2006 exercia a atividade de Diretor da Regional Sudoeste Paulista, refutando peremptoriamente o documento às fls. 175, posto que não reconhece a assinatura como sua, bem como a própria formatação do referido documento que não se coaduna com o modelo utilizado à época, salientando que as autorizações para limpeza eram expedidas em formulário padrão totalmente diferente do documento apresentado. Ressalta, ainda, que no documento a palavra processo está grafada com 's' e a numeração 13229, que não chega nem perto da numeração de processos de sua diretoria, que giram em torno de 70.000. Foi feito auto de colheita de material gráfico do Sr. Minoru, entre as fls. 196 e 200, o que comprova que a assinatura do documento acoplado às fls. 175 em nada se parece com a real assinatura do engenheiro agrônomo.
Em seu auto de qualificação e interrogatório, ás fls. 245 e 246, Sérgio dias Martins admite que forneceu uma cópia da autorização aos compradores dos imóveis que estavam sendo adquiridos no loteamento de propriedade da família, afirmando que tal documento lhe foi entregue pelo advogado Jpsé \carlos Caramez, que havia sido constituído para realizar o inventário do seu genitor, tendo renunciado aos poderes no decorrer do processo (cópia da renúncia autuada às fls. 250).
Já José Carlos Caramez, às fls. 266, que de fato foi o advogado constituído para proceder o inventário de Emilio Lopes Martins, cujo inventariante foi Sérgio Dias Martins, e que, devido á morosidade provocada pelo próprio inventariante, renunciou à causa, desconhecimento o documento de fls. 175.

Diante disso, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL denunciou SÉRGIO DIAS MARTINS como incurso nas sanções dos crimes previstos nos artigos 197 do Código Penal e 38-A da Lei 9.605/1998.

DA EMENDATIO LIBELLI

Em razões de Apelação, o Ministério Público Federal pleiteia a reforma parcial da r. sentença parcialmente condenatória, a fim de que o acusado SÉRGIO DIAS MARTINS seja condenado nas penas do art. 304 c.c. art. 297, ambos do Código Penal, mediante emendatio libelli (art. 383 do Código de Processo Penal), pois, apesar de a denúncia ter capitulado a conduta de SÉRGIO como falsificação de documento público (art. 297 do Código Penal), restou descrito na denúncia e provado nos autos que SÉRGIO fora a pessoa quem efetivamente utilizou-se do referido documento público falso.

Primeiramente, mostra-se imperioso rememorar ser possível (porque contemplada a hipótese pelo ordenamento jurídico pátrio) a adequação da capitulação jurídica do fato narrado na denúncia ao tipo penal pertinente mediante a aplicação do instituto da emendatio libelli, cuja previsão encontra-se no art. 383 do Código de Processo Penal (O juiz, sem modificar a descrição do fato contida na denúncia ou queixa, poderá atribuir-lhe definição jurídica diversa, ainda que, em consequência, tenha de aplicar pena mais grave).

Isto porque, o acusado se defende dos fatos a ele irrogados (e não da capitulação jurídica propriamente dita), o que tem o condão de espancar qualquer ilação no sentido de que tal proceder ofenderia o devido processo legal (e seus corolários: ampla defesa e contraditório) a culminar em defeso cerceamento de defesa.

Nesse sentido:

Inquérito. Requisitos de validade da denúncia. Descrição fática consistente. Material probatório que impede o reconhecimento da atipicidade da conduta. Denúncia recebida. 1. O exame da admissibilidade da denúncia se limita à existência de substrato probatório mínimo e à validade formal da inicial acusatória. 2. A acusada se defende dos fatos descritos pela acusação e não propriamente da classificação jurídica dos fatos. Precedentes. 3. Não é inepta a denúncia que, ao descrever fato certo e determinado, permite à acusada o exercício da ampla defesa. Precedentes. (...) (STF, Inq 3113, Rel. Min. ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, julgado em 02/12/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-025 DIVULG 05-02-2015 PUBLIC 06-02-2015) - destaque nosso.

Ainda com o escopo de bem aquilatar a questão, cumpre trazer à colação julgados que sufragam a possibilidade de que a emendatio libelli ocorra em 2º grau de jurisdição (julgados estes que apenas impõem o limitativo de que a situação do acusado não reste piorada quando tiver havido o manejo de recurso de Apelação apenas pela defesa em decorrência da aplicação do disposto no art. 617 do Código de Processo Penal, o que, entretanto, sequer socorre o embargante à luz de que foi o Ministério Público Federal quem manifestou inconformismo com a r. sentença monocrática):

HABEAS CORPUS. EMENDATIO LIBELLI NO SEGUNDO GRAU DE JURISDIÇÃO. POSSIBILIDADE. MERA SUBSUNÇÃO DOS FATOS NARRADOS À NORMA DE INCIDÊNCIA. CRIME DE TORTURA. INCONSISTÊNCIA PROBATÓRIA. INOCORRÊNCIA. CONDENAÇÃO EM SEGUNDO GRAU DE JURISDIÇÃO. PREJUÍZO AO EXERCÍCIO DA AMPLA DEFESA. IMPROCEDÊNCIA. CONDENAÇÃO CONTRÁRIA AOS LAUDOS PERICIAIS OFICIAIS. JUSTIFICATIVA IDÔNEA. REGRA DO CONCURSO MATERIAL. APLICABILIDADE. DESÍGNIOS AUTÔNOMOS. PERDA DE PATENTE E DO POSTO. CONSEQÜÊNCIA DA CONDENAÇÃO. AUSENTE ILEGALIDADE. ORDEM DENEGADA. 1. Inexiste vedação à realização da emendatio libelli no segundo grau de jurisdição, pois se trata de simples redefinição jurídica dos fatos narrados na denúncia. Art. 383 do Código de Processo Penal. O réu se defende dos fatos, e não da definição jurídica a eles atribuída. (...) (STF, HC 92181, Rel. Min. JOAQUIM BARBOSA, Segunda Turma, julgado em 03/06/2008, DJe-142 DIVULG 31-07-2008 PUBLIC 01-08-2008 EMENT VOL-02326-03 PP-00567 RT v. 97, n. 877, 2008, p. 508-514) - destaque nosso.
HABEAS CORPUS. IMPETRAÇÃO ORIGINÁRIA. SUBSTITUIÇÃO AO RECURSO ESPECIAL CABÍVEL. IMPOSSIBILIDADE. RESPEITO AO SISTEMA RECURSAL PREVISTO NA CARTA MAGNA. NÃO CONHECIMENTO. (...) FURTO QUALIFICADO (ART. 155, § 4.º, II, DO CÓDIGO PENAL). CONDENAÇÃO. APELAÇÃO EXCLUSIVA DA DEFESA. EMENDATIO LIBELLI. POSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO EVIDENCIADO. REFORMATIO IN PEJUS. NÃO OCORRÊNCIA. 1. A emendatio libelli pode ser aplicada em segundo grau, desde que nos limites do art. 617 do Código de Processo Penal, que proíbe a reformatio in pejus. 2. Não há ilegalidade no procedimento adotado pelo Tribunal estadual ao retificar a condenação da paciente, dando-a como incursa no artigo 312, § 1.º, do Código Penal, já que, nos exatos termos do artigo 617, combinado com o artigo 383, ambos do Código de Processo Penal, atribuiu definição jurídica diversa aos fatos contidos na inicial sem majorar-lhe a pena. 3. Tendo o Tribunal coator pura e simplesmente atribuído definição jurídica diversa ao fato devidamente narrado na inicial acusatória, não se pode falar em cerceamento de defesa, tampouco em violação ao princípio do contraditório, uma vez que o acusado se defende das condutas que lhe são imputadas na peça vestibular, e não da capitulação jurídica a elas dada pelo órgão acusatório. (...) (STJ, HC nº 247.252/PR, Rel. Min. Jorge Mussi, Quinta Turma, j. 11.03.2014) - destaque nosso.
PENAL E PROCESSO PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. APROPRIAÇÃO INDÉBITA. FUNCIONÁRIO PÚBLICO. EMENDATIO LIBELLI. PECULATO. ARTIGO 312, CAPUT, DO CÓDIGO PENAL. PRELIMINAR REJEITADA. MERO ERRO MATERIAL. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. DOLO GENÉRICO. INAPLICABILIDADE DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. CONDENAÇÃO MANTIDA. (...) 3. Não há qualquer limitação para a aplicação da denominada emendatio libelli pelo Tribunal, pois a desclassificação, operada sem qualquer outra providência, não resultará em ofensa ao princípio da correlação entre a acusação e a decisão final ou ao direito de ampla defesa, pois não haverá surpresa para o acusado, que se defendeu amplamente dos fatos que lhe foram imputados na denúncia. 4. Pena mínima decorrente da prática do crime de peculato é maior do que a pena aplicada na sentença pela prática de apropriação indébita e havendo somente recurso da defesa, a fim de se evitar a reformatio in pejus, a reprimenda do apelante, em caso de manutenção da condenação, deve limitar-se aquela fixada em primeira instância, nos termos do artigo 617 do Código de Processo Penal. (...) (TRF3, ACR nº 0003263-22.2008.4.03.6117/SP, Rel. Des. Fed. Antonio Cedenho, Quinta Turma, D.E. 21.09.2012) - destaque nosso.

Cabe perquirir, então, se, no caso em concreto, a denúncia efetivamente descreveu a conduta de utilização de documento público falso, valendo, dessa forma, a transcrição da r. denúncia quanto a este ponto, in verbis (destaque nosso):

Consta nos autos que em 20 de dezembro de 2010, Paulo Nunes Alves foi autuado por danificar vegetação nativa em estágio médio de regeneração nativa em estágio média de regeneração do bioma da Mata Atlântica, em Zona de Amortecimento da FLONA de Ipanema, sem autorização de órgão ambiental competente. Acontece que Paulo adquiriu o terreno do denunciado Sérgio Dias Martins, afirmando que, quando da comprova, a área já estava limpa. Além disso, na transação referida Paulo e todos os outros que adquiriram lotes de Sérgio receberam um documento da Secretaria do Meio Ambiente, assinado pelo engenheiro agrônomo Minoru Iwakami Beltrão "autorizando a limpeza da área de supressão da vegetação nativa", documento este que se constatou ser falso durante este procedimento. Assim, denuncia-se Sérgio pela falsificação de documento público, tipificada no caput do art. 297 do Código Penal, além do dano ambiental causado no bioma Mata Atlântica, conforme exposto no art. 38-A da Lei 9.605/1998.
(...)
Às fls. 175 foi juntado a autorização favorável ao pedido de limpeza de área de supressão de vegetação nativa de sub bosque do processo 13229, solicitado por Sérgio Dias Martins e outros ao diretor regional da sudeste paulista, o senhor Minoru (grafado no documento como Iwakami Beltra, vindo do Departamento Estadual de Proteção de Recursos Naturais- DEPRN, de 13 de agosto e 2007, e assinado, inclusive, por Sérgio Dias Martins.
(...)
Em seu auto de qualificação e interrogatório, ás fls. 245 e 246, Sérgio dias Martins admite que forneceu uma cópia da autorização aos compradores dos imóveis que estavam sendo adquiridos no loteamento de propriedade da família, afirmando que tal documento lhe foi entregue pelo advogado José Carlos Caramez, que havia sido constituído para realizar o inventário do seu genitor, tendo renunciado aos poderes no decorrer do processo (cópia da renúncia autuada às fls. 250).

Vê-se, portanto, que a conduta relacionada ao delito de uso de documento falso foi descrita na denúncia implícita e explicitamente na denúncia ao restar evidente que, de fato, SÉRGIO DIAS MARTINS foi a pessoa que forneceu o documento falsificado aos compradores de seus lotes, incluindo o terreno pertencente à pessoa de nome Paulo Nunes Alves, que foi autuada em 20 de dezembro de 2010 por danificar vegetação nativa em estágio médio de regeneração nativa do bioma da Mata Atlântica, em Zona de Amortecimento da FLONA de Ipanema, sem autorização de órgão ambiental competente.

Inclusive, é de se ressaltar também que a instrução probatória, os memoriais e a sentença monocrática debruçaram-se não só acerca de esmiuçar quem havia sido o responsável pela falsificação do documento em questão, mas também sobre o potencial conhecimento, ou não, de SÉRGIO DIAS MARTINS acerca de tal falsidade quando do uso de referido documento, o que amoldar-se-ia, assim, ao delito de uso de documento falso (art. 304 c.c. art. 297, ambos do Código Penal), e não ao de falsificação de documento público (art. 297 do Código Penal), tal como capitulado na denúncia.

Diante disso, mostra-se plenamente possível a emendatio libelli em razões de Apelação ministerial pleiteando a condenação do réu no delito do art. 304 c.c. art. 297, ambos do Código Penal.

Nesse mesmo sentido, precedente do E. Tribunal Regional da 4ª Região em situação fática semelhante acerca dos delitos de falsificação de documento público e uso de documento falso, in verbis:

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. USO DE DOCUMENTO FALSO. ARTIGO 304 C/C 297 DO CÓDIGO PENAL. EMENDATIO LIBELLI. ENQUADRAMENTO TÍPICO. DESCLASSIFICAÇÃO PARA O DELITO DE ARTIGO 304 C/C 299 DO CÓDIGO PENAL. USO DE DOCUMENTO IDEOLOGICAMENTE FALSO. RG E CPF. TIPICIDADE. CRIME FORMAL. MATERIALIDADE, AUTORIA E DOLO DEMONSTRADOS. CRIME IMPOSSÍVEL. INOCORRÊNCIA. DOCUMENTO DOTADO DE POTENCIALIDADE LESIVA. INEXISTÊNCIA DE ABSOLUTA INEFICÁCIA DO MEIO. CONDENAÇÃO. DOSIMETRIA. COMPENSAÇÃO PARCIAL DA AGRAVANTE DA REINCIDÊNCIA COM A ATENUANTE DA CONFISSÃO. REINCIDÊNCIA ESPECÍFICA. REGIME INICIAL SEMIABERTO. SUBSTITUIÇÃO DA PENA INCABÍVEL. MEDIDA QUE NÃO SE MOSTRA SOCIALMENTE RECOMENDÁVEL NO CASO. ANTECEDENTES DESFAVORÁVEIS. REINCIDÊNCIA. 1. Segundo narrado pela exordial acusatória, o denunciado fez inserir, em documentos públicos (RG e CPF), dados falsos, com o intuito de, apresentando o CPF na Junta Comercial, constituir empresa individual. Aplicável ao caso a emendatio libelli, nos termos do artigo 383 do Código de Processo Penal, de forma a alterar a tipificação do fato delituoso, devendo o réu responder pela prática da conduta descrita no artigo 304 c/c artigo 299 do Código Penal - uso de documento ideologicamente falso, e não pelo crime previsto nos artigos 304 e 297 do Código Penal, como constou na denúncia. 2. A falsidade ideológica diz com a ausência de veracidade do conteúdo do documento, isto é, as informações nele contidas não correspondem à realidade, embora tenham sido lançadas por quem realmente o subscreve, o que conserva intacto o seu aspecto extrínseco, sendo falso somente a informação nele contida. Vale dizer: o documento é aprarentemente idôneo. O falsum, assim, reside no conteúdo de documento formalmente perfeito. De outro lado, a falsidade material refere-se à alteração extríneca, ou seja, o falso não se restringe à veracidade da idéia, mas alcança a adulteração da forma, de modo que seu aspecto externo é forjado. 3. Na espécie em exame, os documentos apresentados pelo réu (RG e CPF), embora emitidos pelo órgão público competente, contêm informações inverídicas, uma vez que expedidos com base em documentos também inidôneos, caracterizando, portanto, o delito de falsidade ideológica. 4. Comete o crime de uso de documento falso quem apresenta documento inautêntico em situação juridicamente relevante. 5. O delito de uso de documento falso é de caráter formal, prescindindo da ocorrência de resultado naturalístico. Consuma-se com a mera apresentação do documento para o fim a que se destina. 6. Demonstradas a materialidade e a autoria pelos elementos constantes nos autos, ressaindo ainda no caso a confissão do réu, nas fase policial e judicial. 7. Sendo genérico o dolo do delito do artigo 304 do Código Penal, decorre da própria conduta de apresentar o documento sabendo ser inautêntico. Basta, para a subsunção do fato à norma, a vontade de usar o documento em situação juridicamente relevante, com consciência da sua falsidade. 8. O elemento subjetivo mostra-se presente nos autos, pois o réu agiu com vontade livre e consciente com o intuito de apresentar, perante a ECT e a Junta Comercial, documentos espúrios, com o intuito de obter CPF e abrir empresa individual, condutas reprováveis pelo ordenamento jurídico. 9. No caso, o dolo é inequívoco, pois o réu admitiu, na fase policial e em juízo, ter feito uso de documento sabidamente falso. 10. Não há falar em crime impossível, pois o delito de uso de documento falso é de natureza formal, dispensando a ocorrência de resultado. Apresentado o documento apto a iludir, em situação valorada juridicamente, está consumado o crime, uma vez que malferida a fé pública. 11. A possibilidade ou a necessidade de verificação posterior do documento não retira sua a potencialidade lesiva, razão por que, apresentado o documento espúrio, e, no caso, aparentemente idôneo, para o fim a que se destina, está consumado o delito. 12. Não há falar ainda em não caracterização do crime quando o documento possui potencialidade lesiva para iludir os destinatários. Sendo a falsificação apta a iludir, não se acolhe a tese defensiva de crime impossível e de ineficácia absoluta do meio empregado. 13. Em se tratando de reincidência específica, deve preponderar a agravante da reincidência (artigo 61, I, do Código Penal) com relação à atenuante da confissão (artigo 65, III, d, do Código Penal). Assim, a compensação integral da reincidência com a confissão só é possível quando não se trate de reincidente específico ou de multirreincidente. Mantida no caso a compensação parcial. 14. Cuidando-se de réu reincidente, deve ser mantido o regime semiaberto para o início do cumprimento da pena corporal, nos termos do artigo 33, § 2º, alíneas "b" e "c", do Código Penal. 15. A substituição da pena corporal por restritivas de direitos submete-se a requisitos objetivos e subjetivos, mostrando-se inviável nas hipóteses em que o réu seja reincidente em crime doloso e seus antecedentes não indiquem como suficiente a substituição. 16. Ainda, a reincidência específica - hipótese dos autos - impede a substituição da pena privativa de liberdade por penas alternativas, conforme expressa disposição legal (artigo 44, § 3º, Código Penal). 17. A reincidência e a existência de maus antecedentes impossibilitam a substituição da pena, conforme artigo 44, incisos II e III, do Código Penal, pois a medida não se mostra socialmente recomendável ao caso, tampouco suficiente à retribuição sancionatória e à prevenção de novos delitos. (TRF4, ACR 5078667-44.2016.4.04.7100, SÉTIMA TURMA, Relatora CLÁUDIA CRISTINA CRISTOFANI, juntado aos autos em 21/08/2019)

Portanto, mostrando-se adequado ao caso em concreto a aplicação do instituto da emendatio libelli, passo, então à análise meritória da Apelação ministerial considerando o delito de uso de documento falso previsto no art. 304 c.c. art. 297, ambos do Código Penal.

DA MATERIALIDADE, AUTORIA E ELEMENTO SUBJETIVO DO DELITO DE USO DE DOCUMENTO FALSO

O crime de uso de documento público falso vem assim tipificado no Código Penal:

Art. 304 - Fazer uso de qualquer dos papéis falsificados ou alterados, a que se referem os arts. 297 a 302:

Pena - a cominada à falsificação ou à alteração.

(...)

Art. 297 - Falsificar, no todo ou em parte, documento público, ou alterar documento público verdadeiro:

Pena - reclusão, de dois a seis anos, e multa.

O delito em questão classifica-se como crime comum, podendo ser praticado por qualquer pessoa, e consuma-se com o efetivo uso do documento falsificado, independentemente da obtenção de qualquer vantagem. O sujeito passivo do delito é o Estado, podendo eventualmente prejudicar terceiro, de forma secundária. O objeto material é qualquer dos papéis falsificados ou alterados, a que se referem os arts. 297 a 302, todos do Código Penal. O tipo penal não tem pena própria, por ser crime acessório, sendo apenado com a sanção atinente ao crime de documento falso respectivo.

Registre-se que a falsificação deve ter aptidão para enganar o homem médio, sob pena de configurar conduta atípica. No mesmo sentido a sua reprodução, sem autenticação, pois não há a figura do documento para fins penais.

Vale acrescentar que, para a caracterização do crime do art. 304 do Código Penal, exige-se como elemento subjetivo do tipo penal a demonstração do dolo genérico, consistente no conhecimento da falsidade do documento, a despeito da vontade livre e consciente de fazer uso, não havendo previsão para a modalidade culposa.

A materialidade do delito restou comprovada especialmente pelo Laudo de Perícia Criminal Federal (Documentoscopia) (fls. 284/291), que atesta a falsidade do documento apresentado pelo acusado quando da venda dos lotes do empreendimento "Chácara Dias Martins" (fls. 175/176), certificando que este não foi emitido pela Secretaria do Meio Ambiente e a assinatura aposta em tal documento não corresponde à assinatura do engenheiro agrônomo Minoru Iwakami Beltrão, tratando-se, portanto, de documento FALSO.

Também reafirma a materialidade do delito o depoimento da testemunha de acusação Minoru Iwakami Beltrão, engenheiro agrônomo, que confirmou que o documento não foi assinado por ele, e aponta diversos erros constantes em referida certidão, conforme transcrição retirada da r. sentença monocrática: "que não foi responsável por assinar o documento que autorizava o corte de vegetação rasteira; que tem conhecimento do documento e trabalhou no DEPRN, sendo que, em 2006, era de fato o Diretor Regional Sudoeste Paulista e não Sudeste; que o documento apresenta uma série de erros, que normalmente não seriam cometidos; que a assinatura constante do documento de fls. 175/176 não é depoente, tendo sido feito exame grafotécnico na Polícia Federal em 2013 ou 2014, confirmando que a assinatura não era sua; que a administração pública não teria feito a abreviação de processo como 'pros'; que nunca erraria seu nome, o qual constou como 'Minoro Iwakami Beltra', sendo que o correto é 'Minoru Iwakami Beltrão'; que o depoente é engenheiro agrônomo e não engenheiro agrícola como constou; que o papel timbrado parece ser da Secretaria (folha de informação), mas a autorização tinha um outro padrão, por preenchimento de campos e não por texto corrido; que isso foi observado pela Polícia Federal também; que se recorda dos casos em que atuou, embora tenham sido em número bastante grande mas não se lembra desse caso em específico nem do Sr. Sérgio; que em 2006 o depoente exerceu o cargo de diretoria e, em geral, isso é tratado numa equipe técnica, então quem faria o atendimento seria um supervisor ou um técnico e não o diretor regional do departamento, que era o depoente na época; que a numeração era feita por estado e, em geral, na região de Sorocaba, a numeração era em torno de 65.000 ou 70.000, portanto 13.000 era uma numeração que deveria ter sido usada pelo extinto DAIA, Departamento de Avaliação de Impacto Ambiental; que não conhece o advogado Dr. José Carlos Caramez; que o carimbo constante de fls. 175 é semelhante ao do depoente, pois o seu nome está correto, o seu CREA também e a estrutura do carimbo é idêntica, mas não tem ideia de quem possa ter feito esse documento; que ratifica o teor do seu depoimento de fls. 193/194; que tem conhecimento de que o documento de fls. 175 foi apresentado em dois inquéritos nos quais foi convocado pela Polícia Federal para prestar depoimento".

Com relação à autoria, da mesma forma, a instrução probatória demonstrou de maneira suficiente que o acusado SÉRGIO DIAS MARTINS, de fato, entregou o documento falso autorizativo da limpeza da área de supressão de vegetação nativa, datado de 13.08.2007, aos promitentes compradores dos imóveis do loteamento de propriedade de sua família. O próprio acusado, tanto em sede policial como em seu interrogatório judicial (fls. 81/82, 245/246, e fl. 382- mídia), confirmou tal afirmação, inclusive, no que se refere em específico ao comprador Paulo Nunes Alves.

Por outro lado, entendo que o conjunto probatório não logrou evidenciar o elemento subjetivo do dolo de que o acusado SÉRGIO DIAS efetivamente tinha conhecimento acerca da falsidade do documento em questão.

Como bem apontou a sentença a quo a esse respeito, durante seus interrogatórios em sede policial e judicial, o acusado afirmou que não tinha consciência da natureza espúria do documento, alegando que este lhe teria sido entregue pelo advogado José Carlos Caramez, que havia sido constituído para realizar o inventário do genitor do acusado e cuidava das documentações referentes aos lotes. Inclusive, a esse respeito, o réu narrou especificamente que o advogado teria recebido, como pagamento por seus serviços, 16 dos lotes em questão, os quais foram vendidos pelo advogado, razão pela qual não desconfiou que os documentos a ele fornecidos pudessem ser falsos, uma vez que confiou na palavra do patrono, e no fato deste ter realizado a venda dos referidos terrenos em seu próprio benefício.

Tal versão do acusado apresenta verossimilhança com os fatos apurados no decorrer da investigação criminal. Como bem fundamento pelo r. juízo sentenciante, em que pese José Carlos Caramez tenha afirmado, por ocasião de sua oitiva na qualidade de testemunha do Juízo (fl. 373- mídia), que desconhecia a existência do documento em questão e que não intermediava a venda dos lotes do empreendimento "Chácara Dias Martins", sendo que sua ligação com a família teria sido exclusivamente de prestação de serviços enquanto advogado responsável pelo inventário do pai do acusado SÉRGIO, tal afirmação mostrou-se inverídica ao longo da instrução processual.

A informante Sueli Globo, ex-esposa do acusado SÉRGIO, confirmou que, além de ter sido contratado para cuidar do inventário do pai do réu, o Dr. José Carlos Caramez também foi contratado para regularizar o loteamento da área e que, a título de honorários, teriam sido-lhe entregues 16 (dezesseis) lotes, os quais foram posteriormente vendidos por ele. Confirmou, ainda, que o suposto documento falsificado de fls. 175/176 foi entregue a SÉRGIO por José Carlos Caramez e que o acusado desconhecia a falsidade de tal documento (fl. 353- mídia).

Valdir Credo Negrelli, engenheiro que trabalhou diretamente nos lotes da "Chácara Dias Martins", igualmente, confirmou que foi contratado por José Carlos Caramez para prestação de seus serviços como engenheiro e para tentar a regularização dos lotes perante a Prefeitura, tendo recebido, em troca de seu trabalho, 01 (um) dos 16 (dezesseis) lotes de propriedade do advogado José Carlos Camarez, afirmando, ademais, ter ciência de que o advogado vendeu os outros 15 (quinze) lotes restantes de forma irregular, sendo que, atualmente, já havia moradia e residências no local. Ainda sobre os fatos, a testemunha afirmou que quem insistiu e convenceu o pai do acusado SÉRGIO para fazer o loteamento foi o Dr. Caramez, sendo que foi feito um contrato entre eles acordando que o advogado faria o loteamento, topografia, projeto, etc, e, em troca, pegaria 40% do terreno do pai de Sérgio, daí, por isso, o recebimento dos 16 lotes pelo Dr. Caramez.

Ademais, o depoimento das testemunhas de defesa José Carlos Quirino, Maria Odete Gagliardi, Santina Dias Martins e Florinda Aparecida Vieira também confirmaram a intermediação do advogado José Carlos Caramez na venda dos lotes do empreendimento em questão (fls. 373 e 382- mídias).

Vê-se, portanto, que se afigura plausível a versão apresentada pelo réu de que recebeu o documento falsificado da pessoa de José Carlos Caramez, versão esta que foi ratificada de maneira coesa e harmônica por várias das testemunhas de defesa e da acusação, e que se mostra coerente com a própria qualidade de advogado contratado para tal serviço, o que conferiria segurança e confiança aos documentos por ele apresentados.

Diante disso, ainda que haja um contexto indiciário que pesa em desfavor de SÉRGIO DIAS MARTINS que, como proprietário do terreno, deveria diligenciar acerca da documentação apresentada antes de proceder sua venda, mantenho o entendimento proferido pelo r. juízo sentenciante de que o conhecimento do acusado acerca da falsidade do documento não se mostrou devidamente demonstrada.

A prova indiciária quando indicativa de mera probabilidade, como ocorre in casu, não serve como prova substitutiva e suficiente não apurada de forma concludente no curso da instrução criminal.

A doutrina é firme a respeito da certeza na convicção do julgador ao emitir decreto condenatório. Confira-se sobre o assunto, os comentários de Guilherme de Souza Nucci ao artigo 386 do Código de Processo Penal (in Código de Processo Penal Comentado", 15ª Edição, ano 2016, Editora Revista dos Tribunais, pág. 857):

Prova insuficiente para a condenação: é outra consagração do princípio da prevalência do interesse do réu - in dubio pro reu. Se o Juiz não possui provas sólidas para a formação de seu convencimento, sem poder indica-las na fundamentação da sua sentença, o melhor caminho é a absolvição. Logicamente, neste caso, há possibilidade de se propor ação indenizatória na esfera cível.

Nesse sentido, precedente de reconhecimento da ausência de dolo no uso de documento falso extraído deste E. Tribunal Regional Federal da 3ª Região, in verbis:

PENAL. PROCESSO PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO PÚBLICO. USO DE DOCUMENTO FALSO. MATERIALIDADE COMPROVADA. AUSÊNCIA DE PROVAS SUFICIENTES DO DOLO. TEORIA DA CEGUEIRA DELIBERADA. NÃO APLICÁVEL. ABSOLVIÇÃO MANTIDA. RECURSO MINISTERIAL DESPROVIDO.
1. A materialidade delitiva do crime de uso de documento falso restou evidenciada pelo conjunto probatório encartado aos autos.
2. Não há como se extrair a certeza a respeito do dolo, seja ele direto ou eventual, na conduta do acusado no que tange ao conhecimento de que o documento público apresentado era falso.
3. Afastada a alegação da acusação de que o acusado teria agido em uma cegueira deliberada a fim de justificar a presença do dolo, ao menos o eventual, tendo em vista que neste, o agente prevê a possibilidade do resultado lesivo e assume o risco do dano que porventura venha a ocorrer.
4. Considerando que a acusação não se desincumbiu do ônus que lhe impõe o art. 156 do Código de Processo Penal, havendo dúvida razoável acerca dos elementos essenciais do crime, não cabe a condenação do réu.
5. Nego provimento à apelação da acusação.
(TRF 3ª Região, 5ª Turma, ApCrim - APELAÇÃO CRIMINAL - 0001711-58.2017.4.03.6003, Rel. Desembargador Federal MAURICIO YUKIKAZU KATO, julgado em 18/09/2020, Intimação via sistema DATA: 22/09/2020)

Portanto, os elementos de persuasão racional coletados no bojo do caderno processual são insuficientes no que se refere ao elemento subjetivo do dolo para embasar o guerreado édito condenatório, razão pela qual, confirma-se a r. sentença nesse aspecto, absolvendo-se SÉRGIO DIAS MARTINS quanto ao delito do art. 297 c.c. art. 304, ambos do Código Penal.

Vale consignar, por fim, que, como bem apontado pela sentença a quo, no que concerne ao possível envolvimento de José Carlos Camarez no caso, que ensejaria a instauração de investigação criminal em seu desfavor, tem-se que, para tal fato, já houve a prescrição da pretensão punitiva estatal.

DO OFERECIMENTO DOS BENEFÍCIOS DESPENALIZADORES DA LEI Nº 9.099/1995

Diante da absolvição quanto ao delito do art. 297 c.c. art. 304, ambos do Código Penal, remanesce contra o acusado tão somente a condenação procedida pelo r. juízo sentenciante referente ao delito do art. 38-A da Lei de Crimes Ambientais, cuja pena mínima prescrita é de 01 (um) ano de detenção, configurando, portanto, crime de menor potencial ofensivo.

E, em se tratando SÉRGIO DIAS MARTINS de acusado primário, mostra-se de rigor que, antes de proferir decreto condenatório definitivo, seja oportunizada a manifestação do Ministério Público sobre o eventual cabimento dos benefícios despenalizadores previstos na Lei Federal nº 9.099/1995.

Nesse sentido, diversos precedentes, inclusive das C. Cortes Superiores, já se manifestaram para declarar a nulidade das sentenças que, ao mudar a classificação jurídica da denúncia ou absolver parcialmente o réu da imputação inicialmente prevista, deixaram de dar vista dos autos ao Ministério Público Federal passando diretamente à condenação e dosimetria da pena de delitos que, em tese, fazem jus aos benefícios da Lei nº 9.099/1995. Veja-se, in verbis:

HABEAS CORPUS. IMPETRAÇÃO EM SUBSTITUIÇÃO AO RECURSO CABÍVEL. UTILIZAÇÃO INDEVIDA DO REMÉDIO CONSTITUCIONAL. NÃO CONHECIMENTO.
A via eleita se revela inadequada para a insurgência contra o ato apontado como coator, pois o ordenamento jurídico prevê recurso específico para tal fim, circunstância que impede o seu formal conhecimento. Precedentes.
2. O alegado constrangimento ilegal será analisado para a verificação da eventual possibilidade de atuação ex officio, nos termos do artigo 654, § 2º, do Código de Processo penal.
FAVORECIMENTO REAL E QUADRILHA. CONCURSO MATERIAL. DELITOS CUJAS PENAS ULTRAPASSAM OS LIMITES PREVISTOS NA LEI 9.099/1995. IMPOSSIBILIDADE DE OFERECIMENTO DE TRANSAÇÃO PENAL OU DE SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO. QUANDO DEFLAGRADA A AÇÃO PENAL. ENUNCIADO 231 DA SÚMULA DO SUPERIOR DE JUSTIÇA. COAÇÃO ILEGAL INEXISTENTE.
1. Nos termos do enunciado 243 da Súmula deste Superior Tribunal de Justiça, "o benefício da suspensão do processo não é aplicável em relação às infrações penais cometidas em concurso material, concurso formal ou continuidade delitiva, quando a pena mínima cominada, seja pelo somatório, seja pela incidência da majorante, ultrapassar o limite de um (01) ano".
2. O mesmo entendimento é aplicável à transação penal, que não pode ser ofertada aos acusados de crimes cuja pena máxima, considerado o concurso material, ultrapasse 2 (dois) anos, limite para que se considere a infração de menor potencial ofensivo. Precedente.
3. No caso dos autos, a paciente foi denunciada pela prática dos delitos previstos nos 349-A e 288 do Código penal, em concurso material, cujas penas máximas são, respectivamente, de 1 (um) ano de detenção e de 3 (três) anos de reclusão, as quais, somadas, ultrapassam os limites previstos na Lei 9.099/1995, o que demonstra que, quando iniciada a ação penal em apreço, não fazia jus aos benefícios d transação penal ou d suspensão condicional do processo.
SUPERVENIÊNCIA DE SENTENÇA ABSOLVENDO A ACUSADA DO DELITO DE QUADRILHA. SUBSISTÊNCIA DE CRIME QUE PERMITE A APLICAÇÃO DOS BENEFÍCIOS PREVISTOS NA LEI DOS JUIZADOS ESPECIAIS. AUSÊNCIA DE ABERTURA DE VISTA DOS AUTOS AO MINISTÉRIO PÚBLICO PARA SE MANIFESTAR SOBRE A QUESTÃO. NULIDADE. CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO. CONCESSÃO DA ORDEM DE OFÍCIO.
Este Sodalício possui entendimento consolidado no sentido de que absolvido o réu de parte das imputações que lhe foram feitas, e sendo cabível o oferecimento dos benefícios previstos na Lei 9.099/1995 quanto aos ilícitos remanescentes, cumpre ao magistrado abrir vista dos autos ao Ministério Público a fim de que sobre eles se manifeste. Enunciado 337 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça.Não tendo o togado sentenciante remetido os autos ao órgão ministerial a fim de que se pronunciasse sobre a possibilidade de propositura dos institutos despenalizadores previstos na Lei 9.099/1995 à paciente, afastando-a de pronto e passando à dosimetria da pena, constata-se a nulidade do feito.
3. Habeas corpus não conhecido. Ordem concedida de ofício para, mantida a absolvição da paciente quanto ao delito de quadrilha, oportunizar ao Ministério Público que se manifeste sobre a possibilidade de oferecimento de suspensão condicional do processo à paciente.
(HC 309.975/RS, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 17/03/2015, DJe 25/03/2015- destaque nosso)
Trata-se de habeas corpus com pedido liminar, impetrado pela Defensoria Pública da União, em favor de Wander Gonçalves Mota, contra acórdão proferido pela Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que negou provimento ao Agravo Regimental nos autos do Agravo em Recurso Especial 904.165/MG. Consta dos autos que o paciente foi condenado pela prática dos delitos descritos nos artigos 28 e 37 da Lei 11.343/2006 à pena de 2 anos de reclusão, em regime inicial aberto, substituída por duas restritivas de direitos; bem como à medida educativa de comparecimento a programa ou cursos educativos, pelo prazo de 6 meses. Irresignada, a defesa interpôs apelação criminal no Tribunal de Justiça mineiro, postulando, em suma, a absolvição pelo crime previsto no artigo 37 da Lei de Drogas por atipicidade da conduta. Alternativamente, pugnou pelo reconhecimento da confissão espontânea em relação ao delito de posse de entorpecentes para consumo pessoal, bem como pela redução da medida educativa aplicada ao réu. O recurso foi parcialmente provido para absolver o réu do delito descrito no artigo 37 da Lei de Drogas por falta de provas, bem como para, em relação ao crime de posse de entorpecentes para consumo pessoal, reconhecer a atenuante da confissão espontânea e assim reduzir a pena imposta ao apelante, concretizando-a em comparecimento a programa ou curso educativo pelo prazo de 2 meses. Eis a ementa desse julgado: APELAÇÃO CRIMINAL COLABORAÇÃO COM GRUPO, ORGANIZAÇÃO OU ASSOCIAÇÃO DESTINADOS AO TRÁFICO ILÍCITO DE SUBSTÂNCIAS ENTORPECENTES PROVA INSUFICIENTE ABSOLVIÇÃO QUE SE IMPÕE POSSE DE ENTORPECENTES PARA CONSUMO PESSOAL AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS CONDENAÇÃO MANTIDA REPRIMENDA EXARCERBADA REDUÇÃO QUE SE IMPÕE. 01. Inexistindo prova segura de que o réu colaborava, como informante, com grupo, organização ou associação constituídos para o tráfico ilícito de substâncias entorpecentes, a absolvição é medida que se impõe (art. 386, VII, do CPP). 02. Demonstradas, quantum satis , a materialidade e a autoria do crime de posse de entorpecentes para consumo pessoal, a condenação do réu, à falta de causas excludentes de ilicitude ou de culpabilidade, é medida que se impõe. 03. A sanção penal, medida de exceção, deve ser, por excelência, aquela necessária e suficiente à prevenção e reprovação do injusto, eis porque, se aplicada com exagero, há que ser adequada. (eDOC 2, p. 10) Sobreveio recurso especial, o qual foi obstado na origem. Impugnou-se a decisão por meio de agravo no Superior Tribunal de Justiça. O recurso não foi conhecido, nos termos da jurisprudência da Corte Especial. No presente writ, a DPU insiste na alegação de nulidade do feito em razão da não abertura de vista ao Ministério Público para manifestar-se acerca da transação penal. Requer, liminarmente, a suspensão da tramitação da ação penal até o julgamento final deste mandamus. Em 28.2.2018, deferi a liminar, para determinar a suspensão dos efeitos da condenação. A Procuradoria-Geral da República opinou pelo não conhecimento do pedido. (eDOC 18) É o relatório. Passo a decidir. Conforme registrei na decisão pretérita, a despeito de, originalmente, ter sido o paciente denunciado ainda por outro delito (artigo 37 da Lei de Drogas), circunstância que afastava o cabimento da suspensão em face da somatória das penas (acima do mínimo legal de 1 ano exigido pelo artigo 89 da Lei 9.099/1995), operou-se em grau de recurso a absolvição pelo segundo delito. Neste caso, o crime remanescente, quanto à pena, autorizava a proposta de suspensão do processo. Existem precedentes do próprio STJ consignando a viabilidade do oferecimento da proposta de suspensão pelo Ministério Público, conforme, dentre outros, o seguinte julgado: (...)
O mesmo STJ acabou editando a Súmula 337 permitindo aludido benefício processual em hipótese semelhante ao destes autos: Súmula 337. STJ: é cabível a suspensão condicional do processo na desclassificação do crime e na procedência parcial da pretensão punitiva. Acerca da tese ministerial, segundo a qual a transação penal traria consequência mais gravosa que a sanção imposta ao paciente, verifico tratar-se de matéria afeta à sua própria deliberação. É que a Defensoria busca, através do presente writ, que seja ofertada, ao paciente, a transação penal, o que não significa que ele vá aceitá-la. E mais: até que esta Corte julgue o RE 635.659, de minha relatoria, o entendimento atual é no sentido de que não houve abolitio criminis do crime de posse de droga para uso pessoal, mas apenas sua despenalização, de modo que a condenação havida pode gerar reincidência e demais consequências processuais. Dito isso, tenho que, ao contrário do que alega a PGR, a condenação por infração ao art. 28 da Lei de Drogas pode ser mais gravosa que a aceitação da transação penal. Ante os fundamentos expostos, concedo a ordem para confirmar a liminar deferida e determinar seja ofertada ao paciente a transação penal, nos termos da Lei 9.099/95.
Comunique-se. Publique-se. Brasília, 24 de agosto de 2018. Ministro Gilmar Mendes Relator Documento assinado digitalmente
(HC 151688, Relator(a): Min. GILMAR MENDES, Supremo Tribunal Federal, julgado em 24/08/2018, publicado em PROCESSO ELETRÔNICO DJe-176 DIVULG 27/08/2018 PUBLIC 28/08/2018)
HABEAS CORPUS. DIREITO PROCESSUAL PENAL. SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO. PRESCRIÇÃO DE UM DOS CRIMES. CABIMENTO DO SURSIS PROCESSUAL. SÚMULA Nº 337/STJ. UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA. INEXISTÊNCIA DE DIVERGÊNCIA. FACULDADE DO RELATOR. AGRAVO IMPROVIDO. 1. Em se fazendo cabível a suspensão condicional do processo, por força de desclassificação ou procedência só parcial da denúncia, é dever do Juiz suscitar a manifestação do Ministério Público, a propósito da sua suficiência como resposta penal, excluindo, como exclui, a imposição da pena correspondente ao fato-crime. 2. Em casos tais, não se há de anular a denúncia e, tampouco, tudo mais do processo no primeiro grau de jurisdição, mas tão-só desconstituir a condenação decretada na sentença, para determinar que seja ouvido o Ministério Público sobre a proposta de suspensão do processo referida no artigo 89 da Lei nº 9.099/95. Precedentes. 3. "É cabível a suspensão condicional do processo na desclassificação do crime e na procedência parcial da pretensão punitiva." (Súmula do STJ, Enunciado nº 337). 4. O incidente de uniformização de jurisprudência, à luz do exame topográfico da letra do artigo 476 do Título IX do Código de Processo Civil, não consubstancia recurso, devendo, como deve, ser suscitado previamente ao pronunciamento jurisdicional, sob pena de rematada extemporaneidade. 5. "(...) A suscitação do incidente de uniformização de jurisprudência em nosso sistema constitui faculdade, não vinculando o juiz, sem embargo do estímulo e do prestígio que se deve dar a esse louvável e belo instituto." (REsp nº 3.835/PR, Relator Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, in DJ 29/10/90). 6. Agravo regimental improvido
(STJ - AgRg no REsp: 828063 GO 2006/0068285-3, Relator: Ministro HAMILTON CARVALHIDO, Data de Julgamento: 24/05/2007, T6 - SEXTA TURMA, Data de Publicação: DJ 10.09.2007 p. 321)
RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. ART. 334, CAPUT, DO CÓDIGO PENAL. CONDENAÇÃO À PENA DE 1 ANO DE RECLUSÃO. APELAÇÃO. REMESSA DOS AUTOS AO JUÍZO DE ORIGEM. OFERECIMENTO D SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO. ACEITA PELOS RECORRENTES. INSUBSISTÊNCIA DA SENTENÇA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL PATENTE. PRESCRIÇÃO. OCORRÊNCIA. RECURSO PROVIDO. 1. Dispõe a Súmula 337 desta Corte que é cabível a suspensão condicional do processo na procedência parcial da pretensão punitiva. 2. "Se não foi conferida ao Ministério Público a possibilidade de propor transação penal ou a suspensão condicional do processo, em hipótese na qual a pena abstrata prevista permite a aplicação de tais institutos, não pode subsistir a condenação, por excluir do acusado a oportunidade de eventualmente aceita-las." (HC 162.807/SP, Rel. Ministra LAURITA VAZ, Quinta Turma, julgado em 08/05/2012, DJe 21/05/2012). Ressalva do entendimento da Relatora. 3. Diante da insubsistência da sentença que condenou os recorrentes pela prática do crime tipificado no art. 334, caput, do Código Penal, apura-se o transcurso do lapso prescricional, fato que exige o reconhecimento da extinção da punibilidade. 4. Recurso a que se dá provimento para desconstituir a sentença, na parte em que foram condenados os recorrentes Francisco, Gildivan e Leandro, e, por conseguinte, declarar extinta a punibilidade, dada a prescrição punitiva estatal.
(STJ - RHC: 73124 PR 2016/0176831-0, Relator: Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, Data de Julgamento: 01/09/2016, T6 - SEXTA TURMA, Data de Publicação: DJe 12/09/2016)
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. PORNOGRAFIA INFANTIL. ACUSADO DENUNCIADO POR INFRAÇÃO AOS ARTS. 241-A E 241-B DA LEI N. 8069/1990. PROCEDÊNCIA PARCIAL DA PRETENSÃO PUNITIVA. POSSIBILIDADE DE SURSIS PROCESSUAL. SÚMULA 337/STJ. CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO. REMESSA DO FEITO AO MINISTÉRIO PÚBLICO. AGRAVO NÃO PROVIDO.
1. Nos termos do art. 89 da Lei n. 9.099/1995, "Nos crimes em que a pena mínima cominada for igual ou inferior a um ano, abrangidas ou não por esta Lei, o Ministério Público, ao oferecer a denúncia, poderá propor a suspensão do processo, por dois a quatro anos, desde que o acusado não esteja sendo processado ou não tenha sido condenado por outro crime, presentes os demais requisitos que autorizariam a suspensão condicional da pena (art. 77 do Código Penal)".
2. De acordo com o enunciado n. 337, da Súmula do STJ, é cabível a suspensão condicional do processo na desclassificação do crime e na procedência parcial da pretensão punitiva.
3. Havendo a procedência parcial da pretensão punitiva, enquadrandose o crime entre aqueles que admitem a suspensão condicional do processo é dever do magistrado encaminhar os autos ao órgão do Ministério Público, a fim de que este avalie a possibilidade de propor o benefício despenalizador.
4. Em casos excepcionais, configurada flagrante ilegalidade apta a gerar constrangimento ilegal, é possível a concessão da ordem de ofício, nos termos do art. 654, § 2º, do Código de Processo Penal, ainda que a matéria não tenha sido devidamente prequestionada.
5. Agravo regimental a que se nega provimento.
(AgRg no REsp 1788501/CE, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 24/09/2019, DJe 04/10/2019, grifei.)
HABEAS CORPUS. IMPETRAÇÃO EM SUBSTITUIÇÃO AO RECURSO CABÍVEL. UTILIZAÇÃO INDEVIDA DO REMÉDIO CONSTITUCIONAL. VIOLAÇÃO AO SISTEMA RECURSAL. NÃO CONHECIMENTO.
1. A via eleita revela-se inadequada para a insurgência contra o ato apontado como coator, pois o ordenamento jurídico prevê recurso específico para tal fim, circunstância que impede o seu formal conhecimento. Precedentes.
2. O alegado constrangimento ilegal será analisado para a verificação da eventual possibilidade de atuação ex officio, nos termos do artigo 654, § 2º, do Código de Processo Penal.
CRIME DE USURPAÇÃO DE PATRIMÔNIO DA UNIÃO. ART. 2º DA LEI 8.176/91. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. ALEGAÇÃO DE ATIPICIDADE. SENTENÇA CONDENATÓRIA. PERDA DE OBJETO DO WRIT.
1. De acordo com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, a superveniência de sentença condenatória prejudica o mandamus que tem por objeto o trancamento da ação penal por ausência de justa causa, pois o juiz de primeiro grau, em sede de cognição exauriente, reputou presentes os elementos probatórios da conduta delitiva.
Precedentes.
EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE DE UM DOS DELITOS DENUNCIADOS. DECLARAÇÃO NO SEGUNDO GRAU DE JURISDIÇÃO. CRIME REMANESCENTE QUE COMPORTA A SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO. APLICAÇÃO DA SÚMULA N. 337/STJ. CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO. HABEAS CORPUS CONCEDIDO DE OFÍCIO.
1. Ainda que a prescrição da pretensão punitiva em relação a um dos crimes denunciados tenha sido reconhecida no segundo grau de jurisdição, tem aplicabilidade o entendimento firmado no enunciado n. 337 da Súmula desta Corte Superior de Justiça, sendo devida a análise da possibilidade de suspensão condicional do processo, caso o delito remanescente se amolde ao requisito objetivo previsto no artigo 89 da Lei n. 9.099/95.
2. Com o advento da reforma processual levada a efeito pela Lei n. 11.719/2008, a causa extintiva da punibilidade do agente passou a ser hipótese de sua absolvição sumária, nos termos do artigo 397, inciso VI, do Código de Processo Penal, não havendo razão pela qual a sua verificação em momento posterior - seja na sentença ou no julgamento do recurso de apelação - deva receber tratamento distinto dos casos em que há prolação de um juízo de mérito absolutório.
3. Habeas corpus não conhecido. Ordem concedida de ofício para anular parcialmente o julgamento do recurso de apelação, mantida a declaração de extinção da punibilidade do paciente pelo delito previsto no artigo 55 da Lei n. 9.605/98, e determinar a remessa dos autos ao Ministério Público Federal para que se manifeste sobre a possibilidade de concessão da suspensão condicional do processo no que diz respeito ao delito remanescente.
(HC 367.779/RJ, Rel. Ministro FELIX FISCHER, Rel. p/ Acórdão Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 07/02/2017, DJe 17/02/2017)

Inclusive, a esse respeito, a Súmula 337 do C. Superior Tribunal de Justiça é expressa ao prever a possibilidade de oferecimento dos benefícios da Lei 9.099/1995 ao crime remanescente ao prever que é cabível a suspensão condicional do processo na desclassificação do crime e na procedência parcial da pretensão punitiva, o que se amolda ao caso ora em questão.

Ressalte-se que, ainda que no caso concreto a condenação do réu tenha permitido a conversão da pena privativa de liberdade em uma pena restritiva de direitos, é importante apontar que a condenação penal gera efeitos outros, como a reincidência e os antecedentes criminais, e, portanto, deve ser oportunizada ao menos a possibilidade de que o Ministério Público Federal analise a eventual propositura de tais benefícios despenalizadores, o que pode, ou não, ser aceito pelo acusado.

Assim, deve ser SUSPENSO o julgamento das razões do apelo no que se refere ao exame da dosimetria da pena do delito previsto no art. 38-A da Lei de Crimes Ambientais, convertendo-se o julgamento em diligências para remeter os autos ao r. juízo de origem, com posterior encaminhamento ao Ministério Público Federal, para que se manifeste acerca da eventual possibilidade de oferecimento da suspensão condicional do processo acerca do delito remanescente (art. 38-A da Lei 9.605/1998).

Efetuando-se a proposta de suspensão condicional do processo e aceitas suas condições, o processo deverá ser suspenso, permanecendo os autos no juízo de primeiro grau, que acompanhará o cumprimento das condições pelo período devido. Findo tal prazo e tendo sido devidamente cumpridas todas as condições, caberá ao juízo de primeiro grau extinguir a punibilidade do réu, nos termos do art. 89, § 5º, da Lei nº 9.099/95, não sendo necessário o envio dos autos a este Tribunal para esse fim.

Em caso contrário, caso frustrada a tentativa de efetiva suspensão condicional do processo, o juízo deverá remeter os autos a este Tribunal para que haja o julgamento do recurso na parte faltante referente à dosimetria da pena do delito ambiental.

DISPOSITIVO

Ante o exposto, voto por apreciar parcialmente o recurso do Ministério Público Federal e, na parte apreciada, NEGAR PROVIMENTO no que tange ao delito de uso de documento falso (art. 297 c.c. art. 304, ambos do Código Penal), absolvendo o acusado de tal imputação, uma vez que ausente a comprovação do elemento subjetivo do dolo. No que tange à insurgência da acusação quanto à dosimetria art. 38-A da Lei 9.605/1998, DE OFÍCIO, voto por SUSPENDER o julgamento das razões do apelo quanto a este ponto, convertendo-se o julgamento em diligências para determinar a remessa dos autos ao r. juízo de origem, com posterior encaminhamento ao Ministério Público Federal, para que se manifeste acerca da eventual possibilidade de oferecimento da suspensão condicional do processo acerca do delito remanescente (art. 38-A da Lei 9.605/1998), nos termos do voto acima proferido.

É o voto.

FAUSTO DE SANCTIS
Desembargador Federal


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