Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 16/05/2022
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0010142-95.2018.4.03.6181/SP
2018.61.81.010142-1/SP
RELATOR : Desembargador Federal FAUSTO DE SANCTIS
APELANTE : FREDERICO GUSTAVO TROIANO BUHRER reu/ré preso(a)
ADVOGADO : SP125337 JOSE PEDRO SAID JUNIOR
: SP146938 PAULO ANTONIO SAID
: SP331009 GABRIEL MARTINS FURQUIM
APELADO(A) : Justica Publica
No. ORIG. : 00101429520184036181 9P Vr SAO PAULO/SP

EMENTA

DIREITO PENAL. PROCESSUAL PENAL. TRÁFICO TRANSNACIONAL DE DROGAS. ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. MATERIALIDADE E AUTORIA DELITIVAS DEVIDAMENTE COMPROVADAS. ELEMENTOS DE INFORMAÇÃO COLETADOS NA ETAPA PERQUISITIVA-ANTEJUDICIAL CONFIRMADOS PELAS PROVAS PRODUZIDAS EM JUÍZO, SOB O CRIVO DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA. TESTEMUNHAS QUE CONFIRMAM A PARTICIPAÇÃO DO RÉU NOS EVENTOS DANOSOS. PALAVRAS DOS POLICIAIS CIVIS FIRMES E COESAS. AUSÊNCIA DE MÁCULA NA OBTENÇÃO DAS PROVAS. CONDENAÇÃO CONFIRMADA. DOSIMETRIA DAS PENAS. PRIMEIRA FASE. PENA-BASE. EXASPERAÇÃO. MANUTENÇÃO. GRANDE QUANTIDADE E VARIEDADE DE ENTORPECENTES APREENDIDOS (03 QUILOS DE COCAÍNA). PATAMARES DESTA E. TURMA JULGADORA. SEGUNDA FASE. AUSÊNCIA DE AGRAVANTES OU ATENUANTES. TERCEIRA FASE. CAUSA DE AUMENTO DE PENA. TRANSNACIONALIDADE DELITIVA. DROGA QUE TINHA COMO DESTINO A ALEMANHA. AUSÊNCIA DE BIS IN IDEM. BENEFÍCIO PREVISTO NO ART. 33, § 4º, DA LEI DE DROGAS. INAPLICABILIDADE. CIRCUNSTÂNCIAS QUE INDICAM A REITERAÇÃO DELITIVA E A EFETIVA PARTICIPAÇÃO DO RÉU EM ORGANIZAÇÕES CRIMINOSAS. REGIME INICIAL fechado. detração. NÃO influência. SUBSTITUIÇÃO DA PENA. IMPOSSIBILIDADE. APELAÇÃO DEFENSIVA DESPROVIDA. SENTENÇA CONFIRMADA.
- Questão de fundo. A autoria delitiva relacionada aos delitos de tráfico internacional de drogas e associação para o tráfico atribuída ao réu FREDERICO, assim como o elemento subjetivo dos tipos penais (dolo direto), restaram sobejamente comprovados nos autos em análise por intermédio das provas colacionadas no bojo do caderno processual, sobretudo porque a prova testemunhal e os relatórios de investigação endossaram os fatos descritos na r. exordial-incoativa.
- O decreto monocrático não se baseou apenas em elementos de informação coletados no bojo da etapa inquisitiva-antejudicial. A sentença prolatada pelo r. juízo de origem está fundamentada não só nos trabalhos investigativos, mas também nos elementos de persuasão racional colacionados na etapa instrutória, a exemplo dos testemunhos dos policiais civis e das declarações de Jenifer.
- As declarações de Jenifer foram confirmadas em juízo pela oitiva do Delegado de Polícia que presidiu a investigação e corroboradas pelas declarações dos demais policiais civis. Registre-se que está superada a malfadada tese da parcialidade dos testemunhos, sob compromisso, de agentes recrutados mediante processo seletivo, até porque seria contrassenso credenciar pessoas para atuar na prevenção e repressão ao crime e, mais tarde, quando mais se necessita desses testigos para apaziguar e combater condutas que afligem a sociedade, o Estado-Juiz negar-lhes crédito tão-somente em razão da função pública que exercem.
- Não há qualquer mácula na apreensão do aparelho de telefonia móvel pertencente a Jenifer pela polícia, sobretudo porque ela mesma forneceu a senha de acesso ao celular, a fim de colaborar com as investigações.
- Eventual perícia sobre o aparelho e as fotografias encartadas aos autos deveria ser requisitada pela defesa, ônus que lhe incumbia, nos termos do artigo 156 do Código de Processo Penal. Ainda que assim não fosse, cremos que eventual perícia sobre o aparelho tornar-se-ia despicienda, porquanto as imagens foram extraídas pela polícia civil no âmbito de suas atribuições investigativas, de modo que não há espaço para se falar em adulteração de seu conteúdo.
- A prova produzida em juízo, sob o crivo do contraditório e da ampla defesa, é robusta no sentido de esclarecer, com a desejável segurança, a correta dinâmica concernente aos delitos em comento, atribuindo responsabilidade penal ao recorrente. Em outras palavras, os elementos de persuasão racional coletados no bojo do caderno processual são suficientes para embasar o guerreado édito condenatório, não se tratando de prova meramente indiciária ou colhida apenas na etapa administrativa. Com esteio nestes fundamentos, também não há falar em aplicação do princípio do in dubio pro reo, já que a prova despontou direta, razão pela qual, confirma-se a r. sentença nesse aspecto.
- As provas colacionadas aos autos em análise também demonstram que a associação criminosa estava constituída há algum tempo e dedicava-se ao narcotráfico internacional. Dos testemunhos de Jenifer e dos relatórios policiais extrai-se que os associados contavam com grande estrutura material e financeira, a exemplo do apartamento locado pelo réu em região nobre da Cidade de São Paulo (bairro dos Jardins), assim como veículo de luxo (apreensão do carro Mercedes-Benz), pagamento da viagem em espécie e acomodação da corré em mais de um hotel em São Paulo, demonstrando-se grande poder financeiro por parte dos envolvidos e, ainda, que eles não eram incipientes neste tipo de crime (tráfico de drogas).
- Além disso, a codenunciada Jenifer declarou em juízo que foi cooptada em outro Estado da Federação (Espírito Santo), por um indivíduo ainda não corretamente identificado, o que demonstra que a quadrilha atuava em diversos Estados e tinha como finalidade a captação de "mulas" para a realização de narcotráfico por meio de viagens internacionais, circunstância que também indica a estrutura firme e bem organizada do bando, assim como demonstra que os envolvidos estavam associados não apenas para a prática do delito de tráfico apurado neste persecutório (aproximadamente três quilos de Cocaína transportado por Jenifer), mas também para o desenvolvimento de outros crimes da mesma espécie.
- Não foi comprovada renda para a aquisição de veículo de luxo e aluguel em edifícios de alto padrão, inferindo-se que os associados não possuíam fonte lícita para ostentar o padrão de vida que possuíam.
- Dosimetria da pena. Primeira fase. Considerando-se a qualidade e quantidade de droga transportada (pouco mais de três quilos de Cocaína), assim como tendo em vista os precedentes desta E. Turma Julgadora, bem fixada a reprimenda em 05 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão e pagamento de 583 (quinhentos e oitenta e três) dias-multa referente ao delito do artigo 33, caput, da Lei nº 11.343/2006, e de 03 (três) anos e 06 (seis) meses de reclusão e pagamento de 816 (oitocentos e dezesseis) dias multa para o delito do artigo 35, caput, da Lei nº 11.343/2006.
- Segunda fase. Inexistem agravantes ou atenuantes genéricas a interferirem nas penas, tampouco há recurso das partes nesse aspecto, pelo que se mantém as penas-base em 05 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão e pagamento de 583 (quinhentos e oitenta e três) dias-multa referente ao delito do artigo 33, caput, da Lei nº 11.343/2006, e de 03 (três) anos e 06 (seis) meses de reclusão e pagamento de 816 (oitocentos e dezesseis) dias multa para o delito do artigo 35, caput, da Lei 11.343-2006.
- Terceira fase. Causa de aumento de pena. O Superior Tribunal de justiça já decidiu que a causa de aumento prevista no artigo 40, inciso I, da Lei nº 11.343/2006 pode ser aplicada tanto ao crime do artigo 33, quanto ao delito do artigo 35, ambos da Lei de Drogas, porquanto tratarem-se de tipos penais autônomos, sem que haja falar em proibição pelo princípio do non bis in idem.
- Cause de diminuição. O réu integrava extensa associação criminosa criada para a consecução de reiteradas remessas de drogas ao exterior, contando com o auxílio de outros participantes. Dos autos examinados evidenciou-se que ele e os demais associados cooptavam garotas de programas em diversos estados da Federação e convenciam-nas a embarcar em voos internacionais, com a justificativa de que iriam conhecer países novos. Antes de embarcarem, os associados introduziam drogas nas malas das garotas e orientavam-nas em como obter êxito quanto ao controle imigratório dos países de destino, com a finalidade de assegurar que o entorpecente chegasse a salvo. É bem de ver que a associação criminosa angariava grandes importes financeiros, já que o réu ostentava carro luxuoso (Mercedes-Benz AMG GLE 43 CO) e residência em bairro nobre de São Paulo (Jardins), evidenciando-se que os envolvidos estavam bem estruturados e não eram incipientes neste tipo de crime. Por tal razão, não merece a aplicação da causa de redução de pena prevista no § 4º do artigo 33, da Lei 11.343/2006.
- Pena definitiva: Tendo em vista a ausência de identidade de desígnios, bem aplicado o concurso material de crimes e fixada a pena definitiva do réu FREDERICO em 10 (dez) anos 10 (dez) meses e 20 (vinte) dias de reclusão, e o pagamento de 1.632 (mil seiscentos e trinta e dois) dias-multa, cada um destes correspondentes a valor de 01 (um) salário-mínimo vigente à época da prisão efêmera.
- Pena de multa. O número de dias-multa deve atender os critérios de proporcionalidade à pena privativa de liberdade, ao passo que o valor de cada dia-multa deve ser fixado dependendo da situação econômica dos condenados. Nesse sentido, no caso concreto, a condição econômica do réu foi devidamente levada em consideração para a fixação do valor de cada um dos dias-multa, nos termos do art. 43 da Lei nº 11.343/2006. Conforme anotado linhas acima, o réu ostentava confortável vida financeira, já que possuía carros de luxo e residia em um dos bairros mais caros da cidade de São Paulo. Assim, mantém-se a pena de multa tal como fixada.
- Regime inicial. A pena privativa de liberdade foi fixada em 10 (dez) anos, 10 (dez) meses e 20 (vinte) dias de reclusão, circunstância que autoriza a fixação do regime inicial mais gravoso, qual seja, o FECHADO.
- Saliente-se que a detração de que trata o artigo 387, §2º, do Código de Processo Penal, introduzido pela Lei nº 12.736/2012, não influencia no regime já que, ainda que descontado o período entre a data da prisão (16.05.2018) e a data da sentença (15.04.2019), a pena remanescente continua superando 08 (oito) anos de reclusão.
- Substituição da pena. Incabível a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, porquanto ausentes os requisitos previstos no artigo 44 do Código Penal.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por maioria, NEGAR PROVIMENTO à Apelação defensiva, confirmada a r. sentença monocrática, nos termos do relatório e voto do Desembargador Federal Relator com quem votou o Desembargador Federal Nino Toldo. Vencido o Desembargador Federal José Lunardelli, que DAVA PARCIAL PROVIMENTO à apelação da defesa, para absolver Frederico Gustavo Troiano Buhrer da prática do crime previsto no artigo 35, caput c/c art. 40, I, todos da Lei 11.343/06, mantendo sua condenação pelo crime de tráfico transnacional de droga (art. 33, caput, c.c art. 40, I, da Lei 11.343/06), à pena de 06 (seis) anos 09 (nove) meses e 20 (vinte) dias de reclusão, no regime inicial semiaberto, e pagamento de 680 (seiscentos e oitenta) dias-multa.


São Paulo, 24 de março de 2022.
FAUSTO DE SANCTIS
Desembargador Federal


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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0010142-95.2018.4.03.6181/SP
2018.61.81.010142-1/SP
RELATOR : Desembargador Federal FAUSTO DE SANCTIS
APELANTE : FREDERICO GUSTAVO TROIANO BUHRER reu/ré preso(a)
ADVOGADO : SP125337 JOSE PEDRO SAID JUNIOR
: SP146938 PAULO ANTONIO SAID
: SP331009 GABRIEL MARTINS FURQUIM
APELADO(A) : Justica Publica
No. ORIG. : 00101429520184036181 9P Vr SAO PAULO/SP

DECLARAÇÃO DE VOTO

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI.

Peço vênia ao e. Relator para dele divergir, apenas para absolver o apelante da prática do crime previsto no art. 35 da Lei n. 11.343/06, acompanhando-o no mais.

Segundo consta do voto do e. Relator, a r. denúncia foi oferecida pelo Ministério Público do Estado de São Paulo (fls. 271/276) e ratificada pelo Ministério Público Federal (fls. 270), nos seguintes termos:

"Consta dos autos do inquérito policial em epígrafe que, em circunstâncias de tempo e lugar ainda não determinados, neste Munícipio e Comarca, FREDERICO GUSTAVO TROIANO BUHER, vulgo Fred, qualificado às fls. 95/101, JOSÉ DANIEL PAREDES, vulgo Dani, de nacionalidade paraguaia, qualificado indiretamente às fls. 133/135, REMY MARLON HERRERA FISCHER, de nacionalidade colombiana, qualificado indiretamente às fls. 136/138, MAGALYS SANCHES HECHEVARRIA, qualificado às fls. 139/141, e JENIFER DA SILVA GOMES, qualificada às fls. 17/21, esta última a partir de 19 de fevereiro de 2018, associaram-se para o fim de praticar, reiteradamente ou não, o crime tipificado no art. 33 da Lei nª 11.343/06.
Consta ainda que, entre os dias 19 e 25 de fevereiro de 2018, neste Município e Comarca, no edifício situado na Alameda Lorena nº 1272, apto. 82, e depois no Hotel Puma, situado na Rua Pedro Álvares Cabral nº 115 - Luz, ambos neste Município e Comarca, FREDERICO GUSTAVCO TROIANO BAUHER, vulgo Fred, qualificado às fls. 95/101, JOSÉ DANIEL PAREDES, vulgo Dani, de nacionalidade paraguaia, qualificado indiretamente às fls. 133/135, REMY MARLON HERRERA FISCHER, de nacionalidade colombiana, qualificado indiretamente às fls. 136/138, MAGALYS SANCEHS HECHEVARRIA, qualificado indiretamente às fls. 139/141, agindo em concurso e unidade de desígnios, previamente ajustados, de forma organizada e com distribuição de tarefas, mantinham em depósito, guardavam e forneceram 3035 (três mil e trinta e cinco gramas) de cocaína, que seriam exportados para Frankfurt, na Alemanha, com a finalidade de posterior entrega a consumo e fornecimento a terceiros, conforme boletim de ocorrência de fls. 13/15 dos autos em apenso, auto de exibição e apreensão e laudo de exame toxicológico a serem oportunamente anexados aos autos, substância essa entorpecente e que determina dependência física ou psíquica, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar.
(...)"

Sabe-se que o injusto penal delineado no art. 35 da Lei nº 11.343/06 é um crime formal, o qual se perfaz sem a necessidade da efetiva circulação de drogas, bastando uma associação, estável e permanente, com o intuito de traficar drogas, conforme leciona Guilherme de Souza Nucci na sua obra Leis Penais e Processuais Penais Comentadas, Volume I, 8ª edição revista, atualizada e ampliada, Editora Forense, página 362.

Como muito bem anotado pelo próprio Ilustre doutrinador, tal tipo penal tutela, como bens jurídicos, a paz e saúde públicas, as quais se veem aviltadas pela comercialização e associação de pessoas para a narcotraficância:

"105. Objeto material e jurídico: o objeto material confunde-se com o jurídico: a paz pública. Secundariamente, neste caso, está presente a proteção à saúde pública". (NUCCI, Guilherme de Souza. op.cit., página 362).

O crime em análise exige a presença de apenas duas pessoas agrupadas de forma estável e permanente (elemento objetivo) com animus associativo (elemento subjetivo) voltado para a prática dos delitos previstos no art. 33, caput e 1º, e 34 da referida Lei de Drogas. Todavia, constitui um crime autônomo, ou seja, basta a presença do animus associativo de pessoas agrupadas de forma estável e permanente, tendo por finalidade a prática dos tipos previstos nos artigos 33, caput e 1º, e 34 da Lei de Drogas.

A expressão "reiteradamente ou não" contida no caput não afasta a necessidade da presença do dolo de se associar com estabilidade e permanência, sendo que a reunião ocasional de duas ou mais pessoas não se subsumi ao tipo do artigo 35 da Lei nº 11.343/06. Nesse sentido:

"HABEAS CORPUS. ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO DE DROGAS. ESTABILIDADE E PERMANÊNCIA. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO. POSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DA MINORANTE PREVISTA NO ART. 33, § 4º, DA LEI N. 11.343/2006. CONSECTÁRIOS. REGIME MAIS BRANDO E SUBSTITUIÇÃO. CORRÉU. SITUAÇÃO FÁTICO-PROCESSUAL IDÊNTICA. ORDEM CONCEDIDA, COM EXTENSÃO AO CORRÉU.
1. A jurisprudência deste Superior Tribunal firmou o entendimento de que, para a subsunção da conduta ao tipo previsto no art. 35 da Lei n. 11.343/2006, é necessária a demonstração concreta da estabilidade e da permanência da associação criminosa. Isso porque, se assim não fosse, estaria evidenciado mero concurso de agentes para a prática do crime de tráfico de drogas.(HC 350.593/SP, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 20/06/2017, DJe 26/06/2017)."

Contudo, no caso em tela, não existem elementos aptos a demonstrar cabalmente a estabilidade e a permanência da reunião do apelante com qualquer outra pessoa, com animus associativo, para o fim da prática de outros crimes além do específico tráfico narrado na denúncia.

O que estão presentes, nestes autos, são os requisitos necessários à configuração do concurso de pessoas, ou seja, exatamente por terem sido colhidos elementos de provas que demonstraram que o apelante Frederico foi um dos responsáveis pela recepção de Jenifer em São Paulo e pela operacionalização da viagem que esta realizaria com o objetivo de enviar droga ao exterior (Alemanha), é que o ora apelante foi denunciado e condenado pela prática do crime de tráfico de drogas narrado na denúncia.

As provas produzidas pela acusação, sobretudo pelas declarações da própria Jenifer, foram aptas a demonstrar a atuação do ora apelante na prática deste específico tráfico de drogas. Ou seja, Frederico foi condenado pelo crime de tráfico de drogas justamente porque restou comprovado que recepcionou Jenifer em sua chegada a São Paulo, a recebeu em seu apartamento, bem como intermediou o fornecimento do numerário, em espécie, para a compra das passagens aéreas e o fornecimento da valise com a específica droga que seria transportada para a Alemanha, além de orientá-la em como proceder no setor de imigração da Alemanha.

Ressalte-se, por fim, que, não obstante as circunstâncias de (i) Jenifer ter sido aliciada em outro Estado (Espírito Santo); (ii) de o apelante possuir um apartamento locado na região nobre da Cidade de São Paulo, (iii) possuir um veículo de luxo, e (iv) ter contado com a ajuda de terceiro para a prática do crime e tráfico narrado na denúncia, indiquem que possivelmente integre associação criminosa voltada ao tráfico de drogas, não é suficiente para condená-lo pela prática do crime previsto no art. 35 da Lei de Drogas, pois a estabilidade e permanência exigidas para a configuração deste tipo penal não foram demonstradas pela acusação. Ou seja, não há qualquer indício de que o apelante tenha praticado ou que pretendesse praticar qualquer outro crime da mesma espécie delitiva, além daquele específico tráfico de drogas descrito na exordial acusatória.

Repita-se, a meu ver, os elementos dos autos demonstram, sim, que o apelante estava atuando em concurso de pessoas para a prática do delito previsto no art. 33 da Lei. 11.343/06, praticado por Jenifer, e justamente em razão de sua participação foi por ele condenado.

Nesse sentido o entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça:

"HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS E ASSOCIAÇÃO PARA O NARCOTRÁFICO. WRIT SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓPRIO. DESVIRTUAMENTO. IMPOSSIBILIDADE. CRIME PREVISTO NO ARTIGO 35 DA LEI N. 11.343/2006. ESTABILIDADE E PERMANÊNCIA DA ASSOCIAÇÃO . AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO. MERO CONCURSO DE AGENTES. ABSOLVIÇÃO. CAUSA ESPECIAL DE DIMINUIÇÃO DE PENA PREVISTA NO ARTIGO 46 DA LEI DE DROGAS. SEMI-IMPUTABILIDADE. PRETENDIDO RECONHECIMENTO. IMPOSSIBILIDADE. PACIENTE INTEIRAMENTE CAPAZ DE ENTENDER O CARÁTER ILÍCITO DO FATO E DE DETERMINAR-SE DE ACORDO COM ESSE ENTENDIMENTO. MANIFESTO CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO.
1. O Superior Tribunal de Justiça, alinhando-se à nova jurisprudência da Corte Suprema, também passou a restringir as hipóteses de cabimento do habeas corpus, não admitindo que o remédio constitucional seja utilizado em substituição ao recurso ou ação cabível, salvo nas hipóteses de flagrante ilegalidade, abuso de poder ou teratologia jurídica.
2. A jurisprudência deste Superior Tribunal firmou o entendimento no sentido de que, para a subsunção da conduta ao tipo previsto no artigo 35 da Lei n. 11.343/2006, é necessária a demonstração concreta da estabilidade e da permanência da associação criminosa.
3. No caso, as instâncias ordinárias, ao concluírem pela condenação dos pacientes em relação ao crime previsto no artigo 35 da Lei n. 11.343/2006, em momento algum fizeram referência ao vínculo associativo estável e permanente porventura existente entre eles, de maneira que, constatada a mera associação eventual entre os acusados para a prática do tráfico de drogas, devem ser absolvidos em relação ao delito de associação para o narcotráfico.
4. Como consectário da absolvição em relação ao crime de associação para o tráfico de drogas (artigo 35 da Lei n. 11.343/2006), deve ser concedido habeas corpus, de ofício, para que o Juízo das Execuções Criminais avalie o eventual preenchimento, pelos acusados, dos requisitos necessários à aplicação da causa especial de diminuição de pena prevista no § 4º do artigo 33 da Lei n. 11.343/2006, quais sejam, além da primariedade e dos bons antecedentes, a não integração em organização criminosa e a não dedicação a atividades delituosas.
5. Os pacientes foram condenados, ainda, pela prática do crime de tráfico de drogas (artigo 33, caput, da Lei n. 11.343/2006), por venderem e trazerem consigo, para fins de comercialização, 2 papelotes de cocaína, totalizando 0,4 g (quatro decigramas).6. Uma vez verificado que o paciente era, ao tempo do crime, inteiramente capaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento, bem como que não era portador de deficiência física ou psíquica, não há constrangimento ilegal no ponto em que foi negada a aplicação da minorante prevista no artigo 46 da Lei n. 11.343/2006 (semi-imputabilidade). 7. Como consectário da própria absolvição dos pacientes em relação ao crime de associação para o narcotráfico, deve ser concedido habeas corpus, de ofício, também para que o Juízo das Execuções verifique a eventual possibilidade de imposição de regime inicial mais brando de cumprimento de pena, à luz do disposto no artigo 33 do Código Penal. 8. Ordem não conhecida. Habeas corpus concedido, de ofício, apenas para absolver os pacientes em relação ao crime previsto no artigo 35 da Lei n. 11.343/2006 ( associação para o narcotráfico), mantida a condenação pelo crime positivado no artigo 33, caput, da Lei de Drogas, tornando a reprimenda, de cada um, definitiva em 5 anos de reclusão e pagamento de 500 dias-multa. Ainda, habeas corpus concedido, de ofício, também para que o Juízo das Execuções Criminais avalie o eventual preenchimento, pelos acusados, dos requisitos necessários à aplicação da causa especial de diminuição de pena prevista no § 4º do artigo 33 da Lei n. 11.343/2006, bem como para que verifique a eventual possibilidade de imposição de regime inicial mais brando de cumprimento de pena, à luz do disposto no artigo 33 do Código Penal." (STJ - HC: 108359 MS 2008/0127780-5, Relator: Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, Data de Julgamento: 26/11/2013, T6 - SEXTA TURMA, Data de Publicação: DJe 12/12/2013) - (destaquei)

Nestes termos, absolvo Frederico Gustavo Troiano Buhrer da prática do crime previsto no artigo 35, caput c/c art. 40, I, todos da Lei 11.343/06.

No tocante ao delito previsto no art. 33, caput, c. c art. 40, I, da mesma lei (crime de tráfico transnacional de drogas), acompanho integralmente o voto do e. Relator quanto ao mérito e dosimetria das penas, inclusive quanto à não aplicação da causa de diminuição prevista no art. 33, §4º, da Lei n.º 11.343/2006, pois apesar de não existirem elementos de prova suficientes para a condenação pelo crime de associação para o tráfico, há indícios de que o apelante se dedica a atividades criminosas, pela forma e estrutura com que praticaram o crime de tráfico de drogas narrado na denúncia.

Nestes termos, fica mantida a condenação do apelante Frederico pelo delito de tráfico transnacional de drogas à pena definitiva de 06 (seis) anos 09 (nove) meses e 20 (vinte) dias de reclusão, e pagamento de 680 (seiscentos e oitenta) dias-multa, entretanto, readequo o regime inicial de cumprimento de penas para o regime semiaberto, com fundamento no art. 33, § 2º, "b", do Código Penal.

Dispositivo

Posto isso, dou parcial provimento à apelação da defesa para absolver Frederico Gustavo Troiano Buhrer da prática do crime previsto no artigo 35, caput c/c art. 40, I, todos da Lei 11.343/06, mantendo sua condenação pelo crime de tráfico transnacional de drogas, à pena de 06 (seis) anos 09 (nove) meses e 20 (vinte) dias de reclusão, no regime inicial semiaberto, e pagamento de 680 (seiscentos e oitenta) dias-multa.

É o voto.

JOSÉ LUNARDELLI
Desembargador Federal


APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0010142-95.2018.4.03.6181/SP
2018.61.81.010142-1/SP
RELATOR : Desembargador Federal FAUSTO DE SANCTIS
APELANTE : FREDERICO GUSTAVO TROIANO BUHRER reu/ré preso(a)
ADVOGADO : SP125337 JOSE PEDRO SAID JUNIOR
: SP146938 PAULO ANTONIO SAID
: SP331009 GABRIEL MARTINS FURQUIM
APELADO(A) : Justica Publica
No. ORIG. : 00101429520184036181 9P Vr SAO PAULO/SP

RELATÓRIO

O DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS:

Trata-se de recurso de Apelação interposto por FREDERICO GUSTAVO TROIANO BURHER, brasileiro e nascido aos 04.12.1978, contra a r. sentença proferida pelo Exmo. Juiz Federal Silvio César Arouck Gemaque (fls. 743/785) que, julgando PROCEDENTE o pedido formulado na Ação Penal Pública Incondicionada, CONDENOU o réu à pena corporal de 10 (dez) anos, 10 (dez) meses e 20 (vinte) de reclusão, a ser cumprida no regime inicial FECHADO, bem como ao pagamento de 1.632 (mil seiscentos e trinta e dois) dias-multa, cada qual fixado em 01 (um) do salário mínimo vigente à época dos fatos, pela prática do delito descrito no artigo 33, caput, e artigo 35, caput, ambos c.c. o artigo 40, inciso I, todos da Lei Federal nº 11.343/2006, na forma do artigo 69, em sua forma fundamental, do Código Penal.

A r. denúncia foi oferecida pelo Ministério Público do Estado de São Paulo (fls. 271/276) e ratificada pelo Ministério Público Federal (fls. 270), nos seguintes termos:

Consta dos autos do inquérito policial em epígrafe que, em circunstâncias de tempo e lugar ainda não determinados, neste Munícipio e Comarca, FREDERICO GUSTAVO TROIANO BUHER, vulgo Fred, qualificado às fls. 95/101, JOSÉ DANIEL PAREDES, vulgo Dani, de nacionalidade paraguaia, qualificado indiretamente às fls. 133/135, REMY MARLON HERRERA FISCHER, de nacionalidade colombiana, qualificado indiretamente às fls. 136/138, MAGALYS SANCHES HECHEVARRIA, qualificado às fls. 139/141, e JENIFER DA SILVA GOMES, qualificada às fls. 17/21, esta última a partir de 19 de fevereiro de 2018, associaram-se para o fim de praticar, reiteradamente ou não, o crime tipificado no art. 33 da Lei nª 11.343/06.
Consta ainda que, entre os dias 19 e 25 de fevereiro de 2018, neste Município e Comarca, no edifício situado na Alameda Lorena nº 1272, apto. 82, e depois no Hotel Puma, situado na Rua Pedro Álvares Cabral nº 115 - Luz, ambos neste Município e Comarca, FREDERICO GUSTAVCO TROIANO BAUHER, vulgo Fred, qualificado às fls. 95/101, JOSÉ DANIEL PAREDES, vulgo Dani, de nacionalidade paraguaia, qualificado indiretamente às fls. 133/135, REMY MARLON HERRERA FISCHER, de nacionalidade colombiana, qualificado indiretamente às fls. 136/138, MAGALYS SANCEHS HECHEVARRIA, qualificado indiretamente às fls. 139/141, agindo em concurso e unidade de desígnios, previamente ajustados, de forma organizada e com distribuição de tarefas, mantinham em depósito, guardavam e forneceram 3035 (três mil e trinta e cinco gramas) de cocaína, que seriam exportados para Frankfurt, na Alemanha, com a finalidade de posterior entrega a consumo e fornecimento a terceiros, conforme boletim de ocorrência de fls. 13/15 dos autos em apenso, auto de exibição e apreensão e laudo de exame toxicológico a serem oportunamente anexados aos autos, substância essa entorpecente e que determina dependência física ou psíquica, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar.
(...)

Diante disso, os réus FREDERICO, JOSÉ DANIEL, REMY e MAGALYS foram incursionados nas sanções do artigo 33, caput, e artigo 35, caput, c.c. o artigo 40, inciso I, todos da Lei Federal nº 11.343/2006, na forma do artigo 69 do Código Penal, assim como a ré JENIFER incursionada nas sanções do artigo 35 da Lei Federal nº 11.343/2006.

A r. denúncia foi recebida pela Justiça Federal com relação ao réu FREDERICO em 16.10.2018 (fls. 392/398). Determinou-se o desmembramento do Feito em relação aos codenunciados REMY, MAGALYS, JOSÉ DANIEL e JENIFER, já que não foram localizados para a citação (fl. 462, v.o.).

A r. sentença baixou em Secretaria em 15.04.2019 (fl. 786).

A defesa do réu FREDERICO apresentou razões de Apelação (fls. 883/912), pleiteando, em síntese: 1) a absolvição das imputações formuladas na r. denúncia, por entender que os elementos de persuasão racional colacionados no bojo do caderno processual não são fortes e suficientemente seguros a embasar um édito de natureza condenatória, aplicando-se, subsidiariamente, o princípio do in dubio pro reo; 2) a fixação das reprimendas básicas nos patamares mínimos legais; 3) o decote da causa de aumento de pena previsto no artigo 40, inciso I, da Lei de Drogas, relacionada ao crime de associação para o tráfico; 3) a redução do quantum estabelecido para cada um dos dias-multa e; 4) a fixação de regime menos severo como forma inicial de resgate prisional.

Contrarrazões de Apelação pela acusação (fls. 973/976).

A Procuradoria Regional da República manifestou-se pelo desprovimento do recurso defensivo (fls. 980/994).

É o relatório.

À revisão.

FAUSTO DE SANCTIS
Desembargador Federal Relator


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
Signatário (a): FAUSTO MARTIN DE SANCTIS:10066
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Data e Hora: 11/01/2022 09:13:13



APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0010142-95.2018.4.03.6181/SP
2018.61.81.010142-1/SP
RELATOR : Desembargador Federal FAUSTO DE SANCTIS
APELANTE : FREDERICO GUSTAVO TROIANO BUHRER reu/ré preso(a)
ADVOGADO : SP125337 JOSE PEDRO SAID JUNIOR
: SP146938 PAULO ANTONIO SAID
: SP331009 GABRIEL MARTINS FURQUIM
APELADO(A) : Justica Publica
No. ORIG. : 00101429520184036181 9P Vr SAO PAULO/SP

VOTO


O DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS:
DA IMPUTAÇÃO

A r. denúncia foi oferecida pelo Ministério Público do Estado de São Paulo (fls. 271/276) e ratificada pelo Ministério Público Federal (fls. 270), nos seguintes termos:

Consta dos autos do inquérito policial em epígrafe que, em circunstâncias de tempo e lugar ainda não determinados, neste Munícipio e Comarca, FREDERICO GUSTAVO TROIANO BUHER, vulgo Fred, qualificado às fls. 95/101, JOSÉ DANIEL PAREDES, vulgo Dani, de nacionalidade paraguaia, qualificado indiretamente às fls. 133/135, REMY MARLON HERRERA FISCHER, de nacionalidade colombiana, qualificado indiretamente às fls. 136/138, MAGALYS SANCHES HECHEVARRIA, qualificado às fls. 139/141, e JENIFER DA SILVA GOMES, qualificada às fls. 17/21, esta última a partir de 19 de fevereiro de 2018, associaram-se para o fim de praticar, reiteradamente ou não, o crime tipificado no art. 33 da Lei nª 11.343/06.
Consta ainda que, entre os dias 19 e 25 de fevereiro de 2018, neste Município e Comarca, no edifício situado na Alameda Lorena nº 1272, apto. 82, e depois no Hotel Puma, situado na Rua Pedro Álvares Cabral nº 115 - Luz, ambos neste Município e Comarca, FREDERICO GUSTAVCO TROIANO BAUHER, vulgo Fred, qualificado às fls. 95/101, JOSÉ DANIEL PAREDES, vulgo Dani, de nacionalidade paraguaia, qualificado indiretamente às fls. 133/135, REMY MARLON HERRERA FISCHER, de nacionalidade colombiana, qualificado indiretamente às fls. 136/138, MAGALYS SANCEHS HECHEVARRIA, qualificado indiretamente às fls. 139/141, agindo em concurso e unidade de desígnios, previamente ajustados, de forma organizada e com distribuição de tarefas, mantinham em depósito, guardavam e forneceram 3035 (três mil e trinta e cinco gramas) de cocaína, que seriam exportados para Frankfurt, na Alemanha, com a finalidade de posterior entrega a consumo e fornecimento a terceiros, conforme boletim de ocorrência de fls. 13/15 dos autos em apenso, auto de exibição e apreensão e laudo de exame toxicológico a serem oportunamente anexados aos autos, substância essa entorpecente e que determina dependência física ou psíquica, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar.
(...)

Diante disso, os réus FREDERICO, JOSÉ DANIEL, REMY e MAGALYS foram incursionados nas sanções do artigo 33, caput, e artigo 35, caput, c.c. o artigo 40, inciso I, todos da Lei Federal nº 11.343/2006, na forma do artigo 69 do Código Penal, assim como a ré JENIFER incursionada nas sanções do artigo 35 da Lei Federal nº 11.343/2006.

DA MATERIALIDADE E AUTORIA DELITIVA

A materialidade delitiva restou amplamente comprovada nos autos em análise, por intermédio dos seguintes documentos:

- Relatório de Investigação Policial (fase 01) relacionado ao Inquérito Policial nº 311/2018 (fls. 03/06), oriundo do Primeiro Distrito Policial - Sé - São Paulo/SP, esclarecendo que a codenunciada Jenifer foi presa em flagrante delito ao transportar a quantidade aproximada de 03Kg (três quilos) de Cocaína, ao tentar embarcar para a Cidade de Frankfurt, na Alemanha. O bilhete aéreo correspondente foi adquirido em uma loja da CVC, localizada no Centro da Cidade de São Paulo/SP. Em diligências à agência de turismo, os policiais identificaram que o comprador das passagens foi o codenunciado Remy Marlon Herrera Fischer (colombiano). As imagens do sistema de monitoramento de segurança da empresa CVC, fornecida aos investigadores, mostra o exato momento em que os denunciados Jenifer e Remy adquirem as passagens (dia 19.02.2018, por volta das 13h40m).

O Relatório policial ainda aponta que Jenifer ficou hospedada em dois hotéis localizados no Centro de São Paulo, sendo certo que o codenunciado José Daniel Paredes foi o responsável pelo pagamento das hospedagens. Consta ainda que a corré Jenifer esteve acompanhada do codenunciado Remy Marlon.

- Relatório Policial (fase 02) (fls. 09/15) informando que a codenunciada Jenifer colaborou com as investigações e esclareceu que o réu FREDERICO foi o responsável por toda a operacionalização das drogas, sendo certo que, antes da viagem, foi por ele recepcionada em um veículo de luxo da cor preta (cuja marca não soube identificar), oportunidade em que ele orientou-a em como se portar no aeroporto e no setor de imigração, transmitindo informações para que evitasse a fiscalização. Jenifer ainda informou que se encontrou novamente com o réu FREDERICO em uma apartamento, onde consumiu maconha e brincou com um cão da raça pitbull.

Em sede de diligências ao mencionado imóvel atribuído ao réu FREDERICO, a equipe policial recuperou as imagens das câmeras de segurança, que registraram a presença de Jenifer e Remy no local, confirmando a versão colaborativa apresentada por Jenifer à polícia. Os funcionários do edifício confirmaram que o corréu FREDERICO realmente reside no local. As imagens afetas ao edifício ainda registraram o momento em que indivíduos saem pelo elevador carregando três malas idênticas àquela que foi apreendida com Jenifer na consecução do delito de tráfico de drogas.
- Auto de Reconhecimento fotográfico positivo (fl. 22), conclusivo no sentido de que a corré Jenifer reconheceu o réu FREDERICO como sendo o responsável por contratá-la para fazer o transporte de drogas ao exterior, arcando com as despesas de sua estadia.
- Relatório Policial (fls. 31/36) ilustrado com fotos retiradas do celular de Jenifer, em que é possível verificar imagens de dentro do apartamento de FREDERICO, no dia 19/02/2018, bem como do passeio de carro que envolvia Jenifer, Remy e FREDERICO.

- Ofício da empresa Vivo (Telefônica do Brasil S.A.) (fls. 519/520), informando que o réu FREDERICO possuía, à época dos fatos, o número +55 11 97373-7185. Também foi possível verificar o número do denunciado Daniel Paredes Gonzales (+55 11 94204-1419) e o número utilizado por uma pessoa apenas conhecida como "Teki" (+55 11 94265-1325). A empresa CLARO S.A também forneceu informações a respeito do número +55 11 97059-2632, pertencente ao denunciado Remy (fls. 545/547).

- Auto de prisão em flagrante delito relacionado a Jenifer da Silva Gomes (fls. 246/250);

- Auto de exibição e apreensão de fls. 254/255, concernente à apreensão da quantidade de 3.360G (três mil trezentos e sessenta gramas) da substância entorpecente denominada Cocaína, além 01 (um) cartão bancário confidence (cash passaport), 01 (um) voucher de passagem aérea com destino a Frankfurt/Alemanha (imagem de fl. 257) e 01 (uma) mala de viagem onde foi localizada a droga, tudo pertencente a Jenifer da Silva Gomes.

- Laudo de Exame Pericial registrado sob o nº 80.006/2018 (fls. 260/261), conclusivo no sentido de que era COCAÍNA a substância aprendida em poder de Jenifer da Silva Gomes.

- Relatório Final elaborado pela digna Autoridade Policial, ex vi do disposto no artigo 10, § 1º, do Código de Processo Penal (fls. 146/158);

DA QUESTÃO DE FUNDO


No que se relaciona à questão de fundo, este v. Acórdão analisará, em conjunto, os delitos de tráfico de drogas e associação para o tráfico, considerando-se que as provas produzidas no bojo do caderno processual são intrínsecas e correspondentes a ambos os crimes. Assim, evita-se extensiva repetição dos mesmos argumentos e torna-se o julgado mais coeso, prestigiando-se o princípio da celeridade processual, sem perder de vista o primado constitucional de sua fundamentação (artigo 93, inciso IX, da Constituição Federal).


AUTORIA E ELEMENTO SUBJETIVO DOS TIPOS PENAIS


Malgrado os esforços defensivos, a autoria delitiva relacionada aos delitos de tráfico internacional de drogas e associação para o tráfico atribuída ao réu FREDERICO, assim como o elemento subjetivo dos tipos penais (dolo direto), restaram sobejamente comprovados nos autos em análise por intermédio das provas colacionadas no bojo do caderno processual, sobretudo porque a prova testemunhal e os relatórios de investigação endossaram os fatos descritos na r. exordial-incoativa.


A propósito, ao contrário do que sustenta a defesa em suas razões de Apelação, o decreto monocrático não se baseou apenas em elementos de informação coletados no bojo da etapa inquisitiva-antejudicial. A sentença prolatada pelo r. juízo de origem está fundamentada não só nos trabalhos investigativos, mas também nos elementos de persuasão racional colacionados na etapa instrutória, a exemplo dos testemunhos dos policiais civis e das declarações de Jenifer.


Com efeito, regularmente interrogada no bojo da Ação Penal nº 0004393-97.2018.4.03.6181, extrai-se que a codenunciada Jenifer colaborou efetivamente com as investigações encetadas para desmantelar a associação criminosa voltada para a prática do narcotráfico internacional, bem assim esclarecendo que o apelante FREDERICO foi um dos responsáveis pela operacionalização da viagem que tinha como objetivo enviar drogas ao exterior (Alemanha). De sua inquirição extrai-se que ela afirmou ser natural de Vila Velha/ES, e que exercia a atividade de garota de programa, oportunidade em que conheceu um cliente, que lhe propôs conhecer a Europa, sendo certo que ainda receberia o valor de R$ 15.000,00 (quinze mil reais) pela viagem. Após aceitar a proposta, viajou a São Paulo, onde iria pegar o voo para a Alemanha. Nesta Capital, foi recepcionada pelo colombiano Remy, integrante da associação criminosa, que a levou à região central (25 de março) para adquirir roupas de frio, bem como à agência de viagem da CVC, onde compraram as passagens aéreas para a Frankfurt. Hospedou-se na região da Rua Augusta e da Luz até a data do embarque ao exterior. O colombiano Remy levou-a, ainda, ao apartamento do réu FREDERICO, que também integrava a associação criminosa voltada para a disseminação de drogas ao exterior, para que consumissem um cigarro de maconha. A propósito, a residência de FREDERICO estava situada à Alameda Lorena, a quinze minutos a pé do hotel da Rua Augusta. Nesta residência, Jenifer foi orientada a entrar em contato com outro integrante da organização criminosa, de nome José Daniel (ou Dani, ou paraguaio), caso necessitasse de algo em São Paulo. Ao retornar ao hotel da Rua Augusta, Jenifer recebeu uma mensagem de WhatsApp de José Daniel, solicitando que fosse buscar uma mala de presente, e que seria utilizada na viagem à Alemanha. Após coletar a valise, retornou ao hotel e, ao abri-la, havia a quantia de dois mil e quinhentos euros. Não desconfiou que a mala possuísse um fundo falso com as drogas. No dia da viagem, chamou um Uber para ir ao aeroporto, mas foi interceptada por policiais civis no trajeto. Na Delegacia de Polícia, foram localizados, na bagagem, cerca de 03Kg (três quilos) de Cocaína, razão pela qual foi presa em flagrante delito.


Observa-se que o interrogatório judicial da corré Jenifer foi produzido nos autos 0004393-97.2018.4.03.6181 e trazido ao presente processo por empréstimo (prova emprestada), a pedido do Ministério Público Federal, com ciência às partes desde antes de ratificada a denúncia, prestigiando-se o princípio constitucional do contraditório e da ampla defesa. Desse modo, não há falar em qualquer nulidade da prova emprestada.


Na fase policial (fls. 17/21), Jenifer detalhou ainda que, ao desembarcar em São Paulo, mais precisamente no dia 19 de fevereiro de 2018, foi recepcionada por Remy e pelo apelante FREDERICO, sendo certo que todos foram dar uma volta no carro de FREDERICO, vale dizer, um automóvel de luxo de cor preta e teto de vidro (no curso das investigações descobriu-se tratar-se de um veículo marca Mercedes-Benz, modelo GLE AMG). Durante o trajeto, FREDERICO explicou a Jenifer em como proceder ao desembarcar na Alemanha e passar pelo controle imigratório daquele país, sendo certo que ela ainda deveria envelopar a mala antes da sobredita viagem. Descreveu o réu FREDERICO como um rapaz de aproximadamente trinta e poucos anos, branco, alto e magro. Foi ele quem deu o dinheiro, em espécie, para que o colombiano Remy Marlon comprasse as passagens para a Alemanha, na agência CVC.


As declarações de Jenifer foram corroboradas pelo depoimento da testemunha de acusação Samir Augusto Abbud (o teor do depoimento está transcrito na r. sentença às fls. 747 v/751), policial civil ouvido em pretório, sob o crivo do contraditório e da ampla defesa. Samir confirmou que participou da prisão em flagrante da codenunciada, sendo certo que, na oportunidade, Jenifer declarou que Remy, José Daniel e o réu FREDERICO teriam a recebido em São Paulo, bem como efetuado o pagamento dos hotéis em que se hospedou e das passagens aéreas para a Alemanha. Samir ainda salientou que a polícia civil obteve imagens das câmeras de segurança dos hotéis, em que aparecem as pessoas que chegaram com Jenifer e realizaram check-in, sendo certo, outrossim, que José Daniel chegou a fornecer seu próprio documento na recepção da hospedaria. Samir ainda afirmou que obteve as imagens das câmeras de segurança do edifício de FREDERICO, as quais mostram que Remy e Jenifer realmente estiveram no local. Há também imagens dos membros da associação criminosa descendo três malas pelo elevador do prédio do apelante, uma delas bastante similar à que foi encontrada em poder de Jenifer com as drogas. Samir ainda afirmou que se dirigiu à agência CVC, sendo certo que o contrato de viagem foi firmado em nome de Remy.


As asserções de Jenifer foram ainda confirmadas em juízo pelo Delegado de Polícia, Dr. Amadeu Ricardo dos Santos, que presidiu o inquérito policial instaurado para a correta apuração dos fatos (o teor do depoimento está transcrito na r. sentença às fls. 752v/755). Em síntese, esta testemunha confirmou que Jenifer colaborou de pronto com as investigações, inclusive entregando o seu celular com fotos tiradas dos envolvidos. Nas imagens é possível visualizar o passeio no carro de FREDERICO, em que ele aparece como condutor do automóvel, além do interior de seu apartamento. Segundo o delegado, as declarações de Jenifer se mostraram muito relevantes e nortearam as investigações: com o que ela falou, conseguiram pontuar corretamente com o que ela os passou. Então, o depoimento dela tomou uma consistência muito grande. Porque o que ela falou, era um apartamento na Lorena, era um cachorro assim, ele me falou isso, isso e isso. Fui comprar a passagem em tal lugar, ele me deixou na porta da CVC, acha que com o Remy, não se recorda agora. Com tudo isso, foram juntando os elos e por isso conseguiu concluir que realmente ele (o apelante FREDERICO) fazia parte da quadrilha para tráfico de drogas.


Portanto, as palavras das testemunhas ouvidas em pretório foram essenciais para apontar a autoria delitiva relacionada aos delitos de tráfico e associação para o tráfico, na justa medida em que confirmaram que o réu FREDERICO recepcionou Jenifer em sua chegada a São Paulo, assim como forneceu numerário, em espécie, para a compra das passagens aéreas e forneceu a valise com as drogas, orientando a codenunciada em como proceder no setor de imigração da Alemanha. Destaca-se que os policiais narraram detalhadamente a dinâmica delitiva, sem cair em qualquer contradição ou apresentar divergências sobre o episódio, razão pela qual suas asserções assumem especial relevância para o contexto probatório.


Sobre o tema, registre-se que está superada a malfadada tese da parcialidade dos testemunhos, sob compromisso, de agentes recrutados mediante processo seletivo, até porque seria contrassenso credenciar pessoas para atuar na prevenção e repressão ao crime e, mais tarde, quando mais se necessita desses testigos para apaziguar e combater condutas que afligem a sociedade, o Estado-Juiz negar-lhes crédito tão-somente em razão da função pública que exercem.


Deve-se ressaltar, ainda, que não há nos autos nenhum indício de prova que desabone as asserções dos policiais, e, nossos Tribunais Superiores já decidiram no sentido de que suas palavras não devem ser tomadas com ressalvas, muito menos desconfianças, máxime quando em conformidade com o quadro probatório trazido à colação. Nesse sentido a jurisprudência do Egrégio Supremo Tribunal Federal:

"A simples condição de policial não torna a testemunha impedida ou suspeita" (RT 68/64).
"O valor do depoimento testemunhal de servidores policiais especialmente quando prestado em juízo, sob a garantia do contraditório - reveste-se de inquestionável eficácia probatória, não se podendo desqualificá-lo pelo só fato de emanar de agentes estatais incumbidos, por dever de ofício, da repressão penal" (HC 74.608-SP).
"O depoimento testemunhal do agente policial somente não terá valor, quando se evidenciar que esse servidor do Estado, por revelar interesse particular na investigação penal, age facciosamente ou quando se demonstrar - tal como ocorre com as demais testemunhas - que as suas declarações não encontram suporte e nem se harmonizam com outros elementos probatórios idôneos" (DJU 11.04.97, p. 12.189).

A propósito, não há qualquer mácula na apreensão do referido aparelho de telefonia móvel pertencente a Jenifer pela polícia, sobretudo porque ela mesma forneceu a senha de acesso ao celular, a fim de colaborar com as investigações.

Eventual perícia sobre o aparelho e as fotografias encartadas aos autos deveria ser requisitada pela defesa, ônus que lhe incumbia, nos termos do artigo 156 do Código de Processo Penal. Ainda que assim não fosse, cremos que eventual perícia sobre o aparelho tornar-se-ia despicienda, porquanto as imagens foram extraídas pela polícia civil no âmbito de suas atribuições investigativas, de modo que não há espaço para se falar em adulteração de seu conteúdo.

Não se desconhece que a ré Jenifer tenha omitido, durante o interrogatório judicial, que FREDERICO tenha a recepcionado na chegada a São Paulo, certamente com a finalidade de eximi-lo de responsabilidade criminal. Entretanto, a participação do apelante nos eventos danosos restou sobejamente comprovada por meio de outros elementos de persuasão colacionados aos autos. Isso porque, extrai-se do interrogatório do próprio réu FREDERICO, transcrito pela r. sentença e sem insurgência da parte, que ele, no dia 19/02/2018, no horário do almoço, teria, de fato, ido com Remy Marlon encontrar Jenifer: era no horário do almoço mais ou menos. Ele [Remy] estava sozinho. Isso foi em fevereiro. Não se recorda do dia exatamente. Ele esteve em uma casa e disse que esteve com uma garota que queria apresentá-lo. Perguntou por que ela não tinha subido e ele respondeu que ela havia ficado com vergonha, meio tímida e que o estaria esperando na esquina, em um barzinho perto de casa. Disse a ele que colocaria uma roupa e desceria para encontrar com ela. Ele apresentou a menina, a princípio, como uma menina que estivesse disposta a trabalhar para o interrogando no ramo da prostituição; desceu com ele (imagem do elevador das 12:41 horas). Chegaram até esse barzinho. Ela (Jenifer) estava lá. Foi quando a viu pela primeira vez.

Soma-se a isso que Jenifer, quando inquirida na fase administrativa (fls. 17/21), esclareceu que os advogados do réu FREDERICO compareceram ao presídio onde estava custodiada para persuadi-la a não fornecer informações sobre o seu envolvimento no contexto criminoso. Essa assertiva justifica a intenção de Jenifer em ocultar a participação de FREDERICO em juízo.

Ainda a corroborar a tese acusatória de que o réu FREDERICO estava envolvido na empreitada criminosa, tem-se as imagens das câmeras de segurança de seu prédio (fls. 13/14), ilustrando que o réu deixou o local exatamente na hora do almoço (dia 19.02.2018), em companhia de Remy. Mais tarde, por volta das 18h51m do mesmo dia, verifica-se claramente que Jenifer e Remy se dirigem ao apartamento do FREDERICO, onde permanecem por aproximadamente 20 minutos.

Além das imagens das câmeras de segurança, temos nos autos em análise fotos retiradas do celular de Jenifer, em que é possível verificar imagens de dentro do apartamento de FREDEIRCO, no dia 19.02.2018, bem como do passeio de carro realizado na hora do almoço, de que participaram Jenifer, Remy e FREDERICO. Nas imagens, a propósito, bem se vê o veículo com o teto de vidro narrado por Jenifer, além de um amplo apartamento típico da região dos Jardins, em que aparece um cão da raça pitbull.

Como bem destacou o magistrado sentenciante, essas provas, colhidas em pretório e confirmadas em juízo, atestam o encontro do grupo criminoso para acertar detalhes da viagem para a Alemanha.

No que se relaciona à alegação defensiva de que a pessoa retratada nas fotos não era FREDERICO, verifica-se que há nos autos elementos seguros para dizer que tal pessoa seja, realmente, o apelante. A uma, pois o formato da cabeça e compleição física aparentam ser do réu. A duas, pois ao revés do alegado pela defesa, a pessoa retratada não é calva, sendo certo que esta impressão deve-se claramente ao foco de luz existente nas imagens sobre a sua cabeça, como bem ressaltou o magistrado sentenciante.

Portanto, a prova produzida em juízo, sob o crivo do contraditório e da ampla defesa, é robusta no sentido de esclarecer, com a desejável segurança, a correta dinâmica concernente aos delitos em comento, atribuindo responsabilidade penal ao recorrente. Em outras palavras, os elementos de persuasão racional coletados no bojo do caderno processual são suficientes para embasar o guerreado édito condenatório, não se tratando de prova meramente indiciária ou colhida apenas na etapa administrativa. Com esteio nestes fundamentos, também não há falar em aplicação do princípio do in dubio pro reo, já que a prova despontou direta, razão pela qual, confirma-se a r. sentença nesse aspecto.

As provas colacionadas aos autos em análise também demonstram que a associação criminosa estava constituída há algum tempo e dedicava-se ao narcotráfico internacional. Dos testemunhos de Jenifer e dos relatórios policiais extrai-se que os associados contavam com grande estrutura material e financeira, a exemplo do apartamento locado pelo réu em região nobre da Cidade de São Paulo (bairro dos Jardins), assim como veículo de luxo (apreensão do carro Mercedes-Benz), pagamento da viagem em espécie e acomodação da corré em mais de um hotel em São Paulo, demonstrando-se grande poder financeiro por parte dos envolvidos e, ainda, que eles não eram incipientes neste tipo de crime (tráfico de drogas).

Além disso, a codenunciada Jenifer declarou em juízo que foi cooptada em outro Estado da Federação (Espírito Santo), por um indivíduo ainda não corretamente identificado, o que demonstra que a quadrilha atuava em diversos Estados e tinha como finalidade a captação de "mulas" para a realização de narcotráfico por meio de viagens internacionais, circunstância que também indica a estrutura firme e bem organizada do bando, assim como demonstra que os envolvidos estavam associados não apenas para a prática do delito de tráfico apurado neste persecutório (aproximadamente três quilos de Cocaína transportado por Jenifer), mas também para o desenvolvimento de outros crimes da mesma espécie.

No mais, não foi comprovada renda para a aquisição de veículo de luxo e aluguel em edifícios de alto padrão, inferindo-se que os associados não possuíam fonte lícita para ostentar o padrão de vida que possuíam.
DA DOSIMETRIA DA PENA

Deve o magistrado, ao calcular a reprimenda a ser imposta ao réu, respeitar os ditames insculpidos no art. 68 do Código Penal, partindo da pena-base a ser aferida com supedâneo no art. 59 do mesmo Diploma, para, em seguida, incidir na espécie as circunstâncias atenuantes e agravantes e, por último, as causas de diminuição e de aumento de pena.
Primeira Fase

Na primeira fase relacionada à dosimetria das penas dos crimes de tráfico de drogas e associação para o tráfico, o insigne magistrado sentenciante exasperou as reprimendas, por entender deletérias a qualidade e quantidade da droga apreendida em poder de Jenifer (pouco mais de 03 Kg de Cocaína), nos termos do artigo 42 da Lei de Drogas.

A defesa pede a redução das penas-base. Não lhe assiste razão.

Em primeiro lugar, anota-se que a natureza e a quantidade total da substância ou do produto, nos termos do art. 42 da Lei n.º 11.343/2006, realmente devem ser consideradas para exasperação da pena-base. Nesse sentido colaciono julgado do Supremo Tribunal Federal:

Habeas corpus. Penal e Processual Penal. tráfico transnacional de drogas . Artigo 33, caput; c/c o art. 40, I, da Lei nº 11.343/2006. Pena-base. Majoração. Valoração negativa da natureza e da quantidade da droga. Admissibilidade. Vetores a serem considerados na dosimetria, nos termos do art. 42 da Lei nº 11.343/06. Pretendida aplicação do art. 33, § 4º, da Lei de drogas . Impossibilidade de utilização do habeas corpus para revolver o contexto fático-probatório e glosar os elementos de prova em que se amparou a instância ordinária para afastar essa causa de diminuição de pena. Precedentes. Regime inicial fechado. Imposição, na sentença, com fundamento exclusivamente no art. 2º, § 1º, da Lei nº 8.072/90. Manutenção do regime prisional mais gravoso pelo Tribunal Regional Federal, em recurso exclusivo da defesa, com base nas circunstâncias do crime. Utilização de fundamentos inovadores. Reformatio in pejus caracterizada. Ratificação desse entendimento pelo Superior Tribunal de Justiça, com outros fundamentos. Inadmissibilidade. Precedentes. Ilegalidade flagrante. Ordem parcialmente concedida, para determinar ao juízo das execuções criminais que fixe, de forma fundamentada, nos termos do art. 33, § 3º, do Código Penal, e do art. 42 da Lei nº 11.343/06, o regime inicial condizente de cumprimento da pena. A natureza e a quantidade de droga apreendida justificam, nos termos do art. 42 da Lei nº 11.343/06, a majoração da pena-base, ainda que as demais circunstâncias judiciais sejam favoráveis ao agente. Precedentes. (...) 6. Ordem de habeas corpus parcialmente concedida, para determinar ao juízo das execuções criminais competente que fixe, de forma fundamentada, nos termos do art. 42 da Lei de drogas e do art. 33, § 3º, do Código Penal, o regime inicial condizente para o cumprimento da pena. (STF - HC 125781 / SP - Relator: Min. DIAS TOFFOLI - Segunda Turma - Dje 27-04-2015).
Ressalta-se ainda que a Cocaína é uma substância com alto poder destrutivo, que produz sérios danos à saúde, tais como dependência física e psicológica, que leva facilmente ao vício e até a morte. A cocaína é capaz de produzir nefastos efeitos na saúde do usuário e, consequentemente, ter um forte impacto na saúde pública de qualquer Estado. Os danos causados são muito maiores que os danos causados por outras substâncias entorpecentes, como a maconha ou o lança-perfume. Por isso, a conduta praticada pelo réu revestiu-se de especial gravidade.

Considerando-se a qualidade e quantidade de droga transportada (pouco mais de três quilos de Cocaína), assim como tendo em vista os precedentes desta E. Turma Julgadora, bem fixada a reprimenda em 05 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão e pagamento de 583 (quinhentos e oitenta e três) dias-multa referente ao delito do artigo 33, caput, da Lei nº 11.343/2006, e de 03 (três) anos e 06 (seis) meses de reclusão e pagamento de 816 (oitocentos e dezesseis) dias multa para o delito do artigo 35, caput, da Lei nº 11.343/2006.
Segunda fase

Inexistem agravantes ou atenuantes genéricas a interferirem nas penas, tampouco há recurso das partes nesse aspecto, pelo que se mantém as penas-base em 05 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão e pagamento de 583 (quinhentos e oitenta e três) dias-multa referente ao delito do artigo 33, caput, da Lei nº 11.343/2006, e de 03 (três) anos e 06 (seis) meses de reclusão e pagamento de 816 (oitocentos e dezesseis) dias multa para o delito do artigo 35, caput, da Lei 11.343-2006.
Terceira fase

Na terceira fase da dosimetria, o magistrado sentenciante reconheceu a majorante do artigo 40, inciso I, da Lei Federal nº 11.343/2006, em razão da transnacionalidade do delito, na fração de 1/6 (um sexto), para ambos os delitos. Outrossim, deixou de aplicar o redutor previsto no artigo 33, § 4º, da Lei de Drogas.
Causa de aumento de pena prevista no art. 40, inciso I, da Lei Federal nº 11.343/2006.

A transnacionalidade do delito restou comprovada de maneira satisfatória durante a instrução processual. Isso porque, a droga seria transportada por Jenifer em voo comercial com destino a Frankfurt, na Alemanha. Destaca-se que junto a ela foram apreendidos seu passaporte e bilhetes aéreos, confirmando-se a transnacionalidade dos delitos. Logo, aplicada com acerto a causa de aumento da internacionalidade, prevista no art. 40, inciso I, da Lei Federal nº 11.343/2006, na fração de 1/6 (um sexto), o que eleva as penas para 06 (seis) anos 09 (nove) meses e 20 (vinte) dias de reclusão, e pagamento de 680 (seiscentos e oitenta) dias-multa para o delito do artigo 33, caput, da Lei nº 11.343/2006 e para 04 (quatro) anos e 01 (um) mês de reclusão e pagamento de 952 (novecentos e cinquenta e dois) dias-multa para o crime do artigo 35, caput, da Lei 11.343/2006.

A propósito, e como bem anotado pela Procuradoria Regional da República em parecer (fls. 994), o Superior Tribunal de justiça já decidiu que a causa de aumento prevista no artigo 40, inciso I, da Lei nº 11.343/2006 pode ser aplicada tanto ao crime do artigo 33, quanto ao delito do artigo 35, ambos da Lei de Drogas, porquanto tratarem-se de tipos penais autônomos, sem que haja falar em proibição pelo princípio do non bis in idem. A propósito:

PROCESSUAL PENAL E PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ESPECIAL, ORDINÁRIO OU DE REVISÃO CRIMINAL. NÃO CABIMENTO. CAUSA DE AUMENTO. APLICAÇÃO EM PATAMAR ACIMA DO MÍNIMO. FUNDAMENTO CONCRETO. POSSIBILIDADE. BIS IN IDEM. INOCORRÊNCIA. CORREÇÃO, DE OFÍCIO, PELO TRIBUNAL EM APELAÇÃO. INEXISTÊNCIA DE INSURGÊNCIA QUANTO AO QUANTUM DAS PENAS PELO MINISTÉRIO PÚBLICO. REFORMATIO IN PEJUS CONFIGURADA. PENA AUMENTADA SEM RECURSO MINISTERIAL. ILEGALIDADE FLAGRANTE. RESTABELECIMENTO DA SENTENÇA. 1. Ressalvada pessoal compreensão diversa, uniformizou o Superior Tribunal de Justiça ser inadequado o writ em substituição a recursos especial e ordinário, ou de revisão criminal, admitindo-se, de ofício, a concessão da ordem ante a constatação de ilegalidade flagrante, abuso de poder ou teratologia. 2. A jurisprudência desta Corte posiciona-se no sentido de que a aplicação de causa de aumento em patamar acima do mínimo é plenamente válida desde que fundamentada na gravidade concreta do delito. 3. Não se observa violação ao princípio do non bis in idem a aplicação da causa de aumento do art. 40, inciso VI, da Lei 11.343/2006, cumulativamente, para os crimes de associação para o tráfico (art. 35 da Lei de drogas) e de tráfico de drogas (art. 33 da mesma legislação), haja vista tratarem-se de delitos autônomos. 4. É cabível a aplicação da majorante de o crime envolver ou visar a atingir criança ou adolescente (art. 40, VI, da Lei 11.343/2006) em delito de associação para o tráfico de drogas com menor de idade. 5. Configura inegável reformatio in pejus a correção de erro material no julgamento da apelação ainda que para sanar evidente equívoco ocorrido na sentença condenatória que importa em aumento das penas, sem que tenha havido recurso do Ministério Público nesse sentido. 6. Habeas corpus não conhecido, todavia, concedo a ordem, de ofício, para restabelecer a pena fixada na sentença condenatória quanto ao ora paciente, tendo em vista que a correção do erro material, da forma como operada pelo Tribunal estadual, configurou reformatio in pejus.

(STJ - HC: 250455 RJ 2012/0161535-6, Relator: Ministro NEFI CORDEIRO, Data de Julgamento: 17/12/2015, T6 - SEXTA TURMA, Data de Publicação: DJe 05/02/2016 - g.n.)


Causa de diminuição de pena prevista no artigo 33, § 4º, da Lei de Drogas

Embora não tenha se insurgido a defesa, não é demais ressaltar que a causa de diminuição de pena do art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/2006 prevê a redução de 1/6 (um sexto) a 2/3 (dois terços) na reprimenda, para o agente que for primário, possuir bons antecedentes, não se dedicar a atividades criminosas e não integrar organização criminosa.

O réu integrava extensa associação criminosa criada para a consecução de reiteradas remessas de drogas ao exterior, contando com o auxílio de outros participantes. Dos autos examinados evidenciou-se que ele e os demais associados cooptavam garotas de programas em diversos estados da Federação e convenciam-nas a embarcar em voos internacionais, com a justificativa de que iriam conhecer países novos. Antes de embarcarem, os associados introduziam drogas nas malas das garotas e orientavam-nas em como obter êxito quanto ao controle imigratório dos países de destino, com a finalidade de assegurar que o entorpecente chegasse a salvo.

É bem de ver que a associação criminosa angariava grandes importes financeiros, já que o réu ostentava carro luxuoso (Mercedes-Benz AMG GLE 43 CO) e residência em bairro nobre de São Paulo (Jardins), evidenciando-se que os envolvidos estavam bem estruturados e não eram incipientes neste tipo de crime.

Por tal razão, não merece a aplicação da causa de redução de pena prevista no § 4º do artigo 33, da Lei 11.343/2006. Nesse mesmo sentido, entendimento do C. Superior Tribunal de Justiça, in verbis:

"AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. TRÁFICO INTERNACIONAL DE ENTORPECENTES. TRANSPORTADOR DE DROGAS. MULA. INTEGRANTE DE ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA. CAUSA DE DIMINUIÇÃO DO ART. 33, § 4º DA LEI Nº 11.343/06. INAPLICABILIDADE. AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS DESPROVIDO. 1. No caso, o agravante foi preso em flagrante quando se encontrava na iminência de embarcar para a Istambul/Turquia, levando consigo 3.015 gramas de cocaína, ocultados sob o forro da mala que trazia consigo. 2. Em consonância com o entendimento desta Quinta Turma, foi ressaltado que a simples atuação do indivíduo flagrado no transporte eventual de droga alheia ("mula") não pode levar à conclusão de que integre organização criminosa para efeito de afastar a incidência da minorante do art. 33, § 4°, da Lei n. 11.343/06. 3. Todavia, a referida minorante foi afastada pois, no caso, as instâncias ordinárias concluíram, com base nos elementos de prova, que o réu "não se trata indivíduo que se apresente totalmente desvinculado de organizações criminosas ou sobre quem não pairem indicativos de que tenha como meio de vida a dedicação ao crime, notadamente em razão "das anotações de viagens anteriores havidas no passaporte do acusado, viagens estas de curta duração (Azerbaijão - 1 semana; Geórgia - 1 dia) e cujo propósito evidentemente não foi aquele mencionado pelo réu na versão que trouxe à baila em seu interrogatório (procura de um trabalho temporário) tudo a indicar que foram realizadas com o mesmo propósito que a viagem feita ao Brasil e que culminou com sua prisão, ou seja, a traficância de drogas." 4. Com efeito, "esta Corte tem entendido que a atuação como transportador de droga, aliada à presença de elementos que demonstram, concretamente, a vinculação com organização criminosa, é fundamento idôneo para afastar a redução aqui pleiteada." (AgRg no AREsp 736.510/SP, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 27/04/2017, DJe 10/05/2017) 5. Ademais, para se acolher a tese de que o paciente não se dedica a atividades criminosas, é necessário o reexame aprofundado das provas, inviável em habeas corpus. Agravo regimental no habeas corpus desprovido.
(AgRg no HC 241.072/SP, Rel. Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, QUINTA TURMA, julgado em 08/08/2017, DJe 18/08/2017)"

Da mesma maneira vêm decidindo esta C. 11ª Turma do E. Tribunal Regional Federal da 3ª Região:

PENAL. PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO INTERNACIONAL DE DROGAS. ARTIGOS 33, CAPUT, E 40, I, AMBOS DA LEI 11.343/06. CONDUTA TÍPICA. MATERIALIDADE E AUTORIA INCONTROVERSAS. DOLO DEMONSTRADO. EXCLUDENTES DE ILICITUDE OU CULPABILIDADE NÃO CONFIGURADAS. ALEGAÇÃO DE ESTADO DE NECESSIDADE AFASTADA. DOSIMETRIA. PENA-BASE EXASPERADA EM RAZÃO DA QUANTIDADE E NATUREZA DA SUBSTÂNCIA. ATENUANTE DA CONFISSÃO ESPONTÂNEA EM UM SEXTO, NOS LIMITES DA SÚMULA 231 DO STJ. ATENUANTE DO ARTIGO 65, III, "A", DO CÓDIGO PENAL, INAPLICÁVEL IN CASU. PRESENÇA DA CAUSA DE AUMENTO DECORRENTE DA TRANSNACIONALIDADE FIXADA NO MÍNIMO LEGAL. AUSÊNCIA DE BIS IN IDEM. NÃO INCIDÊNCIA DAS CAUSAS DE DIMINUIÇÃO DE PENA DO ARTIGO 33, § 4º, DA LEI 11.343/06, E DO ARTIGO 24, § 2º, DO CÓDIGO PENAL. PENA CUMULATIVA DE MULTA. VALOR UNITÁRIO DO DIA-MULTA FIXADO NO MÍNIMO LEGAL. ARTIGO 49, § 1º, DO CÓDIGO PENAL. IMPOSSIBILIDADE DE DISPENSA. REGIME INICIAL ALTERADO PARA O SEMIABERTO. ARTIGO 33, § 2º, "B", E § 3º, DO CÓDIGO PENAL. ARTIGO 387, § 2º, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. RECURSO DA DEFESA PARCIALMENTE PROVIDO. 1. Não houve impugnação quanto à autoria, materialidade ou dolo do acusado em relação ao cometimento do delito devidamente tipificado no artigo 33, caput, c. c. o artigo 40, caput, I, da Lei 11.343/06, os quais se encontram amplamente demonstrados nos autos, à míngua de quaisquer excludentes de ilicitude ou culpabilidade (rechaçada a alegação de estado de necessidade). 2. Primeira fase da dosimetria: Preservada a pena-base corporal em 06 (seis) anos de reclusão (exasperação correspondente a um quinto), considerando, como circunstâncias preponderantes desfavoráveis, apenas a natureza e a quantidade da droga apreendida, nos termos do artigo 42 da Lei 11.343/06. 3. Segunda fase da dosimetria: A incidência da circunstância atenuante da confissão espontânea, já reconhecida pelo magistrado sentenciante à razão de um sexto, não pode, todavia, conduzir à redução da pena abaixo do mínimo legal, à luz da Súmula 231 do STJ, restando mantida a mesma pena intermediária outrora fixada em 05 (cinco) anos de reclusão. De resto, não se vislumbrou nos autos a presença da atenuante genérica prevista no artigo 65, III, "a", do Código Penal. 4. Terceira fase da dosimetria: Mantida a majoração da pena em decorrência da causa de aumento prevista no art. 40, I, da Lei n. 11.343/06 (transnacionalidade do delito), no percentual mínimo de 1/6 (um sexto), pois presente uma única causa de aumento do referido dispositivo. 5. Com efeito, não há de se falar em bis in idem, porquanto as elementares do delito imputado ("transportar" e "trazer consigo" drogas, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar) não guardam qualquer relação intrínseca com a eventual transnacionalidade do crime de tráfico de drogas, de fato, observada na hipótese. 6. Ademais, mantidas inaplicáveis in casu as causas de diminuição de pena previstas no artigo 24, § 2º, do Código Penal (à míngua de estado de necessidade exculpante no caso concreto), e no artigo 33, § 4º, da Lei 11.343/06 (cujos requisitos cumulativos não restaram plenamente atendidos pelo réu na hipótese, ante sua evidente dedicação às atividades criminosas, inclusive, em território brasileiro). 7. Quando consta no passaporte ou em certidão de movimentos migratórios da "mula" do tráfico que esta realizou viagens anteriores de longa distância e de curta duração (como é o caso do réu, de passaporte colombiano e carteira de identidade permanente de Hong Kong, com diversos registros de entrada e saída, bastante próximos entre si, no Aeroporto Internacional de São Paulo-Guarulhos, notadamente entre 22/10/2015 e 17/08/2016 - fls. 39/40 e 173/178), tal fato é indicativo de que se dedica ao tráfico internacional de drogas como meio de vida, razão pela qual não merece a aplicação da causa especial de redução de pena prevista no § 4º do artigo 33 da Lei 11.343/06. Precedentes deste E-TRF3. 8. Por conseguinte, preservada definitivamente a pena privativa de liberdade do réu em 05 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão, pelo cometimento do delito previsto no artigo 33, caput, c. c. o artigo 40, I, da Lei 11.343/06, no mesmo quantum inicialmente fixado na r. sentença. 9. Acompanhando a proporção da pena privativa de liberdade ora preservada, tornou-se definitiva a mesma sanção "cumulativa" de multa então fixada ao acusado pelo magistrado sentenciante, a saber, 583 (quinhentos e oitenta e três) dias-multa, no valor unitário de um trigésimo do salário mínimo vigente à época dos fatos, já tendo em conta a situação desfavorável do acusado (fls. 136/138-mídia), embora adstrito ao limite mínimo estabelecido no artigo 49, § 1º, do Código Penal ("O valor do dia-multa será fixado pelo juiz não podendo ser inferior a um trigésimo do maior salário mínimo mensal vigente ao tempo do fato, nem superior a 5 (cinco) vezes esse salário", g.n), vedada sua pretensa dispensa. 10. De rigor a alteração do regime prisional inicialmente fixado ao réu para o regime semiaberto, nos termos do artigo 33, § 2º, "b", do Código Penal, e ainda do artigo 387, § 2º, do Código de Processo Penal (computando-se o tempo de sua prisão provisória durante cerca de oito meses, desde 17/08/2016 até a presente data - fls. 02/03 e 164/168), visto que, além de ser primário e não ostentar maus antecedentes, sua pena-base restou exasperada na r. sentença apenas em razão da quantidade e natureza da droga apreendida, na forma do artigo 42 da Lei 11.343/06, o que, por si só, não justificaria a aplicação de regime inicial mais gravoso, como necessário e suficiente à prevenção e repressão do delito no caso concreto, atendendo-se, nesse ponto, ao pleito subsidiário da defesa. 11. Nos moldes do artigo 44, I, do Código Penal, sendo superior a 04 (quatro) anos, deixo de substituir a pena privativa de liberdade imposta a "JORGE IVAN" por eventuais restritivas de direitos. 12. O pedido de aguardar o julgamento do recurso em liberdade fica prejudicado com o julgamento da apelação e a execução provisória da pena. 13. Apelação da defesa parcialmente provida. (TRF 3ª Região, DÉCIMA PRIMEIRA TURMA, Ap. - APELAÇÃO CRIMINAL - 70722 - 0008521-26.2016.4.03.6119, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI, julgado em 30/05/2017, e-DJF3 Judicial 1 DATA:09/06/2017 )


PENA DE MULTA

Em suas razões de apelo, a defesa também pede a redução da pena de multa. Esse pedido, todavia, não procede.

O número de dias-multa deve atender os critérios de proporcionalidade à pena privativa de liberdade, ao passo que o valor de cada dia-multa deve ser fixado dependendo da situação econômica dos condenados.

Nesse sentido, no caso concreto, a condição econômica do réu foi devidamente levada em consideração para a fixação do valor de cada um dos dias-multa, nos termos do art. 43 da Lei nº 11.343/2006. Conforme anotado linhas acima, o réu ostentava confortável vida financeira, já que possuía carros de luxo e residia em um dos bairros mais caros da cidade de São Paulo.

Assim, mantém-se a pena de multa tal como fixada na sentença.

DA PENA DEFINITIVA

Tendo em vista a ausência de identidade de desígnios, bem aplicado o concurso material de crimes e fixada a pena definitiva do réu FREDERICO em 10 (dez) anos 10 (dez) meses e 20 (vinte) dias de reclusão, e o pagamento de 1.632 (mil seiscentos e trinta e dois) dias-multa no valor de 01 (um) salário mínimo vigente à época da prisão efêmera.


DO REGIME INICIAL

O magistrado sentenciante estabeleceu o regime fechado como forma inicial do resgate prisional.

Primeiramente, relevante salientar que a obrigatoriedade do regime inicial fechado aos sentenciados por crimes hediondos e equiparados não mais subsiste, diante da declaração de inconstitucionalidade do § 1º do art. 2º da Lei n. 8.072/1990, pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Habeas Corpus nº 111840, em 27 de junho de 2012.

Desta forma, para determinação do regime inicial, deve-se observar o artigo 33, parágrafos 2º e 3º, do Código Penal, e do artigo 59 do mesmo Codex, de forma que a fixação do regime inicial se adeque às circunstâncias do caso concreto. Ressalte-se que, especificamente quanto ao delito de tráfico ilícito de drogas, também se considerará a natureza e quantidade de entorpecentes como fundamentação idônea para a fixação do regime inicial para cumprimento de pena, nos termos do artigo 42 da Lei 11.343/2006.

Nesse sentido:
PENAL. PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. TRÁFICO DE DROGAS. REGIME PRISIONAL MAIS GRAVOSO. FUNDAMENTAÇÃO VINCULADA. VEDAÇÃO LEGAL CONTIDA NO ART. 2º, § 1º, DA LEI N. 8.072/90, NA REDAÇÃO DADA PELO LEI N. 11.464/2007. INCONSTITUCIONALIDADE. AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO. 1. Embora possa haver nos autos elementos concretos que justifiquem a imposição de regime mais gravoso, sabe-se que para cada uma das fases de dosimetria das penas, bem como para a fixação do regime prisional, a fundamentação deverá ser vinculada aos motivos declinados pelo julgador. 2. Declarada a inconstitucionalidade do art. 2º, § 1º da Lei n. 8.072/90, que determinava a obrigatoriedade de imposição de regime inicial fechado aos condenados por crimes hediondos ou equiparados, a fixação do regime inicial deve observar os critérios do art. 33, §§ 2º e 3º do Código Penal e do art. 42 da Lei n. 11.343/06, aos condenados por tráfico de drogas. 3. Agravo regimental improvido. (AgRg no REsp 1512607/RJ, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 22/03/2018, DJe 03/04/2018- destaque nosso)
HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO. DESCABIMENTO. TRÁFICO DE DROGAS. DOSIMETRIA. PENA-BASE. MAJORAÇÃO. QUANTIDADE E NATUREZA DA SUBSTÂNCIA ENTORPECENTE. QUANTUM DE AUMENTO. DISCRICIONARIEDADE. ART. 42 DA LEI N. 11.343/06. INCIDÊNCIA DO REDUTOR PREVISTO NO § 4º DO ART. 33 DA LEI N. 11.343/06. DEDICAÇÃO A ATIVIDADES CRIMINOSAS. IMPOSSIBILIDADE. INEXISTÊNCIA DE BIS IN IDEM. HIPÓTESE DIVERSA DAQUELA TRATADA NO ARE N. 666.334/RG (REPERCUSSÃO GERAL), DO STF. REGIME FECHADO. POSSIBILIDADE. QUANTIDADE, VARIEDADE E NATUREZA DA DROGA APREENDIDA. SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVA DE DIREITOS. AUSÊNCIA DE PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO EVIDENCIADO. WRIT NÃO CONHECIDO. (...) 5. O STF, no julgamento do HC n. 111.840/ES, declarou inconstitucionalidade do § 1º do art. 2º da Lei n. 8.072/90, com a redação que lhe foi dada pela Lei n. 11.464/07, afastando, dessa forma, a obrigatoriedade do regime inicial fechado para os condenados por crimes hediondos e equiparados. Assim, o regime prisional deverá ser fixado em obediência ao que dispõe o art. 33, §§ 2º e 3º, e art. 59, ambos do Código Penal - CP. In casu, a quantidade, variedade e natureza da droga apreendida, utilizadas na terceira fase da dosimetria para afastar a aplicação do redutor previsto no art. 33, § 4º, da Lei de Drogas, justificam a fixação do regime prisional mais gravoso. Precedentes. 6. Considerando a pena aplicada, no patamar superior a 4 anos, inviável a aplicação da substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, ante o não preenchimento dos requisitos do art. 44, I, do CP. Habeas corpus não conhecido. (HC 425.688/SP, Rel. Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, QUINTA TURMA, julgado em 17/04/2018, DJe 02/05/2018- destaque nosso)

In casu, tem-se que a pena privativa de liberdade foi fixada em 10 (dez) anos, 10 (dez) meses e 20 (vinte) dias de reclusão, circunstância que autoriza a fixação do regime inicial mais gravoso, qual seja, o FECHADO.

Saliente-se que a detração de que trata o artigo 387, §2º, do Código de Processo Penal, introduzido pela Lei nº 12.736/2012, não influencia no regime já que, ainda que descontado o período entre a data da prisão (16.05.2018) e a data da sentença (15.04.2019), a pena remanescente continua superando 08 (oito) anos de reclusão.


SUBSTITUIÇÃO DA PENA

Incabível a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, porquanto ausentes os requisitos previstos no artigo 44 do Código Penal.
DISPOSITIVO

Ante o exposto, voto por NEGAR PROVIMENTO à Apelação defensiva, confirmada a r. sentença monocrática, que bem aplicou o ordenamento jurídico à espécie.
É o voto.


FAUSTO DE SANCTIS
Desembargador Federal


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