APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0013072-15.2017.4.03.9999
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: IVAIR TAVARES DE LIMA
Advogado do(a) APELADO: EDUARDO PEREIRA LIMA FILHO - SP224167-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0013072-15.2017.4.03.9999 RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS APELADO: IVAIR TAVARES DE LIMA Advogado do(a) APELADO: EDUARDO PEREIRA LIMA FILHO - SP224167-N OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de ação objetivando a concessão de benefício de auxílio-doença ou de aposentadoria por invalidez a partir da data da alta médica, ocorrida em 31/08/2014. A sentença proferida em 29/09/2016 julgou parcialmente procedente o pedido para condenar o INSS a conceder à parte autora o benefício de auxílio-acidente equivalente a 50% do salário de benefício, com termo inicial a partir do dia seguinte à cessação do auxílio-doença, com o pagamento dos valores em atraso acrescidos de correção monetária segundo o Manual de Cálculos da Justiça Federal e juros de mora nos termos da Lei nº 11.960/09, condenando o INSS ao pagamento d e honorários advocatícios arbitrados em 10% sobre o valor da condenação, excluídas as parcelas vincendas, observada a súmula nº 111/STJ, reconhecida a isenção de custas processuais. Foi concedida a tutela de urgência para a imediata implantação do benefício. Dispensado o reexame necessário. Apela o INSS, arguindo preliminar de nulidade da sentença por julgamento extra-petita, pois a petição inicial não veiculou pedido de concessão de benefício de auxílio-acidente, limitando-se a postular a concessão dos benefícios de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez, não se aplicando na espécie a fungibilidade dos benefícios, data a natureza indenizatória do auxílio-acidente, enquanto os benefícios por incapacidade são substitutivos de renda. Alega ainda violação ao principio do contraditório e da ampla defesa, pois não apresentou defesa acerca da matéria decidida na sentença. No mérito, pede seja decretada a improcedência do pedido, ante a ausência de incapacidade reconhecida no laudo pericial. Sem contrarrazões. É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0013072-15.2017.4.03.9999 RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS APELADO: IVAIR TAVARES DE LIMA Advogado do(a) APELADO: EDUARDO PEREIRA LIMA FILHO - SP224167-N OUTROS PARTICIPANTES: V O T O Inicialmente, acolho a preliminar de julgamento extra-petita suscitada pelo INSS. Verifico que a sentença decidiu pretensão diversa da pleiteada na petição inicial da presente ação. A parte autora deduziu pretensão de concessão de benefício de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez a partir da alta médica, enquanto a sentença resolveu questão jurídica diversa, condenando o INSS a conceder à autora benefício de auxílio-acidente previdenciário, sem que houvesse pedido especifico em tal sentido na inicial. Dessa forma, reconheço a ocorrência de julgamento extra petita e declaro nula a sentença, por afronta ao artigo 492 do Código de Processo Civil/2015. Estando o processo em condições de imediato julgamento, aplico a regra do artigo 1.013, § 3º, III, da norma processual e passo ao exame do mérito. A Lei nº 8.213/91, no artigo 42, estabelece os requisitos necessários para a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez, quais sejam: qualidade de segurado, cumprimento da carência, quando exigida, e moléstia incapacitante e insuscetível de reabilitação para atividade que lhe garanta a subsistência. O auxílio-doença, por sua vez, tem seus pressupostos previstos nos artigos 59 a 63 da Lei nº 8.213/91, sendo concedido nos casos de incapacidade temporária. É dizer: a incapacidade total e permanente para o exercício de atividade que garanta a subsistência enseja a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez; a incapacidade total e temporária para o exercício de atividade que garanta a subsistência justifica a concessão do benefício de auxílio-doença e a incapacidade parcial e temporária somente legitima a concessão do benefício de auxílio-doença se impossibilitar o exercício do labor ou da atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias pelo segurado. A condição de segurado (obrigatório ou facultativo) decorre da inscrição no regime de previdência pública, cumulada com o recolhimento das contribuições correspondentes. O artigo 15 da Lei nº 8.213/91 dispõe sobre as hipóteses de manutenção da qualidade de segurado, independentemente de contribuições; trata-se do denominado período de graça, durante o qual remanesce o direito a toda a cobertura previdenciária. Também é considerado segurado aquele que trabalhava, mas ficou impossibilitado de recolher contribuições previdenciárias em razão de doença incapacitante. Nesse passo, acresça-se que no que toca à prorrogação do período de graça ao trabalhador desempregado, não obstante a redação do §2º do artigo 15 da Lei nº. 8.213/1991 mencionar a necessidade de registro perante o Ministério do Trabalho e da Previdência Social para tanto, o Superior Tribunal de Justiça, em sede de Incidente de Uniformização de Interpretação de Lei Federal (Pet. 7.115), firmou entendimento no sentido de que a ausência desse registro poderá ser suprida quando outras provas constantes dos autos, inclusive a testemunhal, se revelarem aptas a comprovar a situação de desemprego. A perda da qualidade de segurado está disciplinada no §4º desse dispositivo legal, ocorrendo no dia seguinte ao do término do prazo para recolhimento da contribuição referente ao mês de competência imediatamente posterior ao final dos prazos para manutenção da qualidade de segurado. Depreende-se, assim, que o segurado mantém essa qualidade por mais um mês e meio após o término do período de graça, independente de contribuição, mantendo para si e para os seus dependentes o direito aos benefícios previdenciários. Anote-se que a eventual inadimplência das obrigações trabalhistas e previdenciárias acerca do tempo trabalhado como empregado deve ser imputada ao empregador, responsável tributário, conforme preconizado na alínea a do inciso I do artigo 30 da Lei nº 8.213/91, não sendo cabível a punição do empregado urbano pela ausência de recolhimentos, computando-se, assim, o período laborado para fins de verificação da qualidade de segurado. Por fim, quanto à carência, exige-se o cumprimento de 12 (doze) contribuições mensais para a concessão de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença, conforme prescreve a Lei n.º 8.213/91, em seu artigo 25, inciso I, in verbis: "Art. 25. A concessão das prestações pecuniárias do Regime Geral de Previdência Social depende dos seguintes períodos de carência, ressalvado o disposto no art. 26:I - auxílio-doença e aposentadoria por invalidez: 12 (doze) contribuições mensais;". No caso concreto: De início, verifico que não houve a impugnação da matéria relativa à carência e à qualidade de segurado, pelo que restaram incontroversas. Nascido em 22/04/1974, o autor propôs a presente ação em 17/12/2014 afirmando na inicial incapacidade total e permanente para a atividades laborais habituais de auxiliar de produção e auxiliar de montagem, em decorrência de quadro de luxação, entorse e distensão das articulações e ligamentos do joelho, tornozelo e pé, artrose, além de trauma na mão direita, com rompimento de tendões e atrofia muscular, com redução de movimentos e perda de força, tendo permanecido afastado em gozo de benefício de auxílio-doença no período de 2007 a 2014 sem melhora do quadro clínico. No que toca à questão da incapacidade, o exame médico pericial, ocorrido em 14/12/2015, constatou encontrar-se o autor acometido de sequela definitiva de ferimento corto-contuso em mão direita ocorrido em 30/08/2012, do qual resultou lesão dos músculos e tendões dos fletores dos dedos, tendo sido submetido a cirurgia de tenografia, apresentando sequela definitiva de limitação a flexão e extensão de punho e apreensão da mão, com limitação na flexão de quatro dedos da mão direita, dificuldade para pegar objetos. Concluiu o laudo pela existência de incapacidade laborativa parcial e permanente para tarefas que exijam força e apreensão de mão direita. Somada à prova técnica houve a apresentação da prova documental que instruiu a inicial, da qual se constata que, por ocasião da ocorrência do ferimento corto contuso sofrido em mão direita, no ano de 2012, o autor já se encontrava afastado em gozo de auxílio-doença desde o ano de 2007 em decorrência de artropatia em joelho direito, com lesão ligamentar, e já tinha encaminhamento para tratamento cirúrgico que não se realizou por conta do tratamento cirúrgico a que se submeteu na mão direita. Consta ainda de fls. 26 relatório do médico do trabalho produzido em 12/09/2014, após a alta médica concedida, no qual o autor foi reconhecido como inapto para o retorno ao trabalho, por permanecer incapacitado para o desempenho das atividades típicas da sua função. O conjunto probatório demonstrou que o autor permanecia incapacitado de forma total para o retorno às suas atividades laborais por ocasião da alta médica, pois desempenhava atividade de trabalhador braçal claramente incompatível com as limitações funcionais impostas pelas sequelas do trauma em mão direita sofrido. O artigo 479 do Código de Processo Civil (artigo 436 do CPC/73) dispõe que o juiz não está adstrito às conclusões do laudo pericial, facultando-lhe, sob a luz do princípio do livre convencimento motivado, decidir de maneira diversa, constituindo entendimento jurisprudencial assente no C. Superior Tribunal de Justiça que, "para a concessão da aposentadoria por invalidez, o magistrado não está vinculado à prova pericial e pode concluir pela incapacidade laboral levando em conta os aspectos socioeconômicos, profissionais e culturais do segurado" (STJ, AgRg no AREsp 103.056/MG, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, DJe de 02/08/2013). O laudo médico apontou limitação parcial do autor ao desempenho de atividades laborais, constatando a aptidão laboral para atividades que não demandem esforço físico, com a existência de limitação funcional que não pode ser reconhecida como causadora de incapacidade total e permanente para qualquer atividade, estando apto à reabilitação profissional para exercer atividades laborais compatíveis com as restrições físicas por ele apresentadas. Cabe ao INSS submeter a parte autora ao processo de reabilitação profissional previsto na legislação em vigência, devendo o auxílio doença ser mantido até o final do programa de reabilitação e, nesse sentido, cabe ao requerente aderir ao tratamento médico adequado e ao processo de reabilitação com seriedade e constância, favorecendo o seu êxito. Portanto, depreende-se do conjunto probatório, que a parte autora faz jus ao restabelecimento do benefício previdenciário de auxílio-doença, fixado o termo inicial do benefício na data da cessação do benefício de auxílio-doença, 31/08/2014. Por fim nota-se que a parte autora, atualmente com 45 anos de idade, está inserido em faixa etária ainda propicia à produtividade e ao desempenho profissional, e não havendo nos autos nenhum elemento que evidencie a existência de incapacidade total e permanente, inviável a concessão da aposentadoria por invalidez. De rigor a concessão do benefício de auxílio-doença até a conclusão do processo de reabilitação do autor, deduzidas as parcelas eventualmente recebidas a título de benefício não acumulável e em razão da tutela antecipada concedida. As parcelas vencidas deverão ser corrigidas monetariamente e acrescidas de juros de mora pelos índices constantes do Manual de Orientação para a elaboração de Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta, observando-se, em relação à correção monetária, a aplicação do IPCA-e em substituição à TR – Taxa Referencial, consoante decidido pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no RE nº 870.947, tema de repercussão geral nº 810, em 20.09.2017, Relator Ministro Luiz Fux. Anoto que os embargos de declaração opostos perante o STF que objetivavam a modulação dos efeitos da decisão supra, para fins de atribuição de eficácia prospectiva, foram rejeitados no julgamento realizado em 03.10.2019. Quanto aos honorários advocatícios, condeno o INSS ao pagamento de honorários de advogado fixados em 10% do valor da condenação, consoante o entendimento desta Turma e o disposto §§ 2º e 3º do artigo 85 do Código de Processo Civil/2015, considerando as parcelas vencidas até a data da sentença, nos termos da Súmula nº 111 do Superior Tribunal de Justiça. Ante o exposto, com fulcro no caput do artigo 492 do CPC/2015, acolho e preliminar de julgamento extra-petita e declaro nula a sentença e, de acordo com o seu artigo 1.013, § 3º, III, julgo procedente o pedido formulado na inicial para restabelecer o benefício de auxílio-doença até a conclusão do processo de reabilitação, restando prejudicada a apelação interposta. É o voto.
E M E N T A
APELAÇÃO CÍVEL. PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-ACIDENTE. PRELIMINAR DE JULGAMENTO EXTRA PETITA ACOLHIDA. PEDIDO INICIAL VERSANDO O RESTABELECIMENTO DE AUXÍLIO-DOENÇA OU CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. JULGAMENTO DO MÉRITO DIRETAMENTE PELO TRIBUNAL. INCAPACIDADE PARCIAL E PERMANENTE DEMONSTRADA. RESTABELECIMENTO DO BENEFÍCIO DE AUXÍLIO-DOENÇA ATÉ A CONCLUSÃO DO PROCESSO DE REABILITAÇÃO. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. MANUAL DE CÁLCULOS NA JUSTIÇA FEDERAL.
1. Sentença que julgou pedido diverso do formulado na inicial. Nulidade por julgamento extra petita na forma do caput do artigo 492 do CPC/2015.
2. Condições de imediato julgamento. Aplicação da regra do inciso III do §3º do artigo 1.013 do Código de Processo Civil/2015. Exame do mérito.
3. A Lei nº 8.213/91, no artigo 42, estabelece os requisitos necessários para a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez, quais sejam: qualidade de segurado, cumprimento da carência, quando exigida, e moléstia incapacitante e insuscetível de reabilitação para atividade que lhe garanta a subsistência. O auxílio-doença, por sua vez, tem seus pressupostos previstos nos artigos 59 a 63 da Lei nº 8.213/91, sendo concedido nos casos de incapacidade temporária.
4 O laudo médico apontou limitação parcial do autor ao desempenho de atividades laborais, constatando a aptidão laboral para atividades que não demandem esforço físico, com a existência de limitação funcional que não pode ser reconhecida como causadora de incapacidade total e permanente para qualquer atividade, estando apto à reabilitação profissional para exercer atividades laborais compatíveis com as restrições físicas por ele apresentadas.
5. Restabelecimento do benefício previdenciário de auxílio-doença, fixado o termo inicial do benefício na data da cessação do benefício de auxílio-doença. devendo ser mantido até o final do programa de reabilitação e, nesse sentido, cabe ao requerente aderir ao tratamento médico adequado e ao processo de reabilitação com seriedade e constância, favorecendo o seu êxito.
6. Juros e correção monetária pelos índices constantes do Manual de Orientação para a elaboração de Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta, observando-se, em relação à correção monetária, a aplicação do IPCA-e em substituição à TR – Taxa Referencial, consoante decidido pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no RE nº 870.947, tema de repercussão geral nº 810, em 20.09.2017, Relator Ministro Luiz Fux.
7. Condenação do INSS ao pagamento de honorários de advogado fixados em 10% do valor da condenação, consoante o entendimento desta Turma e o disposto §§ 2º e 3º do artigo 85 do Código de Processo Civil/2015, considerando as parcelas vencidas até a data da sentença, nos termos da Súmula nº 111 do Superior Tribunal de Justiça.
9. Apelação do INSS provida. Sentença anulada. Com base no artigo 1.013, § 3º, III do Código de Processo Civil, julgado procedente o pedido para conceder ao autor benefício de auxílio-doença até conclusão do processo de reabilitação profissional. Reexame necessário não conhecido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região decide a Sétima Turma, por unanimidade, de ofício, declarar a nulidade da sentença e julgar procedente o pedido inicial, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.