AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº 0016640-39.2012.4.03.0000
RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
AUTOR: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) AUTOR: FRANCISCO DE ASSIS GAMA - SP73759-N
RÉU: JOSE FRANCISCO ZAMPINI
Advogado do(a) RÉU: CARLOS ALBERTO FERNANDES - SP61447-N
OUTROS PARTICIPANTES:
AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº 0016640-39.2012.4.03.0000 RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA RECONVINTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS Advogado do(a) RECONVINTE: FRANCISCO DE ASSIS GAMA - SP73759-N RECONVINDO: JOSE FRANCISCO ZAMPINI Advogado do(a) RECONVINDO: CARLOS ALBERTO FERNANDES - SP61447-N OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (RELATORA): Trata-se de ação rescisória ajuizada em 01.06.2012 (ID 90063686, pág. 3) em face de decisão terminativa de ID 90063686, págs. 140/148, cujo trânsito em julgado se deu em 09.12.2011 (ID 90063686, pág. 153). A decisão rescindenda, de lavra da E. Desembargadora Federal MARISA SANTOS, deu parcial provimento à apelação da autora, para fixar o termo inicial da aposentadoria por invalidez na data do requerimento administrativo (05.12.2002), observada a prescrição quinquenal, e deu parcial provimento à remessa oficial, para explicitar os critérios de apuração da correção monetária e juros de mora. Constou, ainda, do voto o seguinte: "O laudo pericial constatou que a incapacidade teve início em 12.05.2000 (quesito 9 do INSS- fl. 73). Portanto, o(a) autor(a) mantinha a condição de segurado à época do pedido, pois, conforme dados do CNIS (documento anexo), a última contribuição foi em 05.2000. Na data do requerimento, também já estava cumprida a carência" (ID 90063686, págs. 140/142). Inconformado, ingressou o INSS com a presente ação rescisória, com base nos incisos V e IX do artigo 485 do CPC/73, ao fundamento de que a decisão rescindenda incorreu em violação a literal disposição de lei (artigo 15, inciso II, artigo 27, inciso II, artigo 42 e artigo 102, todos da Lei 8.213/91) e em erro de fato, uma vez que, no momento em que teve início a incapacidade, o autor não preenchia os requisitos de carência e não mantinha mais a qualidade de segurado, pois os recolhimentos das contribuições foram efetuados fora do prazo legal, não fazendo jus, assim, à aposentadoria por invalidez. Forte nisso, pede a desconstituição do julgado, bem assim a concessão de tutela de urgência. A decisão de ID 90063686, pág. 170, dispensou o INSS de realizar o depósito de que cuida o artigo 488, II, do CPC/1973; postergou a apreciação do pedido de antecipação dos efeitos da tutela; e determinou a citação do INSS. Citada, o réu apresentou contestação, em que alega, preliminarmente, carência da ação, por falta de interesse processual, pleiteando, no mérito, a improcedência do pedido. Requereu, por fim, a concessão dos benefícios da Justiça Gratuita (ID 90063686, págs. 178/186). Justiça Gratuita deferida (ID 90063686, pág. 196). Encerrada a instrução processual, as partes apresentaram suas razões finais (ID 90063686, págs. 203/208 e 210). O Ministério Público Federal manifestou-se no sentido da improcedência da ação (ID 90063686, págs. 212/222). É o breve relatório.
AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº 0016640-39.2012.4.03.0000 RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA RECONVINTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS Advogado do(a) RECONVINTE: FRANCISCO DE ASSIS GAMA - SP73759-N RECONVINDO: JOSE FRANCISCO ZAMPINI Advogado do(a) RECONVINDO: CARLOS ALBERTO FERNANDES - SP61447-N OUTROS PARTICIPANTES: V O T O A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (RELATORA): Por ter sido a presente ação ajuizada na vigência do CPC/1973, consigno que as situações jurídicas consolidadas e os atos processuais impugnados serão apreciados em conformidade com as normas ali inscritas, consoante determina o artigo 14 da Lei nº 13.105/2015. Friso que segundo a jurisprudência da C. 3ª Seção desta Corte, na análise da ação rescisória, aplica-se a legislação vigente à época em que ocorreu o trânsito em julgado da decisão rescindenda: PROCESSO CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO RESCISÓRIA. ARTIGO 966, VII, DO NCPC. DIREITO INTERTEMPORAL. PROVA NOVA. OITIVA DE TESTEMUNHAS. IMPOSSIBILIDADE. NÃO CONFIGURAÇÃO DE DOCUMENTO NOVO. LEGISLAÇÃO APLICÁVEL: A DO TRANSITO EM JULGADO DA SENTENÇA OU ACÓRDÃO. ARTIGO 485, VII, DO CPC/73. HONORÁRIOS DE ADVOGADO. IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO RESCISÓRIA. AGRAVO REGIMENTAL PREJUDICADO. - A sentença proferida na ação matriz transitou em julgado em 19/02/2016. Como a propositura da ação rescisória deu-se em 22/08/2016, não fluiu o prazo decadencial de 2 (dois) anos, previsto nos artigos 495 do CPC/73 e 975 do NCPC. [...] - Entretanto, o trânsito em julgado da sentença deu-se na vigência do Código de Processo Civil de 1973, que naõ previa a possibilidade de propor ação rescisória com base em obtenção de "prova nova", mas apenas no caso de "documento novo". Com efeito, é bastante conhecida a lição de direito intertemporal, segundo a qual se aplica, nas ações rescisórias, a legislação vigente quando do trânsito em julgado da sentença ou acórdão a que se visa rescindir. - Outra não é a lição do antigo e ilustre Professor Titular de Direito Processual Civil da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, Celso Neves: "A Lei superveniente que regule de maneira diversa a ação rescisória, seja quanto a seus pressupostos, seja quanto ao prazo, não se aplica, pois, às ações rescisória que, anteriormente, já poderiam ter sido ajuizadas (in Prazo de Ação Rescisória e Direito Intertemporal). - No mesmo sentido: "AÇÃO RESCISÓRIA. DIREITO INTERTEMPORAL. - Acórdão rescindendo que transitou em julgado na vigência do Código de Processo Civil de 1939. Ação rescisória fundada em novos pressupostos criados pelo atual diploma processual. Impossibilidade, porquanto, a lei reguladora da ação rescisória é a contemporânea ao trânsito em julgado da sentença rescindenda" (Supremo Tribunal Federal, Ação Rescisória 944/RJ, Tribunal Pleno, DJ 28/3/1980, relator Ministro Soares Munoz). [...] (TRF 3ª Região, TERCEIRA SEÇÃO, AR - AÇÃO RESCISÓRIA - 11342 - 0015682-14.2016.4.03.0000, Rel. JUIZ CONVOCADO RODRIGO ZACHARIAS, julgado por unanimidade em 10/05/2018, e-DJF3 Judicial 1 DATA:18/05/2018) E diferentemente não poderia ser, pois, como o direito à rescisão surge com o trânsito em julgado, na análise da rescisória deve-se considerar o ordenamento jurídico então vigente. DA OBSERVÂNCIA DO PRAZO DECADENCIAL Conforme relatado, a decisão rescindenda transitou em julgado em 09.12.2011 (ID 90063686, pág. 153) e a presente ação foi ajuizada em 01.06.2012 (ID 90063686, pág. 3), ou seja, dentro do prazo previsto no artigo 495 do CPC/1973. DA PRELIMINAR SUSCITADA O réu apresentou contestação, em que alega, preliminarmente, carência da ação, por falta de interesse processual, pois, em seu entender, o INSS veicula pretensão incompatível com a legislação aplicável ao caso concreto, bem como contrária à jurisprudência consolidada de Tribunais superiores. Tal preliminar não pode ser acolhida, pois tais questões dizem respeito ao próprio mérito do pedido de rescisão, devendo, como tal, serem analisadas. Por tais razões, rejeito a preliminar suscitada. DA DECISÃO RESCINDENDA E DA PRETENSÃO RESCISÓRIA. A decisão monocrática impugnada nesta ação rescisória, de lavra da E. Desembargadora Federal MARISA SANTOS, deu parcial provimento à apelação da autora, para fixar o termo inicial da aposentadoria por invalidez na data do requerimento administrativo (05.12.2002), observada a prescrição quinquenal, e deu parcial provimento à remessa oficial, para explicitar os critérios de apuração da correção monetária e juros de mora. Inconformado, ingressou o INSS com a presente ação rescisória, com base nos incisos V e IX do artigo 485 do CPC/73. De rigor, portanto, a análise de tal causa de pedir e, se o caso, do pedido rescisório. DO JUÍZO RESCINDENTE - ERRO DE FATO E VIOLAÇÃO A NORMA JURÍDICA NÃO CONFIGURADOS. Previa o art. 485, inciso V, do CPC/73, que "A sentença de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quando: [...] violar literal disposição de lei". A melhor exegese de referido dispositivo revela que "O vocábulo "literal" inserto no inciso V do artigo 485 revela a exigência de que a afronta deve ser tamanha que contrarie a lei em sua literalidade. Já quando o texto legal dá ensejo a mais de uma exegese, não é possível desconstituir o julgado proferido à luz de qualquer das interpretações plausíveis" (SOUZA, Bernardo Pimentel. Introdução aos recursos cíveis e à ação rescisória. Brasília: Brasília Jurídica. 2000. P. 380/381). A violação à norma jurídica precisa, portanto, ser manifesta, ou seja, evidente, clara e não depender de prova a ser produzida no bojo da rescisória. Caberá rescisória quando a decisão rescindenda conferir uma interpretação sem qualquer razoabilidade a texto normativo. Nessa linha, a Súmula 343 do STF estabelece que "Não cabe ação rescisória por ofensa a literal disposição de lei, quando a decisão rescindenda se tiver baseado em texto legal de interpretação controvertida nos tribunais". Por outro lado, nos termos do artigo 485, IX, do CPC/1973, a decisão de mérito poderá ser rescindida nos casos em que estiver "fundada em erro de fato, resultante de atos ou de documentos da causa". O artigo 485, §1°, do CPC/73, esclarecia que há erro de fato "quando a sentença admitir um fato inexistente, ou quando considerar inexistente um fato efetivamente ocorrido" e que "É indispensável, num como noutro caso, que não tenha havido controvérsia, nem pronunciamento judicial sobre o fato" (CPC/73, art. 485, §2°). Nessa mesma linha, o CPC/2015 dispõe, no artigo 966, VIII, que a "decisão de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quando: [...] for fundada em erro de fato verificável do exame dos autos", esclarecendo o § 1o que "Há erro de fato quando a decisão rescindenda admitir fato inexistente ou quando considerar inexistente fato efetivamente ocorrido, sendo indispensável, em ambos os casos, que o fato não represente ponto controvertido sobre o qual o juiz deveria ter se pronunciado". A interpretação de tais dispositivos revela que há erro de fato quando o julgador chega a uma conclusão partindo de uma premissa fática falsa; quando há uma incongruência entre a representação fática do magistrado, o que ele supõe existir, e realidade fática. Por isso, a lei diz que há o erro de fato quando "a sentença admitir um fato inexistente, ou quando considerar inexistente um fato efetivamente ocorrido". O erro de fato enseja uma decisão putativa, operando-se no plano da suposição. Além disso, a legislação exige, para a configuração do erro de fato, que "não tenha havido controvérsia, nem pronunciamento judicial sobre o fato". E assim o faz porque, quando se estabelece uma controvérsia sobre a premissa fática adotada pela decisão rescindenda e o magistrado sobre ela emite um juízo, um eventual equívoco nesse particular não se dá no plano da suposição e sim no da valoração, caso em que não se estará diante de um erro de fato, mas sim de um possível erro de interpretação, o qual não autoriza a rescisão do julgado, na forma do artigo 485, IX, do CPC, ou do artigo 966, VIII, do CPC/2015. Por fim, exige-se que (a) a sentença tenha se fundado no erro de fato - sem ele a decisão seria outra -; e que (b) o erro seja identificável com o simples exame dos documentos processuais, não sendo possível a produção de novas provas no âmbito da rescisória a fim de demonstrá-lo. Sobre o tema, precisa a lição de Bernardo Pimentel Souza, a qual, embora erigida na vigência do CPC/1973, permanece atual, considerando que o CPC/2015 manteve, em larga medida, a sistemática anterior no particular: Com efeito, além das limitações gerais insertas no caput do artigo 485, o inciso IX indica que só o erro de fato perceptível à luz dos autos do processo anterior pode ser sanado em ação rescisória. Daí a conclusão: é inadmissível ação rescisória por erro de fato, cuja constatação depende da produção de provas que não figuram nos autos do processo primitivo. A teor do § 2º do artigo 485, apenas o erro relacionado a fato que não foi alvo de discussão pode ser corrigido em ação rescisória. A existência de controvérsia entre as partes acerca do fato impede a desconstituição do julgado. A expressão erro de fato" tem significado técnico-processual que consta do § 1 - do artigo 485: "Há erro, quando a sentença admitir um fato inexistente, ou quando considerar inexistente um fato efetivamente ocorrido". Assim, o erro que pode ser corrigido na ação rescisória é o de percepção do julgador, não o proveniente da interpretação das provas. Exemplo típico de erro de fato é o ocorrido em sentença de procedência proferida tendo em conta prova pericial que não foi produzida na ação de investigação de paternidade. Já a equivocada interpretação da prova não configura erro de fato à luz do § 1- do artigo 485, não dando ensejo à desconstituição do julgado. Apenas o erro de fato relevante permite a rescisão do decisum. É necessária a existência de nexo de causalidade entre o erro de fato e a conclusão do juiz prolator do decisum rescindendo. Erro de fato irrelevante não dá ensejo à desconstituição do julgado. (SOUZA, Bernardo Pimentel. Introdução aos recursos cíveis e à ação rescisória. Brasília: Brasília Jurídica. 2000. P. 386/387). No caso, o INSS afirma que a decisão rescindenda incorreu em violação a literal disposição de lei (artigo 15, inciso II, artigo 27, inciso II, artigo 42 e artigo 102, todos da Lei 8.213/91) e em erro de fato, uma vez que, no momento em que teve início a incapacidade, o autor não preenchia os requisitos de carência e não mantinha mais a qualidade de segurado, pois os recolhimentos das contribuições foram efetuados fora do prazo legal, não fazendo jus, assim, à aposentadoria por invalidez. Tais alegações, entretanto, não procedem, eis que o fato impeditivo ao direito reconhecido na decisão rescindenda – recolhimento extemporâneo de contribuições e consequente perda da qualidade de segurado e falta de carência - só veio a ser suscitado pelo INSS nesta rescisória, não tendo, em nenhum momento, sido noticiado no feito de origem. De fato, no feito subjacente, apenas havia a notícia de que o réu vertera contribuições relativas ao período de 1995 a 2000, sendo certo que em nenhum momento o INSS lá alegou que tais contribuições só foram recolhidas pelo réu em 2002. Na contestação apresentada pela autarquia, no ano de 2008, o INSS apenas sustentou que o último vínculo empregatício do autor havia se encerrado em dezembro de 1989, de forma que em maio de 2000 ele já teria perdido a qualidade de segurado. O INSS, em tal oportunidade, sequer mencionou os recolhimentos do período de 1995 a 2000, realizados em 2002. Proferida sentença, o INSS, mais uma vez, silenciou quanto à extemporaneidade dos recolhimentos, tendo deixado de interpor recurso de apelação e requerido a dispensa do reexame necessário, caso o valor da condenação fosse inferior ao limite legal (Num. 90063686 - Pág. 128). Nada obstante, diante do recurso de apelação manejado pelo réu e considerando que a sentença já havia determinado a remessa necessária, a e. Desembargadora Federal Relatora do feito proferiu a decisão monocrática aqui impugnada. Com a decisão rescindenda foi juntada aos autos consulta ao CNIS, a qual apontou os recolhimentos do autor como contribuinte individual, no período de maio de 1995 a maio de 2000. Tal documento não indica, contudo, que os recolhimentos foram realizados apenas em 2002. Vê-se, assim, que o fato que alicerça a causa de pedir apresentada pela autarquia nesta rescisória – recolhimento das contribuições do período de maio/1955 a maio/2000 apenas em 2002 e consequente perda da qualidade de segurado – não foi suscitado, tampouco comprovado no feito subjacente. De notar que a autarquia previdenciária, nesta rescisória, não indicou qualquer elemento de prova constante do feito subjacente que comprovasse o recolhimento extemporâneo das contribuições, tendo se limitado a asseverar que tal informação poderia ter sido obtida em consulta ao sistema CNIS. Nesse cenário, não há como se divisar o erro de fato alegado, já que, como visto, para que tal vício fique caracterizado, é preciso que ele seja identificável com o simples exame dos documentos processuais, e que não haja a necessidade de produção de novas provas no âmbito da rescisória a fim de demonstrá-lo, o que não se verifica in casu. Em resumo, não se divisa o alegado erro de fato, tendo em vista que o fato que o INSS afirma que foi desconsiderado pela decisão objurgada não foi alegado tampouco pode ser inferido dos elementos residentes nos autos subjacentes. Sob outro vértice, não prospera a alegação de violação a norma jurídica extraída dos dispositivos citados pelo INSS na sua exordial, uma vez que a circunstância fática que atrairia a incidência de tal norma não foi noticiada no feito subjacente, tendo a decisão rescindenda adequadamente apreciado a controvérsia que lhe foi posta em conformidade com as provas residentes nos autos. Ou seja, como o julgado rescindendo está em total conformidade com as provas produzidas nos autos subjacentes, não há como se acolher a alegação de manifesta violação à norma jurídica. Entendo que a violação manifesta à norma jurídica pressupõe que a parte que a alega tenha apresentado o substrato fático que atrai a sua incidência ao magistrado prolator da decisão objurgada, pois não se exige do julgador o conhecimento de fatos não reportado nos autos. Tivesse o INSS alegado ou, pelo menos, juntado no feito subjacente qualquer elemento de prova a indicar a extemporaneidade do recolhimento, e o julgado desconsiderado tal circunstância fática, poder-se-ia cogitar em violação à norma jurídica apontada e mesmo erro de fato a autorizar a rescisão do julgado rescindendo. No entanto, como, in casu, isso não ocorreu, não há como rescindir o julgado, até porque, como se sabe, essa estreita via não é meio jurídico adequado para sanar as omissões das partes quanto aos seus ônus processuais. A ação rescisória fundada na alegação de violação manifesta a norma jurídica e erro de fato não é recurso, tampouco via para corrigir eventuais injustiças, sobretudo quando estas decorrem da inércia das partes quanto aos seus ônus processuais. A lógica que orienta a sistemática processual pátria no concernente à ação rescisória é a de que, nesta estreita via, a parte só pode alegar questões que não pôde, por razões justificáveis, suscitar no feito originário. Do contrário, prestigiar-se-ia a desídia da parte no que toca ao desvencilhamento do seu ônus processual. Isso fica claro, por exemplo, no artigo 485, VII, do CPC/73, o qual exige, para a configuração do "documento novo", que o autor ignorasse a existência da documentação ou demonstre que dele não pôde fazer uso. Da mesma forma, só se caracteriza o erro de fato quando "a sentença admitir um fato inexistente, ou quando considerar inexistente um fato efetivamente ocorrido" "resultante de atos ou de documentos da causa", o que revela que, para se reconhecer tal vício, é preciso que ele deflua dos elementos residentes no feito originário, não sendo possível configurá-lo a partir de novos elementos que venham a ser trazidos apenas no bojo da rescisória. Portanto, a impossibilidade de o autor inovar a lide em sede de rescisória é um freio ou contrapeso ao desvirtuamento desse meio autônomo de impugnação das decisões judicias, evitando-se, com isso, uma reabertura, em sede de rescisória, das discussões que deveriam ter sido suscitadas no feito de origem. Não se pode exigir que o magistrado cogite de questões fáticas não suscitadas pelas partes e, consequentemente, considerar que uma decisão incorre em violação direta a dispositivo normativo se o respectivo cenário fático não tiver sido apresentado no processo. Ocorre que o magistrado, embora não esteja limitado à fundamentação legal apresentada pelas partes, está adstrito aos fatos e pedidos apresentados pelas partes (artigo 128, do CPC/1973; artigo 141, do CPC/2015). Sendo assim, considerando que cabe ao magistrado promover a subsunção do fato à norma, "sendo-lhe defeso conhecer de questões, não suscitadas, a cujo respeito a lei exige a iniciativa da parte", forçoso é concluir ser inviável o pedido de rescisão formulado com base em violação a norma jurídica (art. 485, V, do CPC), quando o respectivo substrato fático não tiver sido tratado no feito originário, sendo apresentado apenas na ação rescisória. Sobre o tema, assim já se manifestou o C. STJ: PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA . SERVIDOR PÚBLICO. VIOLAÇÃO LITERAL DE DISPOSITIVO LEGAL (ART. 485, V, CPC/1973). AÇÃO RESCISÓRIA COMO SUCEDÂNEO RECURSAL. IMPOSSIBILIDADE. AÇÃO RESCISÓRIA NÃO PROVIDA. 1. Pela disposição normativa prevista tanto no art. 485, V, do CPC/1973 quanto no art. 966, V, do CPC/2015, observa-se que a concretização do vício rescisório está na manifesta divergência entre o julgado e o legislado. Ou seja, a não observação de preceito legal deve ser clara e inequívoca. 2. No caso dos autos, os dispositivos indicados como expressamente violados são: I) arts. 3º, VI, e 267, ambos do CPC/1973 e art. 1º do Dec.-Lei n. 1.110/1970, porque a ilegitimidade da União não foi declarada; II) do art. 1º do Dec.-Lei n. 20.910/1932 e dos arts. 219, § 5º, e 618, ambos do CPC/1973, porquanto não houve a extinção da execução, apesar da ocorrência da prescrição da pretensão executória. 3. Não se vincula a existência de vício rescisório a uma prévia indicação precisa do dispositivo na fundamentação do julgado rescindendo. Contudo, a inexistência de prequestionamento como requisito de ação rescisória não significa que essa possa ser utilizada como sucedâneo recursal, em face de seu caráter excepcional consequente da proteção à coisa julgada e à segurança jurídica. Assim, a deliberação contrária a disposição legal deve se apresentar no julgado rescindendo, mesmo quando não apresentada expressamente, de forma relevante. 4. A decisão rescindenda limitou-se a examinar questão relacionada ao excesso de execução. Tanto que deu provimento aos embargos à execução para abater R$ 15.568,69 do requerido inicialmente na execução do título firmado em mandado de segurança. Não houve análise de teses relacionadas à ilegitimidade ou à prescrição, até mesmo porque essas questões sequer foram elencadas na petição de embargos à execução. Portanto, verifica-se que esta ação rescisória foi manejada com o fim de substituir recurso e de discutir questões novas, que poderiam ter sido analisadas antes do trânsito do julgado rescindendo. 5. ação rescisória não provida. (AR 5.581/DF, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 14/11/2018, DJe 12/12/2018) PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO RESCISÓRIA. VIOLAÇÃO LITERAL A DISPOSITIVO DE LEI. QUESTÃO ESTRANHA AO CONTEÚDO DA DECISÃO TRANSITADA EM JULGADO. INVIABILIDADE. 1. Trata-se, na origem, de Ação Rescisória ajuizada pelo INSS com a finalidade de desconstituir parcialmente o trânsito em julgado de sentença que condenou a autarquia ao pagamento de benefício previdenciário. 2. A demanda foi ajuizada com base no art. 485, V, do CPC/1973, tendo sido apontado como violado o art. 219, § 5º, daquele diploma legislativo. 3. O Tribunal local corretamente julgou improcedente o pedido, adotando como fundamento a inviabilidade desta demanda para discutir matéria estranha ao conteúdo do acórdão cuja rescisão era almejada. 4. "Ainda que não se exija que a lei tenha sido invocada no processo originário, tendo em vista que o requisito do prequestionamento não se aplica em sede de ação rescisória , mostra-se inviável o pedido de rescisão, com base no art. 485, V, do CPC, fundado em suposta violação a disposição de lei, quando a questão aduzida na ação rescisória não foi tratada em nenhum momento em tal processo" (AgRg na AR 4.741/SC, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, DJe 6/11/2013). 5. Recurso Especial não provido. (REsp 1648617/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 04/05/2017, DJe 17/05/2017) Em caso análogo, esta C. Seção assim já se manifestou: PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO RESCISÓRIA . ARTIGO 485, INCISO V, DO CPC/1973. PENSÃO POR MORTE. GENITORA E COMPANHEIRA DE SEGURADO. DEPENDENTES DE CLASSES DISTINTAS. MATÉRIA ALEGADA EM RESCISÓRIA NÃO FOI OBJETO DE DISCUSSÃO NOS AUTOS DA AÇÃO SUBJACENTE. VIOLAÇÃO DE LEI NÃO CONFIGURADA. AÇÃO RESCISÓRIA QUE SE JULGA IMPROCEDENTE. 1) ação rescisória ajuizada na vigência do CPC/1973. 2) Em julgamento precedente da 3ª Seção, afastada a prejudicial de decadência, tendo em vista que o termo final para ajuizamento da ação se deu em dia não útil. 3) Embora ausente contestação da ré, é entendimento pretoriano que não incidem no âmbito da ação rescisória os efeitos da revelia, por força do princípio da preservação da coisa julgada. 4) O CPC/2015 manteve a regra do art. 319 do CPC/1973, segundo a qual a revelia não produz o efeito mencionado no art. 344 - presunção da veracidade das alegações de fato formuladas pelo autor - se o litígio versar sobre direitos indisponíveis (art. 345, II). Não há que se falar em "reconhecimento tácito do pedido", pois o pedido de extinção do feito - formulado pela autora nos autos da demanda subjacente e em fase de cumprimento de sentença - pode ser eventualmente analisado em sede de juízo rescisório, mas não constitui óbice à apreciação do pedido de desconstituição da decisão de mérito, ocasião em que se examinará a lisura do ato judicial em comento, visto que indisponível o objeto do iudicium rescindens. 5) ação rescisória não é recurso. Seu objetivo não é rescindir qualquer julgado, mas somente aquele que incida numa das específicas hipóteses do art. 485 do CPC/1973, autorizando-se, a partir da rescisão e nos seus limites, a análise do mérito da pretensão posta na lide originária. 6) Em matéria de pensão por morte, o princípio segundo o qual tempus regit actum impõe a aplicação da legislação vigente na data do óbito do segurado. Conforme certidão de óbito, o filho da autora faleceu em 20/09/2004, aplicando-se ao caso a Lei 8.213/91. 7) Qualidade de segurado e dependência econômica demonstradas. O julgador aplicou o disposto nos arts. 15, 16 e 74 da Lei 8.213/91, decidindo de acordo com os elementos de que dispunha, não havendo amparo jurídico para a afirmação da ocorrência de violação à literal disposição de lei. 8) A informação de que a companheira do segurado falecido recebe benefício de pensão por morte não consta dos autos da demanda originária. A matéria ora trazida para fins de desconstituição do julgado não foi objeto da decisão rescindenda. 9) ação rescisória que se julga improcedente. (TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO TERCEIRA SEÇÃO 0016908-25.2014.4.03.0000 Classe AR - AÇÃO RESCISÓRIA - 9937 Relator(a) DESEMBARGADORA FEDERAL MARISA SANTOS e-DJF3 Judicial 1 DATA:18/05/2018) Pelo exposto voto pela improcedência dos pedidos de rescisão do julgado deduzidos com base no artigo 485, V e IX, do CPC/1973. DO JUÍZO RESCISÓRIO. Julgado improcedente o pedido de rescisão do julgado, fica prejudicada a análise do pedido rescisório. DA SUCUMBÊNCIA Vencido o INSS, condeno-o ao pagamento da verba honorária, a qual fixo em R$ 1.000,00 (mil reais), nos termos da jurisprudência desta C. Seção. CONCLUSÃO Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTE o pedido, condenando o INSS a arcar com o pagamento de honorários advocatícios, na forma antes delineada. É COMO VOTO.
E M E N T A
PROCESSO CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO RESCISÓRIA. DA PRELIMINAR REJEITADA. ERRO DE FATO E VIOLAÇÃO A NORMA JURÍDICA NÃO CONFIGURADOS. AÇÃO RESCISÓRIA IMPROCEDENTE.
1. Tendo a ação rescisória sido ajuizada na vigência do CPC/1973, ela deve ser apreciada em conformidade com as normas ali inscritas, consoante determina o artigo 14 da Lei nº 13.105/2015.
2. Observado o prazo decadencial previsto no artigo 495 do CPC/1973.
3. O réu apresentou contestação, em que alega, preliminarmente, carência da ação, por falta de interesse processual, pois, em seu entender, o INSS veicula pretensão incompatível com a legislação aplicável ao caso concreto, bem como contrária à jurisprudência consolidada de Tribunais superiores. Tal preliminar não pode ser acolhida, pois tais questões dizem respeito ao próprio mérito do pedido de rescisão, devendo, como tal, serem analisadas.
4. Há erro de fato quando o julgador chega a uma conclusão partindo de uma premissa fática falsa; quando há uma incongruência entre a representação fática do magistrado, o que ele supõe existir, e realidade fática. Por isso, a lei diz que há o erro de fato quando "a sentença admitir um fato inexistente, ou quando considerar inexistente um fato efetivamente ocorrido". O erro de fato enseja uma decisão putativa, operando-se no plano da suposição. Além disso, a legislação exige, para a configuração do erro de fato, que "não tenha havido controvérsia, nem pronunciamento judicial sobre o fato". E assim o faz porque, quando se estabelece uma controvérsia sobre a premissa fática adotada pela decisão rescindenda e o magistrado sobre ela emite um juízo, um eventual equívoco nesse particular não se dá no plano da suposição e sim no da valoração, caso em que não se estará diante de um erro de fato, mas sim de um possível erro de interpretação, o qual não autoriza a rescisão do julgado, na forma do artigo 485, IX, do CPC, ou do artigo 966, VIII, do CPC/2015. Exige-se, ainda, que (a) a sentença tenha se fundado no erro de fato - sem ele a decisão seria outra -; e que (b) o erro seja identificável com o simples exame dos documentos processuais, não sendo possível a produção de novas provas no âmbito da rescisória a fim de demonstrá-lo.
5. A violação à norma jurídica precisa ser manifesta, ou seja, evidente, clara e não depender de prova a ser produzida no bojo da rescisória. Caberá rescisória quando a decisão rescindenda conferir uma interpretação sem qualquer razoabilidade a texto normativo. Nessa linha, a Súmula 343 do STF estabelece que "Não cabe ação rescisória por ofensa a literal disposição de lei, quando a decisão rescindenda se tiver baseado em texto legal de interpretação controvertida nos tribunais".
6. No caso, o INSS afirma que a decisão rescindenda incorreu em violação a literal disposição de lei (artigo 15, inciso II, artigo 27, inciso II, artigo 42 e artigo 102, todos da Lei 8.213/91) e em erro de fato, uma vez que, no momento em que teve início a incapacidade, o autor não preenchia os requisitos de carência e não mantinha mais a qualidade de segurado, pois os recolhimentos das contribuições foram efetuados fora do prazo legal, não fazendo jus, assim, à aposentadoria por invalidez. Tais alegações, entretanto, não procedem, eis que o fato impeditivo ao direito reconhecido na decisão rescindenda – recolhimento extemporâneo de contribuições e consequente perda da qualidade de segurado e falta de carência - só veio a ser suscitado pelo INSS nesta rescisória, não tendo, em nenhum momento, sido noticiado no feito de origem.
7. Não há como se divisar o erro de fato alegado, já que para que tal vício fique caracterizado, é preciso que ele seja identificável com o simples exame dos documentos processuais, e que não haja a necessidade de produção de novas provas no âmbito da rescisória a fim de demonstrá-lo, o que não se verifica in casu.
8. Não prospera a alegação de violação a norma jurídica extraída dos dispositivos citados pelo INSS na sua exordial, uma vez que a circunstância fática que atrairia a incidência de tal norma não foi noticiada no feito subjacente, tendo a decisão rescindenda adequadamente apreciado a controvérsia que lhe foi posta em conformidade com as provas residentes nos autos
9. A violação manifesta à norma jurídica pressupõe que a parte que a alega tenha apresentado o substrato fático que atrai a sua incidência ao magistrado prolator da decisão objurgada, pois não se exige do julgador o conhecimento de fatos não reportado nos autos.
10. A ação rescisória fundada na alegação de violação manifesta a norma jurídica e erro de fato não é recurso, tampouco via para corrigir eventuais injustiças, sobretudo quando estas decorrem da inércia das partes quanto aos seus ônus processuais. A lógica que orienta a sistemática processual pátria no concernente à ação rescisória é a de que, nesta estreita via, a parte só pode alegar questões que não pôde, por razões justificáveis, suscitar no feito originário. Do contrário, prestigiar-se-ia a desídia da parte no que toca ao desvencilhamento do seu ônus processual.
11. A impossibilidade de o autor inovar a lide em sede de rescisória é um freio ou contrapeso ao desvirtuamento desse meio autônomo de impugnação das decisões judicias, evitando-se, com isso, uma reabertura, em sede de rescisória, das discussões que deveriam ter sido suscitadas no feito de origem.
12. Não se pode exigir que o magistrado cogite de questões fáticas não suscitadas pelas partes e, consequentemente, considerar que uma decisão incorre em violação direta a dispositivo normativo se o respectivo cenário fático não tiver sido apresentado no processo. O magistrado, embora não esteja limitado à fundamentação legal apresentada pelas partes, está adstrito aos fatos e pedidos apresentados pelas partes (artigo 128, do CPC/1973; artigo 141, do CPC/2015). Sendo assim, considerando que cabe ao magistrado promover a subsunção do fato à norma, "sendo-lhe defeso conhecer de questões, não suscitadas, a cujo respeito a lei exige a iniciativa da parte", forçoso é concluir ser inviável o pedido de rescisão formulado com base em violação a norma jurídica (art. 485, V, do CPC), quando o respectivo substrato fático não tiver sido tratado no feito originário, sendo apresentado apenas na ação rescisória. Precedentes do C. STJ e desta E. Seção.
13. Julgados improcedentes os pedidos de rescisão do julgado, fica prejudicada a análise do pedido rescisório.
14. Vencido o INSS, fica ele condenado ao pagamento da verba honorária, fixada em R$ 1.000,00 (mil reais), nos termos da jurisprudência desta C. Seção.
15. Ação rescisória improcedente.