Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5004315-31.2018.4.03.6112

RELATOR: Gab. 13 - DES. FED. MONICA NOBRE

APELANTE: CONSELHO REGIONAL DE FARMACIA DO ESTADO DE SAO PAULO

APELADO: MUNICIPIO DE MIRANTE DO PARANAPANEMA

Advogado do(a) APELADO: FAUSTO CAVICHINI INFANTE GUTIERREZ - SP285403-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5004315-31.2018.4.03.6112

RELATOR: Gab. 13 - DES. FED. MONICA NOBRE

APELANTE: CONSELHO REGIONAL DE FARMACIA DO ESTADO DE SAO PAULO

APELADO: MUNICIPIO DE MIRANTE DO PARANAPANEMA

Advogado do(a) APELADO: FAUSTO CAVICHINI INFANTE GUTIERREZ - SP285403-A

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

 

 

Trata-se de apelação interposta pelo CONSELHO REGIONAL DE FARMÁCIA DO ESTADO DE SÃO PAULO - CRF/SP em face de sentença que acolheu os embargos à execução, nos termos do artigo 487, I do Código de Processo Civil, para o fim de desconstituir o crédito tributário, por entender ser dispensável a manutenção de responsável técnico farmacêutico no dispensário de medicamentos mantidos pelo Embargante. O embargado foi condenado ao pagamento de honorários advocatícios, arbitrados em 10% do valor da causa.

Alega o apelante, em síntese, que por força da Lei nº 13.021/14, é obrigatória a presença de profissional farmacêutico nas farmácias privativas de unidades públicas de saúde, em razão da extinção do conceito de dispensário de medicamentos. Requer a reforma da r. sentença.

Com contrarrazões de apelação, subiram os autos a este E. Tribunal.

É o relatório.

 

 

 

 

 

 


APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5004315-31.2018.4.03.6112

RELATOR: Gab. 13 - DES. FED. MONICA NOBRE

APELANTE: CONSELHO REGIONAL DE FARMACIA DO ESTADO DE SAO PAULO

APELADO: MUNICIPIO DE MIRANTE DO PARANAPANEMA

Advogado do(a) APELADO: FAUSTO CAVICHINI INFANTE GUTIERREZ - SP285403-A

 

 

 

 

 

 

V O T O

 

 

 

A controvérsia dos autos gira em torno da necessidade, ou não, nos termos da legislação vigente, da atuação de farmacêutico em dispensário de medicamentos mantido pelo apelado.

Pois bem.

O apelado possui um dispensário de medicamentos, no qual não existe manipulação de remédios, onde é realizada a distribuição de medicamentos pela rede pública.

A obrigatoriedade de profissional técnico farmacêutico nas farmácias e drogarias, vem disciplinada no artigo 15 da Lei nº 5.991/73, que trata do Controle Sanitário do Comércio de Drogas, Medicamentos, Insumos Farmacêuticos e Correlatos, e dá outras Providências, ipsis litteris:

 

"Art. 15 - A farmácia e a drogaria terão, obrigatoriamente, a assistência de técnico responsável, inscrito no Conselho Regional de Farmácia, na forma da Lei."

 

Por sua vez, o artigo 4º de referido diploma legal conceitua drogaria, farmácia e dispensário de medicamentos, nos seguintes termos:

 

"Art. 4º - Para efeitos desta Lei, são adotados os seguintes conceitos:

(...)

X - Farmácia - estabelecimento de manipulação de fórmulas magistrais e oficinais, de comércio de drogas, medicamentos, insumos farmacêuticos e correlatos, compreendendo o de dispensação e o de atendimento privativo de unidade hospitalar ou de qualquer outra equivalente de assistência médica;

XI - Drogaria - estabelecimento de dispensação e comércio de drogas, medicamentos, insumos farmacêuticos e correlatos em suas embalagens originais;

(...)

XIV - Dispensário de medicamentos - setor de fornecimento de medicamentos industrializados, privativo de pequena unidade hospitalar ou equivalente."

Desse modo, ausente previsão legal, inviável exigir a permanência de profissional farmacêutico no posto e/ou dispensário de medicamentos.

Nesse sentido, "se eventual dispositivo regulamentar, seja ele Decreto, Portaria ou Resolução, consignou tal obrigação, o fez de forma a extrapolar os termos estritos da legislação vigente e, desta forma, não pode prevalecer" (REsp 1.110.906/SP). Assim, a obrigatoriedade da assistência e responsabilidade de farmacêutico em dispensários de medicamentos não pode subsistir nos termos em que dispõe o artigo 1º do Decreto nº 85.878/81.

A propósito, a C. Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça pacificou o entendimento, em julgamento submetido à sistemática do art. 543-C do Código de Processo Civil/1973 - REsp nº 1.110.906/SP, de que não é exigível a presença de responsável técnico farmacêutico nos dispensários de medicamentos.

Na ocasião, restou consignada a incidência da Súmula 140 do extinto Tribunal Federal de Recursos, cujo conceito de dispensário de medicamentos foi atualizado para estabelecer que, "a partir da revogação da Portaria Ministerial 316/77, ocorrida em 30/12/10, considera-se unidade hospitalar de pequeno porte o hospital cuja capacidade é de até 50 leitos". Nesse passo, a interpretação dada pelo julgado não viola os princípios da isonomia, da proporcionalidade e da dignidade humana, bem assim os artigos 6º e 196 da Constituição Federal.

Por oportuno, transcrevo a ementa do referido julgado:

 

"ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. ART. 543-C DO CPC. CONSELHO REGIONAL DE FARMÁCIA. DISPENSÁRIO DE MEDICAMENTOS. PRESENÇA DE FARMACÊUTICO. DESNECESSIDADE. ROL TAXATIVO NO ART. 15 DA LEI N. 5.991/73. OBRIGAÇÃO POR REGULAMENTO. DESBORDO DOS LIMITES LEGAIS. ILEGALIDADE. SÚMULA 140 DO EXTINTO TFR. MATÉRIA PACIFICADA NO STJ.

1. Cuida-se de recurso especial representativo da controvérsia, fundado no art. 543-C do Código de Processo Civil sobre a obrigatoriedade, ou não, da presença de farmacêutico responsável em dispensário de medicamentos de hospitais e clínicas públicos, ou privados, por força da Lei n. 5.991/73.

2. Não é obrigatória a presença de farmacêutico em dispensário de medicamentos, conforme o inciso XIV do art. 4º da Lei n. 5.991/73, pois não é possível criar a postulada obrigação por meio da interpretação sistemática dos arts. 15 e 19 do referido diploma legal.

3. Ademais, se eventual dispositivo regulamentar, tal como o Decreto n. 793, de 5 de abril de 1993 (que alterou o Decreto n. 74.170, de 10 de junho de 1974), fixar tal obrigação ultrapassará os limites da lei, porquanto desbordará o evidente rol taxativo fixado na Lei n. 5.991/73.

4. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é firme no sentido de que não é obrigatória a presença de farmacêutico em dispensário de medicamentos de hospital ou de clínica, prestigiando - inclusive - a aplicação da Súmula 140 do extinto Tribunal Federal de Recursos. Precedentes.

5. O teor da Súmula 140/TFR - e a desobrigação de manter profissional farmacêutico - deve ser entendido a partir da regulamentação existente, pela qual o conceito de dispensário atinge somente "pequena unidade hospitalar ou equivalente" (art. 4º, XV, da Lei n. 5.991/73); atualmente, é considerada como pequena a unidade hospitalar com até 50 (cinqüenta) leitos, ao teor da regulamentação específica do Ministério da Saúde; os hospitais e equivalentes, com mais de 50 (cinqüenta) leitos, realizam a dispensação de medicamentos por meio de farmácias e drogarias e, portanto, são obrigados a manter farmacêutico credenciado pelo Conselho Profissional, como bem indicado no voto-vista do Min. Teori Zavascki, incorporado aos presentes fundamentos.

6. Recurso sujeito ao regime do art. 543-C do CPC, combinado com a Resolução STJ 08/2008.

Recurso especial improvido."

(REsp 1110906/SP, Relator Ministro Humberto Martins, Primeira Seção, j. 23.05.2012, DJe 07/08/2012)

 

No mesmo sentido, cito os julgados:

 

"PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. CONSELHO REGIONAL DE FARMÁCIA. DISPENSÁRIO DE MEDICAMENTOS. PRESENÇA DE PROFISSIONAL FARMACÊUTICO. DESNECESSIDADE. PRECEDENTE EM RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. RESP N. 1.110.906/SP.

1. Sobre o desrespeito aos arts. 4º, 19, 40 a 42 da Lei n. 5.991/73, art. 1º do Decreto n. 85.878/81 e 24 da Lei n. 3.820/60, é de se notar que a Primeira Seção desta Corte, por ocasião do julgamento do REsp 1.110.906/SP, submetido à sistemática do artigo 543-C do CPC, entendeu que não é exigível a presença de responsável técnico de farmacêutico nos dispensários de medicamentos, conforme inteligência do art. 15 da Lei 5.991/73 c/c art. 4º, XIV do mesmo diploma legal.

2. Agravo regimental não provido, com aplicação de multa no percentual de 1% (um por cento) do valor corrigido da causa."

(AgRg no REsp 1.246.614/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 7/2/2013, DJe 18/2/2013.)PROCESSUAL CIVIL. CONSELHO REGIONAL DE FARMÁCIA. DISPENSÁRIO DE MEDICAMENTOS. PRESENÇA DE FARMACÊUTICO. DESNECESSIDADE. ROL TAXATIVO NO ART. 15 DA LEI N. 5.991/73. ENTENDIMENTO EXTENSIVO ÀS UNIDADES BÁSICAS DE SAÚDE.

1. Observando o teor do acórdão a quo, nota-se que houve decisão em sintonia com o entendimento sedimentado pelo STJ, na sistemática do art. 543-C do CPC.

2. As Unidades Básicas de Saúde não merecem entendimento diverso do que já foi apreciado pelo STJ no julgamento do recurso repetitivo, segundo o qual "não é obrigatória a presença de farmacêutico em dispensário de medicamentos de hospital ou de clínica, prestigiando - inclusive - a aplicação da Súmula 140 do extinto Tribunal Federal de Recursos. Precedentes." (REsp 1.110.906/SP, deste Relator, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 23/5/2012, DJe 7/8/2012.) Agravo regimental improvido.

(AgRg no AREsp 512.961/SP, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 05/08/2014, DJe 13/08/2014)

 

EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. CONSELHO REGIONAL DE FARMÁCIA. DISPENSÁRIO DE MEDICAMENTOS. PRESENÇA DE PROFISSIONAL LEGALMENTE HABILITADO. INEXIGIBILIDADE. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.

- Dispõe o artigo 24, parágrafo único, da Lei n º 3.820/60, que as empresas e estabelecimentos que exploram serviços para os quais são necessárias atividades de profissional farmacêutico deverão provar perante os Conselhos Federal e Regionais que essas atividades são exercidas por profissional habilitado e registrado.

- Como prevê o artigo 15 da Lei n.º 5.991/73, somente as farmácias comerciais e as drogarias estão obrigadas a contar com a assistência de farmacêutico responsável inscrito no Conselho Regional de Farmácia.

- A obrigação da presença de profissional farmacêutico não se estende ao dispensário médico do posto de saúde. O fato de o ambulatório manter medicamentos industrializados, destinados, sob receita, aos munícipes, sem finalidade comercial, não o obriga a ter a assistência de farmacêutico e nem a obter certificado de regularidade e de habilitação legal do Conselho Regional de Farmácia, na medida em que não pode ser propriamente equiparada à atividade de farmácias e drogarias.

- Não prospera a alegação de que a inexistência do dispensário de medicamentos no rol de estabelecimentos liberados da necessidade de assistência profissional, previsto no artigo 19 da Lei n.º 5.991/73, o coloca necessariamente na condição de obrigatoriedade assinalada pelo artigo 15 do mesmo diploma legal, pois acaba por criar uma nova obrigação, não prevista expressamente pela lei, por meio da conjugação de seus dispositivos.

- Da mesma maneira, não prevalece a combinação do artigo 1° do Decreto n.º 85.878/81 e artigo 6° da Lei n.º 5.991/73, tampouco entre o artigo 11 da Lei nº 8.069/90 e artigo 15 da Lei nº 10.741/2003 com a finalidade de determinar a obrigatoriedade de profissional farmacêutico no dispensário de medicamentos, porque não cabe ao intérprete criar uma obrigação que não foi imposta pelo legislador.

- Pelo mesmo motivo tampouco preponderam as argumentações com supedâneo nos artigos 40, 41 e 42 da Lei n.º 5.991/73, porque tratam de aviamento de medicamentos, o que não é objeto do dispensário, bem como em relação aos artigos 67 da Portaria do Ministério da Saúde n.º 344/98, 1º da Portaria da Secretaria de Atenção à Saúde n.º 1.017/02, 24 do Decreto n.º 20.931/32, e item 6.2 da Resolução n.º 10/01 da Agência Nacional da Vigilância Sanitária, normas infralegais que não se destinam a estabelecer obrigações não previstas em lei.

- No tocante à aplicação da Súmula 140 do extinto Tribunal Federal de recursos, não há que se falar em ofensa aos princípios da isonomia e da dignidade humana, tampouco aos artigos 1º, inciso III, 3º, incisos III e IV, 196 da Constituição, porque o entendimento jurisprudencial surgiu com o intuito de promover a interpretação do inciso XIV do artigo 4º da Lei n.º 5.991/73.

- A questão foi decidida pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento do Recurso Especial n.º Recurso Especial n.º 1.110.906/SP, representativo da controvérsia, que foi submetido ao regime de julgamento previsto pelo artigo 543-C do Código de Processo Civil, ao entendimento de que não é obrigatória a presença de farmacêutico em dispensário de medicamentos, conforme o inciso XIV do art. 4º da Lei n. 5.991/73, pois não é possível criar a postulada obrigação por meio da interpretação sistemática dos artigos. 15 e 19 do referido diploma legal.

- Honorários advocatícios mantidos em R$ 2.900,00 (valor da causa R$ 42.509,40), porquanto proporcionais e em consonância com a norma estabelecida pelo artigo 20, §§ 3º e 4º, do Código de Processo Civil.

- Remessa oficial e apelação da União desprovidas. Recurso adesivo da municipalidade não provido.

(Apelação/Reexame Necessário nº 0012274-59.2014.4.03.9999/SP, Quarta Turma, Relator Desembargador Federal ANDRÉ NABARRETE, julgado em 11/09/2014, D.E. 26/09/2014)

 

ADMINISTRATIVO - CONSELHO REGIONAL DE FARMÁCIA - EXECUÇÃO FISCAL. MULTA POR INFRAÇÃO. POSTO/DISPENSÁRIO DE MEDICAMENTOS.

1. Ilegalidade da exigência de profissional farmacêutico em posto/dispensário de medicamentos (artigo 15, da Lei Federal nº 5.991/73).

2. Apelação improvida.

(Apelação Cível nº 0013536-15.2012.4.03.9999/SP, Quarta Turma, Relatora Desembargadora Federal ALDA BASTO, julgado em 13/11/2014, D.E. 02/12/2014)

 

Cabe ressaltar que realmente a matéria sofreu profundas alterações em razão da entrada em vigor da Lei nº 13.021/14. Ocorre, no entanto, que os artigos 9º e 17 da citada lei, que tratavam dos dispensários de medicamentos, foram vetados sob argumento de que as restrições trazidas pela proposta em relação ao tratamento hoje dispensado para o tema na Lei nº 5.991/73 “poderiam colocar em risco a assistência farmacêutica à população de diversas regiões do País, sobretudo nas localidades mais isoladas [...]."

Assim, para as unidades hospitalares em que há apenas dispensário de medicamento, permanece o entendimento da súmula 140 do TFR e do REsp 1.110.906/SP (repetitivo tema 483), não podendo o conselho regular o funcionamento.

Dessa forma, no caso concreto, há de ser mantida a r. sentença.

Por derradeiro, a fixação dos honorários advocatícios observou o disposto no art. 85 do NCPC, e levando-se em conta não provimento do recurso de apelação, de rigor a aplicação da regra do § 11 do artigo 85 do CPC/2015, pelo que determino, a título de sucumbência recursal, a majoração dos honorários advocatícios em 1%, sobre o valor da causa, nos termos do art. 85, § 3º, I.

Ante o exposto, nego provimento à apelação.

É o voto.

 

 

 

 

 

 

 

 


APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5004315-31.2018.4.03.6112

RELATOR: Gab. 13 - DES. FED. MONICA NOBRE

APELANTE: CONSELHO REGIONAL DE FARMACIA DO ESTADO DE SAO PAULO

APELADO: MUNICIPIO DE MIRANTE DO PARANAPANEMA

Advogado do(a) APELADO: FAUSTO CAVICHINI INFANTE GUTIERREZ - SP285403-A

DECLARAÇÃO DE VOTO

Adoto, em sua integralidade, o relatório apresentado pela ilustre Desembargadora Federal Relatora Mônica Nobre.

Trata-se de apelação interposta pelo CONSELHO REGIONAL DE FARMÁCIA DO ESTADO DE SÃO PAULO - CRF/SP em face de sentença que acolheu os embargos à execução, nos termos do artigo 487, I do Código de Processo Civil, para o fim de desconstituir o crédito tributário, por entender ser dispensável a manutenção de responsável técnico farmacêutico no dispensário de medicamentos mantidos pelo Embargante. O embargado foi condenado ao pagamento de honorários advocatícios, arbitrados em 10% do valor da causa.

Alega o apelante, em síntese, que por força da Lei nº 13.021/14, é obrigatória a presença de profissional farmacêutico nas farmácias privativas de unidades públicas de saúde, em razão da extinção do conceito de dispensário de medicamentos. Requer a reforma da r. sentença.

A eminente Desembargadora Federal Relatora negou provimento à apelação.

Com a devida vênia, ouso divergir da ilustre Relatora.

A questão versada nos autos envolve a eventual obrigatoriedade de se manter um farmacêutico responsável no dispensário de Medicamentos mencionado nos autos e, consequentemente, a anulação dos autos de infração lavrados pelo Conselho Regional de Farmácia do Estado de São Paulo.

A Lei nº 3.820/60, ao criar os Conselhos Federal e Regional de farmácia, assim dispôs:

 

"Art. 1º. Ficam criados os Conselhos Federal e Regionais de farmácia, dotados de personalidade jurídica de direito público, autonomia administrativa e financeira, destinados a zelar pela fiel observância dos princípios da ética e da disciplina da classe dos que exercem atividades profissionais farmacêuticas no País.

(...)

Art. 10. As atribuições dos Conselhos Regionais são as seguintes:

(...)

c) fiscalizar o exercício da profissão, impedindo e punindo as infrações à lei, bem como enviando às autoridades competentes relatórios documentados sobre os fatos que apurarem e cuja solução não seja de sua alçada."

 

Entende-se dos dispositivos acima, ser atribuição dos Conselhos Regionais de farmácia fiscalizar o exercício profissional dos farmacêuticos e punir eventuais infrações decorrentes de expressa previsão legal.

Outrossim, prevê o art. 24 da Lei nº 3.820/60, com a redação dada pela Lei nº 5.724/71:

"Art. 24. As empresas e estabelecimentos que exploram serviços para os quais são necessárias atividades de profissional farmacêutico deverão provar perante os Conselhos Federal e Regionais que essas atividades são exercidas por profissional habilitado e registrado.

Parágrafo único. Aos infratores deste artigo será aplicada pelo respectivo Conselho Regional a multa de valor igual a 1 (um) salário-mínimo a 3 (três) salários-mínimos regionais, que serão elevados ao dobro em caso de reincidência."

 

Os órgãos responsáveis pela vigilância sanitária exercem tão-somente o controle sanitário do comércio de drogas, medicamentos, insumos farmacêuticos e correlatos, consoante dispõe o art. 1º da Lei nº 5.991/73. Detêm competência para fiscalizar os estabelecimentos farmacêuticos para verificação das condições de licenciamento e funcionamento, restringindo a fiscalização aos aspectos sanitários referentes ao comércio praticado. É o que se extrai da leitura do art. 44 da Lei nº 5.991/73:

"Art. 44. Compete aos órgãos de fiscalização sanitária dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios a fiscalização dos estabelecimentos de que trata esta lei, para a verificação das condições de licenciamento e funcionamento."

Não é o caso dos estabelecimentos hospitalares, os quais não tem por finalidade o comércio de drogas, medicamentos, insumos farmacêuticos e correlatos.

Nestes termos, os dispensários de medicamentos são utilizados para o atendimento em pacientes internados ou atendidos no hospital, segundo prescrições médicas, não se confundindo com drogarias e farmácias, nas quais há manipulação de produtos químicos ou farmacêuticos, para fins das exigências contidas nas normas legais supramencionadas.

A Lei nº 5.991/73 previu a obrigatoriedade da presença de profissional farmacêutico tão-somente nas farmácias e drogarias e não nas unidades hospitalares, nos termos do art. 15, in verbis:

"Art. 15. A farmácia e a drogaria terão obrigatoriamente a assistência de técnico responsável, inscrito no Conselho Regional de farmácia , na forma da lei.

§ 1º. A presença do técnico responsável será obrigatória durante todo o horário de funcionamento do estabelecimento."

 

Ocorre que, atualmente, a Lei nº 13.021/2014, especialmente em seus artigos 3º, 5º e 6º, inciso I, prevê expressamente a necessidade da presença de farmacêutico para dispensário de medicamentos, in verbis:

Art. 3º farmácia é uma unidade de prestação de serviços destinada a prestar assistência farmacêutica, assistência à saúde e orientação sanitária individual e coletiva, na qual se processe a manipulação e/ou dispensação de medicamentos magistrais, oficinais, farmacopeicos ou industrializados, cosméticos, insumos farmacêuticos, produtos farmacêuticos e correlatos.

Parágrafo único. As farmácias serão classificadas segundo sua natureza como:

I - farmácia sem manipulação ou drogaria: estabelecimento de dispensação e comércio de drogas, medicamentos, insumos farmacêuticos e correlatos em suas embalagens originais;

II - farmácia com manipulação: estabelecimento de manipulação de fórmulas magistrais e oficinais, de comércio de drogas, medicamentos, insumos farmacêuticos e correlatos, compreendendo o de dispensação e o de atendimento privativo de unidade hospitalar ou de qualquer outra equivalente de assistência médica.

Art. 5º No âmbito da assistência farmacêutica, as farmácias de qualquer natureza requerem, obrigatoriamente, para seu funcionamento, a responsabilidade e a assistência técnica de farmacêutico habilitado na forma da lei.

Art. 6º Para o funcionamento das farmácias de qualquer natureza, exigem-se a autorização e o licenciamento da autoridade competente, além das seguintes condições:

I - ter a presença de farmacêutico durante todo o horário de funcionamento;

Segundo a Lei nº 13.021/2014, os estabelecimentos de dispensação de medicamentos são considerados: (a) farmácia sem manipulação (drogaria): estabelecimento de dispensação e comércio de drogas, medicamentos, insumos farmacêuticos e correlatos em suas embalagens originais; (b) farmácia com manipulação: estabelecimento de manipulação de fórmulas magistrais e oficinais, de comércio de drogas, medicamentos, insumos farmacêuticos e correlatos, compreendendo o de dispensação e o de atendimento privativo de unidade hospitalar ou de qualquer outra equivalente de assistência médica.

Como é bem de ver, os dispensários de medicamentos da rede pública e também aqueles dos hospitais, passam a ser legalmente considerados como farmácias.

Dispõe o art. 5º, da Lei nº 13.021 /2014 de forma clara, repita-se, que no âmbito da assistência farmacêutica, as farmácias de qualquer natureza requerem, obrigatoriamente, para seu funcionamento, a responsabilidade e a assistência técnica de farmacêutico habilitado na forma da lei.

No caso dos autos, verifica-se que as infrações foram lavradas  posteriormente a vigência da Lei nº 13.021/2014, de 08 de agosto de 2014, restando forçoso reconhecer que foram observados os ditames legais quando das autuações.

Ante o exposto, dou provimento à apelação para reformar a r. sentença para reconhecer a legalidade da cobrança das multas aplicadas, invertendo os ônus da sucumbência.

É o voto.

MARCELO SARAIVA

Desembargador Federal

 

 


E M E N T A

 

APELAÇÃO. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. CONSELHO REGIONAL DE FARMÁCIA. PRESENÇA DE FARMACÊUTICO. DISPENSÁRIO DE MEDICAMENTOS. FISCALIZAÇÃO. ROL TAXATIVO NO ART. 15 DA LEI N. 5.991/73. ENTENDIMENTO EXTENSIVO ÀS UNIDADES BÁSICAS DE SAÚDE. APELAÇÃO IMPROVIDA.

- O apelado possui um dispensário de medicamentos, no qual não existe manipulação de remédios, onde é realizada a distribuição de medicamentos pela rede pública.

-A obrigatoriedade de profissional técnico farmacêutico nas farmácias e drogarias, encontra-se disciplinada no artigo 15 da Lei nº 5.991/73, que trata do Controle Sanitário do Comércio de Drogas, Medicamentos, Insumos Farmacêuticos e Correlatos, e dá outras Providências. O artigo 4º de referido diploma legal conceitua drogaria, farmácia e dispensário de medicamentos.

- Ausente previsão legal, inviável exigir a permanência de profissional farmacêutico no posto e/ou dispensário de medicamentos.

- A C. Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça pacificou o entendimento, em julgamento submetido à sistemática do art. 543-C do Código de Processo Civil/1973 - REsp nº 1.110.906/SP, de que não é exigível a presença de responsável técnico farmacêutico nos dispensários de medicamentos.

 

-- A matéria sofreu profundas alterações em razão da entrada em vigor da Lei nº 13.021/14. Ocorre, no entanto, que os artigos 9º e 17 da citada lei, que tratavam dos dispensários de medicamentos, foram vetados sob argumento de que as restrições trazidas pela proposta em relação ao tratamento hoje dispensado para o tema na Lei nº 5.991/73 "poderiam colocar em risco a assistência farmacêutica à população de diversas regiões do País, sobretudo nas localidades mais isoladas [...]."

-Assim, para as unidades hospitalares em que há apenas dispensário de medicamento, permanece o entendimento da súmula 140 do TFR e do REsp 1.110.906/SP (repetitivo tema 483), não podendo o conselho apelante regular o funcionamento.

- Apelação improvida.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, A Quarta Turma, por maioria, decidiu negar provimento à apelação, nos termos do voto da Des. Fed. MÔNICA NOBRE (Relatora), com quem votaram o Juiz Fed. Conv. MARCELO GUERRA (em substituição ao Des. Fed. ANDRÉ NABARRETE), o Des. Fed. SOUZA RIBEIRO (convocado nos termos dos artigos 53 e 160 do RITRF3) e a Juíza Federal LEILA PAIVA (convocada nos termos dos artigos 53 e 260 do RITRF3), vencido o Des. Fed. MARCELO SARAIVA, que dava provimento à apelação para reformar a r. sentença para reconhecer a legalidade da cobrança das multas aplicadas, invertendo os ônus da sucumbência. Fará declaração de voto o Des. Fed. MARCELO SARAIVA., nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.