APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0003032-37.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 34 - DES. FED. BAPTISTA PEREIRA
APELANTE: MARIA DE LOURDES VICENTE DE MORAIS
Advogado do(a) APELANTE: UENDER CASSIO DE LIMA - SP223587-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0003032-37.2018.4.03.9999 RELATOR: Gab. 34 - DES. FED. BAPTISTA PEREIRA APELANTE: MARIA DE LOURDES VICENTE DE MORAIS Advogado do(a) APELANTE: UENDER CASSIO DE LIMA - SP223587-N APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de remessa oficial, havida como submetida, e apelação interposta contra sentença proferida em ação de conhecimento, em que se busca a concessão de aposentadoria por invalidez, ou auxílio doença, desde a data do requerimento administrativo. O MM. Juízo a quo julgou improcedente o pedido, ao fundamento do não cumprimento da carência necessária ao benefício, condenando a parte autora ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios de 10% sobre o valor da causa, ressalvada a suspensão da exigibilidade, ante a gratuidade judiciária concedida. Em suas razões recursais, pleiteia a autora a reforma da r. sentença, sob a alegação de que faz jus ao benefício, pois, embora sua refiliação ao RGPS tenha ocorrido em maio de 2011, e o exame pericial tenha indicado o início da incapacidade no mês de agosto daquele ano, época em que ainda não havia preenchido a carência exigida, por se tratar de doença progressiva, o início da incapacidade deve ser fixado na data do exame pericial, em 2015, momento em que já havia preenchido todos os requisitos necessários. Sem contrarrazões, subiram os autos. É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0003032-37.2018.4.03.9999 RELATOR: Gab. 34 - DES. FED. BAPTISTA PEREIRA APELANTE: MARIA DE LOURDES VICENTE DE MORAIS Advogado do(a) APELANTE: UENDER CASSIO DE LIMA - SP223587-N APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O benefício de auxílio doença está previsto no Art. 59, da Lei nº 8.213/91, que dispõe: "Art. 59. O auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o período de carência exigido nesta Lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos". Portanto, é benefício devido ao segurado incapacitado por moléstia que inviabilize temporariamente o exercício de sua profissão. Por sua vez, a aposentadoria por invalidez expressa no Art. 42, da mesma lei, in verbis: "A aposentadoria por invalidez, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência exigida, será devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nesta condição". Como se vê dos dados constantes do CNIS, a autora efetuou recolhimentos como segurada empregada, por períodos descontínuos, no intervalo de junho/1993 a junho/1996; tornou a contribuir, como empregada doméstica, nos períodos de março/2003 a maio/2005, maio/2010 a julho/2010 e maio/2011 a janeiro/2012; recolheu como contribuinte facultativo no intervalo de setembro/2008 a março/2009 e, posteriormente voltando a contribuir para a Previdência Social, nessa mesma condição (contribuinte facultativo), nas competências de 07/2014 a 02/2015, quando readquiriu a condição de segurada e o direito de computar as contribuições anteriores para efeito de carência, pelo cumprimento de 1/3 das contribuições exigidas para a concessão do benefício, nos termos do Parágrafo único do Art. 24, da Lei nº 8.213/91, na redação então vigente (atualmente Art. 27-A). Dispõe a legislação quanto ao contribuinte facultativo: Lei nº 8.213/91: "Art. 13. É segurado facultativo o maior de 14 (quatorze) anos que se filiar ao Regime Geral de Previdência Social, mediante contribuição, desde que não incluído nas disposições do art. 11." Decreto nº 3.048/99: "Art. 11. É segurado facultativo o maior de dezesseis anos de idade que se filiar ao Regime Geral de Previdência Social, mediante contribuição, na forma do art. 199, desde que não esteja exercendo atividade remunerada que o enquadre como segurado obrigatório da previdência social. ... Art. 44. A aposentadoria por invalidez consiste numa renda mensal calculada na forma do inciso II do caput do art. 39 e será devida a contar do dia imediato ao da cessação do auxílio-doença, ressalvado o disposto no § 1º. § 1º Concluindo a perícia médica inicial pela existência de incapacidade total e definitiva para o trabalho, a aposentadoria por invalidez será devida: I - ... II - ao segurado empregado doméstico, contribuinte individual, trabalhador avulso, especial ou facultativo, a contar da data do início da incapacidade ou da data da entrada do requerimento, se entre essas datas decorrerem mais de trinta dias. ... Art. 71. O auxílio-doença será devido ao segurado que, após cumprida, quando for o caso, a carência exigida, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de quinze dias consecutivos. ... § 2º Será devido auxílio-doença, independentemente de carência, aos segurados obrigatório e facultativo, quando sofrerem acidente de qualquer natureza." Quanto à capacidade laborativa, o laudo, referente ao exame realizado em 15.04.2015, atesta que a periciada é portadora de artrose de coluna lombar com hérnia de disco, epicondilite e tendinopatia de supra espinhal, apresentando incapacidade parcial e permanente a partir de 12.08.2011 (fls. 59/64). Não se pode afirmar que somente a incapacidade total justifica a concessão do benefício de auxílio doença, vez que é predominante o entendimento segundo o qual, verificando-se que a incapacidade parcial está acompanhada de elementos concretos que indiquem a necessidade de reabilitação do segurado, é de rigor a concessão do auxílio doença (STJ, REsp 699.920/SP, Relator Ministro José Arnaldo da Fonseca, 5ª Turma, julgado em 17/02/2005, DJ 14/03/2005, p. 423). Com o escopo de pacificar a matéria no âmbito dos órgãos jurídicos da União Federal, a Advocacia-Geral da União editou a Súmula 25, cujo teor é o seguinte: "Será concedido auxílio-doença ao segurado considerado temporariamente incapaz para o trabalho ou sua atividade habitual, de forma total ou parcial, atendidos os demais requisitos legais, entendendo-se por incapacidade parcial aquela que permita sua reabilitação para outras atividades laborais." (DOU, Seção I, de 10/06, 11/06 e 12/06/08). O pleito administrativo do benefício de auxílio doença, formulado em 11.04.2013, foi indeferido, conforme comunicação de decisão, às fls. 16. A presente ação foi ajuizada em 02.07.2013. Consoante os documentos médicos de fls. 21 e 25, a autora, desde agosto/2011, estava em tratamento e sem condições para o trabalho. Contudo, após aquela data, continuou a exercer suas atividades laborais (empregada doméstica) até 31.01.2012, momento a partir do qual passou a efetuar contribuições como segurado facultativo. O primeiro registro de consulta ortopédica é datado de 18.08.2011 (fl. 25). De outra parte, o atestado médico de 21, emitido em 10.11.2011, indica a incapacidade temporária da autora, por 10 (dez) dias, em razão do acometimento das enfermidades identificadas pelo CID M 75.1 (síndrome do manguito rotador), e pelo CID M 77.0 (epicondilite medial); o de fls. 20, emitido em 01.09.2012, indica a incapacidade temporária por 01 (um) dia, em razão da enfermidade identificada pelo CID M 54.5 (dor lombar baixa); por sua vez, o de fl. 19, emitido em 07.03.2013, permite a mesma conclusão sobre a incapacidade temporária, por 07 (sete) dias, devido à enfermidade a que se refere o CID M 77.9 (entesopatia não identificada). Finalmente, em complemento dos documentos expedidos pelos médicos ortopedistas que acompanhavam a autora, o relatório emitido por sua fisioterapeuta, em 09.05.2013, indica que, àquela época, a paciente mantinha-se em tratamento fisioterápico devido ao acometimento de tendinopatia da supra espinhal bilateral e lombalgia, apresentando dor crônica e intensificação do quadro álgico ao esforço físico (fl. 17). Malgrado a afirmação pericial de que a incapacidade teve início em 12.08.2011, o cotejo entre os documentos acima relatados revela que a autora foi acometida pelos sintomas das enfermidades ortopédicas no ano de 2011, todavia, a incapacitação sobreveio somente em momento posterior, após a última contribuição como empregada doméstica, tornando-se definitiva em decorrência do agravamento do quadro, tendo sido constatada somente quando do exame pericial, realizado em abril/2015. Desse modo, não há que se falar em incapacidade preexistente ou no não preenchimento da carência exigida, pois sua refiliação ao RGPS ocorreu em julho/2014 e a incapacitação em abril/2015, sendo o caso de aplicação da ressalva prevista no § 2º, do Art. 42, da Lei nº 8.213/1991. No mesmo sentido é o entendimento do e. STJ: "PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. PREQUESTIONAMENTO. PERDA DA QUALIDADE DE SEGURADO. INCAPACITAÇÃO TOTAL E PERMANENTE. REEXAME DE PROVA. DOENÇA PREEXISTENTE. AGRAVAMENTO. ART. 42, § 2º, DA LEI Nº 8.213/91. - Matéria referente à exigência de comprovação de um período mínimo de carência não apreciada na instância a quo, sequer foram opostos embargos de declaração para provocar a manifestação do colegiado sobre o tema. Ausente, portanto, o indispensável prequestionamento da questão federal suscitada no apelo raro. - Não implica na perda de direito ao benefício de aposentadoria por invalidez no caso de segurado que deixa de contribuir para previdência por estar incapacitado para o labor. - A análise da alegação de que não restou comprovada a incapacitação total e permanente do beneficiário demandaria reexame de prova, o que é vedado em sede especial por força do contido na Súmula 07/STJ. - A doença preexistente à filiação do segurado à previdência social conferirá direito à aposentadoria por invalidez quando a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento dessa doença. - Recurso especial não conhecido. (REsp 217727/SP, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 10/08/1999, DJ 06/09/1999, p. 131)". Analisando o conjunto probatório e considerando o parecer do sr. Perito judicial, é de se reconhecer o direito da autora à percepção do benefício de auxílio doença, não estando configurados os requisitos legais à concessão da aposentadoria por invalidez, que exige que o segurado seja considerado incapaz total e permanentemente para o exercício de sua atividade habitual. Tratando-se de contribuinte facultativo, que não exerce atividade laborativa, não há que se falar em falta de capacitação ou de oportunidades de reabilitação para a assunção de outras atividades ou de ausência de condições de reingressar no mercado de trabalho. O termo inicial do benefício deve ser fixado a partir da data da realização do exame pericial (15.04.2015), em observância dos limites do pedido deduzido em sede recursal, sendo certo que o INSS tem o poder/dever de proceder à revisão de benefícios por incapacidade, ainda que concedidos judicialmente, através de perícia médica periódica, para aferir a continuidade ou não do quadro incapacitante, visando a manutenção, cancelamento do benefício ou a reabilitação do segurado para o exercício de outro trabalho (Art. 71, da Lei nº 8.212/91, Art. 101, da Lei nº 8.213/91). Destarte, é de se reformar a r. sentença, devendo o réu conceder à autora o benefício de auxílio doença a partir de 15.04.2015, e pagar as prestações vencidas, corrigidas monetariamente e acrescidas de juros de mora. A correção monetária, que incide sobre as prestações em atraso desde as respectivas competências, e os juros de mora devem ser aplicados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, observando-se a aplicação do IPCA-E conforme decisão do e. STF, em regime de julgamento de recursos repetitivos no RE 870947, e o decidido também por aquela Corte quando do julgamento da questão de ordem nas ADIs 4357 e 4425. Os juros de mora incidirão até a data da expedição do precatório/RPV, conforme decidido em 19.04.2017 pelo Pleno do e. Supremo Tribunal Federal quando do julgamento do RE 579431, com repercussão geral reconhecida. A partir de então deve ser observada a Súmula Vinculante nº 17. À hipótese dos autos não se aplicam os precedentes do e. Superior Tribunal de Justiça e desta Corte, no sentido de não ser possível a percepção cumulativa do benefício por incapacidade com o salário percebido, uma vez que os recolhimentos ao RGPS foram efetuados na qualidade de segurado facultativo que não exerce atividade remunerada. Os honorários advocatícios devem observar as disposições contidas no inciso II, do § 4º, do Art. 85, do CPC, e a Súmula 111, do e. STJ. A autarquia previdenciária está isenta das custas e emolumentos, nos termos do Art. 4º, I, da Lei 9.289/96, do Art. 24-A da Lei 9.028/95, com a redação dada pelo Art. 3º da MP 2.180-35/01, e do Art. 8º, § 1º, da Lei 8.620/93. Ante ao exposto, dou parcial provimento à apelação. É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO DOENÇA. CONTRIBUINTE FACULTATIVO. INCAPACIDADE PARCIAL E PERMANENTE.
1. O benefício de auxílio doença é devido ao segurado incapacitado por moléstia que inviabilize temporariamente o exercício de sua profissão. Já a aposentadoria por invalidez exige que o segurado seja considerado incapaz e insusceptível de convalescença para o exercício de ofício que lhe garanta a subsistência.
2.
Laudo pericial conclusivo pela existência de incapacidade parcial e permanente.
3. Nos termos da Súmula 25/AGU, "Será concedido auxílio doença ao segurado considerado temporariamente incapaz para o trabalho ou sua atividade habitual, de forma total ou parcial, atendidos os demais requisitos legais, entendendo-se por incapacidade parcial aquela que permita sua reabilitação para outras atividades laborais.".
4. Preenchidos os requisitos, é de se reconhecer o direito da autora à percepção do benefício de auxílio doença.
5. A correção monetária, que incide sobre as prestações em atraso desde as respectivas competências, e os juros de mora devem ser aplicados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal e, no que couber, observando-se o decidido pelo e. Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento da questão de ordem nas ADIs 4357 e 4425.
6. Os juros de mora incidirão até a data da expedição do precatório/RPV, conforme decidido em 19.04.2017 pelo Pleno do e. Supremo Tribunal Federal quando do julgamento do RE 579431, com repercussão geral reconhecida. A partir de então deve ser observada a Súmula Vinculante nº 17.
7. Os honorários advocatícios devem observar as disposições contidas no inciso II, do § 4º, do Art. 85, do CPC, e a Súmula 111, do e. STJ.
8. A autarquia previdenciária está isenta das custas e emolumentos, nos termos do Art. 4º, I, da Lei 9.289/96, do Art. 24-A da Lei 9.028/95, com a redação dada pelo Art. 3º da MP 2.180-35/01, e do Art. 8º, § 1º, da Lei 8.620/93.
9. Apelação provida em parte.