APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000378-07.2018.4.03.6114
RELATOR: Gab. 19 - DES. FED. FÁBIO PRIETO
APELANTE: ESTELA EMI TAKASE, SOFIA TAKASE DE OLIVEIRA, CONSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO DE SAO PAULO
Advogado do(a) APELANTE: MARINA ROCHA SILVA - SP150167-A
Advogado do(a) APELANTE: MARINA ROCHA SILVA - SP150167-A
Advogados do(a) APELANTE: ADRIANA TEIXEIRA DA TRINDADE FERREIRA - SP152714-A, TOMAS TENSHIN SATAKA BUGARIN - SP332339-A, OLGA CODORNIZ CAMPELLO CARNEIRO - SP86795-A
APELADO: CONSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO DE SAO PAULO, ESTELA EMI TAKASE, SOFIA TAKASE DE OLIVEIRA
Advogados do(a) APELADO: ADRIANA TEIXEIRA DA TRINDADE FERREIRA - SP152714-A, TOMAS TENSHIN SATAKA BUGARIN - SP332339-A, OLGA CODORNIZ CAMPELLO CARNEIRO - SP86795-A
Advogado do(a) APELADO: MARINA ROCHA SILVA - SP150167-A
Advogado do(a) APELADO: MARINA ROCHA SILVA - SP150167-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000378-07.2018.4.03.6114 RELATOR: Gab. 19 - DES. FED. FÁBIO PRIETO APELANTE: ESTELA EMI TAKASE, SOFIA TAKASE DE OLIVEIRA, CONSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO DE SAO PAULO Advogado do(a) APELANTE: MARINA ROCHA SILVA - SP150167-A APELADO: CONSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO DE SAO PAULO, ESTELA EMI TAKASE, SOFIA TAKASE DE OLIVEIRA Advogado do(a) APELADO: OLGA CODORNIZ CAMPELLO CARNEIRO - SP86795-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O A Senhora Juíza Federal Convocada Leila Paiva: Trata-se de apelações contra r. sentença que julgou procedente o pedido para determinar que o Conselho Regional de Medicina se abstenha de impedir o procedimento de fertilização “in vitro” pela primeira autora (Estela Emi Takase), a partir de óvulos doados pela segunda autora (Sofia Takase de Oliveira), sua irmã, bem como para não aplique qualquer medida ético-disciplinar aos médicos envolvidos no procedimento. O réu foi condenado ao pagamento de custas processuais e honorários advocatícios, no percentual de 10% sobre o valor atualizado da causa (R$ 1.000,00). O Conselho Regional de Medicina, apela para que a r. sentença seja reformada. As autoras, ora apelantes, por sua vez, requerem a majoração da verba honorária. As contrarrazões foram apresentadas. É o relatório. ecperis
Advogado do(a) APELANTE: MARINA ROCHA SILVA - SP150167-A
Advogado do(a) APELANTE: OLGA CODORNIZ CAMPELLO CARNEIRO - SP86795-A
Advogado do(a) APELADO: MARINA ROCHA SILVA - SP150167-A
Advogado do(a) APELADO: MARINA ROCHA SILVA - SP150167-A
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000378-07.2018.4.03.6114 RELATOR: Gab. 19 - DES. FED. FÁBIO PRIETO APELANTE: ESTELA EMI TAKASE, SOFIA TAKASE DE OLIVEIRA, CONSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO DE SAO PAULO Advogado do(a) APELANTE: MARINA ROCHA SILVA - SP150167-A APELADO: CONSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO DE SAO PAULO, ESTELA EMI TAKASE, SOFIA TAKASE DE OLIVEIRA Advogado do(a) APELADO: OLGA CODORNIZ CAMPELLO CARNEIRO - SP86795-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O A Senhora Juíza Federal Convocada Leila Paiva: A Constituição Federal: Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. (...) § 7º Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privadas. (...)". O Código Civil: "Art. 21. A vida privada da pessoa natural é inviolável, e o juiz, a requerimento do interessado, adotará as providências necessárias para impedir ou fazer cessar ato contrário a esta norma". "Art. 1.565. Pelo casamento, homem e mulher assumem mutuamente a condição de consortes, companheiros e responsáveis pelos encargos da família. (...) § 2º O planejamento familiar é de livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e financeiros para o exercício desse direito, vedado qualquer tipo de coerção por parte de instituições privadas ou públicas". A Lei Federal nº 9.263/96: "(...) Art. 2º Para fins desta Lei, entende-se planejamento familiar como o conjunto de ações de regulação da fecundidade que garanta direitos iguais de constituição, limitação ou aumento da prole pela mulher, pelo homem ou pelo casal. (...) Art. 9º Para o exercício do direito ao planejamento familiar, serão oferecidos todos os métodos e técnicas de concepção e contracepção cientificamente aceitos e que não coloquem em risco a vida e a saúde das pessoas, garantida a liberdade de opção. (...)". A Resolução nº 2.168/2017, do Conselho Federal de Medicina: "IV - DOAÇÃO DE GAMETAS OU EMBRIÕES (...) 2 - Os doadores não devem conhecer a identidade dos receptores e vice-versa. (...) 4 - Será mantido, obrigatoriamente, o sigilo sobre a identidade dos doadores de gametas e embriões, bem como dos receptores. Em situações especiais, informações sobre os doadores, por motivação médica, podem ser fornecidas exclusivamente para médicos, resguardando-se a identidade civil do(a) doador(a). Dentro do possível, deverá garantir que o(a) doador(a) tenha a maior semelhança fenotípica e a máxima possibilidade de compatibilidade com a receptora. (...)". No caso concreto, Estela Emi Takase pretende utilizar óvulos doados por sua irmã, Sofia Takase de Oliveira, com a concordância desta, para a realização de fertilização in vitro, sem que haja a aplicação de qualquer punição ao médico que realizar o procedimento. A garantia de sigilo, prevista na Resolução 2.121/2.015, do Conselho Federal de Medicina, objetiva proteger o doador e evitar-lhe futuras consequências pessoais, familiares ou jurídicas. Não há vedação legal ao levantamento da regra do anonimato na doação de óvulos e, no presente feito, ambas as autoras concordam com o afastamento de tal proteção. Deve prevalecer, portanto, a solução que melhor dê cumprimento ao princípio da liberdade de planejamento familiar (artigo 226 da Constituição Federal). Nestes termos, é de rigor a manutenção r. sentença que deferiu a fertilização e afastou a aplicação de punição aos médicos envolvidos no procedimento. A jurisprudência: CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. REPRODUÇÃO ASSISTIDA - FERTILIZAÇÃO IN VITRO - ILEGITIMIDADE ATIVA E PASSIVA AD CAUSAM - INOCORRÊNCIA - DOADORA E RECEPTORA DE ÓVULOS - DOAÇÃO ENTRE IRMÃS - REGRA DO ANONIMATO - RESOLUÇÃO/CFM Nº 2121/2015 - INAPLICABILIDADE - PLANEJAMENTO FAMILIAR - SAÚDE - DIREITO FUNDAMENTAL. 1. Legitimidade da receptora de óvulos, seu cônjuge e irmã (possível doadora) para a propositura da presente ação. Evidencia-se a titularidade dos autores para pleitearem o direito debatido, dada a inegável repercussão, em suas esferas jurídicas, da proibição de realização de procedimento de reprodução assistida mediante doação de óvulos por pessoa conhecida, inscrita na Resolução/CFM nº 2013/2013 e repetida pela Resolução/CFM nº 2121/2015, em vigor. 2. Legitimidade passiva ad causam do Conselho Regional de Medicina, considerando sua atribuição fiscalizatória do cumprimento das diretrizes que vinculam os profissionais e entidades da área médica. 3. Causa madura. Afastada a sentença terminativa, está o Tribunal autorizado, em sede de apelação, a proceder ao imediato julgamento do feito sempre que (i) versar a causa sobre questão exclusivamente de direito e (ii) encontrar-se o feito em estado que possibilite seu imediato julgamento (art. 515, § 3º, CPC). 4. A adoção dos procedimentos e técnicas de reprodução assistida encontra guarida nos direitos constitucionais ao planejamento familiar (art. 226, § 7º, CF/88) e à saúde (art. 196, CF/88), bem como no princípio da autonomia privada. 5. Em harmonia com a Constituição, o Código Civil reconhece, no artigo § 2º do art. 1.565, a importância do planejamento familiar, direito cujo exercício deve contar com apoio educacional e financeiro do Estado. 6. Nesse cenário de tutela da aspiração reprodutiva como consequência do direito fundamental à saúde e ao planejamento familiar e, consequentemente, de autorização e facilitação de acesso às técnicas de procriação medicamente assistida, eventuais restrições, para se legitimarem, devem encontrar suporte lógico, científico e jurídico. 7. O direito à reprodução por técnicas de fecundação artificial não possui, por óbvio, caráter absoluto. Contudo, eventuais medidas restritivas de acesso às técnicas de reprodução assistida, ínsito ao exercício de direitos fundamentais de alta envergadura, consoante demonstrado, só se justificam diante do risco de dano efetivo a um bem relevante, análise a ser perpetrada, não raro, em face do caso concreto. 8. No caso dos autos, objetivam os autores autorização para a realização de procedimento de fertilização in vitro mediante utilização de óvulos de doadora conhecida (irmã da autora), afastando-se a proibição do item 2, IV, da Resolução nº 2121/2015, emanada do Conselho Federal de Medicina, que revogou a anterior Resolução/CFM nº 2013/2013, embora mantenha disposição no mesmo sentido. 9. A razão maior da proibição inscrita na Resolução/CFM nº 2121/2015, ao resguardar a identidade de doador(a) e receptor(a), encontra fundamento ético nos riscos de questionamento da filiação biológica da futura criança, desestabilizando as relações familiares e pondo em cheque o bem estar emocional de todos os envolvidos. 10. Os laços consanguíneos existentes entre as irmãs e o fato da possível doadora haver constituído família tornam remota a chance de qualquer disputa em torno da maternidade, caindo por terra, então, diante da análise da situação concreta, a proibição inserta na norma questionada e a cautela representada pela preocupação que moveu o Conselho Federal de Medicina ao erigi-la. 11. Por outro lado, se o sigilo é importante para garantir aos doadores de gametas isenção de responsabilidade em face dos deveres inerentes às relações de filiação, sob esse aspecto também não se mostra consentâneo com o caso concreto, no qual a relação de parentesco verificada entre doadora, casal e futura criança caracteriza vínculo do qual decorrem obrigações preexistentes de cuidado e assistência mútua. 12. A questão posta não se coloca em face da inidoneidade do texto normativo emanado do Conselho Federal de Medicina, mas de sua inaplicabilidade ao caso sub judice, considerando a razão maior de sua existência. 13. Outrossim, as normas que minudenciam regras aplicáveis aos procedimentos marcados pela intervenção humana na procriação artificial, emanadas desse Conselho, ostentam natureza infralegal, veiculando preceitos eminentemente éticos, portanto, desprovidos de caráter sancionatório (exceto o disciplinar), que, em nosso ordenamento jurídico, é inerente às manifestações do Poder Legislativo. 14. Reconhecido o direito à efetivação do procedimento de fertilização in vitro a partir de óvulos doados pela irmã da autora, abstendo-se a autarquia ré de adotar quaisquer medidas ético-disciplinares contra os profissionais envolvidos nessa intervenção, aos quais se reserva o direito de aferir a viabilidade do procedimento mediante oportuna realização dos exames necessários. (TRF 3ª Região, SEXTA TURMA, Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 2073218 - 0007052-98.2013.4.03.6102, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL MAIRAN MAIA, julgado em 12/11/2015, e-DJF3 Judicial 1 DATA:19/11/2015) MANDADO DE SEGURANÇA. CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. CONSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO DE SÃO PAULO. ART. 226, § 7º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. ART. 9º DA LEI Nº 9.236/96. RESOLUÇÃO 2.121/2015. INDICAÇÃO PELOS PAIS DO DOADOR DE MATERIAL GENÉTICO PARA INSEMINAÇÃO ARTIFICIAL. POSSIBILIDADE. APELAÇÃO PROVIDA. 1. As normas éticas objeto da Resolução 2.121/2015 do Conselho Federal de Medicina não ofendem o princípio constitucional da legalidade, uma vez que a autarquia em testilha é competente, à luz do atual sistema constitucional, para editar esse tipo de normatização. 2. No que tange especificamente à matéria em foco (reprodução humana assistida), a questão não pode ser tratada sem atentar à dicção do art. 226, §7º, da Constituição de 1988 que cuida do chamado planejamento familiar. 3. Logo, o que deve ser analisado é se a lei que rege o planejamento familiar impede que, por ato voluntário e consciente, os doadores de gametas conheçam a identidade dos receptores e vice-versa. Com efeito, a resposta é negativa. Repita-se, em nenhum dispositivo da Lei 9.263/96 há menção expressa, ou mesmo indireta, que leve à conclusão de que a pretensão manifestada pelos impetrantes na exordial é proibida. 4. O art. 9º da Lei 9.263/96, ao garantir a liberdade de opção quanto aos métodos e técnicas de concepção e contracepção cientificamente aceitos, desde que não coloquem em risco a vida e a saúde das pessoas, deixa antever exatamente o contrário, sendo certo que nada indica que a utilização dos gametas do irmão do impetrante possa colocar em risco a integridade física da futura mãe, do pai ou mesmo do nascituro. 5. Nessa banda, o anonimato objeto da Resolução 2.121 do Conselho Federal de Medicina visa proteger o doador (ou até a mãe receptora) quando não exista interesse ou vontade em conhecer a origem dos gametas fornecidos. 6. É certo que o pai biológico, no caso o irmão do impetrante varão, não poderá futuramente, para quaisquer fins, postular o reconhecimento da paternidade da criança gerada a partir do seu espermatozoide, nem tampouco a criança poderá fazê-lo em face do pai biológico. 7. Apelação provida. Segurança concedida. (TRF 3ª Região, QUARTA TURMA, Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 365095 - 0021514-95.2015.4.03.6100, Rel. DESEMBARGADORA FEDERAL MARLI FERREIRA, julgado em 15/02/2017, e-DJF3 Judicial 1 DATA:09/03/2017 ) O artigo 85, "caput", do Código de Processo Civil: "A sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor". É o caso concreto: os pedidos foram julgados procedentes. A condenação do réu deve ser mantida no percentual de 10% sobre o valor atribuído à causa, em consideração à elevada importância social da causa e ao zelo profissional dos procuradores, nos termos do artigo 85, § 2º, do Código de Processo Civil Não há desproporcionalidade. Por estes fundamentos, nego provimento às apelações. É o voto. ecperis
Advogado do(a) APELANTE: MARINA ROCHA SILVA - SP150167-A
Advogado do(a) APELANTE: OLGA CODORNIZ CAMPELLO CARNEIRO - SP86795-A
Advogado do(a) APELADO: MARINA ROCHA SILVA - SP150167-A
Advogado do(a) APELADO: MARINA ROCHA SILVA - SP150167-A
E M E N T A
CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO - DOAÇÃO DE ÓVULOS ENTRE IRMÃS - RESOLUÇÃO/CFM Nº 2.121/2.015 - REGRA DO ANONIMATO - INAPLICABILIDADE.
1. A garantia de sigilo, prevista na Resolução 2.121/2.015, do Conselho Federal de Medicina, objetiva proteger o doador e evitar-lhe futuras consequências pessoais, familiares ou jurídicas.
2. Não há vedação legal ao levantamento da regra do anonimato na doação de óvulos e, no presente feito, ambas as autoras, na qualidade de doadora e receptora, concordam com o afastamento de tal proteção.
3. Deve prevalecer, portanto, a solução que melhor dê cumprimento ao princípio da liberdade de planejamento familiar (artigo 226 da Constituição Federal). Precedentes deste Egrégio Tribunal.
4. É de rigor a manutenção da r. sentença que deferiu a fertilização e afastou a aplicação de punição aos médicos envolvidos no procedimento.
5. Apelações desprovidas.