Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000848-88.2016.4.03.6116

RELATOR: Gab. 30 - DES. FED. MARISA SANTOS

APELANTE: AURELINO DE SOUZA LIMA

Advogado do(a) APELANTE: GUILHERME ROUMANOS LOPES DIB - SP291074-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000848-88.2016.4.03.6116

RELATOR: Gab. 30 - DES. FED. MARISA SANTOS

APELANTE: AURELINO DE SOUZA LIMA

Advogado do(a) APELANTE: GUILHERME ROUMANOS LOPES DIB - SP291074-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

OUTROS PARTICIPANTES:

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

Apelação de sentença que julgou improcedente o pedido, com resolução do mérito, na forma do art. 487, I, do CPC. Honorários advocatícios fixados em 10% do valor da causa, observada a concessão da gratuidade da justiça.

Apela o autor, requerendo o provimento da apelação e a consequente procedência do pedido inicial.

Com contrarrazões, vieram os autos.

É o relatório.

 

 

 

 


APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000848-88.2016.4.03.6116

RELATOR: Gab. 30 - DES. FED. MARISA SANTOS

APELANTE: AURELINO DE SOUZA LIMA

Advogado do(a) APELANTE: GUILHERME ROUMANOS LOPES DIB - SP291074-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

V O T O

 

 

 

Na inicial, sustenta o autor:

 

É certo que o autor é aposentado por idade, beneficio n° 156.787.584-7, concedido em 18/03/2015; conforme documentos em anexo. Com efeito, durante o período de 18/04/2005 a 17/13/2015 o autor recebeu o beneficio da amparo social ao idoso, sob o 00 133.513.928-9. Porém, quando o autor fez o protocolo do beneficio do amparo social ao idoso. Este já preenchia todos os requisitos necessários para concessão do beneficio de aposentadoria por idade. Ou seja, o INSS concedeu um beneficio muito pior, sendo este o amparo social ao idoso. Quando poderia ter concedido o beneficio de aposentadoria por idade. Pior do que isso, em 04/09/2014, o autor recebeu do INSS, o oficio 000102/2014, onde a Autarquia Federal Ré, notifica o autor a devolver a importância de R$ 40.706,43, pelo pagamento equivocado do beneficio n° 133.513.928-9. Em primeiro, os valores recebidos sob o beneficio de amparo social ao idoso de 0 133.513.928-9, não pode ser devolvido. Pois, a priori, o pagamento não foi indevido, visto que em: 14/04/2005, autor preenchia todos os requisitos para a concessão do beneficio amparo social ao idoso. Além disso, o pagamento, de fato, evidencia a ocorrência pública e notória do dano moral. Isto porque, quando o autor foi protocolar o seu beneficio em 18/04/2005 já contava com mais de 15 anos de contribuição e 65 anos de idade. De modo que deveria ter sido aposentado por idade e não ter recebido o beneficio de amparo social ao idoso.

 

A sentença é explícita:

 

Trata-se de ação proposta por AURELINO DE SOUZA LIMA em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL, pleiteando a cessação de consignação atualmente ativa em seu benefício previdenciário de aposentadoria por idade (NB 156.787.584-7), diante da apuração de irregularidade no recebimento de amparo social ao idoso (NB 133.513.928-9) no período de 18/04/2005 a 17/03/2015.

O autor afirma que no ano de 2005, quando já completava 65 (sessenta e cinco) anos de idade, compareceu à agência do INSS e requereu benefício previdenciário, sendo-lhe concedido o amparo social ao idoso, sob o n° 133.513.928-9, quando já preenchia todos os requisitos necessários à concessão de Aposentadoria por idade. Desde então, teria recebido o beneficio assistencial ao idoso no período de 18/04/2005 até 17/03/2015. Sustenta, outrossim, ter sido notificado em 04/09/2014 pela Autarquia ré de que deveria restituir a importância de R$ 40.706.43 (quarenta mil, setecentos e seis reais e quarenta e três centavos) aos cofres da Previdência Social, em virtude da revisão do benefício previdenciário supracitado onde fora constatado erro na concessão.

Entende ser indevida a cobrança por se tratar de erro da autarquia previdenciária e por ter recebido o benefício de boa-fé. Alega, ainda, a ocorrência de danos morais e requer a condenação do requerido ao pagamento da importância de R$ 50.000,00 a esse título.

...

No presente caso, consoante os documentos de fls. 16/18, o INSS implementou o benefício de Amparo Social à Pessoa Idosa em 18/04/2005. Naquela ocasião, o segurado declarou estar desempregado. Ocorre que, a Autarquia Previdenciária, em procedimento interno de controle de benefícios, ao efetuar a revisão, identificou irregularidade no pagamento. Constatou que o autor prestou serviços na empresa Mercado Nossa Senhora da Juta Ltda ME, como empregado, desde 01/03/2007 a 31/07/2014, situação que conflita com o disposto no art. 20, §3° da Lei n° 8.742/2003, já que teria renda superior a 1/4 do salário mínimo. E mais: ao que se vê, oportunizado o contraditório na via administrativa, o segurado confirmou ter sido sócio de empreendimento comercial, fato este também confirmado pelas informações do CNIS. Também chegou a ser comprovado que ele era proprietário de um veículo (motocicleta), conforme se vê do documento de f. 129.

...

Assim, concedido o benefício de Amparo Social ao Idoso e, posteriormente, havendo a sua revisão com a constatação de irregularidades na sua concessão (renda superior à ¼ do salário mínimo), é possível a cobrança dos valores recebidos indevidamente. Logo, tenho que a restituição é devida desde a data de 01/0312007. E, por decorrência lógica, não há que se falar em dano moral. Contudo, nos art. 115, VI, da Lei 8.213/1991 e o ad. 154, II, § 30 do Decreto 3.048/1999 os valores pagos indevidamente deverão ser descontados, respeitado o limite máximo de 30% sobre o benefício do segurado.

 

Conforme o parecer do Ministério Público Federal:

 

In casu, embora o apelante alegue ter recebido o BPC/LOAS de boa-fé, supondo tratar-se de aposentadoria por idade, tal argumento conflita com a prova carreada aos autos, já que, através da cópia do requerimento administrativo (fis. 16/18), verifica-se que ele formulou pedido para a concessão do benefício assistencial, tendo informado inclusive, naquela oportunidade, encontrar-se desempregado. De outro lado, consoante observa-se do extrato do CNIS carreado aos autos (fis. 143/144), durante parcela considerável do tempo em que percebeu o amparo social - a saber, de 01/03/2007 até 31/07/2014 -, ele voltou a auferir renda própria, figurando como sócio da microempresa Mercado Nossa Senhora da Judá Ltda.-ME. Ora, o só fato do recorrente ter continuado a receber o benefício assistencial apesar da alteração de sua condição social, tendo deixado de informar a autarquia previdenciária a respeito, é suficiente para afastar a sua boa -fé quanto aos valores percebidos durante o período de 01/03/2007 até 31/07/2014, em que constava como sócio da microempresa Mercado Nossa Senhora da Judá Ltda.-ME. Devida, portanto, a repetibilidade das quantias recebidas, nos moldes previstos pelo art. 115, inciso Il da Lei n°8.213/91 e pelo art. 154, inciso II e §2° do Decreto n°3.048/99.

...

Por fim, diante da adequação jurídica da devolução dos valores, inviável falar-se em caracterização de dano moral. Irretocável, portanto, a r. sentença.

 

 

Instaurado o processo administrativo de revisão, o autor foi regularmente convocado para o contraditório, onde confirmou a mudança de sua situação econômica, o que acarretaria  a suspensão do benefício assistencial.

Não há que se falar em decadência do direito do INSS em reaver os valores pagos de forma indevida.

Em suas relações com os segurados ou beneficiários, o INSS pratica atos administrativos subordinados à lei, os quais estão sempre sujeitos à revisão, como manifestação do poder/dever de reexame com vistas à proteção do interesse público, no qual se enquadra a Previdência Social.

Nesse sentido, o disposto no art. 69 da Lei nº 8.212, de 24.07.1991, na redação que lhe foi atribuída pela Lei nº 9.528, de 10.12.1997:

 

Art. 69. O Ministério da Previdência e Assistência Social e o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS manterão programa permanente de revisão da concessão e da manutenção dos benefícios da Previdência Social, a fim de apurar irregularidades e falhas existentes.

§ 1º Havendo indício de irregularidade na concessão ou na manutenção de benefício, a Previdência Social notificará o beneficiário para apresentar defesa, provas ou documentos de que dispuser, no prazo de trinta dias.

§ 2º A notificação a que se refere o parágrafo anterior far-se-á por via postal com aviso de recebimento e, não comparecendo o beneficiário nem apresentando defesa, será suspenso o benefício, com notificação ao beneficiário por edital resumido publicado uma vez em jornal de circulação na localidade.

§ 3º Decorrido o prazo concedido pela notificação postal ou pelo edital, sem que tenha havido resposta, ou caso seja considerada pela Previdência Social como insuficiente ou improcedente a defesa apresentada, o benefício será cancelado, dando-se conhecimento da decisão ao beneficiário.

 

A amparar tal entendimento, a jurisprudência de há muito firmada pelo STF e cristalizada na Súmula nº 473:

 

A Administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial.

 

É bem verdade que, conforme explicita, inclusive, o enunciado transcrito, a revisão do ato administrativo deve se pautar pelo respeito às garantias constitucionais que protegem o cidadão dos atos estatais, notadamente o devido processo legal, o contraditório e a ampla defesa.

Nesse sentido:

 

RECURSO ESPECIAL. SUSPENSÃO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. IMPRESCINDIBILIDADE DE PROCESSO ADMINISTRATIVO ONDE SEJAM GARANTIDAS A AMPLA DEFESA E O CONTRADITÓRIO.

Para a suspensão do benefício previdenciário, sob o qual existe suspeita de fraude, é indispensável o prévio processo administrativo, onde sejam garantidos, ao interessado, a ampla defesa e o contraditório."

Recurso desprovido.

 (REsp nº 477.555 - RJ, 5ª T., Rel. Min. José Arnaldo da Fonseca, DJU de 24.3.2003).

 

Não foi por outra razão que, editada a Lei nº 9.784, de 29-1-1999, que "Regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal", inscreveu-se, em seu art. 2º, norma de proteção ao administrado:

 

Art. 2º. A Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência.

Parágrafo único. Nos processos administrativos serão observados, entre outros, os critérios de:

I - atuação conforme a lei e o Direito;

II - atendimento a fins de interesse geral, vedada a renúncia total ou parcial de poderes ou competências, salvo autorização em lei;

III - objetividade no atendimento do interesse público, vedada a promoção pessoal de agentes ou autoridades;

IV - atuação segundo padrões éticos de probidade, decoro e boa-fé;

V - divulgação oficial dos atos administrativos, ressalvadas as hipóteses de sigilo previstas na Constituição;

VI - adequação entre meios e fins, vedada a imposição de obrigações, restrições e sanções em medida superior àquelas estritamente necessárias ao atendimento do interesse público;

VII - indicação dos pressupostos de fato e de direito que determinarem a decisão;

VIII - observância das formalidades essenciais à garantia dos direitos dos administrados.

IX - adoção de formas simples, suficientes para propiciar adequado grau de certeza, segurança e respeito aos direitos dos administrados;

X - garantia dos direitos à comunicação, à apresentação de alegações finais, à produção de provas e à interposição de recursos, nos processos de que possam resultar sanções e nas situações de litígio;

XI - proibição de cobrança de despesas processuais, ressalvadas as previstas em lei;

XII - impulsão, de ofício, do processo administrativo, sem prejuízo da atuação dos interessados;

XIII - interpretação da norma administrativa da forma que melhor garanta o atendimento do fim público a que se dirige, vedada aplicação retroativa de nova interpretação."

 

No caso, fundamental sabermos se efetivamente foram obedecidos tais princípios, notadamente, o devido processo legal, o contraditório e a ampla defesa.

Os elementos coligidos aos autos indicam que a resposta é positiva.

A confissão do autor de mudança de condição econômica impeditiva de recebimento do benefício assistencial afasta a boa-fé de seu procedimento.

Da narrativa da tramitação do processo em referência, é de se concluir por sua lisura.

Evidentemente que o autor não poderia ter recebido benefício a que não mais tinha direito, por ausência dos pressupostos que ensejaram sua concessão, em 2005.

Não há que se falar em boa-fé. A uma, porque não se coaduna com o recebimento de valores pagos indevidamente em decorrência de mudança de situação econômica. A duas, porque o autor foi beneficiário direto da irregularidade descoberta no decorrer do procedimento administrativo, usufruindo do enriquecimento sem causa, mês a mês, ocorrido durante o recebimento indevido do benefício em questão.

Em suma, apurada irregularidade no pagamento do benefício, a devolução das parcelas recebidas indevidamente é imperativo lógico e jurídico, devendo a sentença de improcedência ser mantida.

NEGO PROVIMENTO à apelação.

É o voto.

 

 



AÇÃO DE CESSAÇÃO DE DESCONTOS E DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. PAGAMENTO INDEVIDO. CESSADAS AS CONDIÇÕES  DE RECEBIMENTO DE BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. AUSÊNCIA DE BOA-FÉ. PROCESSO ADMINISTRATIVO REGULAR. NECESSIDADE DE DEVOLUÇÃO. SENTENÇA MANTIDA.

- É princípio do Direito Administrativo que a Administração deve rever seus próprios atos quando eivados de ilegalidade, reforçado pelas Súmulas 346 e 473 do STF.

- Em suas relações com os segurados ou beneficiários, o INSS pratica atos administrativos subordinados à lei, os quais estão sempre sujeitos à revisão, como manifestação do poder/dever de reexame com vistas à proteção do interesse público, no qual se enquadra a Previdência Social.

- A revisão do ato administrativo deve se pautar pelo respeito às garantias constitucionais que protegem o cidadão dos atos estatais, notadamente o devido processo legal, o contraditório e a ampla defesa.

- A confissão do autor de mudança de condição econômica impeditiva de recebimento do benefício assistencial afasta a boa-fé de seu procedimento.

Da narrativa da tramitação do processo em referência, é de se concluir por sua lisura. Evidentemente que o autor não poderia ter recebido benefício previdenciário a que não mais tinha direito, pela ausência dos pressupostos que ensejaram sua concessão, em 2005. Da decisão administrativa não cabe mais qualquer recurso naquele âmbito.

- Não há que se falar em boa-fé. A uma, porque não se coaduna com o recebimento de valores pagos indevidamente em decorrência de mudança de situação econômica. A duas, porque o autor foi beneficiário direto da irregularidade descoberta no decorrer do procedimento administrativo, usufruindo do enriquecimento sem causa, mês a mês, ocorrido durante o recebimento indevido do benefício em questão.

- Apurada irregularidade no pagamento do benefício, a devolução das parcelas recebidas indevidamente é imperativo lógico e jurídico, devendo a sentença de improcedência ser mantida.

- Apelação improvida.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por unanimidade, decidiu negar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.