Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO (1728) Nº 0044736-93.1995.4.03.6100

RELATOR: Gab. 01 - DES. FED. VALDECI DOS SANTOS

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

Advogado do(a) APELANTE: ANDREI HENRIQUE TUONO NERY - SP312583

APELADO: MUNICIPIO DE SAO PAULO

Advogado do(a) APELADO: REGINA MARTINS LOPES - SP70939

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO (1728) Nº 0044736-93.1995.4.03.6100

RELATOR: Gab. 01 - DES. FED. VALDECI DOS SANTOS

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

Advogado do(a) APELANTE: ANDREI HENRIQUE TUONO NERY - SP312583

APELADO: MUNICIPIO DE SAO PAULO

Advogado do(a) APELADO: REGINA MARTINS LOPES - SP70939

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

 

 

O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL VALDECI DOS SANTOS:

Trata-se de remessa oficial e de recurso de apelação interposto pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS contra a sentença que julgou improcedente o pedido de indenização por desapropriação indireta, nos termos do artigo 269, IV, do CPC/1973, sob o fundamento de que ocorreu a prescrição do direito de ação da autarquia.

A demanda foi ajuizada pelo INSS em face do Município de São Paulo, visando à fixação de indenização em razão do apossamento administrativo (desapropriação indireta) de um terreno em formato triangular, registrado no 5º Cartório de Registro de Imóveis da Capital sob o nº 19.915 e situado no setor 07, Quadra 89, com frente para a Avenida Ipiranga, Rua Araújo e Rua Major Sertório, Centro, no município de São Paulo/SP. Alega o autor que o réu ocupa o referido imóvel desde 1969, tendo construído uma praça no local, sem o pagamento de qualquer indenização.

Devidamente citado, o Município de São Paulo ofertou Contestação (fls. 19/23), alegando, preliminarmente, a ausência de prova do domínio do imóvel pelo autor. No mérito, sustentou a ocorrência da prescrição, uma vez que decorreram mais de 20 anos entre a ocupação e o ajuizamento da ação. Aduz, por fim, que somente os bens de uso especial das autarquias são inalienáveis, imprescritíveis, indisponíveis e insuscetíveis de usucapião. Requereu, assim, a improcedência do pedido.

Houve a realização de perícia técnica, sendo estabelecido pelo perito como valor justa da indenização o montante de R$ 410.000,00, para fev/2008 (laudo pericial nas fls. 150/187).

O INSS concordou integralmente com o laudo (fl. 233/234) e o Município apresentou parecer técnico (fls. 204/225).

Sobreveio sentença (fls. 237/247), que julgou improcedente a demanda, nos termos acima descritos, e condenou o autor ao pagamento de honorários advocatícios no valor de R$ 1.500,00.

Irresignado, o INSS interpôs recurso de apelação (fls. 259/263), alegando que, em observância ao princípio do não-locupletamento, a proibição do enriquecimento ilícito do particular e, mais ainda, do ente público, se sobrepõe à prescritibilidade do direito à indenização. Subsidiariamente, requer o afastamento da condenação ao pagamento de honorários, ou, ao menos, a fixação da sucumbência recíproca, tendo em vista que, embora prescrito, o direito foi reconhecido.

Com contrarrazões, os autos subiram a este E. Tribunal.

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 


APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO (1728) Nº 0044736-93.1995.4.03.6100

RELATOR: Gab. 01 - DES. FED. VALDECI DOS SANTOS

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

Advogado do(a) APELANTE: ANDREI HENRIQUE TUONO NERY - SP312583

APELADO: MUNICIPIO DE SAO PAULO

Advogado do(a) APELADO: REGINA MARTINS LOPES - SP70939

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

 

 

O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL VALDECI DOS SANTOS:

Narra a inicial que o INSS é o legítimo proprietário de um terreno em formato triangular, registrado no 5º Cartório de Registro de Imóveis da Capital sob o nº 19.915 e situado no setor 07, Quadra 89, com frente para a Avenida Ipiranga, Rua Araújo e Rua Major Sertório, Centro, no município de São Paulo/SP, ocupado pelo réu desde 1969, onde foi construída uma praça, denominada Praça Darcy Penteado.

Consta que, desde 1969, ambos mantiveram tratativas de alienação onerosa do imóvel. Todavia, em 1995, o réu informou que sua Secretaria de Administração acolheu a tese de doação tácita em favor da Prefeitura Municipal de São Paulo.

Diante disso, o INSS ajuizou a presente ação, visando ao reconhecimento da desapropriação indireta e, por conseguinte, a fixação da devida indenização, sendo julgada improcedente pelo MD. Juízo a quo, sob o fundamento de que ocorreu a prescrição do direito de ação da autarquia.

Em suas razões recursais, o INSS invoca o princípio do não-locupletamento, alegando que a proibição do enriquecimento ilícito do particular e, mais ainda, do ente público, se sobrepõe à prescritibilidade do direito à indenização. Subsidiariamente, requer o afastamento da condenação ao pagamento de honorários, ou, ao menos, a fixação da sucumbência recíproca, tendo em vista que, embora prescrito, o direito foi reconhecido.

Inicialmente, assevero que são considerados bens públicos aqueles elencados no artigo 99 do CC/2002 (artigo 66 do CC/1916), in verbis:

"Art. 99. São bens públicos:

I - os de uso comum do povo, tais como rios, mares, estradas, ruas e praças;

II - os de uso especial, tais como edifícios ou terrenos destinados a serviço ou estabelecimento da administração federal, estadual, territorial ou municipal, inclusive os de suas autarquias;

III - os dominicais, que constituem o patrimônio das pessoas jurídicas de direito público, como objeto de direito pessoal, ou real, de cada uma dessas entidades.

Parágrafo único. Não dispondo a lei em contrário, consideram-se dominicais os bens pertencentes às pessoas jurídicas de direito público a que se tenha dado estrutura de direito privado."

 

Ademais, de acordo com os artigos 100 e 101 do mesmo diploma legal, os bens uso comum e os de uso especial são inalienáveis, enquanto que os dominicais podem ser alienados, desde que observadas as exigências legais.

No caso, cabe registrar que o imóvel objeto da demanda, embora pertencente ao INSS, é passível de alienação por meio de institutos de direito privado. Primeiramente porque, desde a data de sua aquisição (1944 - fls. 05/06), a autarquia não lhe deu qualquer destinação pública.

Ademais, após a ocupação do imóvel pelo Município de São Paulo, que se deu em 1969 mediante autorização do INSS, as partes mantiveram tratativas, visando à alienação onerosa do referido bem.

Noutro giro, cumpre assinalar que a desapropriação é uma das formas de intervenção do Estado na propriedade privada, que pode se dar por necessidade ou utilidade pública, ou por interesse social, e, em todos os casos, mediante justa e prévia indenização (artigo 5º, XXIV, da CF).

Todavia, há situações em que o ente público invade o bem privado e dele se apropria, sem observância do procedimento administrativo da desapropriação e, por conseguinte, do pagamento da indenização prévia. Nesses casos, tem-se a chamada desapropriação indireta, cujo fundamento se encontra no artigo 35 de Decreto Lei nº 3.365/41, in verbis:

"Art. 35. Os bens expropriados, uma vez incorporados à Fazenda Pública, não podem ser objeto de reivindicação, ainda que fundada em nulidade do processo de desapropriação. Qualquer ação, julgada procedente, resolver-se-á em perdas e danos."

 

Da leitura do citado dispositivo, extrai-se que os bens expropriados, uma vez incorporados ao patrimônio público, não podem retornar ao proprietário anterior, em razão de sua afetação ao interesse público. Desta feita, em casos de desapropriação indireta, cabe ao expropriado somente pleitear o seu reconhecimento judicial, bem como o pagamento da indenização devida pela perda de seu imóvel.

Nesse cenário, a jurisprudência do C. Superior Tribunal de Justiça consolidou entendimento no sentido de que, para que seja reconhecida a desapropriação indireta, devem ser preenchidos três requisitos: o apossamento irregular do bem pelo ente público; a afetação desse bem ao interesse público; e a impossibilidade de se reverter a situação sem ensejar prejuízos ao interesse da coletividade. Vejamos:

"ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL. DECRETO N. 750/93. PRESERVAÇÃO DA MATA ATLÂNTICA. LIMITAÇÃO ADMINISTRATIVA. INEXISTÊNCIA DE ESVAZIAMENTO DO CONTEÚDO ECONÔMICO DO PROPRIEDADE. PRECEDENTES DE AMBAS AS TURMAS E DA PRÓPRIA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO DO STJ. 1. A desapropriação indireta pressupõe três situações, quais sejam: (i) apossamento do bem pelo Estado sem prévia observância do devido processo legal; (ii) afetação do bem, ou seja, destina-lo à utilização pública; e (iii) irreversibilidade da situação fática a tornar ineficaz a tutela judicial específica. 2. A edição do Decreto Federal n. 750/93, que os embargantes reputam ter encerrado desapropriação indireta em sua propriedade, deveras, tão somente vedou o corte, a exploração e a supressão de vegetação primária ou em estados avançado e médio de regeneração da Mata Atlântica, sendo certo que eles mantiveram a posse do imóvel. Logo, o que se tem é mera limitação administrativa. Precedentes: REsp 922.786/SC, Relator Ministro Francisco Falcão, Primeira Turma, DJ de 18 de agosto de 2008; REsp 191.656/SP, Relator Ministro João Otávio de Noronha, Segunda Turma, DJ de 27 de fevereiro de 2009; e EREsp 901.319/SC, Relatora Ministra Eliana Calmon, Primeira Seção, DJ de 3 de agosto de 2009. 3. As vedações contidas no Decreto Federal n. 750/93 não são capazes de esvaziar o conteúdo econômico da área ao ponto de ser decretada a sua perda econômica. 4. Recurso de embargos de divergência conhecido e não provido." (g.n.)

(STJ - Primeira Seção - EREsp 922786/SC, Rel. Min. Benedito Gonçalves, DJe 15/09/2009)

"ADMINISTRATIVO. CEMIG DISTRIBUIÇÃO S/A. DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA . NÃO CONFIGURAÇÃO. NECESSIDADE DO EFETIVO DE APOSSAMENTO E DA IRREVERSIBILIDADE DA SITUAÇÃO. NORMAS AMBIENTAIS. LIMITAÇÃO ADMINISTRATIVA. ESVAZIAMENTO ECONÔMICO DA PROPRIEDADE. AÇÃO DE DIREITO PESSOAL. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. 1. Não há desapropriação indireta sem que haja o efetivo apossamento da propriedade pelo Poder Público. Desse modo, as restrições ao direito de propriedade, impostas por normas ambientais, ainda que esvaziem o conteúdo econômico, não se constituem desapropriação indireta . 2. O que ocorre com a edição de leis ambientais que restringem o uso da propriedade é a limitação administrativa, cujos prejuízos causados devem ser indenizados por meio de uma ação de direito pessoal, e não de direito real, como é o caso da ação em face de desapropriação indireta . 3. Assim, ainda que tenha havido danos aos agravantes, em face de eventual esvaziamento econômico de propriedade, devem ser indenizados pelo Estado, por meio de ação de direito pessoal, cujo prazo prescricional é de 5 anos, nos termos do art. 10, parágrafo único, do Decreto-Lei n. 3.365/41. Agravo regimental improvido." (g.n.)

(STJ - Segunda Turma - AgRg no REsp 1361025 / MG, Rel. Min. Humberto Martins, DJe 29/04/2013)

 

No caso em tela, embora o Município de São Paulo tenha se apossado do bem do INSS e lhe dado destinação pública, qual seja, a construção de uma praça, transcorreram mais de vinte anos entre a ocupação (1969) e o ajuizamento da ação (1995).

Assim, considerando que os fatos narrados nos autos e a distribuição da presente ação se deram na vigência do Código Civil de 1916, deve ser adotado o prazo prescricional previsto na Súmula 119 do STJ, in verbis:

"Súmula 119 - A ação de desapropriação indireta prescreve em vinte anos."

 

A esse respeito, colaciono a jurisprudência proferida pelo STJ:

"ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA. PRAZO PRESCRICIONAL. AÇÃO DE NATUREZA REAL. USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIO. SÚMULA 119/STJ. PRESCRIÇÃO VINTENÁRIA. CÓDIGO CIVIL DE 2002. ART. 1.238, PARÁGRAFO ÚNICO. PRESCRIÇÃO DECENAL. REDUÇÃO DO PRAZO. ART. 2.028 DO CC/02. REGRA DE TRANSIÇÃO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. ART. 27, §§ 1º E 3º, DO DL 3.365/1941. 1. A ação de desapropriação indireta possui natureza real e, enquanto não transcorrido o prazo para aquisição da propriedade por usucapião, ante a impossibilidade de reivindicar a coisa, subsiste a pretensão indenizatória em relação ao preço correspondente ao bem objeto do apossamento administrativo. 2. Com fundamento no art. 550 do Código Civil de 1916, o STJ firmou a orientação de que "a ação de desapropriação indireta prescreve em 20 anos" (Súmula 119/STJ). 3. O Código Civil de 2002 reduziu o prazo do usucapião extraordinário para 10 anos (art. 1.238, parágrafo único), na hipótese de realização de obras ou serviços de caráter produtivo no imóvel, devendo-se, a partir de então, observadas as regras de transição previstas no Codex (art. 2.028), adotá-lo nas expropriatórias indiretas. 4. Especificamente no caso dos autos, considerando que o lustro prescricional foi interrompido em 13.5.1994, com a publicação do Decreto expropriatório, e que não decorreu mais da metade do prazo vintenário previsto no código revogado, consoante a disposição do art. 2.028 do CC/02, incide o prazo decenal a partir da entrada em vigor do novel Código Civil (11.1.2003). 5. Assim, levando-se em conta que a ação foi proposta em dezembro de 2008, antes do transcurso dos 10 (dez) anos da vigência do atual Código, não se configurou a prescrição. 6. Os limites percentuais estabelecidos no art. 27, §§ 1º e 3º, do DL 3.365/1941, relativos aos honorários advocatícios, aplicam-se às desapropriações indiretas. Precedentes do STJ. 7. Verba honorária minorada para 5% do valor da condenação. 8. Recurso Especial parcialmente provido, apenas para redução dos honorários advocatícios." (g.n.)

(STJ, RESP n. 1300442/SC, Relator Ministro HERMAN BENJAMIN, j. 18/06/2013, DJE 26/06/2013).

 

Desse modo, resta evidenciada a ocorrência da prescrição da ação.

Todavia, conforme bem assinalado na r. sentença, o reconhecimento da prescrição do direito do autor de ingressar com a presente ação indenizatória não implica no reconhecimento da prescrição aquisitiva do imóvel pelo Município de São Paulo. Isso porque, além da própria Constituição Federal dispor que "os imóveis públicos não serão adquiridos por usucapião" (art. 183, § 3º), a Súmula 340 do STF orienta que, a partir da vigência do Código Civil de 1916, até mesmo os bens dominicais são insuscetíveis de usucapião, nos seguintes termos:

"Súmula 340 - Desde a vigência do Código Civil, os bens dominicais, como os demais bens públicos, não podem ser adquiridos por usucapião."

 

Por fim, mantenho a condenação do INSS ao pagamento de honorários advocatícios, uma vez que fixados em valor moderado (R$ 1.500,00), nos termos do artigo 20, §4º, do CPC/1973.

Em face do exposto, nego provimento à remessa oficial e à apelação do INSS, mantendo, na íntegra, o teor da r. sentença recorrida.

 

É o voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 


O Exmo. Sr. Desembargador Federal COTRIM GUIMARÃES: Pedi vista dos presentes autos apenas para poder analisar com mais cuidado as argumentações que assentam alguma divergência de fundamento e conclusão em face da relatoria do feito.


 
 

Em primeiro raciocínio, consigo concluir que a presente demanda não possui caráter real; assim, não se coloca em pauta reivindicação ou questionamento acerca do direito de propriedade - o que somente seria viável por meio da ação petitória pertinente.


 
 

Sendo assim, está assente que a propriedade prossegue - como denota o registro público presente - nas mãos do INSS. Esta autarquia não intentou recobrar seu domínio, pois, para tanto, seria imprescindível que se valesse da ação adequada.


 
 

Como seu objetivo era outro - o ressarcimento por uma ocupação sem desapropriação formal - teve que se sujeitar aos ditames do ordenamento civil, o que envolve a atenção aos prazos prescricionais que regulam o direito de demandar, prazos estes válidos para pessoas de direito civil privada ou pública.


 
 

Também não se pleiteia nos autos o reconhecimento do domínio por usucapião pelo Município, o que suscitaria pedido formalmente expresso, com fundamento jurídico pertinente.


 
 

Aponta-se que na Contestação da ré não há qualquer menção ao reconhecimento de prescrição aquisitiva quanto ao imóvel em discussão; ao contrário, este Município menciona que a ocupação sequer possui caráter irreversível (fls. 23).


 
 

Então, o que resta a apreciar, no meu entender, é tão somente o pedido em uma ação de reparação por ocupação de imóvel apontada como indevida pela ré e, a meu ver, pouco importa ser o autor da demanda pessoa jurídica de direito público ou privado.


 
 

Os prazos prescricionais para esta demanda específica são únicos e previstos pelo ordenamento civil, como lei geral.


 
 

Desta feita, é forçoso acompanhar a conclusão da relatoria, ainda que respeitando-se as consideradas argumentações divergentes.


 
 

É como voto.


E M E N T A

 

APELAÇÃO CÍVEL. REMESSA OFICIAL. DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA. IMÓVEL DO INSS OCUPADO PELO MUNICÍPIO DE SÃO PAULO. BEM DOMINICAL. AUSÊNCIA DE DESTINAÇÃO PÚBLICA. POSSIBILIDADE DE VENDA. DECORRÊNCIA DO PRAZO PRESCRICIONAL DE VINTE ANOS. SÚMULA 119 DO STJ. CONDENAÇÃO EM HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS MANTIDA. RECURSOS IMPROVIDOS.

1. Narra a inicial que o INSS é o legítimo proprietário de um terreno em formato triangular, registrado no 5º Cartório de Registro de Imóveis da Capital sob o nº 19.915 e situado no setor 07, Quadra 89, com frente para a Avenida Ipiranga, Rua Araújo e Rua Major Sertório, Centro, no município de São Paulo/SP, ocupado pelo réu desde 1969, onde foi construída uma praça, denominada Praça Darcy Penteado.

2. Consta que, desde 1969, ambos mantêm tratativas de alienação onerosa do imóvel. Todavia, em 1995, o réu informou que sua Secretaria de Administração acolheu a tese de doação tácita em favor da Prefeitura Municipal de São Paulo.

3. Diante disso, o INSS ajuizou a presente ação, visando ao reconhecimento da desapropriação indireta e, por conseguinte, a fixação da devida indenização, sendo julgada improcedente pelo MD. Juízo a quo, sob o fundamento de que ocorreu a prescrição do direito de ação da autarquia.

4. Em suas razões recursais, o INSS invoca o princípio do não-locupletamento, alegando que a proibição do enriquecimento ilícito do particular e, mais ainda, do ente público, se sobrepõe à prescritibilidade do direito à indenização. Subsidiariamente, requer o afastamento da condenação ao pagamento de honorários, ou, ao menos, a fixação da sucumbência recíproca, tendo em vista que, embora prescrito, o direito foi reconhecido.

5. Inicialmente, assevera-se que são considerados bens públicos aqueles elencados no artigo 99 do CC/2002 (artigo 66 do CC/1916).

6. Ademais, de acordo com os artigos 100 e 101 do mesmo diploma legal, os bens uso comum e os de uso especial são inalienáveis, enquanto que os dominicais podem ser alienados, desde que observadas as exigências legais.

7. No caso, cabe registrar que o imóvel objeto da demanda, embora pertencente ao INSS, é passível de alienação por meio de institutos de direito privado. Primeiramente porque, desde a data de sua aquisição (1944), a autarquia não lhe deu qualquer destinação pública.

8. Ademais, após a ocupação do imóvel pelo Município de São Paulo, que se deu em 1969 mediante autorização do INSS, as partes mantiveram tratativas, visando à alienação onerosa do referido bem.

9. Noutro giro, cumpre assinalar que a desapropriação é uma das formas de intervenção do Estado na propriedade privada, que pode se dar por necessidade ou utilidade pública, ou por interesse social, e, em todos os casos, mediante justa e prévia indenização (artigo 5º, XXIV, da CF).

10. Todavia, há situações em que o ente público invade o bem privado e dele se apropria, sem observância do procedimento administrativo da desapropriação e, por conseguinte, do pagamento da indenização prévia. Nesses casos, tem-se a chamada desapropriação indireta, cujo fundamento se encontra no artigo 35 de Decreto Lei nº 3.365/41.

11. Da leitura do citado dispositivo, extrai-se que os bens expropriados, uma vez incorporados ao patrimônio público, não podem retornar ao proprietário anterior, em razão de sua afetação ao interesse público. Desta feita, em casos de desapropriação indireta, cabe ao expropriado somente pleitear o seu reconhecimento judicial, bem como o pagamento da indenização devida pela perda de seu imóvel.

12. Nesse cenário, a jurisprudência do C. Superior Tribunal de Justiça consolidou entendimento no sentido de que, para que seja reconhecida a desapropriação indireta, devem ser preenchidos três requisitos: o apossamento irregular do bem pelo ente público; a afetação desse bem ao interesse público; e a impossibilidade de se reverter a situação sem ensejar prejuízos ao interesse da coletividade. Precedentes.

13. No caso em tela, embora o Município de São Paulo tenha se apossado do bem do INSS e lhe dado destinação pública, qual seja, a construção de uma praça, transcorreram mais de vinte anos entre a ocupação (1969) e o ajuizamento da ação (1995).

14. Assim, considerando que os fatos narrados nos autos e a distribuição da presente ação se deram na vigência do Código Civil de 1916, deve ser adotado o prazo prescricional de vinte anos, previsto na Súmula 119 do STJ, restando evidenciada a ocorrência da prescrição da ação.

15. Todavia, conforme bem assinalado na r. sentença, o reconhecimento da prescrição do direito do autor de ingressar com a presente ação indenizatória não implica no reconhecimento da prescrição aquisitiva do imóvel pelo Município de São Paulo. Isso porque, além da própria Constituição Federal dispor que "os imóveis públicos não serão adquiridos por usucapião" (art. 183, § 3º), a Súmula 340 do STF orienta que, a partir da vigência do Código Civil de 1916, até mesmo os bens dominicais são insuscetíveis de usucapião.

16. Por fim, mantém-se a condenação do INSS ao pagamento de honorários advocatícios, uma vez que fixados em valor moderado (R$ 1.500,00), nos termos do artigo 20, §4º, do CPC/1973.

17. Remessa oficial e apelação do INSS a que se nega provimento.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, POR MAIORIA, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO À REMESSA OFICIAL E À APELAÇÃO DO INSS, NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR DES. FED. VALDECI DOS SANTOS, ACOMPANHADO PELO DES. FED. HÉLIO NOGUEIRA E PELOS DESEMBARGADORES PEIXOTO JUNIOR E COTRIM GUIMARÃES, VENCIDO O DES. FED. WILSON ZAUHY QUE DAVA PROVIMENTO AO RECURSO DE APELAÇÃO INTERPOSTO, PARA O FIM DE (I) AFASTAR O RECONHECIMENTO DA PRESCRIÇÃO VINTENÁRIA PARA QUE O INSS EXERCESSE A SUA PRETENSÃO DE OBTER INDENIZAÇÃO EM VIRTUDE DA DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA DE IMÓVEL DE SUA TITULARIDADE POR PARTE DA MUNICIPALIDADE DE SÃO PAULO; (II) RECONHECER A EFETIVA OCORRÊNCIA DA DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA, ACOLHENDO COMO VALOR A SER INDENIZADO AQUELE APONTADO PELO PERITO JUDICIAL (R$ 410.000,00), ACRESCIDO DOS CONSECTÁRIOS DE ESTILO, DELIMITADOS ACIMA; E (III) CONDENAR A MUNICIPALIDADE DE SÃO PAULO AO PAGAMENTO DA VERBA HONORÁRIA FIXADA NO IMPORTE DE 2,5% (DOIS E MEIO POR CENTO) SOBRE O VALOR DA INDENIZAÇÃO, EM CONFORMIDADE COM O QUE PRECEITUA O ART. 27, §1°, DO DECRETO-LEI E. 3.365/1941, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.