APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000845-02.2018.4.03.6141
RELATOR: Gab. 02 - DES. FED. WILSON ZAUHY
APELANTE: UNIAO FEDERAL
APELADO: NILTON COSTA DA SILVA
Advogado do(a) APELADO: VIVIAN LOPES DE MELLO - SP303830-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000845-02.2018.4.03.6141 RELATOR: Gab. 02 - DES. FED. WILSON ZAUHY APELANTE: UNIAO FEDERAL APELADO: NILTON COSTA DA SILVA Advogado do(a) APELADO: VIVIAN LOPES DE MELLO - SP303830-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de apelação interposta pela UNIÃO FEDERAL contra sentença proferida em ação ordinária movida por NILTON COSTA DA SILVA objetivando a condenação da ré ao pagamento de pensão por morte instituída por anistiado político, com quem alega ter vivido em união estável. Contestação pela União (Num. 3544825). Realizada audiência, foi colhido o depoimento pessoal do autor, bem como ouvidas duas testemunhas (Num. 3544827 – pág. 12/15). Em sentença publicada em 14/12/2017, o Juízo de Origem julgou procedente o pedido para reconhecer o seu direito à transferência do benefício de reparação econômica em prestação continuada que o anistiado político falecido recebia, concedendo a tutela de urgência para que a União a implemente no prazo de 45 dias, com início em 22/03/2016, condenando a ré ao pagamento das importâncias relativas às prestações vencidas desde 22/03/2016 com atualização monetária e juros de mora nos termos do Manual de Cálculos vigente na data do trânsito em julgado. A União foi condenada, ainda, ao pagamento de honorários advocatícios fixados no patamar mínimo dos incisos do § 3º do art. 85 do CPC/2015, sendo que o inciso pertinente será apurado em liquidação de sentença (Num. 3544828 – pág. 01/05 e 11). A União apela para ver o pedido julgado improcedente, sustentando que o autor não demonstrou a união estável com o anistiado político falecido, tampouco a dependência econômica em relação a ele (Num. 3544829 – pág. 01/07). Contrarrazões pelo autor (Num. 3544829 – pág. 13/18). É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000845-02.2018.4.03.6141 RELATOR: Gab. 02 - DES. FED. WILSON ZAUHY APELANTE: UNIAO FEDERAL APELADO: NILTON COSTA DA SILVA Advogado do(a) APELADO: VIVIAN LOPES DE MELLO - SP303830-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O No caso dos autos, pretende o autor a transferência do direito a reparação econômica antes recebida por anistiado político falecido, com quem alega ter vivido em união estável, fundamentando sua pretensão no art. 13 da Lei n° 10.559/2002, verbis: Art. 13. No caso de falecimento do anistiado político, o direito à reparação econômica transfere-se aos seus dependentes, observados os critérios fixados nos regimes jurídicos dos servidores civis e militares da União. Contra a sentença se insurge a União sustentando que as provas dos autos não são suficientes a se demonstrar a existência de união estável entre o autor e o anistiado falecido. Inicialmente, cumpre consignar que compete à Justiça Federal analisar, incidentalmente e como prejudicial de mérito, o reconhecimento da união estável nas hipóteses em que se pleiteia a concessão de benefício previdenciário, consoante entendimento sedimentado na Jurisprudência do C. Superior Tribunal de Justiça, verbis: PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. IMPETRAÇÃO POR PESSOA JURÍDICA DE DIREITO PÚBLICO. POSSIBILIDADE. AÇÃO DE RECONHECIMENTO DE UNIÃO ESTÁVEL. DECISÃO DO JUIZ ESTADUAL QUE DETERMINA AO INSS O PAGAMENTO DA PENSÃO POR MORTE À AUTORA. PROVIMENTO DE COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. AUTARQUIA QUE NÃO FOI PARTE NA LIDE. APLICAÇÃO DO ART. 472 DO CPC. MANIFESTA ILEGALIDADE. 1. O art. 1º da Lei n. 12.016/2009 preconiza que "conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, sempre que, ilegalmente ou com abuso de poder, qualquer pessoa física ou jurídica sofrer violação ou houver justo receio de sofrê-la por parte de autoridade, seja de que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça". 2. Considerando que o texto legal expressamente assegura a impetração do remédio heroico por qualquer pessoa jurídica, não é possível ao Poder Judiciário vedar a sua utilização por entidade de direito público. 3. Compete à Justiça estadual o processamento e julgamento de demanda proposta com o escopo de obter provimento judicial declaratório de existência de vínculo familiar, para o fim de viabilizar futuro pedido de concessão de benefício previdenciário. Seara exclusiva do Direito de Família, relativa ao estado das pessoas. 4. Se a ação tem por objetivo provimento judicial constitutivo relativo à imediata concessão de benefício previdenciário, ostentando como causa de pedir o reconhecimento da união estável, deverá ser proposta perante a Justiça Federal, ante a obrigatoriedade da participação do INSS no polo passivo da lide, seja de maneira isolada, se for o caso, seja como litisconsorte passivo necessário. 5. A presença do INSS é condição que se impõe porque a instituição de benefício previdenciário constitui obrigação que atinge diretamente os cofres da Previdência Social, revelando, assim, a existência de interesse jurídico e econômico da autarquia federal responsável pela sua gestão, razão pela qual ela deve ser citada para responder à demanda judicial, sob pena de violação dos postulados da ampla defesa e do contraditório, imprescindíveis para a garantia do devido processo legal. 6. A instituição de novo beneficiário, ainda que seja para ratear pensão já concedida, também agrava a situação jurídica e econômica da Previdência, porquanto representa causa que pode repercutir em maior tempo de permanência da obrigação de pagamento do benefício. 7. Hipótese em que a sentença proferida em sede de ação judicial circunscrita ao reconhecimento de união estável — ajuizada exclusivamente em face do alegado companheiro, representado nos autos por sua herdeira —, a teor do art. 472 do Código de Processo Civil, não vincula a autarquia previdenciária que não fez parte da lide, o que denota a manifesta ilegalidade da decisão. 8. Recurso ordinário provido. (STJ, RMS nº 35.018/MG, Rel. Min. Gurgel de Faria, Quinta Turma, DJe: 20/08/2015) (destaquei). Sendo assim, com muito mais razão há que se reconhecer a competência absoluta da Justiça Federal para processar e julgar o presente feito, que versa sobre a concessão de pensão por morte estatutária, hipótese de evidente interesse jurídico do ente federal requerido, nos termos do art. 109, I da Constituição Federal: Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar: I - as causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal forem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou oponentes, exceto as de falência, as de acidentes de trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho; Dito isto, verifico que a questão essencial ao deslinde da causa é a de saber se o autor viveu ou não em união estável com o anistiado político falecido para que se decida sobre o seu direito à transferência do benefício de reparação econômica, com fundamento no art. 13 da Lei n° 10.559/2002. Quanto ao instituto da união estável, trago à colação os ensinamentos de Flávio Tartuce e José Fernando Simão: “DA UNIÃO ESTÁVEL 5.1 INTRODUÇÃO A união estável ou união livre sempre foi reconhecida como um fato jurídico, seja no Direito Comparado, seja entre nós. Por certo é que hoje, a união estável assume um papel relevante como entidade familiar na sociedade brasileira, eis que muitas pessoas, principalmente das últimas gerações, têm preferido essa forma de união em detrimento do casamento. Não se deve esquecer que antes da existência da possibilidade de divórcio no Brasil, muitos conviviam em união estável, apesar de casados no papel, mas separados de fato. Nessa situação desconfortável, a união estável não era, muitas vezes, adotada por opção, mas sim por falta de opção. No caso do Brasil, a primeira norma a tratar do assunto foi o Decreto-lei 7.036/1944, que reconheceu a companheira como beneficiária da indenização no caso de acidente de trabalho de que foi vítima o companheiro, lei que ainda é aplicada na prática. A jurisprudência do mesmo modo reconhecia direitos aos companheiros. Antes mesmo da previsão constitucional da união estável, na década de 1960, quando o instituto era tratado sob a denominação de concubinato, o Supremo Tribunal Federal assim sumulou: ‘Comprovada a existência de sociedade de fato entre os concubinos, é cabível sua dissolução judicial com a partilha do patrimônio adquirido pelo esforço comum’ (Sùmula 380 do STF). A ementa data de 3 de abril de 1964. Posteriormente, a Lei 6.015/1973 (Lei de Registros Públicos) passou a admitir a possibilidade de a companheira usar o sobrenome do seu companheiro (art. 57, § 2º). Comentaremos sobre a viabilidade de aplicação atual desse último dispositivo em momento oportuno. A Constituição Federal de 1988 reconheceu, no seu art. 226, § 3º, a união estável, nos seguintes termos: ‘Para efeito de proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento’. Diante do que consta do texto constitucional, filiamo-nos ao entendimento pelo qual a união estável não é igual ao casamento, uma vez que coisas iguais não se convertem uma na outra. Justamente por isso é que há um tratamento diferenciado, como ocorre quanto ao regime de bens e ao direito sucessório. De qualquer forma, deve-se lembrar que a união estável, assim como o casamento, constitui uma entidade familiar, base da sociedade, nos termos do art. 226, caput, do Texto Maior. (...) 5.2 CONCEITO DE UNIÃO ESTÁVEL Segundo o art. 1.723 do CC em vigor, ‘é reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família’. O dispositivo regulamenta o art. 226, § 3º, da CF/1988. Como se nota, o conceito é o mesmo que constava da Lei 9.278/1996. A respeito dos seus requisitos, comenta o Professor Álvaro Villaça Azevedo que: ‘Realmente, como um fato social, a união estável é tão exposta ao público como o casamento, em que os companheiros são conhecidos, no local em que vivem, nos meios sociais, principalmente de sua comunidade, junto aos fornecedores de produtos e serviços, apresentando-se, enfim, como se casados fossem. Diz o povo, em linguagem autêntica, que só falta aos companheiros ‘o papel passado’. Essa convivência, como no casamento, existe em continuidade; os companheiros não só se visitam, mas vivem juntos, participam um da vida do outro, sem termo marcado para se separarem’ (Comentários..., p. 255). Como reconhece o próprio Professor Villaça, a lei não exige prazo mínimo para a sua constituição, sendo certo que o aplicador do direito deve analisar as circunstâncias do caso concreto para apontar a sua existência ou não. Os requisitos, nesse contexto, são que a união seja pública (no sentido de notoriedade, não podendo ser oculta, clandestina), contínua (sem que haja interrupções, sem o famoso ‘dar um tempo’ que é tão comum no namoro) e duradoura, além do objetivo de os companheiros ou conviventes de estabelecerem uma verdadeira família (animus familiae). No mesmo sentido, em tom didático, Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho apresentam elementos caracterizadores essenciais e elementos caracterizadores acidentais para a união estável. Entre os primeiros estão a publicidade, a continuidade, a estabilidade e o objetivo de constituição de família. Como elementos acidentais, destacam-se o tempo, a prole e a coabitação (Novo Curso..., p. 429-436). Como se nota, os elementos essenciais são totalmente subjetivos, razão pela qual acreditamos existir uma verdadeira cláusula geral para a constituição da união estável. (...)” (Direito Civil, v. 5: direito de família / Flávio Tartuce, José Fernando Simão - 7 ed. rev. e atual. - São Paulo: Método, 2012 - p. 263 e 268-269) (destaquei). Fixadas estas premissas, cumpre analisar o mérito recursal. Vê-se que o julgamento de procedência se fundou, precipuamente, nas provas orais coligidas aos autos. E, após detidamente analisá-las, chego à mesma conclusão estampada na sentença. Quanto a isto, destaco que a testemunha James Eronildes de Almeida, colega de trabalho do autor, referiu-se ao falecido como sendo um “casinho” do requerente. Arguído pelo Juízo Processante, esclareceu que soube pelo seu encarregado, que contou a ele e aos demais colegas presentes, que o requerente e o falecido dormiam na mesma cama. Disse, ainda, que sempre que encontrava o autor ele o convidava para ir à casa em que morava com o anistiado falecido, e que a testemunha lá esteve por três vezes. Nota-se, da reprodução de seu depoimento, que a testemunha se mostra claramente desconfortável em falar abertamente sobre o relacionamento discutido nos autos, mas resta evidente que este incômodo está relacionado ao fato de se tratar de uma relação homoafetiva, e não porque a testemunha tivesse quaisquer dúvidas sobre a higidez dos fatos sobre os quais depôs. Ainda, de seu depoimento se extrai que, segundo a percepção da testemunha, o relacionamento entre o autor e o falecido era duradouro, sem idas e vindas, que eles sempre estavam juntos, embora a testemunha não os visse desde dois anos antes de seu depoimento (oitiva em 2016), o que se justifica pelo fato de que o depoente trabalha com coleta de lixo e atende regiões diversas daquelas em que o requerente era gari. Por fim, soube que o autor ficou depressivo após a morte de seu companheiro e teve de tomar remédios (Num. 3544831) De seu turno, a testemunha Laurice Souza depôs no sentido de que conhece o requerente por ter ela, depoente, dois carrinhos de água de coco, um na praia e outro na Praça do Correio, sendo usual ela atender o requerente e o anistiado falecido neste segundo carrinho. Declarou que sempre os via na época de pagamento, em que eles iam ao banco e depois ao carrinho, e que o falecido era o seu cliente mais antigo. Segundo a percepção da declarante, o amor que eles demonstravam um pelo outro era de marido e mulher. Ainda, disse saber que o falecido era aposentado e que o autor era varredor de rua e que eles moravam juntos, o que soube porque eles tinham comentado e também porque todo mundo via. Soube da morte do anistiado falecido porque o autor foi lhe contar, tendo a testemunha comparecido ao velório, que ocorreu num cemitério próximo ao Fórum. Disse que o autor também estava lá e estava muito abalado. Afirmou que soube que o falecido estava internado no Hospital CREI, porque o autor ia ao seu carrinho comprar água de coco para levar para o acamado. Por fim, disse que o autor chamava o falecido de “Tesouro”, e que o de cujus era amoroso com o requerente e a ele chamava de “Chiquinho” (Num. 3544932). Do depoimento pessoal do autor se verifica que ele e o falecido se conheceram no Rio de Janeiro, numa época em que o autor tinha entre dezenove e vinte anos de idade e o de cujus já estava perto de aposentar, com uns cinquenta anos. Se conheceram numa feira, onde bateram papo. Explicou que isto deve ter acontecido em 1986 ou 1987, já que ele, autor, veio para o estado de São Paulo em 1990. Afirmou o requerente que o falecido antes morava com sua mãe adotiva, Dona Paulina, e que após a morte dela, ele se revoltou e foi para Santos/SP, onde tratou de providenciar sua aposentadoria. Embora o relacionamento deles tenha começado no Rio de Janeiro, em Duque de Caxias, o autor ainda ficou por lá cerca de um ano após a vinda do falecido, até que, por intermédio de um amigo do finado, o autor veio a São Paulo procurá-lo e o convenceu a ir buscá-lo em definitivo. Diz que o falecido foi buscá-lo em 09/02/1990, embora a mãe do requerente não aprovasse sua opção sexual. Afirma que vieram eles para Santos/SP, e moraram numa pensão num bairro chamado Vila Matias. Nessa época, o falecido era feitor numa empresa de coleta de lixo chamada Prodesan. Relata que, através de uma amiga que trabalhava nesta empresa, o falecido conseguiu uma casa e perguntou ao autor se queria ir morar lá com ele, o que o requerente, embora receoso, aceitou. Diz que o relacionamento sempre se resumiu aos dois, sem que outras pessoas participassem, e que sempre foi muito ciumento. O falecido também tinha ciúmes, mas menos, por ser mais velho e experiente. Explica que, após morarem na Vila Matias, foram morar na Rua Humaitá, onde viveram até o falecimento do anistiado e o requerente ainda vivia ao tempo do seu depoimento. Afirma que o falecido ficou doente e que foram dois anos de sofrimento, em que o requerente cuidava dele. Explica que ele faleceu no Hospital CREI, após ficar oito dias internado, e que o autor cuidou do velório. Perguntado pelo Juízo sobre o motivo de ter declarado ser filho do falecido na certidão de óbito e em outros documentos, o requerente disse que isso se deu por conta “de um certo preconceito” e também por estar dopado naquele dia, já que teve de tomar muitos remédios em razão de seu estado emocional e de uma súbita alta de sua pressão arterial. Explicou que uma menina colocou no atestado de óbito que ele era filho do finado e que pensou: “agora já foi” (Num. 3544830). Embora relevante o questionamento trazido no recurso da União, de que “caso fosse essa realmente a situação do apelado (de união estável, assim entendido o relacionamento com a finalidade de constituir uma família), deveria este ter trazido a depoimento pessoas íntimas, vizinhas, que acompanhavam a rotina do casal e que poderiam exteriorizar com precisão o entendimento de que realmente existia um vínculo com finalidade de união estável desde o ano de 1993” (Num. 3544829 – pág. 04), o que se vê dos autos é que o autor inegavelmente teve um relacionamento com o anistiado político falecido de caráter público, e que é compreensível o fato de não ter o requerente arrolado vizinhos como testemunhas porque, como visto em seu depoimento, não havia entre o casal e os vizinhos muita proximidade. Veja-se que a discrição adotada pelo requerente e pelo falecido perante seus vizinhos não se confunde com clandestinidade; em verdade, o que se tem no caso concreto é que o autor – e, muito provavelmente, também o seu companheiro falecido – tinha receio de que fossem mal vistos pela comunidade ao seu redor, em razão do fato de terem uma relação homoafetiva, mas que isto não impediu que pessoas que, por qualquer motivo, participassem de sua rotina percebessem, sem quaisquer dúvidas, que eles formavam entre si uma família. É o que se nota do fato de vir aos autos o testemunho, claro e coerente, da pessoa que lhes vendia água de coco todo mês, em um carrinho lotado na praça do Correio, sempre no dia do pagamento do anistiado falecido. A corroborar esta conclusão, consigno que a prova oral coligida aos autos é firme no sentido de que nenhum parente consanguíneo de Clóvis esteve presente em seu velório. Por fim, registre-se que o autor obteve declaração da união estável ora discutida em sentença proferida pelo Juízo Estadual da 1ª Vara da Família e Sucessões da Comarca de São Vicente/SP; muito embora tal decisão não faça coisa julgada em desfavor da União, que não é parte naquele feito, certo é que este é um motivo a mais para se manter a sentença de procedência do pedido deduzido nestes autos (Num. 3544937). Por tais razões, ante a cabal demonstração de que o relacionamento afetivo entre o autor e o anistiado político falecido atendeu aos requisitos próprios da união estável, de rigor a manutenção da sentença de procedência do pedido. Considerando que a decisão foi publicada após 18 de março de 2016, que houve condenação ao pagamento de honorários advocatícios nos patamares mínimos do § 3º do art. 85 do Código de Processo Civil de 2015 e o não provimento do recurso (STJ, EDcl no AgInt no RESP n° 1.573.573 RJ. Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze. Terceira Turma. DJe 08/05/2017), majoro os honorários advocatícios devidos pela União em 1%, devendo o inciso pertinente ser apurado em liquidação de sentença. Dispositivo Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação e majorar os honorários advocatícios devidos pela União em 1%, devendo o inciso pertinente ser apurado em liquidação de sentença.
E M E N T A
DIREITO CIVIL, ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. ANISTIADO POLÍTICO. MORTE. PEDIDO DE TRANSFERÊNCIA DO DIREITO A REPARAÇÃO ECONÔMICA AO COMPANHEIRO. UNIÃO ESTÁVEL DEMONSTRADA. HONORÁRIOS RECURSAIS. APELAÇÃO NÃO PROVIDA.
1. No caso dos autos, pretende o autor a transferência do direito a reparação econômica antes recebida por anistiado político falecido, com quem alega ter vivido em união estável, fundamentando sua pretensão no art. 13 da Lei n° 10.559/2002.
2. Ante a cabal demonstração de que o relacionamento afetivo entre o autor e o anistiado político falecido atendeu aos requisitos próprios da união estável, de rigor a manutenção da sentença de procedência do pedido.
3. Honorários advocatícios devidos pela União majorados em 1%, devendo o inciso pertinente ser apurado em liquidação de sentença.
4. Apelação não provida.