APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0046383-65.2015.4.03.9999
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: APARECIDO RIBEIRO DA SILVA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: ANA MARIA SANTANA - SP273969-N
Advogado do(a) APELANTE: FILIPE BRICKMANN ARENO - SP183382-C
APELADO: APARECIDO RIBEIRO DA SILVA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELADO: ANA MARIA SANTANA - SP273969-N
Advogado do(a) APELADO: FILIPE BRICKMANN ARENO - SP183382-C
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0046383-65.2015.4.03.9999 RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO APELANTE: APARECIDO RIBEIRO DA SILVA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS Advogado do(a) APELANTE: ANA MARIA SANTANA - SP273969-N APELADO: APARECIDO RIBEIRO DA SILVA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS Advogado do(a) APELADO: ANA MARIA SANTANA - SP273969-N OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR): Trata-se de apelações interpostas pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS e pela parte autora, em ação previdenciária ajuizada por APARECIDO RIBEIRO DA SILVA, objetivando a concessão de aposentadoria especial ou por tempo de contribuição, mediante o reconhecimento de trabalho exercido em condições especiais. A r. sentença (ID 106234134 – págs. 57/ 65), integrada pela decisão dos embargos de declaração (ID 106234134 – págs. 76/78), julgou parcialmente procedente o pedido, para reconhecer a especialidade de 07/03/1979 a 31/08/1985, 23/04/1986 a 15/12/1986, 19/06/1991 a 05/07/1993, 08/02/1995 a 02/04/1997, 03/04/1997 a 22/04/1998, 01/06/2005 a 14/11/2005 e 10/11/2009 a 31/08/2010, e condenou a autarquia na implantação da aposentadoria especial, a partir da data do requerimento administrativo, caso atingido o tempo suficiente para a concessão do benefício. Diante da sucumbência recíproca, não houve fixação dos honorários advocatícios. Em razões recursais (ID 106234134 - págs. 97/122), a parte autora alega que restou demonstrada a atividade desempenhada no corte de cana-de-açúcar, de 01/05/1964 a 30/04/1969, que deve ser considerada como especial. Pleiteia a admissão da insalubridade provocada pelo ruído e por agentes químicos, nos períodos de 02/05/1998 a 21/12/1998, 12/04/1999 a 20/08/1999, 24/08/1999 a 29/10/2004 e 04/10/2010 “até a presente data”. Requer a fixação dos honorários advocatícios em 20% sobre o valor atualizado da condenação. Pleiteia a concessão da aposentadoria especial, a partir do requerimento administrativo, acrescidas as parcelas em atraso de juros e de correção monetária. O INSS, por sua vez (ID 106234134 - págs. 128/166), argumenta que não restou demonstrada a especialidade nos interregnos de 07/03/1979 a 31/08/1985, 23/04/1986 a 15/12/1986, 19/06/1991 a 05/07/1993, 08/02/1995 a 02/04/1997, 03/04/1997 a 22/04/1998, 01/06/2005 a 14/11/2005 e 10/11/2009 a 31/08/2010. Em síntese, sustenta a exposição a ruído dentro dos limites de tolerância legal, além de sua neutralização pelos equipamentos individuais de proteção eficazes, portanto, descaracterizando o trabalho especial, sendo que os agentes químicos identificados não podem ser considerados como prejudiciais à saúde. Alega a ausência de prévia fonte de custeio para a concessão do benefício. Subsidiariamente, pleiteia a fixação do termo inicial na data da citação e, quanto à correção monetária e aos juros de mora, pleiteia a aplicação da Lei nº 11.960/2009. Por fim, prequestiona a matéria. Intimadas as partes, o autor apresentou contrarrazões (ID 106234134 - págs. 170/192). Devidamente processados os recursos, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal. É o relatório.
Advogado do(a) APELANTE: FILIPE BRICKMANN ARENO - SP183382-C
Advogado do(a) APELADO: FILIPE BRICKMANN ARENO - SP183382-C
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0046383-65.2015.4.03.9999 RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO APELANTE: APARECIDO RIBEIRO DA SILVA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS Advogado do(a) APELANTE: ANA MARIA SANTANA - SP273969-N APELADO: APARECIDO RIBEIRO DA SILVA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS Advogado do(a) APELADO: ANA MARIA SANTANA - SP273969-N OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR): Trata-se de pedido de concessão de aposentadoria especial ou por tempo de contribuição, mediante o cômputo de labor especial. Fixados os limites da lide pela parte autora, veda-se ao magistrado decidir além (ultra petita), aquém (citra petita) ou diversamente do pedido (extra petita), consoante o art. 492 do CPC/2015. Em sua decisão, o juiz a quo reconheceu tempo de serviço especial e apenas determinou à autarquia que promovesse a recontagem do tempo de contribuição do requerente e somente implantasse o benefício desde que atingido o tempo suficiente para a sua obtenção, portanto, condicionando a sua concessão à análise do INSS. Desta forma, está-se diante de sentença condicional, restando violado o princípio da congruência insculpido no art. 460 do CPC/73, atual art. 492 do CPC/2015. O caso, entretanto, não é de remessa dos autos à 1ª instância, uma vez que a legislação autoriza expressamente o julgamento imediato do processo quando presentes as condições para tanto. É o que se extrai do art. 1.013, § 3º, II, do Código de Processo Civil: "A apelação devolverá ao tribunal o conhecimento da matéria impugnada. (...) § 3º. Se o processo estiver em condições de imediato julgamento, o tribunal deve decidir desde logo o mérito quando: (...) II - Decretar a nulidade da sentença por não ser ela congruente com os limites do pedido ou da causa de pedir". Considerando que a causa encontra-se madura para julgamento - presentes os elementos necessários ao seu deslinde - e que o contraditório e a ampla defesa restaram assegurados - com a citação válida do ente autárquico - e, ainda, amparado pela legislação processual aplicável, passo ao exame do mérito da demanda. A aposentadoria especial foi instituída pelo artigo 31 da Lei n. 3.807, de 26.08.1960 (Lei Orgânica da Previdência Social, LOPS). Sobreveio a Lei n. 5.890, de 08.06.1973, que revogou o artigo 31 da LOPS, e cujo artigo 9º passou regrar esse benefício. A benesse era devida ao segurado que contasse 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a atividade profissional, de serviços para esse efeito considerados penosos, insalubres ou perigosos, por decreto do Poder Executivo. O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a agentes nocivos. Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais, agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os grupos profissionais. Atualmente, a aposentadoria especial encontra previsão no art. 57 da Lei nº 8.213/91, cuja redação prevê que "(...) será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995)". (grifos nossos) Logo, até a edição da Lei nº 9.032/95, era possível o reconhecimento da atividade especial: (a) com base no enquadramento na categoria profissional, desde que a atividade fosse indicada como perigosa, insalubre ou penosa nos anexos dos Decretos nº 53.831/64 ou 83.080/79 (presunção legal); ou (b) mediante comprovação da submissão do trabalhador, independentemente da atividade ou profissão, a algum dos agentes nocivos, por qualquer meio de prova, exceto para ruído e calor. A apresentação de laudo pericial, Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP ou outro formulário equivalente para fins de comprovação de tempo de serviço especial, somente passou a ser exigida a partir de 06.03.1997 (Decreto nº. 2.172/97), exceto para os casos de ruído e calor, em que sempre houve exigência de laudo técnico para verificação do nível de exposição do trabalhador às condições especiais. Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais. O Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/64, código 1.1.6, fixou o nível mínimo em 80dB. Por força do Quadro I do Anexo do Decreto nº 72.771/73, de 06/09/1973, esse nível foi elevado para 90dB. O Quadro Anexo I do Decreto nº 83.080/79, mantido pelo Decreto nº 89.312/84, considera insalubres as atividades que expõem o segurado a níveis de pressão sonora superiores a 90 decibéis, de acordo com o Código 1.1.5. Essa situação foi alterada pela edição dos Decretos nºs 357, de 07/12/1991 e 611, de 21/07/1992, que incorporaram, a um só tempo, o Anexo I do Decreto nº 83.080, de 24/01/1979, que fixou o nível mínimo de ruído em 90dB e o Anexo do Decreto nº 53.831, de 25/03/1964, que fixava o nível mínimo de 80dB, de modo que prevalece este, por ser mais favorável. De 06/03/1997 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 2.172/97, e de 07/05/1999 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 3.048/99, o limite de tolerância voltou a ser fixado em 90 dB. A partir de 19/11/2003, com a alteração ao Decreto nº 3.048/99, Anexo IV, introduzida pelo Decreto nº 4.882/03, o limite de tolerância do agente nocivo ruído caiu para 85 dB. Observa-se que no julgamento do REsp 1398260/PR (Rel. Min. Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014), representativo de controvérsia, o STJ reconheceu a impossibilidade de aplicação retroativa do índice de 85 dB para o período de 06/03/1997 a 18/11/2003, devendo ser aplicado o limite vigente ao tempo da prestação do labor, qual seja, 90dB. Assim, temos o seguinte quadro: Período Trabalhado Enquadramento Limites de Tolerância Até 05/03/1997 1. Anexo do Decreto nº 53.831/64. 2. Decretos nºs 357/91 e 611/92 80 dB De 06/03/1997 a 18/11/2003 Anexo IV do Decreto nº 2.172/97 Anexo IV do Decreto nº 3.048/99, redação original 90dB A partir de 19/11/2003 Anexo IV do Decreto nº 3.048/99, com a alteração do Decreto nº 4.882/03 85 dB Importante ressaltar que o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição, substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo laborado em condições especiais. Saliente-se, mais, e na esteira de entendimento deste E. TRF, "a desnecessidade de que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que exercida a atividade insalubre, em face de inexistência de previsão legal para tanto, e desde que não haja mudanças significativas no cenário laboral" (TRF-3, APELREEX 0004079-86.2012.4.03.6109, OITAVA TURMA, Rel. Des. Fed. TANIA MARANGONI, e-DJF3 Judicial 1 DATA: 15/05/2015). No mesmo sentido: TRF 3ª Região, SÉTIMA TURMA, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1423903 - 0002587-92.2008.4.03.6111, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO DOMINGUES, julgado em 24/10/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:04/11/2016). Por derradeiro, no que se refere ao uso de equipamento de proteção individual, verifica-se que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE 664.335/SC, em sede de repercussão geral, fixou duas teses: "(...) a primeira tese objetiva que se firma é: o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial. A Administração poderá, no exercício da fiscalização, aferir as informações prestadas pela empresa, sem prejuízo do inafastável judicial review. Em caso de divergência ou dúvida sobre a real eficácia do Equipamento de Proteção Individual, a premissa a nortear a Administração e o Judiciário é pelo reconhecimento do direito ao benefício da aposentadoria especial. Isto porque o uso de EPI, no caso concreto, pode não se afigurar suficiente para descaracterizar completamente a relação nociva a que o empregado se submete"; (...) a segunda tese fixada neste Recurso Extraordinário é a seguinte: na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria" (STF, ARE 664.335, Rel. Min. Luiz Fux, Tribunal Pleno, j. 04/12/2014, DJe n. 29, de 11.02.2015, public. 12.02.2015)" (grifos nossos). Destarte, a desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que, ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais. Saliente-se que, conforme declinado alhures, a apresentação de laudos técnicos de forma extemporânea não impede o reconhecimento da especialidade, eis que de se supor que, com o passar do tempo, a evolução da tecnologia tem aptidão de redução das condições agressivas. Portanto, se constatada exposição a tensão elétrica superior a 250 volts em períodos posteriores ao laborado pelo autor, forçoso concluir que, nos anos anteriores, referido nível era superior. Do caso concreto. Como pretensas provas do labor rural do autor, foram apresentadas pelo requerente declarações de exercício de atividades, datadas dos anos de 2002 e 2004, emitidas pelos “proprietários da Fazenda Recanto” (fls. 31 e 35). Também foram colacionadas em companhia da inicial a matrícula do imóvel referido (fls. 33/34), bem como o registro do postulante como empregado, com vínculo anotado de 01/10/1969, na função de tratorista, além de recibos do pagamento do 13º salário e férias nos anos 1970 até 1976 e 1979 (fls. 42/49). A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período que se pretende reconhecer é descabida. No entanto, tais documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado (01/05/1964 a 30/04/1969), no sentido de que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado. Em outras palavras, exige-se a apresentação de documentos datados da época dos fatos discutidos, ou seja, apresenta-se inválida para tal desiderato a documentação que antecede ou sucede o período da alegada atividade campesina, como ocorrido na situação em apreço. Cumpre ressaltar que o art. 55, §3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal. Nesse sentido foi editada a Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça: "A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito de obtenção do benefício previdenciário". Ademais, cumpre verificar que a informação de fl. 39, que supostamente informa o recebimento de salário em 01/05/1964, sequer traz como referência o seu nome, portanto, não podendo vincular tal documento ao requerente. E, ainda que isso fosse possível, não teria sentido a admissão da condição de trabalhador rural em regime de economia familiar para quem foi registrado como empregado. Desta feita, fica afastado o reconhecimento do alegado labor rural no período de 01/05/1964 a 30/04/1969, o que impossibilita, consequentemente, a admissão da especialidade. Entretanto, diante da ausência de início razoável de prova material, imperiosa a extinção da demanda, sem resolução do mérito, a fim de possibilitar a propositura de nova ação, caso o requerente venha a conseguir documentos que comprovem o labor desenvolvido na qualidade de rurícola no período alegado. Nesse sentido, transcrevo o entendimento consolidado do C. STJ, em julgado proferido sob a sistemática de recursos repetitivos, conforme art. 543-C, do CPC/1973: "DIREITO PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. ART. 543-C DO CPC. RESOLUÇÃO No. 8/STJ. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. AUSÊNCIA DE PROVA MATERIAL APTA A COMPROVAR O EXERCÍCIO DA ATIVIDADE RURAL. CARÊNCIA DE PRESSUPOSTO DE CONSTITUIÇÃO E DESENVOLVIMENTO VÁLIDO DO PROCESSO. EXTINÇÃO DO FEITO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO, DE MODO QUE A AÇÃO PODE SER REPROPOSTA, DISPONDO A PARTE DOS ELEMENTOS NECESSÁRIOS PARA COMPROVAR O SEU DIREITO. RECURSO ESPECIAL DO INSS DESPROVIDO. 1. Tradicionalmente, o Direito Previdenciário se vale da processualística civil para regular os seus procedimentos, entretanto, não se deve perder de vista as peculiaridades das demandas previdenciárias, que justificam a flexibilização da rígida metodologia civilista, levando-se em conta os cânones constitucionais atinentes à Seguridade Social, que tem como base o contexto social adverso em que se inserem os que buscam judicialmente os benefícios previdenciários. 2. As normas previdenciárias devem ser interpretadas de modo a favorecer os valores morais da Constituição Federal/1988, que prima pela proteção do Trabalhador Segurado da Previdência Social, motivo pelo qual os pleitos previdenciários devem ser julgados no sentido de amparar a parte hipossuficiente e que, por esse motivo, possui proteção legal que lhe garante a flexibilização dos rígidos institutos processuais. Assim, deve-se procurar encontrar na hermenêutica previdenciária a solução que mais se aproxime do caráter social da Carta Magna, a fim de que as normas processuais não venham a obstar a concretude do direito fundamental à prestação previdenciária a que faz jus o segurado. 3. Assim como ocorre no Direito Sancionador, em que se afastam as regras da processualística civil em razão do especial garantismo conferido por suas normas ao indivíduo, deve-se dar prioridade ao princípio da busca da verdade real, diante do interesse social que envolve essas demandas. 4. A concessão de benefício devido ao trabalhador rural configura direito subjetivo individual garantido constitucionalmente, tendo a CF/88 dado primazia à função social do RGPS ao erigir como direito fundamental de segunda geração o acesso à Previdência do Regime Geral; sendo certo que o trabalhador rural, durante o período de transição, encontra-se constitucionalmente dispensado do recolhimento das contribuições, visando à universalidade da cobertura previdenciária e a inclusão de contingentes desassistidos por meio de distribuição de renda pela via da assistência social. 5. A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa. 6. Recurso Especial do INSS desprovido". (REsp 1352721/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, CORTE ESPECIAL, julgado em 16/12/2015, DJe 28/04/2016). Analiso os demais períodos pleiteados como trabalho especial. Durante as atividades realizadas pelo requerente na Fazenda Recanto, no período de 01/05/1969 a 30/09/1973, consoante o formulário de fl. 107, o autor desempenhou a atividade de tratorista e, portanto, enquadrando-se no Código 2.4.4 do Quadro Anexo do Decreto 53.831/64 e no Código 2.4.2 do Anexo II do Decreto 83.080/79, por ser esta atividade equiparada a de motorista. A corroborar a possibilidade de enquadramento como atividade especial, pela categoria profissional, incluído, por equiparação, o "tratorista", colaciono abaixo o julgado desta E. Corte: "PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. APOSENTADORIA ESPECIAL. NULIDADE. CERCEAMENTO DE DEFESA NÃO CONFIGURADO. ATIVIDADE ESPECIAL COMO MOTORISTA E TRATORISTA. POSSIBILIDADE. REQUISITOS AO BENEFÍCIO NÃO PREENCHIDOS. AGRAVO RETIDO NÃO PROVIDO. APELAÇÕES E REMESSA OFICIAL, TIDA POR INTERPOSTA, PARCIALMENTE PROVIDAS. - Não há cerceamento de defesa, pois a parte autora detém os ônus de comprovar a veracidade dos fatos constitutivos de seu direito, por meio de prova suficiente e segura, nos termos do artigo 373, I, do NCPC/2015. - O tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum, observada a legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado. Além disso, os trabalhadores assim enquadrados poderão fazer a conversão dos anos trabalhados a "qualquer tempo", independentemente do preenchimento dos requisitos necessários à concessão da aposentadoria. (...) - Quanto ao labor exercido na função de tratorista, é possível o reconhecimento de sua natureza especial apenas pelo enquadramento profissional (até 5/3/1997), pois a jurisprudência dominante a equipara a de motorista de ônibus ou motorista de caminhão. Nesse sentido: TRF3; 10ª Turma; AC nº 00005929820004039999; Relator Des. Federal Sérgio Nascimento; DJU 16.11.2005. - A parte autora logrou comprovar, via perfis profissiográficos e LTCAT, exposição habitual e permanente a níveis de ruído acima dos limites de tolerância para a época de prestação do serviço (90 db até 17/11/2003; 85 db a partir de 18/11/2003), como "guincheiro", "motorista de caminhão", de ônibus e "operador de máquinas agrícolas", situação que permite o enquadramento nos códigos 2.4.4 do anexo ao Decreto n. 53.831/64 e 2.4.2 do anexo ao Decreto n. 83.080/79. - Ausentes os requisitos insculpidos no artigo 57 da Lei n. 8.213/91, que estabelece 25 anos de atividade insalutífera à concessão da aposentadoria especial. - Em vista da sucumbência recíproca, ficam as partes condenadas a pagar honorários ao advogado da parte contrária, arbitrados em 5% (cinco por cento) sobre o valor atualizado da causa, conforme critérios do artigo 85, caput e § 14, do Novo CPC. Suspensa a exigibilidade, segundo a regra do artigo 98, § 3º, do mesmo código, por ser a parte autora beneficiária da justiça gratuita. - Referentemente às custas processuais, no Estado de São Paulo, delas está isenta a Autarquia Previdenciária, a teor do disposto nas Leis Federais n. 6.032/74, 8.620/93 e 9.289/96, bem como nas Leis Estaduais n. 4.952/85 e 11.608/03. Contudo, tal isenção não exime a Autarquia Previdenciária do pagamento das custas e despesas processuais em restituição à parte autora, por força da sucumbência, na hipótese de pagamento prévio. - Agravo retido não provido. Apelações e remessa oficial, tida por interposta, parcialmente providas." (TRF 3ª Região, NONA TURMA, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1715227 - 0004036-22.2012.4.03.9999, Rel. JUIZ CONVOCADO RODRIGO ZACHARIAS, julgado em 01/08/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:16/08/2016 ) Quanto aos períodos laborados pelo requerente de 07/03/1979 a 31/08/1985, 23/04/1986 a 15/12/1986, 19/06/1991 a 05/07/1993, 08/02/1995 a 02/04/1997, 03/04/1997 a 22/04/1998, 01/06/2005 a 14/11/2005 e 10/11/2009 a 31/08/2010, consoante os formulários, laudos periciais e Perfis Profissiográficos Previdenciários apresentados nos autos, com indicação dos responsáveis pelos registros ambientais e pela monitoração biológica (fls. 108/110, 111/115, 117/120, 121/122, 123/124, 132 e verso, 133/134), o requerente estava exposto a ruído de: a) 86,1dB; b) 86dB; c) 82dB; d) 95,2 dB; e) 95,2 dB; f) 85,6 dB; e g) 86dB. A medição atestada, em todos os casos, demonstrou-se superior ao limite de tolerância legal à época da prestação dos serviços, justificando admitir tais períodos como especiais. Já com relação aos interregnos trabalhados pelo autor de 02/05/1998 a 21/12/1998, 12/04/1999 a 20/08/1999, 24/08/1999 a 29/10/2004 e 04/10/2010 “até a presente data”, nos termos dos Perfis Profissiográficos Previdenciários, laudos periciais e formulários trazidos a juízo (fls. 125, 126, 127/130 e 135/137), o postulante estava exposto a ruído de: a) 85,6dB; b) 84,4dB; c)83dB e d)81,37dB. Em tais situações, resta afastada a especialidade, tendo em vista que a pressão sonora a que estava exposto o requerente é inferior ao limite legal de tolerância fixado pela legislação durante o exercício de suas atividades. Cumpre verificar, ainda, que também foi provada a submissão a pressão sonora insalubre (86,8dB) nos períodos trabalhados como autônomo pelo requerente, de 01/04/1988 a 31/03/1989, 01/01/1991 a 31/01/1992, 01/12/2006 a 31/03/2007, 01/05/2007 a 31/05/2007 e 01/03/2008 a 31/03/2008, consoante os PPPs apresentados, com indicação do responsável pelos registros ambientais. Por outro lado, quanto aos demais períodos mencionados na inicial, não foram apresentadas provas quanto ao exercício de atividade insalubre por parte do requerente, cabendo frisar que o mero exercício da profissão de mecânico não está enquadrado pela legislação como atividade passível de caracterização como trabalho especial. Assim sendo, à vista do conjunto probatório, enquadrados como especiais os períodos de 01/05/1969 a 30/09/1973, 07/03/1979 a 31/08/1985, 23/04/1986 a 15/12/1986, 01/04/1988 a 31/03/1989, 01/01/1991 a 31/01/1992, 19/06/1991 a 05/07/1993, 08/02/1995 a 02/04/1997, 03/04/1997 a 22/04/1998, 01/06/2005 a 14/11/2005, 01/12/2006 a 31/03/2007, 01/05/2007 a 31/05/2007, 01/03/2008 a 31/03/2008 e 10/11/2009 a 31/08/2010. Consoante planilha anexa, somando-se a especialidade reconhecida nesta demanda, verifica-se que o autor contava com 20 anos e 14 dias de atividade desempenhada em condições especiais no momento do requerimento administrativo (DIB 08/10/2010 – fl. 30), portanto, tempo insuficiente para fazer jus à aposentadoria especial, nos termos do artigo 57 da Lei nº. 8.213/1991. Acresça-se, ainda, ser possível a conversão do tempo especial em comum, independentemente da data do exercício da atividade especial, conforme se extrai da conjugação das regras dos arts. 28 da Lei nº 9.711/98 e 57, § 5º, da Lei nº 8.213/91. Observa-se que o fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, nos termos do art. 70 do Decreto nº 3.048/99, conforme orientação sedimentada no E. Superior Tribunal de Justiça, in verbis: PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. CONVERSÃO DO TEMPO DE SERVIÇO EXERCIDO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS PARA COMUM. FATOR DE CONVERSÃO. INCIDÊNCIA DO DECRETO N. 4.827/2003, QUE ALTEROU O ART. 70 DO DECRETO N. 3.048/1999. MATÉRIA DECIDIDA SOB O RITO DO ART. 543-C DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. AGRAVO DESPROVIDO. 1. "A Terceira Seção desta Corte, no julgamento do REsp.1.151.363/MG, representativo da controvérsia, realizado em 23.3.2011 e de relatoria do douto Ministro JORGE MUSSI, firmou o entendimento de que, de acordo com a alteração dada pelo Decreto 4.827/2003 ao Decreto 3.048/99, a conversão dos períodos de tempo especial desenvolvidos em qualquer época será realizada de acordo com as novas regras da tabela definida no artigo 70 que, para o tempo de serviço especial correspondente a 25 anos, utiliza como fator de conversão, para homens, o multiplicador 1,40". (AgRg no REsp n. 1.080.255/MG, Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, DJe 15.04.2011) 2. Agravo regimental desprovido. (AgRg no REsp 1172563/MG, Rel. Ministro VASCO DELLA GIUSTINA (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/RS), SEXTA TURMA, julgado em 16/06/2011, DJe 01/07/2011) (grifos nossos). A aposentadoria por tempo de contribuição encontra-se atualmente prevista no art. 201, §7º, I, da Constituição Federal, o qual dispõe: § 7º É assegurada aposentadoria no regime geral de previdência social, nos termos da lei, obedecidas as seguintes condições: I - trinta e cinco anos de contribuição, se homem, e trinta anos de contribuição, se mulher; Somando-se a atividade especial reconhecida nesta demanda aos demais períodos constantes no CNIS e na CTPS do autor, verifica-se que a parte autora contava com 39 anos, 7 meses e 10 dias de tempo de serviço na data do requerimento administrativo (DIB 08/10/2010 – fl. 30), o que lhe assegura o direito à aposentadoria integral por tempo de contribuição, não havendo que se falar em aplicação do requisito etário, nos termos do art. 201, § 7º, inciso I, da Constituição Federal. O requisito carência restou também completado. O termo inicial do benefício deve ser fixado na data do requerimento administrativo (DIB 08/10/2010 – fl. 30). A correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento. Os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, devem ser fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante. Quanto aos honorários advocatícios, é inegável que as condenações pecuniárias da autarquia previdenciária são suportadas por toda a sociedade, razão pela qual a referida verba deve, por imposição legal, ser fixada moderadamente - conforme, aliás, preconizava o §4º, do art. 20 do CPC/73, vigente à época do julgado recorrido - o que restou perfeitamente atendido com o percentual de 10% (dez por cento), devendo o mesmo incidir sobre o valor das parcelas vencidas até a data da prolação da sentença, consoante o verbete da Súmula 111 do Superior Tribunal de Justiça. Isenta a Autarquia Securitária do pagamento de custas processuais. Diante do exposto, de ofício, anulo a r. sentença de 1º grau, por se tratar de provimento condicional e, com supedâneo no art. 1.013, §3º, II, do Código de Processo Civil, quanto ao pedido de reconhecimento do labor rural de 01/05/1964 a 30/04/1969, julgo extinto o processo, sem exame do mérito, em atenção ao determinado no REsp 1.352.721/SP, julgado na forma do art. 543-C do CPC/1973, e julgo parcialmente procedente a demanda, para admitir como tempos especiais os períodos de 01/05/1969 a 30/09/1973, 07/03/1979 a 31/08/1985, 23/04/1986 a 15/12/1986, 01/04/1988 a 31/03/1989, 01/01/1991 a 31/01/1992, 19/06/1991 a 05/07/1993, 08/02/1995 a 02/04/1997, 03/04/1997 a 22/04/1998, 01/06/2005 a 14/11/2005, 01/12/2006 a 31/03/2007, 01/05/2007 a 31/05/2007, 01/03/2008 a 31/03/2008 e 10/11/2009 a 31/08/2010, e condenar o INSS na implantação da aposentadoria por tempo de contribuição, a partir da data do requerimento administrativo (08/10/2010), sendo que sobre os valores em atraso incidirá correção monetária de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e juros de mora até a expedição do ofício requisitório, de acordo com o mesmo Manual, condenando-o, ainda, no pagamento dos honorários advocatícios, arbitrados no montante de 10% sobre o valor das parcelas vencidas até a data da prolação da sentença, restando prejudicada a análise das apelações da parte autora e do INSS. Encaminhe-se a mídia à Subsecretaria da Turma para descarte após a interposição de recurso excepcional ou a certificação do trânsito em julgado. É como voto.
Advogado do(a) APELANTE: FILIPE BRICKMANN ARENO - SP183382-C
Advogado do(a) APELADO: FILIPE BRICKMANN ARENO - SP183382-C
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL OU POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. LEI Nº 8.213/1991. SENTENÇA CONDICIONAL. NULIDADE. ATIVIDADE RURAL. AUSÊNCIA DE INÍCIO DE PROVA MATERIAL. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. ATIVIDADE ESPECIAL. RUÍDO. TRATORISTA. CONJUNTO PROBATÓRIO. ADMISSÃO PARCIAL. TEMPO INSUFICIENTE PARA O BENEFÍCIO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO CONCEDIDA. DATA DE INÍCIO. DATA DO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. PEDIDO JULGADO PARCIALMENTE PROCEDENTE. APELAÇÕES PREJUDICADAS.
1 – Trata-se de pedido de concessão de aposentadoria especial ou por tempo de contribuição, mediante o cômputo de labor especial.
2 - Fixados os limites da lide pela parte autora, veda-se ao magistrado decidir além (ultra petita), aquém (citra petita) ou diversamente do pedido (extra petita), consoante o art. 492 do CPC/2015. Em sua decisão, o juiz a quo reconheceu tempo de serviço especial e apenas determinou à autarquia que promovesse a recontagem do tempo de contribuição do requerente e somente implantasse o benefício desde que atingido o tempo suficiente para a sua obtenção, portanto, condicionando a sua concessão à análise do INSS. Desta forma, está-se diante de sentença condicional, restando violado o princípio da congruência insculpido no art. 460 do CPC/73, atual art. 492 do CPC/2015.
3 - O caso, entretanto, não é de remessa dos autos à 1ª instância, uma vez que a legislação autoriza expressamente o julgamento imediato do processo quando presentes as condições para tanto. É o que se extrai do art. 1.013, § 3º, II, do Código de Processo Civil. Considerando que a causa encontra-se madura para julgamento - presentes os elementos necessários ao seu deslinde - e que o contraditório e a ampla defesa restaram assegurados - com a citação válida do ente autárquico - e, ainda, amparado pela legislação processual aplicável, passa-se ao exame do mérito da demanda.
4 - O pedido formulado pela parte autora encontra previsão legal, especificamente na Lei de Benefícios. Assim, devidamente inserido no Sistema Previdenciário, não há que se falar em ausência de custeio, desde que preenchidos os requisitos previstos na vasta legislação aplicável à matéria.
5 - A aposentadoria especial foi instituída pelo artigo 31 da Lei n. 3.807, de 26.08.1960 (Lei Orgânica da Previdência Social, LOPS). Sobreveio a Lei n. 5.890, de 08.06.1973, que revogou o artigo 31 da LOPS, e cujo artigo 9º passou regrar esse benefício. A benesse era devida ao segurado que contasse 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a atividade profissional, de serviços para esse efeito considerados penosos, insalubres ou perigosos, por decreto do Poder Executivo.
6 - O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a agentes nocivos. Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais, agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os grupos profissionais.
7 - Logo, até a edição da Lei nº 9.032/95, era possível o reconhecimento da atividade especial: (a) com base no enquadramento na categoria profissional, desde que a atividade fosse indicada como perigosa, insalubre ou penosa nos anexos dos Decretos nº 53.831/64 ou 83.080/79 (presunção legal); ou (b) mediante comprovação da submissão do trabalhador, independentemente da atividade ou profissão, a algum dos agentes nocivos, por qualquer meio de prova, exceto para ruído e calor.
8 - A apresentação de laudo pericial, Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP ou outro formulário equivalente para fins de comprovação de tempo de serviço especial, somente passou a ser exigida a partir de 06.03.1997 (Decreto nº. 2.172/97), exceto para os casos de ruído e calor, em que sempre houve exigência de laudo técnico para verificação do nível de exposição do trabalhador às condições especiais.
9 - Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
10 - Considera-se insalubre a exposição ao agente ruído acima de 80dB, até 05/03/1997; acima de 90dB, no período de 06/03/1997 a 18/11/2003; e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.
11 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição, substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo laborado em condições especiais.
12 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF 3º Região.
13 - A desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que, ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
14 - Vale frisar que a apresentação de laudos técnicos de forma extemporânea não impede o reconhecimento da especialidade, eis que de se supor que, com o passar do tempo, a evolução da tecnologia tem aptidão de redução das condições agressivas. Portanto, se constatado nível de ruído acima do permitido, em períodos posteriores ao laborado pela parte autora, forçoso concluir que, nos anos anteriores, referido nível era superior.
15 - Como pretensas provas do labor rural do autor, foram apresentadas pelo requerente declarações de exercício de atividades, datadas dos anos de 2002 e 2004, emitidas pelos “proprietários da Fazenda Recanto” (fls. 31 e 35). Também foram colacionadas em companhia da inicial a matrícula do imóvel referido (fls. 33/34), bem como o registro do postulante como empregado, com vínculo anotado de 01/10/1969, na função de tratorista, além de recibos do pagamento do 13º salário e férias nos anos 1970 até 1976 e 1979 (fls. 42/49).
16 - A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período que se pretende reconhecer é descabida. No entanto, tais documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado (01/05/1964 a 30/04/1969), no sentido de que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
17 - Em outras palavras, exige-se a apresentação de documentos datados da época dos fatos discutidos, ou seja, apresenta-se inválida para tal desiderato a documentação que antecede ou sucede o período da alegada atividade campesina, como ocorrido na situação em apreço.
18 - Cumpre ressaltar que o art. 55, §3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal. Nesse sentido foi editada a Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça.
19 - Ademais, cumpre verificar que a informação de fl. 39, que supostamente informa o recebimento de salário em 01/05/1964, sequer traz como referência o seu nome, portanto, não podendo vincular tal documento ao requerente. E, ainda que isso fosse possível, não teria sentido a admissão da condição de trabalhador rural em regime de economia familiar para quem foi registrado como empregado.
20 - Desta feita, fica afastado o reconhecimento do alegado labor rural no período de 01/05/1964 a 30/04/1969, o que impossibilita, consequentemente, a admissão da especialidade.
21 - Entretanto, diante da ausência de início razoável de prova material, imperiosa a extinção da demanda, sem resolução do mérito, a fim de possibilitar a propositura de nova ação, caso o requerente venha a conseguir documentos que comprovem o labor desenvolvido na qualidade de rurícola no período alegado.
22 - Durante as atividades realizadas pelo requerente na Fazenda Recanto, no período de 01/05/1969 a 30/09/1973, consoante o formulário de fl. 107, o autor desempenhou a atividade de tratorista e, portanto, enquadrando-se no Código 2.4.4 do Quadro Anexo do Decreto 53.831/64 e no Código 2.4.2 do Anexo II do Decreto 83.080/79, por ser esta atividade equiparada a de motorista. Precedente.
23 - Quanto aos períodos laborados pelo requerente de 07/03/1979 a 31/08/1985, 23/04/1986 a 15/12/1986, 19/06/1991 a 05/07/1993, 08/02/1995 a 02/04/1997, 03/04/1997 a 22/04/1998, 01/06/2005 a 14/11/2005 e 10/11/2009 a 31/08/2010, consoante os formulários, laudos periciais e Perfis Profissiográficos Previdenciários apresentados nos autos, com indicação dos responsáveis pelos registros ambientais e pela monitoração biológica (fls. 108/110, 111/115, 117/120, 121/122, 123/124, 132 e verso, 133/134), o requerente estava exposto a ruído de: a) 86,1dB; b) 86dB; c) 82dB; d) 95,2 dB; e) 95,2 dB; f) 85,6 dB; e g) 86dB. A medição atestada, em todos os casos, demonstrou-se superior ao limite de tolerância legal à época da prestação dos serviços, justificando admitir tais períodos como especiais.
24 - Já com relação aos interregnos trabalhados pelo autor de 02/05/1998 a 21/12/1998, 12/04/1999 a 20/08/1999, 24/08/1999 a 29/10/2004 e 04/10/2010 “até a presente data”, nos termos dos Perfis Profissiográficos Previdenciários, laudos periciais e formulários trazidos a juízo (fls. 125, 126, 127/130 e 135/137), o postulante estava exposto a ruído de: a) 85,6dB; b) 84,4dB; c)83dB e d)81,37dB. Em tais situações, resta afastada a especialidade, tendo em vista que a pressão sonora a que estava exposto o requerente é inferior ao limite legal de tolerância fixado pela legislação durante o exercício de suas atividades.
25 - Cumpre verificar, ainda, que também foi provada a submissão a pressão sonora insalubre (86,8dB) nos períodos trabalhados como autônomo pelo requerente, de 01/04/1988 a 31/03/1989, 01/01/1991 a 31/01/1992, 01/12/2006 a 31/03/2007, 01/05/2007 a 31/05/2007 e 01/03/2008 a 31/03/2008, consoante os PPPs apresentados, com indicação do responsável pelos registros ambientais.
26 - Por outro lado, quanto aos demais períodos mencionados na inicial, não foram apresentadas provas quanto ao exercício de atividade insalubre por parte do requerente, cabendo frisar que o mero exercício da profissão de mecânico não está enquadrado pela legislação como atividade passível de caracterização como trabalho especial.
27 - Assim sendo, à vista do conjunto probatório, enquadrados como especiais os períodos de 01/05/1969 a 30/09/1973, 07/03/1979 a 31/08/1985, 23/04/1986 a 15/12/1986, 01/04/1988 a 31/03/1989, 01/01/1991 a 31/01/1992, 19/06/1991 a 05/07/1993, 08/02/1995 a 02/04/1997, 03/04/1997 a 22/04/1998, 01/06/2005 a 14/11/2005, 01/12/2006 a 31/03/2007, 01/05/2007 a 31/05/2007, 01/03/2008 a 31/03/2008 e 10/11/2009 a 31/08/2010.
28 - Somando-se a especialidade reconhecida nesta demanda, verifica-se que o autor contava com 20 anos e 14 dias de atividade desempenhada em condições especiais no momento do requerimento administrativo (DIB 08/10/2010 – fl. 30), portanto, tempo insuficiente para fazer jus à aposentadoria especial, nos termos do artigo 57 da Lei nº. 8.213/1991.
29 – É possível a conversão do tempo especial em comum, independentemente da data do exercício da atividade especial, consoante o disposto nos arts. 28 da Lei nº 9.711/98 e 57, § 5º, da Lei nº 8.213/91.
30 - O fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, nos termos do art. 70 do Decreto nº 3.048/99, conforme orientação sedimentada no E. Superior Tribunal de Justiça.
31 - Somando-se a atividade especial reconhecida nesta demanda aos demais períodos constantes no CNIS e na CTPS do autor, verifica-se que a parte autora contava com 39 anos, 7 meses e 1o dias de tempo de serviço na data do requerimento administrativo (DIB 08/10/2010 – fl. 30), o que lhe assegura o direito à aposentadoria integral por tempo de contribuição, não havendo que se falar em aplicação do requisito etário, nos termos do art. 201, § 7º, inciso I, da Constituição Federal.
32 - O requisito carência restou também completado.
33 - O termo inicial do benefício deve ser fixado na data do requerimento administrativo (DIB 08/10/2010 – fl. 30).
34 - Correção monetária dos valores em atraso calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
35 - Juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante.
36 - Quanto aos honorários advocatícios, é inegável que as condenações pecuniárias da autarquia previdenciária são suportadas por toda a sociedade, razão pela qual a referida verba deve, por imposição legal, ser fixada moderadamente - conforme, aliás, preconizava o §4º, do art. 20 do CPC/73, vigente à época do julgado recorrido - o que restará perfeitamente atendido com o percentual de 10% (dez por cento), devendo o mesmo incidir sobre o valor das parcelas vencidas até a data da prolação da sentença, consoante o verbete da Súmula 111 do Superior Tribunal de Justiça.
37 - Isenta a Autarquia Securitária do pagamento de custas processuais.
38 – Sentença anulada. Extinção do processo sem resolução do mérito quanto ao pedido rural. Pedido julgado parcialmente procedente. Apelações prejudicadas.