APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 0001983-75.2001.4.03.6112
RELATOR: Gab. 14 - DES. FED. MARCELO SARAIVA
APELANTE: DIEGO RAFAEL PEIXOTO DINIS, UNIÃO FEDERAL
REPRESENTANTE: ROSA MONICA DOS SANTOS PEIXOTO
Advogado do(a) APELANTE: EVANDRO FERRARI - SP148445,
APELADO: DIEGO RAFAEL PEIXOTO DINIS, UNIÃO FEDERAL
REPRESENTANTE: ROSA MONICA DOS SANTOS PEIXOTO
Advogado do(a) APELADO: EVANDRO FERRARI - SP148445,
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO (1728) Nº 0001983-75.2001.4.03.6112 RELATOR: Gab. 14 - DES. FED. MARCELO SARAIVA APELANTE: DIEGO RAFAEL PEIXOTO DINIS, UNIAO FEDERAL Advogado do(a) APELANTE: EVANDRO FERRARI - SP148445, APELADO: DIEGO RAFAEL PEIXOTO DINIS, UNIAO FEDERAL Advogado do(a) APELADO: EVANDRO FERRARI - SP148445, OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de Ação Ordinária, proposta por Diego Rafael Peixoto Dinis, então menor impúbere, representado por sua genitora, Rosa Mônica dos Santos Peixoto, pela qual intenta a percepção de indenização por danos materiais e morais. Informa que, entre os dias 18 a 23 de janeiro de 1999, o recinto de exposições do município de Presidente Prudente/SP foi utilizado para curso de treinamento de agentes da Polícia Federal, durante o qual foram utilizadas bombas de efeito moral; que, após ministrado o curso, algumas granadas permaneceram dentro de uma casa improvisada ou "refeitório" que há no local, o qual teria permanecido aberto ante a necessidade de que o gás se dissipasse; que o autor, entrando no recinto e sem saber do que se tratavam os artefatos, retirou um exemplar do local e, diante de seus amigos, retirou o pino, o que provocou a detonação e, consequentemente, vários ferimentos em si, fazendo-se necessária inclusive a amputação de dedos de sua mão esquerda. Alega que há legitimidade passiva da União, uma vez que o curso foi realizado em razão de ato administrativo de Delegado da Polícia Federal, órgão permanente mantido pela União Federal, nos termos do art. 144, §1º, da CF/88; que a conduta dos agentes atrai o disposto pelo art. 37, §6º, da CF/88, tratando-se da Responsabilidade Civil Objetiva do Estado; que o autor sofreu danos materiais, morais e estéticos, com diminuição de sua capacidade de estudo e de trabalho. Juntou documentos (fls. 35 a 73). A União Federal, em sua contestação (fls. 79 a 103), argumentou se impor a suspensão do processo, haja vista Ação Penal em curso, configurando-se prejudicialidade externa heterogênea; que, conforme foi apurado em Inquérito Policial, não é possível afirmar que algum dos agentes tenha deixado a casa aberta após sua utilização; que o avô do autor, zelador do espaço, teria entrado na casa, deixando-a destrancada; que se trata de culpa exclusiva da vítima, pois, ainda que menor de idade, ciente do perigo que representa uma bomba; em não se admitindo a culpa da vítima, que se trata de culpa de terceiro, especificamente do avô do autor; que não há nexo causal entre quaisquer atos praticados pelos agentes e os danos sofridos, não se tratando de dano "direto e imediato"; que, excetuando-se a lesão corporal, a ação contempla causa de pedir e pedido hipotéticos, portanto não indenizáveis; que o autor não comprovou o alegado, ônus que lhe cabia, nos termos do art. 333, I, do Código de Processo Civil de 1973; que a indenização deve ser arbitrada de maneira equilibrada, não viabilizando o enriquecimento sem causa; que há confusão entre certos aspectos dos pedidos relativos aos danos materiais e morais. Juntou documentos (fls. 104 a 129). O autor apresentou réplica (fls. 131 a 148). Documentos adicionais juntados pelo autor (fls. 154 a 156). A União juntou cópia da decisão que rejeitou a denúncia (fls. 166 a 169). Determinada a produção de provas periciais de cunho ortopédico, estético, fisioterápico e psicológico, com apresentação de quesitos pelo Juízo de origem (fls. 177); quesitos pelo autor (fls. 183 a 185); quesitos pela União Federal (fls. 197 a 202), além de carreados documentos relativos à vida escolar do autor (fls. 204 a 207). Apresentado laudo da Perícia Fisioterápica (fls. 254 a 265); manifestada concordância pelo assistente técnico da União Federal (fls. 269); impugnação parcial pela parte autora (fls. 270, 271); apresentados esclarecimentos periciais (fls. 278). Determinada a realização de perícia médico-ortopédica, com apresentação de quesitos pelo Juízo de origem (fls. 292); quesitos pelo autor (fls. 294, 295); quesitos pela União Federal (fls. 306, 307). Apresentado laudo da Perícia Psicológica (fls. 341 a 345); manifestada concordância pela parte autora (fls. 348 a 351); impugnação parcial pela União Federal (fls. 354, 355); parecer do assistente técnico da União (fls. 361 a 363); apresentados esclarecimentos periciais (fls. 369, 370); impugnados pela União Federal os esclarecimentos (fls. 391 a 393); parecer da assistente técnica da União (fls. 394 a 396). Apresentado laudo da Perícia Ortopédica (fls. 383 a 389); pedido de esclarecimentos pela União Federal (fls. 417, 418); parecer do assistente técnico da União Federal (fls. 426); manifestação de concordância pela parte autora (fls. 430 a 432); apresentados esclarecimentos periciais (fls. 438 a 440). Deferida a produção de prova testemunhal, depôs o autor (fls. 466, 467) e ouvidas as testemunhas da ré (fls. 468 a 471, 497 a 499). A parte autora apresentou suas alegações finais (fls. 506 a 514). O Ministério Público Federal, em seu parecer (fls. 516 a 525), opinou pela procedência total da ação, devendo a União ser condenada a pagar indenização por danos morais e materiais, entre os últimos incluídos "o que a vítima efetivamente perdeu, o que despendeu, o que deixou de ganhar em consequência direta e imediata do ato lesivo do Poder Público, ou seja, deverá ser indenizada nos danos emergentes e lucros cessantes". A União Federal apresentou suas alegações finais (fls. 527 a 553). Na sentença (fls. 555 a 567), o MM Juízo a quo entendeu restar prejudicada a preliminar de prejudicialidade externa heterogênea, dada a rejeição da denúncia oferecida pelo Ministério Público, de qualquer modo sendo a responsabilidade civil independente da criminal, nos termos do art. 935 do Código Civil, afastando-se a responsabilidade civil somente se caracterizada alguma das hipóteses excludentes de responsabilidade, quais sejam, caso fortuito, força maior ou culpa exclusiva da vítima. Quanto ao mérito, consignou que a permanência de bomba no interior do recinto utilizado para o treinamento torna evidente a relação de causa e efeito entre a atuação de agentes do Estado e os danos sofridos, ou seja, o nexo casual entre um e outro; que incide à hipótese o disposto pelo art. 37, §6º, da CF/88; que não se pode cogitar em culpa exclusiva ou mesmo concorrente da vítima, em se tratando de menor impúbere; que a Doutrina e a Jurisprudência distinguem o dano material do estético, arbitrando indenização referente a ambos em R$35.000,00 (trinta e cinco mil reais), equivalentes a 100 vezes o salário mínimo vigente na data da sentença; que a redução, em definitivo, de sua capacidade laboral deverá ser compensada pelo pagamento de pensão ressarcitória, a ser paga a partir dos 18 anos de idade, quando o autor presumivelmente adentraria o mercado de trabalho, até os 65 anos de idade, devendo corresponder a "20% do provável salário, ou seja, R$210,00 (duzentos e dez reais), por mês, dos 18 aos 65 anos de idade, incluídos lucros cessantes"; que é indevida indenização à título de danos emergentes - decorrentes de despesas diretas advindas do evento - pois não comprovados; que não há prova de queda de rendimento escolar, não sendo carreados aos autos boletins anteriores ao fato. Destarte, julgou parcialmente procedente o pedido para condenar a União Federal a pagar ao autor, a título de indenização por danos morais e estéticos, o valor de R$35.000,00 (trinta e cinco mil reais) e, a título de danos materiais, 20% do valor correspondente a três salários mínimos - presumível renda mensal advinda de sua atividade laborativa, por mês, dos 18 até os 65 anos de idade, devendo ser pagas as parcelas em atraso de uma só vez, corrigidas mês a mês, de cada vencimento até a data do efetivo pagamento, nos termos do Provimento 64/2005 da Corregedoria-Geral da Justiça Federal da 3ª Região; incidentes juros moratórios de 1% ao mês a contar da data do evento danoso, nos termos da Súmula 54/STJ. Declarada a sucumbência recíproca. Determinada a Remessa Oficial. Diego Rafael Peixoto Dinis, representado por sua genitora, Rosa Mônica dos Santos Peixoto, em suas razões de Apelação (fls. 571 a 585), argumenta que deve ser levada em conta a duração de sua vida segundo os critérios do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE, isto é, havendo expectativa de vida até os 71,1 anos de idade; que que, por analogia ao Auxílio-Acidente, conforme disposto pelo art. 104, §1º, do Decreto 3.048/99, devendo a União ser condenada a pagar indenização mensal por lucros cessantes equivalente a 50% sobre valor correspondente a 3,69 salários mínimos; que deve ser majorada a 2.000 salários mínimos a indenização arbitrada a título de danos morais e estéticos; que devem ser majorados os honorários advocatícios a 20% do montante da condenação. A União Federal, em suas razões de Apelação (fls. 589 a 613), reitera não se verificar nexo causal entre a conduta de agentes estatais e os danos sofridos, que se deveram a conduta de terceiro, conclusão reforçada pela rejeição da denúncia criminal ofertada pelo Ministério Público do Estado de São Paulo; que na hipótese de dano ocasionado por omissão estatal deve ser aplicada a teoria da Responsabilidade Subjetiva, de maneira que o Estado somente deve ser responsabilizado se a ele coubesse impedir o dano; que a indenização referente a danos morais e estéticos deve ser inferior, pois o valor arbitrado equivale às indenizações em hipótese de morte ou incapacidade total e permanente; que, ante a impossibilidade de quantificar qual seria o rendimento mensal, os Tribunais tendem a considerar como valor médio o valor do salário mínimo vigente, e não três salários mínimos, conforme estabelecido pelo Juízo de origem - ou, alternativamente, que a perda de capacidade laborativa do autor deve incidir sobre os valores de renda média estabelecidos pelo IBGE; que a redução da capacidade laboral do autor não foi adequadamente aquilatada, não sendo superior a 15%, conforme laudo pericial (fls. 440), de maneira que o valor máximo da pensão mensal a ser fixada não poderia ser superior a R$52,50 (cinquenta e dois reais e cinquenta centavos); que não se deve partir do pressuposto de que toda pessoa está apta a desempenhar quaisquer atividades, pois, se por um lado há uma aptidão, por outro são conhecidos casos de pessoas que, não obstante suas debilidades, executam perfeitamente atividades complexas; que as funções fundamentais da mão do autor restaram preservadas; que não há que se falar em juros moratórios sobre a indenização por dano moral antes da sentença, por inexistir atraso, o mesmo ocorrendo em relação aos dano materiais, pois a pensão mensal deve incidir apenas quando completados 18 anos de idade pelo autor, o que não havia ocorrido quando do apelo; que não devem incidir juros de mora à taxa de 1% ao mês, devendo ser aplicado o disposto pelo art. 1º-F da Lei 9.494/97, isto é, taxa de 6% ao ano; que, reformada a sentença, deve a parte autora ser condenada em honorários. A União Federal, em suas contrarrazões (fls. 616 a 632), diz que a parte autora inova em seu apelo, ao requerer que a pensão deve ser paga até os seus 71,1 anos de idade; que pacífica a jurisprudência do STJ quanto a limitar o pagamento de pensão em casos de responsabilidade civil aos 65 anos de idade, sendo ainda considerada a idade mínima para Aposentadoria por Tempo de Contribuição, nos termos do art. 201, §7º, II, da CF/88 - e, uma vez aposentado, não mais constituirá óbice ao autor sua limitação laborativa; que a indenização se mede pelo dano, nos termos do art. 944 do Código Civil, não sendo cabível analogia ao disposto em relação ao Auxílio-Acidente; que a redução da capacidade laborativa foi avaliada em 15%; que o valor médio da pensão deve ter por base 1 salário mínimo; que a indenização por dano moral não deve ser majorada, sob pena de se configurar enriquecimento sem causa; que o pedido de reforma da sentença em relação aos honorários apenas foi formulado em aditamento ao apelo, configurando-se a preclusão consumativa. Nesses termos, requer seja negado provimento ao apelo. Sem contrarrazões pela parte autora. Feita vista dos autos ao Ministério Público Federal (fls. 638), o órgão não opinou, não vislumbrando a necessidade de sua intervenção (fls. 640, 641). É o relatório.
REPRESENTANTE: ROSA MONICA DOS SANTOS PEIXOTO
REPRESENTANTE: ROSA MONICA DOS SANTOS PEIXOTO
DECLARAÇÃO DE VOTO Consoante se extrai do relatório, ora adotado, a matéria vertida nestes autos diz respeito à indenização por danos moral e material decorrente de alegada negligência de agentes públicos. E, da análise do voto do e. Relator, verifico que, considerando os elementos colacionados aos autos, e, em especial, as provas testemunhais produzidas, restou comprovado o dever de indenizar do Estado, em razão da comprovada negligência dos agentes públicos envolvidos no evento. Nesse contexto, acompanho o voto de Sua Excelência. Entretanto, divirjo no tocante aos valores fixados a título de indenização por danos moral e material, por considerar que, na espécie, houve culpa concorrente da vítima. Entendo que, embora a culpa concorrente da vítima não tenha o condão de excluir a responsabilidade estatal pelo evento verificado, deve ser levada em consideração no arbitramento dos valores devidos à parte lesada, à título de danos moral e material. E, na espécie, os mesmos elementos que serviram de convicção à responsabilização da União Federal, também dão conta de que houve negligência também do autor - menor de idade –,de seus responsáveis e de terceiros que também eram responsáveis pelo local onde ocorreu o evento. Assim é que, considerando a pouca idade do autor na data dos fatos – 9 anos - , incumbia à sua responsável legal o dever de diligência e guarda de seu filho, que jamais poderia estar brincando em local onde, sabidamente, houve treinamentos com bombas. Destaque-se que em depoimento prestado pelo autor, devidamente acompanhado por seu avô, informou perante a Delegacia de Polícia local que “adentrou dentro de uma casa ao lado do campo. Ardeu os olhos, porque “os policias" estouraram bomba lá dentro. (...) pegou uma bomba, que estava num balcão onde guarda comidas, na cozinha de referida casa. A casa estava aberta quando (...) nela adentrou.(...) pegou a bomba e saiu logo, porque seus olhos estavam ardendo. Depois foi para o campinho e em dado momento tirou o pino da bomba. Após ela fez um barulhinho, um estralo, e depois estourou com um barulhão, e (...) se machucou, tendo ferido a mão esquerda, além de outros ferimentos pelo corpo (...).” Tem-se, assim, que na hipótese dos autos, a própria vítima colocou-se em situação de risco ao brincar com o desconhecido, situação agravada pela ausência de vigilância que a lei impõe aos que possuíam a guarda dos menores e do local. Registre-se, a propósito, que o avô do autor – Armindo Peixoto – era zelador do lugar onde ocorreu o incidente, de modo que, pode-se dizer, também tinha o dever de cuidado, tanto para com o seu neto, como para o local dos fatos. Desta forma, entendo que a culpa não pode ser carreada, exclusivamente, ao ente estatal. Destarte, entendo, com a devida vênia, por excessiva a majoração da verba devida a título de danos morais ao autor para R$ 200.000,00 (duzentos mil reais), devendo a mesma ser reduzida à metade – R$ 100.000,00 (cem mil reais). No que diz respeito à indenização por danos materiais, a relatoria manteve o provimento recorrido, que fixou tal verba em 3 (três) salários mínimos. Entendo, porém, que, considerando a culpa concorrente da vítima, bem assim o fato de que a sequela sofrida pelo autor não o torna incapaz ao trabalho, arbitro tal verba em 1 (um) salário mínimo. Ante o exposto, DIVIRJO, em parte, do voto do e. Relator, tão somente quanto aos montantes fixados a título de danos moral e material, na forma acima fundamentada. Acompanho Sua Excelência nos demais termos. É o voto.
APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO (1728) Nº 0001983-75.2001.4.03.6112
RELATOR: Gab. 14 - DES. FED. MARCELO SARAIVA
APELANTE: DIEGO RAFAEL PEIXOTO DINIS, UNIAO FEDERAL
REPRESENTANTE: ROSA MONICA DOS SANTOS PEIXOTO
Advogado do(a) APELANTE: EVANDRO FERRARI - SP148445,
APELADO: DIEGO RAFAEL PEIXOTO DINIS, UNIAO FEDERAL
REPRESENTANTE: ROSA MONICA DOS SANTOS PEIXOTO
Advogado do(a) APELADO: EVANDRO FERRARI - SP148445,
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
É cediço que as esferas civil e criminal são independentes - independência essa de natureza relativa, porém: declarando a esfera penal a inexistência material de fato ou negativa de autoria, vinculada se encontra a esfera civil. Do mesmo modo, confirmadas a autoria e fato por sentença condenatória, é vedado à esfera civil contrariar o afirmado pela esfera criminal, nos termos do art. 935 do Código Civil.
No caso, no entanto, houve meramente a rejeição da denúncia oferecida pelo Ministério Público do Estado de São Paulo, pois, conforme exposto pelo magistrado competente, "a prova acusatória produzida ou requerida é mínima" (fls. 168); assim, não restou devidamente demonstrada a autoria, não se tratando propriamente de negativa de autoria, de modo a ser cabível a presente ação, a teor ainda dos art. 65 a 67 do Código de Processo Penal. Portanto, não há que se falar em prejudicialidade quanto à presente demanda.
Eis os dispositivos:
Art. 65. Faz coisa julgada no cível a sentença penal que reconhecer ter sido o ato praticado em estado de necessidade, em legítima defesa, em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito.
Art. 66. Não obstante a sentença absolutória no juízo criminal, a ação civil poderá ser proposta quando não tiver sido, categoricamente, reconhecida a inexistência material do fato.
Art. 67. Não impedirão igualmente a propositura da ação civil:
I - o despacho de arquivamento do inquérito ou das peças de informação;
II - a decisão que julgar extinta a punibilidade;
III - a sentença absolutória que decidir que o fato imputado não constitui crime.
Código Civil
Art. 935. A responsabilidade civil é independente da criminal, não se podendo questionar mais sobre a existência do fato, ou sobre quem seja o seu autor, quando estas questões se acharem decididas no juízo criminal.
Nesse sentido:
AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DEVER DE INDENIZAR AFASTADO TÃO SOMENTE POR INFLUÊNCIA DE COISA JULGADA PENAL QUE NADA DECIDIU SOBRE OS AGRAVANTES, OS QUAIS NEM SEQUER FORAM DENUNCIADOS. NULIDADE DA SENTENÇA QUE SE IMPÕE. NOVA DECISÃO DEVE SER PROFERIDA COM BASE NAS PROVAS DOS AUTOS. AGRAVO IMPROVIDO.
1. Preconiza o art. 935 do Código Civil que "a responsabilidade civil é independente da criminal, não se podendo questionar mais sobre a existência do fato, ou sobre quem seja o seu autor, quando estas questões se acharem decididas no juízo criminal". No caso, imperioso seja anulada a sentença cível que se utilizou apenas do desfecho dado ao processo penal para afastar a responsabilidade civil dos agravantes, os quais nem sequer foram denunciados na esfera criminal.
2. O que é defeso por força do disposto no art. 935 do Código Civil é tão somente que o Juízo cível contrarie a existência do fato e a autoria afirmadas pela Justiça criminal. Fora isso, conclusões outras acerca do dever dos agravantes de indenizar a agravada devem derivar do entendimento do julgador sobre a responsabilidade civil daqueles - a partir das provas a serem produzidas no processo -, sem nenhum vínculo de dependência com a compreensão alcançada pela Justiça penal, até mesmo porque, consoante já exaustivamente frisado, a ação penal em questão não absolveu os agravantes da prática do crime, afinal, estes não foram denunciados.
3. Agravo regimental a que se nega provimento.
(STJ, AgRg nos EDcl no AREsp 504470/PR, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, 3ª Turma, DJe 04.11.2014)
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL INDEPENDENTE DA RESPONSABILIDADE CRIMINAL. REEXAME DE PROVAS. DANO MORAL. REVISÃO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULAS 7 E 83/STJ. AGRAVO NÃO PROVIDO.
1. Tendo o processo penal sido extinto com fundamento em insuficiência de prova para a condenação (CPP, art. 386, VII), não há interferência na jurisdição cível, uma vez que a responsabilidade civil é independente da criminal. Precedentes.
(...)
(STJ, AgInt no REsp 1450560/SP, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, 4ª Turma, DJe 08.09.2016)
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA INDIVIDUAL. SERVIDOR PÚBLICO FEDERAL. POLICIAL RODOVIÁRIO FEDERAL. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. PENA DE DEMISSÃO. ARTS. 116, I, II E XI, 117, IX E XVI E 132, IV, DA LEI 8.112/1990. [...]
(...)
13. É firme o entendimento no âmbito do STJ no sentido de que a absolvição na esfera penal apenas repercute no âmbito administrativo se estiver baseada na negativa da autoria ou na inexistência do fato, hipóteses que não se verificam no caso, pois o impetrante foi absolvido por não existirem provas suficientes para a condenação (art. 386, VII, do CPP). Precedentes.
14. Segurança denegada.
(STJ, MS 20994/DF, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, 1ª Seção, DJe 06.06.2016)
Passo ao exame do mérito.
"Art. 37. (...)
(...)
§ 6º. As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável no caso de dolo ou culpa.
O aspecto característico da responsabilidade civil objetiva do Estado reside na desnecessidade da prova de dolo ou culpa do agente público ou do serviço, a qual fica restrita à hipótese de direito de regresso contra o responsável (responsabilidade civil subjetiva dos agentes), não abordada nestes autos.
ADMINISTRATIVO. CONSTITUCIONAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. DANOS MORAIS. "CASO MALATHION". PRESCRIÇÃO. NEXO DE CAUSALIDADE. NORMAS TÉCNICAS DE SEGURANÇA. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. IMPUGNAÇÃO GENÉRICA. REVISÃO DE FATOS E PROVAS. SÚMULA 7/STJ. QUANTIFICAÇÃO DOS DANOS MORAIS NÃO EXCESSIVA OU IRRISÓRIA. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. RECURSO NÃO CONHECIDO.
Omissis
4. Na responsabilidade objetiva, como é óbvio, desnecessária a prova de dolo ou culpa na conduta do agente. Longa e minuciosa instrução probatória indica participação determinante de preposto da Funasa no evento danoso, com ampla fundamentação da sentença e do acórdão recorrido a respeito.
Omissis
11. Recurso Especial não conhecido.
(STJ, REsp 1236863/ES, Rel. Ministro Herman Benjamin, 2ª Turma, DJe 27/02/2012)
A Doutrina e a Jurisprudência não são unânimes quanto ao trato da natureza da responsabilidade do Estado em caso de omissão. Embora assente ser objetiva a responsabilidade estatal por ato comissivo, relevante divergência tem sido levantada quando se trata de ato omissivo, para a qual exigida a comprovação do nexo de causalidade e do dolo ou da culpa, elementos atrelados à responsabilidade subjetiva. Conforme julgados abaixo colacionados, prevalece, no âmbito do Supremo Tribunal Federal, o entendimento de que o referido princípio constitucional se refere tanto à ação quanto à omissão.
CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL DAS PESSOAS PÚBLICAS. ATO OMISSIVO DO PODER PÚBLICO: LATROCÍNIO PRATICADO POR APENADO FUGITIVO. RESPONSABILIDADE SUBJETIVA : CULPA PUBLICIZADA: FALTA DO SERVIÇO. C.F., art. 37, § 6º.
I. - Tratando-se de ato omissivo do poder público, a responsabilidade civil por tal ato é subjetiva, pelo que exige dolo ou culpa, esta numa de suas três vertentes, a negligência, a imperícia ou a imprudência, não sendo, entretanto, necessário individualizá-la, dado que pode ser atribuída ao serviço público, de forma genérica, a falta do serviço.
II. - A falta do serviço - faute du service dos franceses - não dispensa o requisito da causalidade, vale dizer, do nexo de causalidade entre a ação omissiva atribuída ao poder público e o dano causado a terceiro.
III. - Latrocínio praticado por quadrilha da qual participava um apenado que fugira da prisão tempos antes: neste caso, não há falar em nexo de causalidade entre a fuga do apenado e o latrocínio. Precedentes do STF: RE 172.025/RJ, Ministro Ilmar Galvão, "D.J." de 19.12.96; RE 130.764/PR, Relator Ministro Moreira Alves, RTJ 143/270.
IV. - RE conhecido e provido.
(STF, RE 369820/RS, Rel. Min. Carlos Velloso, 2ª Turma, DJ 27/02/2004).
ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. QUEDA DE ÁRVORE. DANO EM VEÍCULO ESTACIONADO NA VIA PÚBLICA. NOTIFICAÇÃO DA PREFEITURA ACERCA DO RISCO. INÉRCIA. NEGLIGÊNCIA ADMINISTRATIVA COMPROVADA. DEVER DE INDENIZAR MANTIDO. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL NÃO DEMONSTRADO. AUSÊNCIA DE SIMILITUDE FÁTICA ENTRE OS ARESTOS CONFRONTADOS.
1. A jurisprudência desta Corte se firmou no sentido de ser subjetiva a responsabilidade civil do Estado nas hipóteses de omissão, devendo ser demonstrada a presença concomitante do dano, da negligência administrativa e do nexo de causalidade entre o evento danoso e o comportamento ilícito do Poder Público. Precedentes.
...
4. Recurso especial conhecido em parte e não provido.
(STJ - REsp 1230155/PR, Rel. Ministra Eliana Calmon, 2ª Turma, DJe 17/09/2013)
RECURSO ESPECIAL. DNER. RESPONSABILIDADE CIVIL POR ACIDENTE CAUSADO EM RODOVIA FEDERAL. LEGITIMIDADE PASSIVA. OMISSÃO DO ESTADO. RESPONSABILIDADE SUBJETIVA . MÁ CONSERVAÇÃO DA RODOVIA FEDERAL. CULPA DA AUTARQUIA. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. REDUÇÃO. 300 SALÁRIOS MÍNIMOS. PRECEDENTES.
(...)
No campo da responsabilidade civil do Estado, se o prejuízo adveio de uma omissão do Estado, invoca-se a teoria da responsabilidade subjetiva. Como leciona Celso Antonio Bandeira de Mello, "se o Estado não agiu, não pode logicamente, ser ele o autor do dano. E, se não foi o autor, só cabe responsabilizá-lo caso esteja obrigado a impedir o dano. Isto é: só faz sentido responsabilizá-lo se descumpriu dever legal que lhe impunha obstar ao evento lesivo" ("Curso de direito administrativo", Malheiros Editores, São Paulo, 2002, p. 855).
(...)
(STJ, REsp 549812/CE, Rel. Min. Franciulli Neto, 2ª Turma, DJ 06.05.2004)
Em suma, para se configurar a responsabilidade subjetiva do Estado pela falta do serviço, basta a demonstração do dano, da negligência administrativa e do nexo de causalidade entre o evento danoso e o comportamento ilícito do Poder Público.
Conforme a documentação acostada aos autos, em 21.12.1998, o Delegado de Polícia Federal Rogério Augusto Viana Galloro solicitou, junto à Polícia Estadual do Paraná, autorização para que o policial Kamil Salmen viesse a ministrar curso de táticas policiais aos agentes da DPF em Presidente Prudente/SP, entre os dias 18 e 22 de janeiro de 1999 (fls. 51); o local escolhido foi o denominado Recinto de Exposições (fls. 55) e, segundo depoimento - prestado em 23.02.1999 - de Guilherme de Carvalho, então administrador do local, uma semana antes da realização do curso foi contatado por telefone pelo citado Delegado para que fosse autorizada a utilização do espaço no período em questão, sendo a ele entregue a chave da casa, construída para servir de refeitório e se encontrava desativada; que os participantes do curso permaneceram com a chave da casa até o final do curso (fls. 47).
A partir desse ponto não há consenso acerca do ocorrido. Em seu depoimento à autoridade policial civil, prestado em 25.01.1999, o instrutor do curso e Agente de Polícia Kamil Salmen, declarou que, na quinta-feira - dia 21.01.1999 -, por volta das 17:00 horas, foram realizados arremessos das bombas de efeito moral, uma por aluno e quatro por ele, "sendo que todas explodiram; que, após isso, rumaram para uma residência que fica ao lado do campo de futebol [...] que, para iniciar os treinamentos, o Dr. Galloro, Delegado de Polícia Federal, apanhou as chaves junto ao responsável para abrir a casa [...] que, naquele local fizeram treinamento, onde inicialmente foram lançadas granadas de efeito moral [...] após foram lançadas cinco granadas de gás lacrimogênio, tornando o recinto interno da casa saturado com referido gás, onde os alunos fizeram rápidas entradas para poderem constatar a presença do gás, seu odor e seu efeito; que, imediatamente após esse exercício, o declarante solicitou aos alunos que entrassem no interior daquela casa e fizessem um trabalho no intuito de localizar eventuais explosivos que não tivessem detonado; que foi feito esse trabalho e nada foi encontrado [...] que naquele momento o gás estava muito concentrado, sem qualquer condição de permanência no interior daquele recinto por muito tempo; que existe norma de segurança dando conta de que existe prazo de até 24 horas para o gás lacrimogênio cristalizar e precipitar [...] que, como havia o prévio acordo entre a Polícia Federal e os administradores do recinto de que a casa deveria ficar fechada e somente era permitida a entrada naquele local com prévia autorização da organização do curso, quando então o Dr. Galloro trancou a casa na presença de todos; que ficou acertado que retornariam nessa casa somente no dia seguinte, às 15:00 horas, onde seria realizado o trabalho de limpeza para posterior restituição da mesma, aos administradores do recinto de exposições; que, na sexta-feira, iniciaram as aulas do curso, nas proximidades da casa mencionada, onde permaneceram até às 12:00 horas, onde fizeram pausa para almoço; que, por volta das 14:00 horas, o declarante foi comunicado de que uma criança havia tido acesso ao interior da casa onde havia ocorrido os treinamentos e uma granada de efeito moral havia detonado em sua mão; que o declarante foi para o local e constatou que a casa estava totalmente aberta; que desconhece quem teria aberto a referida casa e permitido o acesso de al criança ao local do evento" (fls. 44 a 46); de outro polo, consta do depoimento do administrador do Recinto de Exposições, Guilherme de Carvalho, que "as chaves foram entregues ao instrutor no dia em que iniciou o curso e restituídas no encerramento do mesmo" (fls. 48).
Por ocasião do depoimento prestado em 26.02.1999, o vigia do Recinto de Exposições, Benicio Rodrigues Oliveira, informou que ninguém lhe devolveu a chave do local utilizado para o curso; que, na manhã do dia 22.01.1999, ouviu os policiais comentarem ser aquele o último dia do curso, "observando, por acaso, no quadro de chaves, que a chave da casa estava naquele local" (fls. 50).
Em seu depoimento, prestado em 23.04.1999, o Delegado da Polícia Federal Rogério Augusto Viana Galloro confirmou as tratativas para a realização do curso, acrescentando que "quem indicou o uso da casa acima mencionada foi um dos zeladores do recinto [...] denominada "cozinha", que estaria desocupada e trancada [...] poderia ser utilizada sem problemas por estar desabitada, sem móveis e trancada, além de localizar-se longe de outras casas; que foi referido zelador quem entregou as chaves da casa ao declarante com a combinação de que as mesmas seriam devolvidas naquele dia após o treinamento; que o declarante, juntamente com os outros [...] dirigiram-se até a mencionada casa, onde a porta principal de entrada foi aberta na presença de todos; que somente a porta principal foi aberta; que, com relação às janelas, essas possuíam grades e somente o vitrô foi aberto [...] iniciaram-se os exercícios de residência e naquele momento eram atiradas algumas granadas dentro da casa [...] o instrutor Kamil dizia ao declarante e aos demais alunos que não se preocupassem com as granadas que não viessem a detonar, pois no final do exercício ele iria providenciar a sua destruição; que ao final desse dia de exercício o instrutor Kamil e seus auxiliares do GOE entraram na casa e fecharam a janelas de vitrô, sendo que as mesmas possuíam grades de ferro [...] que por ordem do instrutor os alunos policiais federais fizeram formação em frente da casa e todos presenciaram quando o declarante trancou a única porta aberta naquela ocasião; após, todos rumaram para o centro do Recinto para a finalização das instruções daquele dia; que foi naquele momento e também na presença de todos que o declarante procurou o zelador para a entrega das chaves da casa; que, como o zelador não foi encontrado e a sala do escritório estava aberta; o declarante pendurou as chaves no quadro próprio ali existente; que, no dia seguinte [...] o declarante foi procurado por um dos zeladores [...] que lhe perguntou: "Doutor, o que vocês jogaram dentro daquela casa? Porque depois do treinamento de vocês eu entrei na casa para averiguar o estrago, mas não aguentei o cheiro forte e saí correndo" [...] que o declarante considerou que referido zelador tivesse deixado a casa da mesma forma como a encontrou, ou seja, totalmente trancada, mas tudo leva o declarante a crer que, após ser surpreendido com os efeitos do gás lacrimogênio o zelador tenha saído correndo e deixado a porta destrancada; que naquele mesmo dia o declarante deixou o recinto após o encerramento do curso e foi para sua residência, sendo que o instrutor Kamil e os policiais civis do GOE lá permaneceram; que por volta das 14:00 horas o declarante encontrava-se em sua residência almoçando quando foi informado, via telefone, pelo plantonista da Polícia Federal, sobre a tragédia ocorrida [...] foi quando o Dr. Gurgel recebeu telefonema de um policial militar informando que haviam sido encontradas mais duas bombas nas proximidades da casa e solicitou que fossem enviados policiais federais para recolhê-las [...]" (fls. 60 a 62).
Em seu depoimento prestado na data de 12.07.1999, Armindo Peixoto, auxiliar de administração no Recinto de Exposições e avô do autor (fls. 109), declarou que "em um dos últimos dias da realização do curso dos Policiais realizado no Recinto de Exposições, olhou por um dos vitrôs das janelas existentes na casa onde ocorreu o treinamento, tendo percebido um forte cheiro no interior da mesma, notando que a porta de entrada parecia aberta; logo em seguida o declarante subiu para o escritório, quando chegou um dos participantes do curso, em uma camioneta, tendo o declarante perguntado ao mesmo o que eles haviam jogado na casa, uma vez que havia um pó branco no chão e ardia os olhos; o policial, o qual o declarante não sabia que era Delegado, respondeu-lhe que eram bombas de efeito moral; o declarante comunicou-o que a porta estava aberta, tendo referido policial respondido que a mesma tinha ficado aberta por causa do cheiro [...] que o declarante, como já disse, não abriu a porta da casa, uma vez que a chave permanecia em um quadro no escritório e quando o local estava sendo usado ficava com os policiais; que durante o curso nunca utilizou a chave para nada, não sendo o responsável pela abertura da porta; que não é verdade que o declarante tenha entrado na casa, sentindo o cheiro forte pelo vitrô" (fls. 110).
Outro vigia do Recinto de Exposições, Antonio Paulino da Silva, cujo depoimento foi prestado em 25.02.1999, informou que na quarta-feira, dia 20.01.1999, foi-lhe solicitada a chave da casa em que ocorreram os eventos, mas "não sabe dizer se a pessoa que solicitou-lhe a chave era instrutor ou participante do curso [...] o depoente disse a essa pessoa que iria embora às dezessete horas daquele dia e que entregasse a chave a outro vigia, de nome Benicio, que iria assumir o serviço; na manhã do dia seguinte; ao chegar ao serviço, o depoente viu a chave da casa em um quadro do escritório; não chegou a conversar com Benicio, não podendo afirmar se a chave foi entregue a ele ou foi ali colocada por algum policial participante do curso; o depoente pode afirmar que a chave da casa não saiu mais do quadro do escritório, uma vez que trabalha todos os dias; durante o dia, na sexta-feira, último dia do curso, ao tomar conhecimento da explosão da bomba, o depoente ouviu o avô de Diego comentar que os policiais teriam deixado a porta da casa aberta para que saísse o gás de alguma bomba detonada no interior da casa" (fls. 112).
Depuseram, ainda, os Agentes de Polícia Federal Janio Konno, em 20.04.1999 (fls. 114), Clóvis Boço, em 08.06.1999 e em 15.09.1999 (fls. 116, 117), Neemias Arruda Severo dos Santos Gonçalves, em 28.06.1999 (fls. 118), Emerson Yukio Ide, em 28.06.1999 (fls. 119), José Osanam Albuquerque Junior, em 29.06.1999 (fls. 120), Suender Teodoro da Silva, em 29.06.1999 (fls. 122), Alexandre Cesar Leal de Souza, em 15.09.1999 (fls. 123), Vagner Castilho Lino, em 16.09.1999 (fls. 124), além de Carlos Renato Ramos de Paula, ex-Investigador de Polícia, em 04.10.1999 (fls. 125), todos participantes do curso. Quanto aos fatos, houve geral concordância quanto a que, após o treinamento, o instrutor Kamil e auxiliares fecharam os vitrôs das janelas da casa utilizada no treinamento daquela quinta-feira, além de realizarem uma busca, incompleta em razão da saturação do ambiente fechado por gás lacrimogênio, por bombas não detonadas dentro do imóvel, cuja porta principal foi depois trancada pelo Delegado Galloro, o qual se dirigiu ao escritório do Recinto de Exposições para a entrega da chave, havendo a intenção de realizar-se no dia seguinte nova busca por artefatos não detonados. Depois de noticiado o acidente ocorrido com o autor, retornaram ao local, onde alguns agentes notaram a existência de bombas não deflagradas na área externa da casa, colocadas sobre passeio cimentado, presumivelmente retiradas do imóvel em momento e por pessoas desconhecidas (fls. 117, 123).
Por fim, em 29.09.1999 foram acareados o Delegado Rogério Augusto Viana Galloro e o zelador Armindo Peixoto (fls. 126 a 128). O primeiro reconheceu o segundo como o funcionário que o havia questionado sobre o que teria sido jogado na casa; Armindo Peixoto declarou que sua casa dista trinta metros do imóvel utilizado no treinamento, de onde pôde verificar que a porta estava aberta e que, passando pela lateral, olhou pelo vitrô aberto e notou pó branco no chão, além de forte odor que dali emanava. Por sua vez, Rogério Galloro reiterou o diálogo tido com o funcionário, o qual teria dito ter entrado na casa e rapidamente saído ao sentir o odor.
Em 02.02.1999, o autor relatou à autoridade policial (fls. 43) que, naquela sexta-feira, dia 22.01.1999, estava com alguns amigos no "campinho" próximo ao local utilizado no treinamento; percebeu que a casa estava aberta, decidiu entrar e, notando haver uma bomba sobre um balcão, pegou-a e logo saiu, por causa da ardência que sentia em seus olhos. Voltando ao campo de futebol, retirou o pino da bomba, a qual estralou e, em seguida, explodiu em sua mão. Acrescentou, por ocasião de seu depoimento prestado em 16.06.2006, que não sabia se tratar de uma bomba (fls. 466).
A prova testemunhal produzida reitera o já mencionado (fls. 468 a 471, 497 a 499).
Resumindo o até aqui exposto, o instrutor e os participantes do treinamento atiraram bombas de gás lacrimogênio na casa em questão, na tarde da quinta-feira, dia 21.01.1999. Encerrada a simulação, foi realizada busca de bombas não detonadas, não sendo concluída a varredura por força dos efeitos do próprio gás e, em seguida, fechadas as janelas e trancada a porta; depois, o Delegado Galloro procurou o zelador para a entrega das chaves e, não o localizando, pendurou-as em quadro de chaves situado no escritório, onde se supõe que permaneceram até a sexta-feira.
Porém, na manhã seguinte, retornando ao local, Galloro foi procurado pelo zelador Peixoto, o qual indagou o delegado sobre o que teria sido jogado na casa, dado o forte odor percebido quando por ali passou, notando que tanto a porta quanto um vitrô estariam abertos.
É possível imaginar algumas hipóteses, como a de que nem todas as janelas tenham sido adequadamente fechadas pelos agentes que entraram na casa, após o treino daquela quinta-feira; que a tranca da porta estava defeituosa; que algum dos funcionários do Recinto de Exposições ali tenha estado, esquecendo-se de trancar a porta ao sair; até mesmo uma conjunção de fatores. No entanto, trata-se de um exercício ocioso, por dois motivos: o próprio inquérito resultou em denúncia rejeitada, pois, repita-se, "a prova acusatória produzida ou requerida é mínima" (fls. 168) e, mais importante, de todo o mencionado se conclui não se afastar a Responsabilidade Civil estatal.
Ainda que tenham sido tomadas certas precauções, houve falha dos agentes estatais na busca por artefatos não detonados, após o treinamento, eventualmente deixados em local acessível por pessoal não autorizado. Ainda que se considere que o imóvel tenha sido adequadamente fechado, não se deu a devida atenção à guarda das chaves, deixadas em local de fácil acesso, tanto que houve o acidente de que aqui se trata - sendo ainda digno de nota que restaram outros artefatos não detonados, dispostos fora da casa por pessoa não identificada.
Em suma, ainda que não seja possível individualizar a responsabilidade, inegável que agentes estatais inadvertidamente deixaram bombas de gás lacrimogênio em local não apropriado, sem a devida guarda. Assim, constatada a conduta e o nexo causal com o dano sofrido pelo autor.
Cabe ainda observar que, segundo MARIA SYLVIA ZANELLA DI PIETRO, "sendo a existência do nexo de causalidade o fundamento da responsabilidade civil do Estado, esta deixará de existir ou incidirá de forma atenuada quando o serviço público não for a causa do dano ou quando estiver aliado a outras circunstâncias, ou seja, quando não for a causa única".
No entanto, no caso em comento sequer há que se falar em culpa concorrente. Além do já mencionado em relação ao comportamento dos agentes estatais, é de acrescentar que, à época dos fatos, a vítima, nascida em 12.01.1990 (fls. 33, 43), contava apenas nove anos de idade recém-completados, tratando-se de pessoa absolutamente incapaz, nos termos do art. 5º, I, do Código Civil de 1916, então vigente, equivalente ao art. 3º do atual Código Civil.
Superada a controvérsia no tocante à responsabilidade, cabe aquilatar a indenização correspondente aos danos - e quais foram esses.
Conforme relatado, o Juízo de origem arbitrou indenização no valor de R$35.000,00, "o equivalente a 100 salários mínimos vigentes na data da sentença" (fls. 565), ou seja, em 06.03.2007, a título de danos morais, aí incluídos danos estéticos.
A parte autora requereu, por ocasião de seu apelo, a majoração da indenização ao montante de 2.000 salários mínimos, ao passo que a União Federal requereu a redução dos mesmos, argumentando já equivaler ao montante costumeiramente arbitrado às indenizações em hipótese de morte ou incapacidade total e permanente.
No caso em tela, inquestionáveis os danos estéticos sofridos pelo autor em razão da detonação do artefato. Além das fotos carreadas aos autos (fls. 35 a 39), oportuno reproduzir o que consta do laudo elaborado pelo perito médico ortopedista: "presença de cicatrizes disformes em região lateral de hemitórax esquerdo, em número de 13, medindo a maior cerca de 1,5cm de diâmetro e a menor 0,5cm de diâmetro. Presença de 2 cicatrizes, sequelas de trauma em face medial do terço proximal do membro superior esquerdo quase no oco, com presença de corpo estranho em 2 delas. Na mão esquerda apresenta cicatriz na região dorsal, indo da base do 1º metacarpiano até o início do túnel do carpo. Cicatriz no dorso da mão esquerda de 4cm, com formato irregular, indo do 1/3 médio do 3º metacarpo até o coto de amputação do 3º dedo, do qual foi preservado somente o 1/3 proximal da falange proximal. Amputação parcial do 2º dedo da mão esquerda ao nível da articulação interfalangeana com coto de amputação em regular estado de evolução, com presença de hipersensibilidade no local da cicatriz cirúrgica" (fls. 384, 385).
Houve controvérsia quanto aos danos morais, indissociáveis os componentes estético e psicológico, cuja licitude da cumulatividade das indenizações é objeto da Súmula 387/STJ.
Por ocasião da avaliação psicológica, realizada em 11.06.2004 (fls. 341 a 345), portanto mais de cinco anos após os fatos, o autor, então com 14 anos de idade, informou ter recebido apelido em razão da perda, em sua mão esquerda, do dedo médio e de parte de seu indicador; que se viu na necessidade de se adaptar à escrita com a mão direita, pois anteriormente era canhoto; que não há como esconder as amputações. Sua genitora referenciou o isolamento do filho, que passou a permanecer mais tempo em sua casa, isolando-se.
A médica perita teceu considerações sobre as possíveis sequelas pessoais e sociais que o autor levará consigo ao longo de sua vida (fls. 344, 345, 370), ao passo que a União Federal, inclusive por meio de sua assistente técnica, enfatizaram a possibilidade de o autor superar os efeitos psicológicos de sua condição posterior ao acidente (fls. 354, 355, 362, 363, 392 a 396).
Por certo, a exata avaliação das sequelas psicológicas sofridas pelo autor quando de acidente ocorrido em tenra idade requer esforço - se não mesmo de empatia - ao menos das "regras de experiência comum", conforme disposto pelo art. 335 do Código de Processo Civil de 1973, equivalente ao art. 375 do novo Código de Processo Civil.
Assim sendo, cabe reconhecer a evolução de nossa sociedade ao longo das últimas décadas, não se perdendo de vista que tal evolução ainda não se completou. É notório que se fez e ainda se faz necessário o amparo das leis a muitos daqueles que, por um motivo ou outro, fujam dos parâmetros do que é considerada a normalidade e, por mais lamentável que seja, os portadores de deficiências físicas ainda carregam certo estigma: basta observar que não se tem notícia de pessoa que reaja com indiferença ante a possibilidade de perda de parte de seu corpo, por menor que seja. Em suma, tenho por inegável o dano moral sofrido pelo autor, agravado pelo fato de que ocorrido se deu quando contava somente nove anos de idade.
Oportuno observar que, nas hipóteses de inscrição indevida em cadastro restritivo, esta Corte costuma arbitrar o valor de R$5.000,00 (cinco mil reais) a título de indenização por dano moral. Por sua vez, em casos relativos a prisões arbitrárias e torturas infligidas por agentes estatais, no período da Ditadura Militar, esta Corte tem arbitrado o valor de R$100.000,00 (cem mil reais) a título de indenização por danos morais. Desse modo, entendo por bem aumentar o valor arbitrado a esse título pelo Juízo de origem para R$ 200.00,00 (duzentos mil reais) diante da gravidade do fato ocorrido na infância do autor, causando-lhe sequelas psicológicas para toda a sua vida.
Quanto aos danos materiais, há três pontos por abordar: o grau da redução da capacidade laborativa do autor, a base de cálculo do benefício e até qual idade deverá ser percebido.
A perda ou redução da capacidade laborativa em virtude de ato de outrem é, notoriamente, passível de indenização pelos assim denominados lucros cessantes. Já o Código Civil de 1916 previa a indenização a esse título, por meio de seu art. 1.538, atualmente tema dos art. 402, 949 e 950, todos do atual Código Civil, que aperfeiçoaram a abordagem da questão. Como é cediço, "correspondem os lucros cessantes a tudo aquilo que o lesado razoavelmente deixou de lucrar, ficando condicionada a indenização desse prejuízo, portanto, a uma probabilidade objetiva resultante do desenvolvimento normal dos acontecimentos" (REsp 846.455/MS, Terceira Turma, DJe 22/04/2009); desse modo, apenas podem ser assim classificados os ganhos futuros não auferidos em razão do dano sofrido, desde que haja previsão razoável e objetiva de lucro, não mera potencialidade, e na mesma proporção do dano.
Eis os dispositivos:
Código Civil de 1916
Art. 1.538. No caso de ferimento ou outra ofensa à saúde, indenizará o ofensor ao ofendido as despesas do tratamento e os lucros cessantes até ao fim da convalescença, além de lhe pagar a importância da multa no grão médio da pena criminal correspondente.
Código Civil de 2002
Art. 402. Salvo as exceções expressamente previstas em lei, as perdas e danos devidas ao credor abrangem, além do que ele efetivamente perdeu, o que razoavelmente deixou de lucrar.
(...)
Art. 949. No caso de lesão ou outra ofensa à saúde, o ofensor indenizará o ofendido das despesas do tratamento e dos lucros cessantes até ao fim da convalescença, além de algum outro prejuízo que o ofendido prove haver sofrido.
Art. 950. Se da ofensa resultar defeito pelo qual o ofendido não possa exercer o seu oficio ou profissão, ou se lhe diminua a capacidade de trabalho, a indenização, além das despesas do tratamento e lucros cessantes até o fim da convalescença, incluirá pensão correspondente à importância do trabalho para que se inabilitou, ou da depreciação que ele sofreu.
Parágrafo único. O prejudicado, se preferir, poderá exigir que a indenização seja arbitrada e paga de uma só vez.
RECURSO ESPECIAL. CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL POR ATO DE TERCEIRO. DEVER DE GUARDA E VIGILÂNCIA. CUNHO OBJETIVO. DEVER DE INDENIZAR. VÍNCULO DE NATUREZA ESPECIAL. EMPREGADO E EMPREGADOR. RELAÇÃO DE SUBORDINAÇÃO. TEORIA DA SUBSTITUIÇÃO. NEXO CAUSAL INCIDENTAL. LEGÍTIMA DEFESA PUTATIVA. CULPA. OCORRÊNCIA. CULPA CONCORRENTE. NÃO CARACTERIZAÇÃO. LUCROS CESSANTES. PERDA NA LAVOURA. ÔNUS DA PROVA. PENSÃO MENSAL. DIMINUIÇÃO DA CAPACIDADE LABORATIVA. CUMULAÇÃO. DANOS MORAIS. VALOR. EXTENSÃO DO DANO CAUSADO. RECURSO ESPECIAL A QUE SE DÁ PROVIMENTO.
(...)
12. A pensão mensal é devida pela diminuição da capacidade laborativa, ainda que a vítima, em tese, esteja capacitada para exercer outras atividades.(grifei)
13. A indenização de lucros cessantes e a fixação de pensão mensal têm finalidades distintas, destinadas a reparar diferentes ordens de danos, razão pela qual não há bis in idem na condenação ao ressarcimento de ambos os prejuízos.
(...)
(STJ, REsp 1433566/RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, 3ª Turma, DJe 31.05.2017)
Por ocasião da avaliação fisioterápica, realizada em 24.10.2002 (fls. 252), a perita fisioterapeuta consignou que "os movimentos da mão esquerda do periciando não foram comprometidos quanto a sua funcionalidade [...] Por ser ambidestro, poderá desempenhar atividades com a mão esquerda, tais como segurar caneta, lápis ou qualquer outro objeto de escrita. Isto se dá pelo fato do movimento de pinça, necessário para tais atividades, estar assegurado pelos movimentos íntegros do polegar do coto do 2º dedo, visto que a flexão da articulação interfalangeana proximal e metacarpofalangeana encontram-se com força muscular normal, tanto na extensão como na flexão e amplitude normal de movimento. A perda do 3º dedo não impede os demais movimentos da mão, necessários para realização das mesmas. Poderá também manusear ferramentas, tais como enxada, chave de fenda, facões, martelos e outras, ou seja, atividades que necessitam de força e preensão da mão, que está assegurada pela integridade dos movimentos de pinça realizada entre o polegar e 4º e 5º dedos, que se encontram íntegros, juntamente com movimentos de pinça realizados pelo polegar e coto do 2º dedo e força de preensão, realizada pela musculatura intrínseca da mão" (fls. 255), ao que corresponderia a inexistência de quaisquer incapacidades (fls. 258). Porém, ainda que em resposta aos quesitos tenha informado que "a doutrina médica apresenta casos mais graves que o do periciando em que houve reabilitação" (fls. 262), acrescentou que "o periciando não passou por tratamento fisioterápico por não ter sido encaminhado ou orientado a tal procedimento", sendo que "a falta de tratamento fisioterápico e de terapia ocupacional pode contribuir para o agravamento de sequelas e adaptações funcionais" (fls. 263).
A perícia médico-ortopédica foi realizada em 30.11.2004 (fls. 383), portanto dois anos e um mês após a avaliação fisioterápica. De modo diverso daquela, o médico perito avaliou "que houve perda parcial da capacidade funcional do membro superior esquerdo, inclusive pela mudança do ato de escrever para o membro superior direito uma vez que o mesmo era sinistro (canhoto) [...] Podemos afirmar que o menor perdeu parcialmente a capacidade de pinça (mecanismo de preensão entre as polpas digitais do 1º e 2º dedos da mesma mão) e mesmo que com o tempo adapte-se espontaneamente para executar esta atividade (pinça), não terá, COM CERTEZA, a mesma habilidade que teria com seus dedos íntegros" - maiúsculas no original (fls. 385).
Em relação ao desempenho de atividades laborais, concluiu o perito médico que "o autor perdeu parte de sua capacidade funcional [...] e, com certeza, perdeu parte de sua habilidade manual para executar atividades em que necessite do uso das polpas digitais de seus dedos [...] Assim é que, ao desempenhar atividades em que necessite do uso das polpas digitais (inclusive o computador), o periciado terá sua capacidade laborativa diminuída" (fls. 386); informou ainda que "as conclusões a que a Advocacia Geral da União chegou são corretas no sentido de que o autor adaptou o uso de sua mão esquerda àquelas disciplinas, mas evidente que seriam ainda melhores se tivesse com sua mão esquerda intacta", de maneira que, "evidentemente, terá sua capacidade diminuída quando necessitar do uso dos dedos que foram amputados por ocasião da explosão que decepou parte de sua mão esquerda" (fls. 387), e "reafirmamos que o autor terá de maneira definitiva perda de habilidade manual à esquerda" (fls. 389).
Ainda que expressada certa discordância, o assistente técnico da União consignou concordar "com o perito quando conclui que a perda da função da mão foi parcial", mas "faço a ressalva de que o requerente apresenta condições suficientes de mobilidade e sensibilidade dos dedos para escrever com a mão esquerda, caso não fosse ambidestro, e que pode exercer funções e profissões que garantam a subsistência" (fls. 426).
Por fim, vindo a prestar esclarecimentos, o perito médico reiterou que "o periciado tem capacidade laborativa para qualquer tipo de atividade profissional. No entanto, ela está diminuída em função das sequelas relativas à explosão da 'granada' em sua mão esquerda e, em vista dessas afirmações, podemos dizer que é portador de deficiência que o incapacita parcial e definitivamente" e, quanto ao grau da perda da capacidade, concluiu que o autor "perdeu 15% (quinze por cento) das funções de seu membro superior esquerdo, de maneira total e definitiva" (fls. 440).
Em suma, o conjunto probatório demonstra de forma inquestionável a perda parcial de habilidade manual na mão esquerda do autor - e, por consequência, de capacidade laboral. No entanto, entendo assistir razão à ré no que se refere à magnitude do dano: havendo o próprio perito definido a perda como sendo da ordem de 15% das funções da mão esquerda, de rigor a redução da indenização de 20% para 15% do provável salário, inclusive a teor do disposto pelo art. 950 do Código Civil.
Nesse mesmo sentido, a jurisprudência:
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DISSÍDIO NOTÓRIO. DEMONSTRAÇÃO. REQUISITOS. MITIGAÇÃO. LUCROS CESSANTES. ACIDENTE. INCAPACIDADE PARA O TRABALHO. PRESUNÇÃO.
1. Tratando-se de dissídio notório com a jurisprudência firmada no âmbito do próprio Superior Tribunal de Justiça, mitigam-se os requisitos de admissibilidade para o conhecimento do recurso especial pela divergência.
2. "Presume-se a redução da capacidade laborativa da vítima de ato ilícito que sofre graves seqüelas físicas permanentes, evidentemente limitadoras de uma vida plena" (REsp 899869/MG, Rel. Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS, TERCEIRA TURMA julgado em 13/02/2007, DJ 26/03/2007, p. 242)
3. Embargos de declaração acolhidos, com efeitos modificativos.
(STJ, EDcl no AgRg no AREsp 167735/DF, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, 4ª Turma, DJe 04.02.2014)
PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. PENSIONAMENTO PREVISTO NO ART. 950 DO CC. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADO. VALOR DA INDENIZAÇÃO. REEXAME DE MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. DENUNCIAÇÃO DA LIDE. INDEFERIMENTO. POSSIBILIDADE. ART. 1º-F DA LEI 9.494/1997. MP 2.180-35/2001. LEI 11.960/2009. NATUREZA PROCESSUAL. APLICAÇÃO IMEDIATA. IRRETROATIVIDADE.
1. Trata-se, na origem, de ação de rito ordinário na qual a parte autora, servidor público federal, pretende indenização por danos materiais e morais em decorrência de acidente ocorrido durante participação no curso Atualização em Bombas e Explosivos, ministrado pela Polícia Federal, em razão de lesões na mão esquerda, que foi dilacerada com a detonação acidental de uma granada.
2. A vítima do evento danoso - que sofre redução parcial e permanente da capacidade laborativa - tem direito ao pensionamento previsto no artigo 950 do Código Civil, independentemente da existência de capacidade para o exercício de outras atividades, em virtude de maior sacrifício para a realização do serviço.
Precedentes do STJ.
(...)
(STJ, REsp 1292728/SC, Rel. Min. Herman Benjamin, 2ª Turma, DJe 02.10.2013)
Quanto à base de cálculo do benefício, cabível a avaliação por estimativa. A dificuldade de semelhante exercício pode ser exemplificada pelas próprias razões enunciadas pela União Federal por ocasião de seu apelo: se, por um lado, argumentou não ser possível "quantificar qual seria o rendimento mensal", de maneira que "a jurisprudência tem se inclinado a considerar como valor médio o valor do salário mínimo vigente", por outro mencionou que "a literatura e os meios de comunicação estão repletos de exemplos em que pessoas totalmente debilitadas funcionalmente [...] executam perfeitamente atividades que exigem complexas habilidades. Tome-se como exemplo as pessoas que não possuem ou têm debilitados os braços e exercem serviços de pintura com os pés e até mesmo com a boca" (fls. 609, 610).
Por certo não se trata de exercício de futurologia. Não cabe ao julgador vaticinar uma vida de dificuldades ou repleta de sucessos e superações, mas de sóbria consideração das condições sócio-culturais do meio em que inserido o autor, via de regra um grande fator a condicionar suas possibilidades.
Dos presentes autos, observa-se que cada parte procurou basear suas pretensões em critérios distintos, vindo ainda a ser utilizada avaliação própria pelo Juízo de origem, por ocasião da sentença. Desse modo, o julgador singular considerou razoável o patamar de três salários mínimos mensais (fls. 565), ao passo que a parte autora buscou como referência a renda familiar (fls. 580), ou, alternativamente, a aplicação analógica do art. 104, §1º, do Decreto 3.048/99, o qual prevê a concessão de Auxílio-Acidente correspondente a 50% do salário-de-benefício do segurado (fls. 581); por sua vez, a União mencionou jurisprudência pela qual se considera o valor do salário mínimo quando inviável a quantificação do rendimento mensal e, alternativamente, a média salarial brasileira em razão dos anos de estudo.
Avalio não se prestar, o presente caso, pura e simplesmente, a utilização do salário mínimo, eis que obviamente o autor não exercia atividade remunerada quando do acidente - como qualquer criança de nove anos que não esteja mergulhada na miséria extrema; do mesmo modo, indevida a analogia com o Auxílio-Acidente concedido a segurados da Previdência Social ou mesmo de singela comparação ao rendimento familiar. Desse modo, reputo razoável a manutenção do quanto decidido pelo Juízo de origem, ou seja, uma renda de três salários mínimos advinda do exercício de atividades laborais.
Cabe deslindar a controvérsia referente ao termo final para a percepção da pensão mensal indenizatória. O estabelecimento da idade de 65 anos como limite é, via de regra, utilizada nas hipóteses em que ocorre o óbito da vítima; no entanto, em se tratando de redução permanente da capacidade laborativa, a jurisprudência caminha no sentido de não se limitar a percepção da indenização aos 65 anos.
Nesse sentido:
AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. TRANSPORTE COLETIVO. 1. APRESENTAÇÃO DE MEMORIAIS. FACULDADE DO MAGISTRADO. AUSÊNCIA DE NULIDADE. SÚMULA 83/STJ. 2. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. NÃO OCORRÊNCIA. 3. ATIVIDADE LABORATIVA PREJUDICADA. PENSIONAMENTO. CABIMENTO. PRECEDENTES. 4. INCAPACIDADE PERMANENTE. PENSÃO VITALÍCIA. SÚMULA N. 83/STJ. 5. REDUÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO. NÃO DEMONSTRADA A ABUSIVIDADE NO VALOR FIXADO NAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS. SÚMULA 7/STJ. 6. JUROS DE MORA. TERMO INICIAL A PARTIR DA CITAÇÃO. PRECEDENTES. 7. VALOR DO SALÁRIO MÍNIMO. FALTA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 211/STJ. 8. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO.
(...)
4. Outrossim, "no caso em que não houve óbito da vítima mas sim redução permanente da capacidade laborativa, inexiste razão para limitar a pensão a ela devida à data em que completar 65 anos" (EDcl no REsp n. 1.269.274/RS, Relator o Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe de 13/3/2013). Acórdão recorrido em harmonia com a jurisprudência do STJ.(grifei)
(...)
(STJ, AgInt no REsp 1764771/RJ, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, 3ª Turma, DJe 14.02.2019)
ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. INDENIZAÇÃO. DANO MORAL. REVISÃO. SÚMULA 7/STJ. JUROS MORATÓRIOS. TERMO FINAL. PENSÃO POR MORTE. EXPECTATIVA DE VIDA DA VÍTIMA. IDADE DO FILHO.
(...)
8. Qualquer que seja o critério adotado para a aferição da expectativa de vida, na hipótese de dúvida o juiz deve solucioná-la da maneira mais favorável à vítima e seus sucessores.
9. A idade de 65 anos, como termo final para pagamento de pensão indenizatória, não é absoluta, sendo cabível o estabelecimento de outro limite, conforme o caso concreto. Precedentes do STJ.
10. É possível a utilização dos dados estatísticos divulgados pela Previdência Social, com base nas informações do IBGE, no tocante ao cálculo de sobrevida da população média brasileira.
(...)
(STJ, REsp 1027318/RJ, Relator Min. Herman Benjamin, 2ª Turma, DJe 31.08.2009)
Ato contínuo, os dados estatísticos apurados pelo IBGE proporcionam medida objetiva para considerar a expectativa de sobrevida do autor. Novamente considerado o ano de 2008, a "expectativa de vida" para os homens de 18 anos era então de adicionais 53,9 anos. Em suma, razoável calcular que o autor alcance 71,9 anos - devendo ser limitada a percepção da indenização mensal aos 71,1 anos, sob pena de decisão extra petita.
Os dados mencionados constam da "Tábua Completa de Mortalidade - Sexo Masculino - 2008", elaborada pelo IBGE e encontrada no sítioeletrônico https://ww2.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/tabuadevida/2008/homens.pdf.
No tocante aos juros, insurgiu-se a União Federal, por ocasião de seu apelo, contra a previsão de juros de mora, uma vez que o autor não havia alcançado a idade de 18 anos quando da prolação da sentença. O ponto se encontra superado, haja vista a recepção do recurso em seu duplo efeito (fls. 614). Desse modo, as parcelas em atraso devem ser pagas de uma só vez, corrigidas mês a mês, de cada vencimento até a data do efetivo pagamento.
Para indenização por lesão de natureza moral (extrapatrimonial), o montante deve ser corrigido a partir da data do arbitramento, nos termos da Súmula 362/STJ, incidindo juros de mora a contar a partir do evento danoso, conforme Súmula 54/STJ, calculando-se consoante os termos do Manual de Cálculos aprovado pela Resolução 134/2010-CJF, com as modificações introduzidas pela Resolução 267/2013-CJF, capítulo referente às ações condenatórias em geral, com os ajustes provenientes das ADI's 4357 e 4425.
Súmula 54/STJ: os juros moratórios fluem a partir do evento danoso, em caso de responsabilidade extracontratual.
Súmula 362/STJ: A correção monetária do valor da indenização do dano moral incide desde a data do arbitramento.
Em relação à indenização por dano de ordem material de caráter extracontratual - no caso concreto, relativamente à pensão mensal - os juros moratórios também incidem a partir do evento danoso (AgInt no AREsp. 889.334/PR, Rel. Min. RAUL ARAÚJO, DJe 19.12.2016; AgInt no REsp. 1.333.963/SP, Rel. Min. LUIS FELIPE SALOMÃO, DJe 9.12.2016; AgInt no REsp. 1.394.188/SC, Rel. Min. SÉRGIO KUKINA, DJe 25.11.2016 e REsp. 1.501.216/SC, Rel. Min. OLINDO MENEZES DJe 22.2.2016), o mesmo ocorrendo com a atualização monetária, a teor da Súmula 43/STJ, e incidem até o efetivo pagamento das parcelas em atraso.
Nesse sentido:
AGRAVO INTERNO. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE EXTRACONTRATUAL. ACIDENTE DE TRÂNSITO. COLISÃO DE VEÍCULOS. DANOS MATERIAIS E MORAIS. JUROS DE MORA E CORREÇÃO MONETÁRIA. TERMO INICIAL.
1. Alegação genérica de violação ao art. 535 do Código de Processo Civil, pois a parte recorrente somente argumentou que as questões postas nos aclaratórios interpostos na origem não foram respondidas, sem pontuar, de forma específica, quais seriam e qual a sua relevância para solução da controvérsia. Incidência da Súmula 284/STF.
2. Falta de emissão de juízo de valor acerca da comprovação dos danos materiais, concomitante com ausência de regular invocação de afronta ao art. 535 do CPC/1973, configura falta de prequestionamento do tema. Incidência das súmulas 282/STF e 211/STJ.
3. No caso de responsabilidade extracontratual, a correção monetária dos valores devidos a título de dano material incide da data do efetivo prejuízo. Já quanto aos danos morais, a correção monetária sobre o quantum devido a título de danos morais incide a partir da data do arbitramento (Súmula 362/STJ) e os juros de mora, desde o evento danoso (Súmula 54/STJ).
4. Agravo interno não provido.
(STJ, AgInt no AREsp 846923/RJ, REl. Min. Luis Felipe Salomão, 4ª Turma, DJe 16.08.2016)
Súmula 43/STJ: incide correção monetária sobre dívida por ato ilícito a partir da data do efetivo prejuízo.
Desse modo, sobre a indenização por dano moral, arbitrada em R$ 200.000,00 (duzentos mil reais), aplicados juros desde a data do evento danoso, ocorrido em 22.01.1999, e atualização monetária a partir do arbitramento, em 06.03.2007 (fls. 567).
Sobre as parcelas em atraso da pensão, devem incidir juros de mora e atualização monetária a partir de 12.01.2008, data em que o autor completou 18 anos de idade e passou a ter o direito à indenização.
No tocante aos índices dos juros moratórios, assiste parcial razão à União.
Há que se aplicar, quanto aos juros moratórios, os critérios insculpidos no Manual de Orientação para os Cálculos na Justiça Federal, em vigor por ocasião do julgado - especificamente, a Resolução 134/2010-CJF, com as modificações introduzidas pela Resolução 267/2013-CJF, ou seja, 0,5% simples ao mês até dezembro de 2002, nos termos dos art. 1.062, 1.063 e 1.064, todos do Código Civil de 1916; de janeiro de 2003 a junho de 2009, a Taxa SELIC, conforme art. 406 do Código Civil de 2002; de julho de 2009 a abril de 2012, aplica-se a taxa de 0,5% ao mês (Art. 1º-F da Lei n. 9.494, de 10 de setembro de 1997, com a redação dada pela Lei n. 11.960, de 29 de junho de 2009, combinado com a Lei n. 8.177, de 1º de março de 1991); a partir de maio de 2012, o mesmo percentual de juros incidentes sobre a caderneta de poupança, capitalizados de forma simples, correspondentes a 0,5% ao mês, caso a Taxa SELIC ao ano seja superior a 8,5% ou, caso a SELIC ao ano seja igual ou inferior a 8,5%, 70% da Taxa SELIC, de maneira mensalizada, nos termos do art. 1º-F da Lei n. 9.494, de 10 de setembro de 1997, com a redação dada pela Lei n. 11.960, de 29 de junho de 2009, combinado com a Lei n. 8.177, de 1º de março de 1991, com alterações da MP n. 567, de 03 de maio de 2012, convertida na Lei n. 12.703, de 07 de agosto de 2012.
Quanto à correção monetária, até dezembro de 2000 deve ser utilizada a UFIR e, a partir de janeiro de 2001, aplicável IPCA-E/IBGE (em razão da extinção da UFIR como indexador, pela MP n. 1.973-67/2000, art. 29, §3º), observado que o percentual a ser utilizado em janeiro de 2001 deverá ser o IPCA-E acumulado no período de janeiro a dezembro de 2000.
Nesse sentido:
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO E REMESSA OFICIAL. LEGITIMIDADE PASSIVA DA UNIÃO. CONFIGURAÇÃO. PRESCRIÇÃO. NÃO CONFIGURAÇÃO. PESSOA PORTADORA DA SÍNDROME DA TALIDOMIDA. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. CABIMENTO. VALOR DA INDENIZAÇÃO. CONSECTÁRIOS LEGAIS.
(...)
Quanto ao cálculo dos juros de mora e correção monetária, determinou-se que fosse realizado de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, o qual nada mais faz do que explicitar os índices aplicáveis de acordo com as normas vigentes no período, nos seguintes termos: correção monetária, a partir de janeiro de 2001, aplicável IPCA-E / IBGE (em razão da extinção da Ufir como indexador, pela MP n. 1.973-67/2000, art. 29, §3º), observado que o percentual a ser utilizado em janeiro de 2001 deverá ser o IPCA-E acumulado no período de janeiro a dezembro de 2000. A partir de janeiro de 2001, deverá ser utilizado o IPCA-E mensal (IPCA-15 / IBGE). Já a título de juros de mora: de jan/2003 a jun/2009 aplica-se a Selic (Art. 406 da Lei n.10.406/2002 - Código Civil); de jul/2009 a abr/2012, aplica-se a taxa de 0,5% ao mês (Art. 1º.-F da Lei n. 9.494, de 10 de setembro de 1997, com a redação dada pela Lei n. 11.960, de 29 de junho de 2009, combinado com a Lei n. 8.177, de 1º de março de 1991); e a partir de maio/2012 incide o mesmo percentual de juros incidentes sobre a caderneta de poupança, capitalizados de forma simples (Art. 1º.-F da Lei n. 9.494, de 10 de setembro de 1997, com a redação dada pela Lei n. 11.960, de 29 de junho de 2009, combinado com a Lei n. 8.177, de 1º de março de 1991, com alterações da MP n. 567, de 03 de maio de 2012, convertida na Lei n. 12.703, de 07 de agosto de 2012). Ressalte-se que nessa especificação de índices já está considerado o resultado das ADI Nº 4357 e 4425, bem como a respectiva modulação de seus efeitos pelo STF.
- Preliminares rejeitadas. Apelação da União e reexame necessário parcialmente providos.
(TRF3R, AC 2011.61.12.007558-0/SP, Rel. Des. Fed. André Nabarrete, 4ª Turma, DJ 18.07.2018)
Ambas as partes requereram a condenação da parte contrária em honorários advocatícios. Observa-se, no entanto, que a União decaiu de maior parte do pedido, haja vista o acolhimento dos pedidos de indenização por dano moral e dano material, o último relativo aos lucros cessantes.
Oportuno rememorar que, em relação ao dano moral, a condenação em montante inferior ao postulado na inicial não implica sucumbência recíproca, conforme prevê a Súmula 326/STJ.
Destarte, de rigor a condenação da União Federal em honorários advocatícios que arbitro em 10% do valor da condenação, montante que está dentro dos padrões de proporcionalidade e razoabilidade, atendendo aos termos do artigo 20, § 4º, do CPC/73, vigente quando da prolação da sentença.
Face ao exposto, dou parcial provimento à Remessa Oficial e à Apelação da União Federal, reformando a sentença para reduzir a pensão indenizatória mensal de 20% a 15% do provável salário, correspondente este a três salários mínimos, além de determinar a incidência de juros moratórios nos critérios expostos para as parcelas em atraso e, ainda, dou parcial provimento à Apelação da parte autora para condenar a União Federal a pagar-lhe danos morais no montante de R$ 200.000,00 (duzentos mil reais), corrigidos conforme já exposto, bem como honorários advocatícios arbitrados em 10% do valor da condenação, nos termos da fundamentação.
É o voto.
E M E N T A
DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. DANOS MORAL E MATERIAL. ACIDENTE ENVOLVENDO MENOR. DEFORMIDADE PERMANENTE PELA DETONAÇÃO DE ARTEFATO EXPLOSIVO ESQUECIDO EM CENTRO MUNIPAL DE EXPOSIÇÕES, UTILIZADO PARA TREINAMENTO DA POLÍCIA FEDERAL. ACESSO RESTRITO. SUBTRAÇÃO DAS CHAVES PELO MENOR DA ZELADORIA. RESPONSABILIDADE CIVIL DA UNIÃO FEDERAL CARACTERIZADA. CULPA CONCORRENTE. NEGLIGÊNCIA DOS PAIS, RESPONSÁVEIS PELA GUARDA DO FILHO MENOR. INDENIZAÇÕES FIXADAS OBSERVANDO A CONCORRÊNCIA DE CULPAS. INDENIZAÇÕES POR DANOS MORAL E MATERIAL (PENSÃO) DEVIDAS. JUROS DE MORA E ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCOS DEVIDOS PELA UNIÃO FEDERAL. APELAÇÕES E REMESSA OFICIAL PARCIALMENTE PROVIDAS.