Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº 0032444-13.2013.4.03.0000

RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA

RECONVINTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

RECONVINDO: ALCINO INOCENCIO

Advogado do(a) RECONVINDO: FERNANDO KUSNIR DE ALMEIDA - SP206789-N

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº 0032444-13.2013.4.03.0000

RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA

RECONVINTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

RECONVINDO: ALCINO INOCENCIO

Advogado do(a) RECONVINDO: FERNANDO KUSNIR DE ALMEIDA - SP206789-N

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

R E L A T Ó R I O

 

 

A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (RELATORA): Trata-se de ação rescisória ajuizada em 27.12.2013  em face da sentença de ID 90065087, págs. 84/88, cujo trânsito em julgado se deu em 16.01.2013 (ID 90065087, pág. 97).

A decisão rescindenda, de lavra do MM Juiz de Direito RAPHAEL ERNANE NEVES, no exercício de competência delegada (art. 109, §3°, da CF/88), julgou procedente o pedido para conceder aposentadoria rural por idade, deferindo a antecipação da tutela.

Inconformado, ingressou o INSS com a presente ação rescisória, com base no inciso IV do artigo 485 do CPC/73, ao fundamento de que “a r. sentença proferida no feito 378/2012, julgando procedente a pretensão da ora Ré, ofendeu a coisa julgada formada anteriormente no feito n° 201063050008844, que havia julgado improcedente a mesma pretensão posta em juízo, fazendo coisa julgada no sentido de que o ora Réu não faz jus à aposentadoria por idade prevista no art. 143 da Lei 8.213/91. Portanto, merece ela ser rescindida, para que novo julgamento seja proferido, agora dando-se pela extinção da ação n° 378/2012 pela ocorrência de coisa julgada” (ID 90065087, pág. 4).

Forte nisso, pede a desconstituição do julgado, bem assim a concessão de tutela de urgência.

Com a inicial, foram juntados documentos, dos quais se extrai que, da sentença de procedência, a autarquia interpôs apelação (ID 90065087, págs. 101/115), que não foi recebida, ao fundamento de intempestividade (ID 90065087, pág. 138, 148/153 e 164).

A apreciação do pedido de antecipação da tutela foi postergada pela decisão de ID 90065087, pág. 170.

Citada, a ré apresentou contestação (ID 90065087, págs. 176 e seguintes e ID 90065088, págs. 1/55).

Justiça Gratuita concedida (ID 90065088, pág. 59).

Foi deferida a antecipação da tutela para suspender a execução do julgado rescindendo até o julgamento de mérito desta ação (ID 90065088, págs. 65/68).

Encerrada a instrução processual, as partes foram intimadas para razões finais, tendo a ré as apresentado (ID 90065134, págs. 3/8) , quedando-se inerte o INSS (ID 90065134, pág. 9).

Aberta vista ao Ministério Público Federal, o parquet opinou pela reabertura da instrução probatória, com a intimação do INSS para esclarecer quanto à data do trânsito em julgado do acórdão da primeira ação de aposentadoria, que teria formado a coisa julgada ora invocada como fundamento para a desconstituição da decisão rescindenda (ID 90065134, págs.10/14).

Convertido o julgamento em diligência, o INSS informou que o trânsito em julgado do processo n° 0000884-58.2010.403.6305 ocorreu em 10.01.2012 (ID 90065134, págs. 20/36).

A ré, por sua vez, peticionou consignando que “A propositura de nova demanda de Aposentadoria na condição de segurado especial, se deu com base em novo requerimento administrativo, mediante o qual, novos argumentos foram levados a conhecimento da Autora. Em contestação, de posse de documentos que instruíram a inicial, inclusive A NOVA NEGATIVA ADMINISTRATIVA, é que fora proposta nova demanda” (ID 90065134, págs. 40/41).

O Ministério Público Federal manifestou-se no sentido da improcedência da ação rescisória (ID 90065134, págs. 43/47).

Peticionou a ré, novamente, informando que “O pedido apresentado junto ao Juizado Especial Federal da Comarca de Registro/SP, trata-se do Benefício n° 150.525.779-1, datado de 27 de Abril de 2010. O Pedido apresentado junto a Comarca de Jacupiranga/SP, trata-se do Benefício n° 157.532.805-1, datado de 25 de Abril de 2012. Assim, não há de se falar em coisa julgada como argumenta a autarquia. Observe-se que uma delas, a de 2010, fala da exigência de 174 contribuições no ano de 2010, enquanto que a segunda, fala em 180” (ID 90065134, págs. 50/51).

É o relatório.

 

 

 


 

 

V O T O

 

A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (RELATORA): Por ter sido a presente ação ajuizada na vigência do CPC/1973, consigno que as situações jurídicas consolidadas e os atos processuais impugnados serão apreciados em conformidade com as normas ali inscritas, consoante determina o artigo 14 da Lei nº 13.105/2015.

Friso que segundo a jurisprudência da C. 3ª Seção desta Corte, na análise da ação rescisória, aplica-se a legislação vigente à época em que ocorreu o trânsito em julgado da decisão rescindenda (TRF 3ª Região, TERCEIRA SEÇÃO, AR - AÇÃO RESCISÓRIA - 11342 - 0015682-14.2016.4.03.0000, Rel. JUIZ CONVOCADO RODRIGO ZACHARIAS, julgado por unanimidade em 10/05/2018, e-DJF3 Judicial 1 DATA:18/05/2018).

E diferentemente não poderia ser, pois, como o direito à rescisão surge com o trânsito em julgado, na análise da rescisória deve-se considerar o ordenamento jurídico então vigente.

DA OBSERVÂNCIA DO PRAZO DECADENCIAL

A decisão rescindenda transitou em julgado em 16.01.2013 (ID 90065087, págs. 84/88) e a presente ação foi ajuizada em 27.12.2013ou seja, dentro do prazo previsto no artigo 495 do CPC/1973.

DA DECISÃO RESCINDENDA E DA PRETENSÃO RESCISÓRIA.

A sentença rescindenda, de lavra do E. Juiz Federal ERNANE NEVES, julgou procedente o pedido de concessão de aposentadoria rural por idade, o que ensejou a interposição de recurso pelo INSS, que  não foi conhecido em razão  de sua intempestividade.

Inconformado, ingressou o INSS com a presente ação rescisória, com base no inciso IV,  do artigo 485 do CPC/73, ao fundamento de que, antes da propositura do processo de origem, que trata da concessão se aposentadoria rural por idade, a parte já havia ajuizado ação em face do INSS com a mesma causa de pedir, processada perante o Juízo da Comarca de Registro/SP sob o número 0000884-58.2010.403.6305,  julgada improcedente, com trânsito em julgado em 10.01.2012.

Em junho de 2012, ou seja, apenas seis meses depois, o ora réu ajuizou nova ação postulando o mesmo benefício, registrada sob o nº 378/2012, em trâmite perante o Juízo de Direito de Jacupiranga/SP.

DO JUÍZO RESCINDENTE - VIOLAÇÃO A COISA JULGADA.

Nos termos do artigo 485, IV, do CPC/1973, é possível rescindir a decisão judicial transitada em julgado quando ela "ofender a coisa julgada".

A coisa julgada pode ser ofendida em seus dois efeitos (a) negativo (proibição de nova decisão) ou (b) positivo (obrigação de observância da coisa julgada como prejudicial).

A rescisória por violação a coisa julgada, em regra, enseja apenas a desconstituição do julgado, sem um juízo rescisório (efeito negativo).

É possível, contudo, que a rescisória seja ajuizada contra decisão que nega a coisa julgada (efeito positivo), caso em que poderá haver o juízo rescisório. Isso é o que ocorre quando a decisão rescindenda é proferida na liquidação ou na fase de cumprimento, negando a coisa julgada.

No caso concreto, o INSS alega que a decisão rescindenda violou o efeito negativo da coisa julgada produzida  nos autos no processo de 0000884-58.2010.403.6305, julgado improcedente, com trânsito em julgado em  10.01.2012.

Pois bem.

No que diz respeito à coisa julgada, tem-se que, para a sua configuração, é preciso a existência da tríplice identidade entre as demandas. É dizer, que as partes, os pedidos e causa de pedir sejam idênticos em dois processos, sendo que um deles já esteja julgado.

Isso é o que se extrai do artigo 301, § 3°, do CPC/1973, vigente quando da prolação da decisão rescindenda, o qual estabelecia que "há coisa julgada , quando se repete ação que já foi decidida por sentença, de que não caiba recurso".

Esta C. Seção, à luz da ratio decidendi do Resp.  1.352.721, tem entendido que, diante das peculiaridades que envolvem as demandas previdenciárias ajuizadas pelos trabalhadores rurais, deve-se buscar a verdade real e flexibilizar o formalismo das normas processuais, reconhecendo-se a possibilidade do “ajuizamento de nova ação pela segurada sem que se possa falar em ofensa à coisa julgada material”, quando a primeira demanda for julgada improcedente diante da insuficiência do quadro probatório e, na segunda ação, forem apresentados documentos não colacionados na primeira:

AÇÃO RESCISÓRIA. APOSENTADORIA POR IDADE A TRABALHADOR RURAL. COISA JULGADA. TRÍPLICE IDENTIDADE. AFASTAMENTO. PRECEDENTES DO STJ E DESTA CORTE. AÇÃO IMPROCEDENTE. 

- Nos autos do Recurso Especial Representativo de Controvérsia nº 1.352.7221, o C. Superior Tribunal de Justiça assentou, expressamente, que, nos casos de ações judiciais visando à concessão de aposentaria por idade rural, não trazendo o segurado, parte hipossuficiente na relação processual, provas suficientes de suas alegações, deve o juiz extinguir o processo sem resolução de mérito, possibilitando, com isso, ao autor o ajuizamento de nova ação, trazendo então as provas imprescindíveis à comprovação de seu direito.

- Trata-se de interpretação flexibilizada do formalismo de nossas normas processuais, exatamente, para que se dê guarida ao direito material do segurado, em razão de se tratar, “in casu”, de direito fundamental e que resguarda a própria sobrevivência e a vida do trabalhador do campo, hipossuficiente. Em última análise, faz prevalecer a verdade real frente ao descumprimento anterior, muitas vezes por desconhecimento do rurícola, de normas processuais, especialmente, a do artigo 283 do CPC/1973.

- No caso dos autos, verifica-se que a despeito de ter sido resolvido o mérito no primeiro processo – autos nº 463/2009 -, o conteúdo da decisão ali proferida foi no sentido da insuficiência de provas documentais a servirem como início de prova material da condição de rurícola da autora, possibilitando-se, assim, na esteira do precedente do C. STJ acima transcrito, o ajuizamento de nova ação pela segurada sem que se possa falar em ofensa à coisa julgada material.

- Na segunda ação a ora requerida trouxe documentos outros que não levara à primeira, exatamente com o fim de melhor amparar a demonstração dos fatos e de seu direito, além de resguardar-se de nova improcedência.

- Portanto, resta clara a aplicação ao presente caso dos precedentes jurisprudenciais supracitados, acrescentando-se, inclusive, conforme entendimento externado em julgado desta E. Terceira Seção, que, se insuficiência de provas foi reconhecido no primeiro julgamento, tem-se como admissível a propositura de nova ação com as mesmas partes e o mesmo pedido, sem que se possa falar em ferimento à coisa julgada, porquanto trazendo o autor novas provas documentais, antes não apresentadas no feito anterior, torna-se possível a conclusão de que a causa de pedir no segundo processo alterou-se parcialmente em relação ao primeiro feito, não havendo, assim, que se cogitar na tríplice identidade entre as duas ações. 

- Nesse sentido, a jurisprudência pátria vem entendendo que a sentença que julga improcedente pedido de benefício previdenciário a trabalhador rurícola, por falta de provas, especialmente a documental, constitui coisa julgada “secundum eventum probationis”.

- Ação rescisória improcedente. (TRF 3ª Região, 3ª Seção,  AR - AÇÃO RESCISÓRIA - 5019119-41.2017.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal LUIZ DE LIMA STEFANINI, julgado em 14/05/2019, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 17/05/2019)

No caso, a decisão proferida no primeiro feito julgou improcedente o pedido de concessão de aposentadoria rural formulado pela ora ré, tendo em vista a fragilidade do conjunto probatório, verbis:

"Faz-se necessário analisar o preenchimento, pela parte autora, dos requisitos necessários à concessão do benefício da aposentadoria rural por idade, previstos nos arts. 48 e 142 da Lei n. 8.213/91. Quanto à idade, não há dúvida do preenchimento desse requisito, uma vez que a parte autora, nascida em 20.09.1949, já com a idade mínima necessária no momento da propositura do requerimento administrativo (22.04.2010 - completou 60 anos em 2009).

Tratando-se de aposentadoria por idade de trabalhador rural, o § 2.° do art. 48 (paragrafo único do art. 48 na redação original) e o art. 143 da Lei n. 8.213/91 permitem a concessão de aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, desde que a atividade rural, ainda que descontinua, no período  imediatamente anterior ao requerimento do benefício (ou no período contemporâneo à época em que completou a idade mínima), em número de meses idêntico à carência do referido benefício.

A titulo de início de prova documental hábil a comprovar a atividade rurícola por ela desenvolvida, a parte autora apresentou a sua certidão de casamento com Maria José de Oliveira, em 23.06.84, onde é  qualificado  como "lavrador".

 Pesquisa efetuada pela Contadoria Judicial demonstra que a parte autora contribuiu, como individual, de junho de 1989 a novembro de 1990, restando negativa para a sua esposa, Maria José de Oliveira Inocêncio.

Passo à análise dos documentos e das declarações das suas testemunhas.

 A comprovação de tempo rural, como pretendido pela parte demandante, deve calcar-se em inicio de prova material e que os fatos apresentados pelos documentos sejam confirmados, em juízo, por suas testemunhas. Ainda, o início de prova material comprova tempo contemporâneo aos fatos apresentados pelos documentos. No caso em tela, o autor apresentou, na condição de inicio de prova material, apenas um documento - certidão de casamento - retratando fato ocorrido em 1984. 1! Suas testemunhas (3), em audiência, confirmaram que em 1984, pelo menos, o autor trabalhava na roça. Aliás, segundo sabem, ele sempre trabalhou na lavoura, no sítio onde mora.

 Ocorre que o documento que apresentou, com respeito à questão da contemporaneidade, não consegue demonstrar que o autor, até hoje ou até 2009, quando completou a idade mínima, ainda trabalha na lavoura.

Em outras palavras, juridicamente não há como estender os efeitos da informação referente ao ano de 1984 por aproximadamente 25 anos, alcançando o ano de 2009.

Quando muito, os efeitos do referido documento podem ser estendidos, de modo a resguardar a questão da çontemporaneidade, por aproximadamente 5 anos. Isto é, atesta a condição de lavrador da parte autora de 1984 a 1988.

Por outro lado, a situação trazida pelo referido documento (informação da profissão de lavrador) cederia em junho de 1989,  quando, comprovadamente, o autor passou a contribuir para o RGPS (até 11/90) em situação que não tem enquadramento como a de trabalhador rural.

Após novembro de 1990, não existe qualquer documento  que faça referência à sua condição de lavrador. As testemunhas, isoladamente, não conseguem comprovar esta situação, como já mencionei. Resumindo, na medida em que o demandante comprova exercício de trabalho rural, na condição de segurado especial, antes de 1991, incide a tabela do art. 142 da Lei n. 8.213/91, ou seja, deveria, para ter direito à aposentadoria pretendida, atestar 168 meses de trabalho rural, até a época em que completou a idade mínima (2009).  Contudo, pelo exposto, conseguiu demonstrar tão-somente 60 meses (= 5 anos - de 1984 a 1988) e, por conseguinte, não tem direito ao benefício pleiteado, de acordo com o art. 143 da Lei n. 8.213/91.

Diante do exposto, julgo improcedente o pedido o inicial; resolvendo o mérito, nos termos do inciso I do artigo 269 do Código de Processo Civil."

 

Na sequência, em 2012 o ora réu  ajuizou a segunda ação (autos nº 378/2012), na qual veiculou mesmo pedido (aposentadoria por idade rural) e a mesma causa de pedir (labor rural exercido ao longo de toda sua vida), sobrevindo sentença de procedência do pedido.

Como início de prova material e buscando comprovar que os pedidos eram diversos, o ora réu instruiu o feito com sua  certidão de casamento, acrescentado  em relação à ação anterior, sua CTPS (Id 90065087 - pgs. 49/51) sem anotações de vínculos empregatícios  o que, no seu entender, demonstra tratar-se de trabalhador rural e  formulou novo pedido administrativo (Id 90065087 - pg 52).

É certo que, diante das peculiaridades que envolvem as demandas previdenciárias ajuizadas pelos trabalhadores rurais, deve-se mitigar o formalismo das normas processuais, reconhecendo-se a possibilidade do “ajuizamento de nova ação pela segurada sem que se possa falar em ofensa à coisa julgada material”.

Contudo é imperioso que se traga  nova prova  na segunda ação e que ela seja  reputada idônea, ou seja, capaz de configurar início de prova material do labor rural, o que não é o caso dos autos.

 Com efeito, além da certidão de casamento  (celebrado no ano de 1984), o único documento colacionado pela ora parte ré, na segunda ação,  é a sua CTPS sem nenhuma anotação de vínculo empregatício o que, no seu entendimento, configuraria início de prova material do labor rural.

Todavia, ainda que se entenda que a ausência de anotação de vínculos em CTPS possa gerar  uma presunção de labor rural, tal fato não afasta a possibilidade, por exemplo, do exercício de atividade informal remunerada.

Portanto, deve haver início de prova material do labor rural no período de carência.

Dentro desse contexto, a certidão de casamento celebrado em 1984, onde o ora réu está qualificado como lavrador, é insuficiente à comprovação do alegado labor rural, notadamente no período de carência, ausente qualquer prova material nesse sentido.

Destarte, considerando que, no primeiro feito, a pretensão foi indeferida em função da deficiência do quadro probatório e que, no feito subjacente, o documento apresentado isoladamente não possuía aptidão para constituir início de prova material, entendo que  é o caso de se reconhecer a alegada violação a coisa julgada, com a consequente rescisão do julgado, nos termos do artigo 485, IV, do CPC/73.

Observo que o julgado é anterior ao julgamento do Resp 1352721 que, portanto, não se aplica ao caso.

Ainda que fosse caso de aplicar  o entendimento atual do Eg. STJ, sedimentado no Recurso Especial n. 1352721/SP (cujo julgamento é posterior ao trânsito em julgado do feito subjacente) processado sob o rito dos recursos repetitivos, faculta-se ao trabalhador rural a possibilidade de ingressar com nova ação DESDE QUE  obtenha início de prova material suficiente à concessão do benefício pleiteado, HIPÓTESE NÃO VERIFICADA NOS AUTOS.

Por conseguinte, em sede de iudicium rescindens, o pleito do órgão previdenciário merece ser julgado procedente, para desconstituir o ato decisório proferido no processo 378/2012 com supedâneo no art. 485, inc. IV, do Compêndio de Processo Civil de 1973 (art. 966, inc. IV, CPC/2015).

No que concerne ao juízo rescisório, é de ser extinto o feito subjacente (nº 378/2012), sem resolução do mérito, haja vista a existência de coisa julgada na espécie.

Condeno a parte ré ao pagamento dos honorários advocatícios, arbitrados em R$ 1.000,00 (mil reais), observada a suspensão da execução do crédito, tendo em vista ser beneficiária da justiça gratuita (fl. 151), conforme previsto no artigo 98, § 3º, do citado codex, e de acordo com o entendimento majoritário da 3ª Seção desta Corte.

Ante o exposto, em juízo rescindendo, com fundamento no artigo 485, inciso IV, do CPC/1973, JULGO PROCEDENTE A PRESENTE AÇÃO RESCISÓRIA, a fim de rescindir a coisa julgada formada nos autos da ação originária (0002083-63.2012.8.26.0294 - 378/2012 - 1 Vara Cível da Comarca de Jacupiranga/SP) e, em juízo rescisório, JULGO EXTINTO O FEITO SUBJACENTE, SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO, nos termos do artigo 267, V, do CPC/1973, em razão do reconhecimento da coisa julgada.

É o voto.

 


AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº 0032444-13.2013.4.03.0000

RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA

RECONVINTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

RECONVINDO: ALCINO INOCENCIO

Advogado do(a) RECONVINDO: FERNANDO KUSNIR DE ALMEIDA - SP206789-N

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

V O T O - V I S T A

 

 

   O Senhor Desembargador Federal Sérgio Nascimento: O Instituto Nacional do Seguro Social - INSS ajuizou a presente ação rescisória, com fulcro no artigo 966, inciso IV, do CPC (ofender a coisa julgada), visando a desconstituição de sentença proferida nos autos n. 378/12, que tramitou na 1ª Vara Judicial da Comarca de Jacupiranga/SP, a fim de que prevaleça a coisa julgada formada no processo autuado sob o nº 2010.63.05.000884-4, que teve curso no Juizado Especial Federal da Subseção Judiciária de Registro/SP.

    A Exma. Sra. Desembargadora Federal Inês Virgínia, em seu brilhante voto, houve por bem, em sede de iudicium rescindens, julgar procedente o pedido, para desconstituir a r. sentença rescindenda e, no âmbito do juízo rescisório, pela decretação da extinção do feito subjacente, sem resolução do mérito, em face da ocorrência de coisa julgada.

    A d. Relatora, em suas razões de fundamentação, assinala que “..é imperioso que se traga nova prova na segunda ação e que ela seja reputada como idônea, ou seja, capaz de configurar início de prova material do labor rural...”, contudo pondera que não é o caso dos autos, pois “...além da certidão de casamento (celebrado no ano de 1984), o único documento colacionado pela ora parte ré, na segunda ação, é a sua CTPS, sem nenhuma anotação de vínculo empregatício o que, no seu entendimento, configuraria início de prova material do labor rural...”.

     Prossegue a d. Relatora que “...considerando que, no primeiro feito, a pretensão foi indeferida em função da deficiência do quadro probatório e que, no feito subjacente, o documento apresentado isoladamente não possuía aptidão para constituir início de prova material. “, acaba por concluir que “...é o caso de se reconhecer a alegada violação a coisa julgada, com a consequente rescisão no julgado, nos termos do artigo 485, IV, do CPC/1973...”, acrescentando, por fim, “...que o julgado é anterior ao julgamento do Resp 1352721 que, portanto, não se aplica ao caso...”.

    Pedi vista dos autos apenas para melhor reflexão quanto à possibilidade da abertura da via rescisória com base no fundamento indicado pelo INSS.

    O fenômeno da coisa julgada se caracteriza pela existência, entre duas causas, da tríplice identidade de partes, pedido e causa de pedir, sendo que uma das causas encontra-se definitivamente julgada, em face do esgotamento dos recursos possíveis.

    No caso vertente, verifica-se que a primeira ação ajuizada pelo então autor, datada de 20.05.2010, perante o Juizado Especial Federal da Subseção Judiciária de Registro/SP (autos n. 0000884-58.2010.4.03.6305), tinha como objeto a concessão do benefício de aposentadoria rural por idade (pedido), com fundamento no fato de que laborou como lavrador por mais de 30 anos, contando, ainda, com mais de 60 anos de idade, sendo que a inicial veio instruída, unicamente, com certidão de casamento, celebrado em 23.06.1984, em que lhe foi atribuída a profissão de “lavrador” (causa de pedir).

    Por seu turno, a segunda ação intentada pelo então autor, datada de junho de 2012, perante a 1ª Vara Cível da Comarca de Jacupiranga/SP, objetivou a concessão do benefício de aposentadoria rural por idade (pedido), com narração de fato consistente no exercício de atividade rural por mais de 30 anos, bem como ter completado mais de 60 anos de idade, tendo instruído a inicial com certidão de casamento, celebrado em 23.06.1984, em que lhe foi atribuída a profissão de “lavrador”, e CTPS com inscrição de sua qualificação, sem anotação de vínculo empregatício (causa de pedir).

     Venho esposando o entendimento no sentido de que a exposição de fato novo, certo e determinado nas causas previdenciárias, evidenciado por meio de provas inéditas e com aptidão para demonstrar o direito vindicado, consubstancia causa de pedir diversa, de modo a afastar a identidade das ações e, por consequência, a ocorrência de coisa julgada.

     Todavia, no caso vertente, não se vislumbra na segunda ação qualquer novidade no campo fático-probatório que possa diferenciá-la da primeira ação quanto à causa de pedir. Com efeito, o único do documento que instruiu a segunda ação e não constava da primeira é a CTPS, que não traz registro de vínculo empregatício, não se prestando, pois, como início de prova material do alegado labor rural, como bem destacado pela i. Relatora,

      De outra parte, malgrado a decisão judicial proferida na primeira ação, que decretou a improcedência do pedido, tenha adotado como fundamento a ausência de documento relativamente à condição de lavrador a partir de 1990, de modo a indicar, segundo o entendimento firmado Recurso Especial Repetitivo n. 1352721/SP (j. 16.12.2015; DJe 28.04.2016), a carência de pressuposto de constituição e de desenvolvimento válido do processo, a ensejar a extinção do feito sem resolução do mérito, é de se ponderar que a aludida decisão judicial se deu em momento anterior à prolação do acórdão paradigmático ora reportado, ocasião em que imperava controvérsia jurisprudencial acerca da questão em comento, a respaldar interpretação de que o mérito fora efetivamente enfrentado.

      Importante frisar que órgão julgador prolator da r. sentença rescindenda não tomou conhecimento a respeito da existência da primeira ação então intentada e de sua resolução, tendo o então autor deixado de mencioná-la na inicial, bem como o réu acabou por ignorá-la em sua contestação.

      Em síntese, evidenciada a tríplice identidade das ações, torna-se imperioso o reconhecimento da ocorrência da coisa julgada, a ensejar o acolhimento do pedido formulado na presente ação rescisória e, no juízo rescisório, a extinção do processo, sem resolução do mérito, na forma prevista no art. 485, inciso V, do CPC.

      Diante do exposto, acompanho a i. Relatora integralmente.

      É como voto.

 

 

 

 

 

 

 

 


E M E N T A

PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO: AÇÃO RESCISÓRIA. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL.OFENSA À COISA JULGADA. OCORRÊNCIA. EXTINÇÃO DA AÇÃO SUBJACENTE.

1. Por ter sido a presente ação ajuizada na vigência do CPC/1973,  as situações jurídicas consolidadas e os atos processuais impugnados serão apreciados em conformidade com as normas ali inscritas, consoante determina o artigo 14 da Lei nº 13.105/2015.

2. A decisão rescindenda transitou em julgado em 16.01.2013 (ID 90065087, págs. 84/88) e a presente ação foi ajuizada em 27.12.2013, ou seja, dentro do prazo previsto no artigo 495 do CPC/1973.

3. No que diz respeito à coisa julgada, tem-se que, para a sua configuração, é preciso a existência da tríplice identidade entre as demandas. É dizer, que as partes, os pedidos e causa de pedir sejam idênticos em dois processos, sendo que um deles já esteja julgado.

4. Isso é o que se extrai do artigo 301, § 3°, do CPC/1973, vigente quando da prolação da decisão rescindenda, o qual estabelecia que "há coisa julgada , quando se repete ação que já foi decidida por sentença, de que não caiba recurso".

5. Esta C. Seção, à luz da ratio decidendi do Resp.  1.352.721, tem entendido que, diante das peculiaridades que envolvem as demandas previdenciárias ajuizadas pelos trabalhadores rurais, deve-se buscar a verdade real e flexibilizar o formalismo das normas processuais, reconhecendo-se a possibilidade do “ajuizamento de nova ação pela segurada sem que se possa falar em ofensa à coisa julgada material”, quando a primeira demanda for julgada improcedente diante da insuficiência do quadro probatório e, na segunda ação, forem apresentados documentos não colacionados na primeira:

6. No caso, a decisão proferida no primeiro feito julgou improcedente o pedido de concessão de aposentadoria rural formulado pela ora ré, tendo em vista a fragilidade do conjunto probatório Na sequência, em 2012 o ora réu  ajuizou a segunda ação (autos nº 378/2012), na qual veiculou mesmo pedido (aposentadoria por idade rural) e a mesma causa de pedir (labor rural exercido ao longo de toda sua vida), sobrevindo sentença de procedência do pedido.

7. Como início de prova material e buscando comprovar que os pedidos eram diversos, o ora réu instruiu o feito com sua  certidão de casamento, acrescentado  em relação à ação anterior, apenas sua CTPS (Id 90065087 - pgs. 49/51) sem anotações de vínculos empregatícios  o que, no seu entender, demonstra tratar-se de trabalhador rural e  formulou novo pedido administrativo (Id 90065087 - pg 52).

8. É certo que, diante das peculiaridades que envolvem as demandas previdenciárias ajuizadas pelos trabalhadores rurais, deve-se mitigar o formalismo das normas processuais, reconhecendo-se a possibilidade do “ajuizamento de nova ação pela segurada sem que se possa falar em ofensa à coisa julgada material”.

9. Contudo é imperioso que se traga  nova prova  na segunda ação e que ela seja  reputada idônea, ou seja, capaz de configurar início de prova material do labor rural, o que não é o caso dos autos.

10.  Com efeito, além da certidão de casamento  (celebrado no ano de 1984), o único documento colacionado pela ora parte ré, na segunda ação,  é a sua CTPS sem nenhuma anotação de vínculo empregatício o que, no seu entendimento, configuraria início de prova material do labor rural. Todavia, ainda que se entenda que a ausência de anotação de vínculos em CTPS possa gerar  uma presunção de labor rural, tal fato não afasta a possibilidade, por exemplo, do exercício de atividade informal remunerada.

11. A certidão de casamento celebrado em 1984, onde o ora réu está qualificado como lavrador, é o único documento trazido (em ambas as ações), sendo insuficiente à comprovação do alegado labor rural, notadamente no período de carência, ausente qualquer prova material nesse sentido.

12. Destarte, considerando que, no primeiro feito, a pretensão foi indeferida em função da deficiência do quadro probatório e que, no feito subjacente, o documento apresentado isoladamente não possuía aptidão para constituir início de prova material, entendo que  é o caso de se reconhecer a alegada violação a coisa julgada, com a consequente rescisão do julgado, nos termos do artigo 485, IV, do CPC/73.

13. O  julgado é anterior ao julgamento do Resp 1352721 que, portanto, não se aplica ao caso.

14. Ainda que fosse caso de aplicar  o entendimento atual do Eg. STJ, sedimentado no Recurso Especial n. 1352721/SP (cujo julgamento é posterior ao trânsito em julgado do feito subjacente) processado sob o rito dos recursos repetitivos, faculta-se ao trabalhador rural a possibilidade de ingressar com nova ação DESDE QUE  obtenha início de prova material suficiente à concessão do benefício pleiteado, HIPÓTESE NÃO VERIFICADA NOS AUTOS.

15. Parte ré condenada  ao pagamento dos honorários advocatícios, arbitrados em R$ 1.000,00 (mil reais), observada a suspensão da execução do crédito, tendo em vista ser beneficiária da justiça gratuita, conforme previsto no artigo 98, § 3º, do citado codex, e de acordo com o entendimento majoritário da 3ª Seção desta Corte.

16. Ação rescisória procedente para,  com fundamento no artigo 485, inciso IV, do CPC/1973,  rescindir a coisa julgada formada nos autos da ação originária (Processo nº 0002083-63.20128.26.0294 - 378/2012 - 1 Vara Cível da Comarca de Jacupiranga/SP) e, em juízo rescisório, julgado extinto o feito subjacente sem resolução do mérito, nos termos do artigo 267, V, do CPC/1973, em razão do reconhecimento da coisa julgada.

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, prosseguindo no julgamento, após a apresentação do voto-vista do Desembargador Federal SÉRGIO NASCIMENTO, a Terceira Seção, por unanimidade, decidiu, em juízo rescindendo, com fundamento no art. 485, IV, do CPC/73, julgar procedente a ação rescisória, a fim de rescindir a coisa julgada e, em juízo rescisório, julgar extinto o feito subjacente, sem resolução do mérito, consoante art. 267, V, do CPC/73, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.