AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5026323-68.2019.4.03.0000
RELATOR: Gab. 12 - DES. FED. MARLI FERREIRA
AGRAVANTE: MUNICIPIO DE SAO VICENTE
Advogado do(a) AGRAVANTE: KARLA APARECIDA VASCONCELOS ALVES DA CRUZ - SP154465-A
AGRAVADO: MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE SAO PAULO, MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP
OUTROS PARTICIPANTES:
INTERESSADO: UNIAO FEDERAL, ESTADO DE SAO PAULO, PLUMBUM COMERCIO E REPRESENTACOES DE PRODUTOS MINERAIS E INDUSTRIAIS LTDA., ICIPAR EMPREENDIMENTOS E PARTICIPACOES S.A, IRINEU PRADO BERTOZZO, RUMO MALHA PAULISTA S.A.
ADVOGADO do(a) INTERESSADO: FABIANO LIMA DE MORAIS
ADVOGADO do(a) INTERESSADO: VICTOR PENITENTE TREVIZAN
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5026323-68.2019.4.03.0000 RELATOR: Gab. 12 - DES. FED. MARLI FERREIRA AGRAVANTE: MUNICIPIO DE SAO VICENTE Advogado do(a) AGRAVANTE: KARLA APARECIDA VASCONCELOS ALVES DA CRUZ - SP154465-A AGRAVADO: MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE SAO PAULO, MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP OUTROS PARTICIPANTES: INTERESSADO: UNIAO FEDERAL, ESTADO DE SAO PAULO, PLUMBUM COMERCIO E REPRESENTACOES DE PRODUTOS MINERAIS E INDUSTRIAIS LTDA., ICIPAR EMPREENDIMENTOS E PARTICIPACOES S.A, IRINEU PRADO BERTOZZO, RUMO MALHA PAULISTA S.A. ADVOGADO do(a) INTERESSADO: FABIANO LIMA DE MORAIS R E L A T Ó R I O Trata-se de agravo de instrumento interposto pelo MUNICÍPIO DE SÃO VICENTE contra decisão que, em ação civil pública, determinou, no prazo de 30 dias, a realização das medidas relativas ao “congelamento” de invasão, em área de União e particular, localizadas na Vila Samaritá ou Fazendinha (área continental de São Vicente), bem como que em 120 dias fosse realizado processo administrativo de demarcação urbanística, fixando multa mensal de R$ 26.530,00, no caso de descumprimento. Afirma que a r. decisão proferida enseja lesão grave ao agravante e de difícil reparação, uma vez que impõe ao Município, o ônus de atender, em exíguo prazo, obrigações de árduo ou impossível cumprimento, diante da complexidade da causa e das medidas a serem realizadas, as quais decorrem de invasão em ÁREA PARTICULAR, de propriedade de empresas e pessoa física, o que enseja a indevida destinação de recursos públicos municipais em proveito particular, além da área pública da União, como considerado nos autos, invadida há mais de uma década, sujeitando as medidas necessárias e soluções pelos particulares e pelo ente federal e não pelo Município, como na decisão ora agravada. Alega que vem tomando medidas, dentro de seus limites de atuação, para enfrentar a questão relativa às ocupações irregulares em seu território, entretanto, ante a repercussão do problema social envolvido, relativo a habitação de famílias, não é possível que a solução seja conferida de forma imediata e ampla ou, nos exíguos prazos estabelecidos pelo Ministério Público Estadual na exordial. Explica que o caso concreto apresenta relevantes peculiaridades, ante problemas enfrentados em outras áreas do Município (que já são objeto de ações judiciais, como o Processo nº 0007381-85.2016.403.6141; Processo nº 0007652-94.2016.403.6141), posto que envolve área particular de grande dimensão de propriedade de empresa privada, a ICIPAR, que simplesmente deixou de cuidar do imóvel, se omitindo nos deveres de proteção de área que tinha como objetivo a compensação ambiental de outro dano ocasionado, tornando ainda mais grave a situação. Acrescenta que, incabível a r. decisão agravada, em face do Município, por se tratar, em parte, de área pública da União, ente público que tem o dever de zelar por sua propriedade, para que cumpra sua função social, a qual deve arcar com todos os atos necessários, designação de pessoal, estrutura e recursos financeiros para tanto. Sustenta ser parte ilegítima para figurar no polo passivo da demanda e que inexiste interesse processual na demanda, por ausência do binômio necessidade-adequação. Declara que, em que pese às dificuldades enfrentadas, em razão da problemática questão social envolvida, bem como por se tratar de grande área particular (de propriedade da ICIPAR, Irineu Bertozo e Plumbum) e a União, vem realizando efetivas medidas no sentido de exercer suas funções fiscalizatórias quanto ao ordenamento urbano, como consta dos documentos anexados aos autos, relativos ao cadastramento das pessoas, identificação das moradias, entre outras providências. Adverte que não tem se quedado inerte para tratar de ocupações irregulares de áreas localizadas em seu território, bem como acerca de questões sociais relativas a habitações para pessoas de baixa renda, além da execução das medidas relativas ao uso e ocupação do solo e de proteção ambiental, observando seus deveres constitucionais e legais. Anota que o empreendedor privado, ICIPAR EMPREENDIMENTOS E PARTICIPAÇÕES ingressou com Ação de Reintegração de Posse, Processo nº 1001615-96.2014.8.26.0590, em trâmite na 2ª Vara Cível de São Vicente e, apesar disso não avançou nas providências necessárias para a proteção de sua propriedade, cumprimento de seu compromisso ambiental relativo a outro processo, deixando arquivar os autos da mencionada ação. Observa que a inércia da ICIPAR, proprietária da área em devidamente exercer seus deveres quanto a proteção desta, ocasionou o dano ambiental e social objeto do presente. Defende que não pode a Municipalidade arcar com os ônus decorrentes do cumprimento da r. decisão de antecipação de tutela jurisdicional, ante a notória omissão do particular em velar pela sua propriedade. Consigna que o processo no qual foi proferida a r. decisão ora agravada envolve complexo problema ambiental e social, porém, neste caso, resta cristalino que os particulares, em especial, a ICIPAR, ante a dimensão de sua propriedade (vide cópias anexas dos documentos que constam do Processo nº 1001615-96.2014.8.26.0590, em trâmite na 2ª Vara Cível de São Vicente) sabendo do dano ambiental que estava sendo perpetrado em sua propriedade, que inclusive estaria sendo utilizada como compensação ambiental de outro impacto ao meio ambiente, perpetrado pela empresa, manteve-se inerte, não realizando as providências necessárias que lhes cabia. Assinala que ela, ao contrário, buscou realizar as medidas possíveis, inclusive com a identificação das construções irregulares, cadastramento das pessoas, os quais foram utilizados no presente e nos autos do Processo nº 1001615-96.2014.8.26.0590, em trâmite na 2ª Vara Cível de São Vicente. Assim, atesta que envidou esforços e recursos para buscar coibir a invasão, porém a responsabilidade direta e principal é dos particulares, ICIPAR, Irineu Bertozzo, Plubum, Rumo Malha Paulista S.A., bem como da União, também proprietária da área. Acrescenta que, o problema relativo a segurança pública é de responsabilidade do Estado de São Paulo. Assim, se os interessados do presente recurso, corréus da ação, não conseguem avançar nas providências quanto ao congelamento da área é por omissão do Estado na observância do artigo 144 da Constituição Federal. Frisa que é inviável arcar, como vem tentando realizar, praticamente sozinho, as medidas para a área, em grande parte particular, destacando-se as dificuldades relativas as medidas necessárias para impedir novas ocupações na área privada e na pública da União, bem como para o custeio das providências relacionadas ao cadastramento de ocupantes da área, topografia para demarcação urbanística e projetos para eventual regularização fundiária, ante a ausência de corpo técnico e recursos financeiros para tanto. Pondera que, caso se entenda pela manutenção da r. decisão, ora agravada, deveria esta ser reformada para que os particulares, em especial, a ICIPAR, proprietária da maior parte do local invadido e a União, cumpram seus termos e não ela. Destaca que, considerando o problema social habitacional e o ambiental, sua solução envolve necessariamente a viabilidade financeira e orçamentária, relativa a destinação de maiores recursos para tal demanda, critério que incumbe ao Poder Executivo e não ao agravado, que pretende estabelecer providências e prazos de cumprimento inviável. Acrescenta que a tutela de urgência, ora concedida, se confunde com o mérito, sendo absolutamente temerário seu deferimento. Argumenta que, ainda que não se pretenda invocar o princípio da reserva do possível, certo é que a limitação financeira impõe ao Poder Público Municipal o dever de arcar com questões extremamente urgentes e prioritárias, não conseguindo, de uma só vez solucionar problemas de ocupação irregular, envolvendo inclusive áreas da União, além de área particular, de grande extensão, como as ora tratadas, ainda mais em sede de antecipação de tutela. Pontua que, nesse compasso, incabível a Municipalidade ser ainda condenada, como determinou a r. decisão agravada, a realizar medidas em proveito econômico de grande área particular, de propriedade de empreendedores, em especial, a ICIPAR. Na sua contraminuta, o MPF declara que, nos termos do art. 23, da CF, compete aos municípios, concorrentemente à União, Estado e Distrito Federal, a proteção do meio ambiente, bem como a promoção de construção de moradias e a melhoria das condições habitacionais e de saneamento básico. Anota que a competência quanto à urbanização está, inclusive, prevista na Lei Orgânica do Município-agravante. Defende que o Município de São Vicente é responsável pela ocupação desordenada no núcleo Vila Samaritá e Fazendinha, já que deveria ter exercido com eficiência seu poder de polícia, mas não o fez. Adverte que, como titular do poder/dever de polícia na ordenação do uso e ocupação do solo, incumbia ao Município de São Vicente a adoção de medidas administrativas para impedir a implantação de construções em desconformidade com a lei e sem licenças e em áreas reservadas em sua grande parte para a preservação ambiental. Anota que, conforme apurado no inquérito civil do Ministério Público, do Estado de São Paulo – IC 832/2013 – a ocupação do núcleo Vila Samaritá ou Fazendinha foi registrada pelo Plano Local de Habitação de Interesse Social (PHLIS 2009), sob responsabilidade do Município de São Vicente. Narra que no referido plano foram identificados no município em comento 38 (trinta e oito) assentamentos precários, sendo 15 (quinze) na área continental e 23 (vinte e três) na área insular, totalizando, cerca de 27.115 famílias vivendo em condições precárias de habitação O núcleo Fazendinha, conforme Lei Municipal 271/99 de Zoneamento de São Vicente, tem seu primeiro registro em 2007. Relata que, a partir de 2012, expandiu-se consideravelmente, avançando sobre demais áreas de preservação ambiental. Acrescenta que, assistentes técnicos da Promotoria do Ministério Público do Estado de São Paulo constataram, por meio de parecer, que a área invadida apresenta risco hidrológico e completa ausência de saneamento básico, estando a população ali residente exposta à insalubridade e vulnerabilidade social. Atenta que o laudo técnico produzido conclui que deveriam ser tomadas ações urgentes pelo Poder Público de fiscalização para o congelamento da ocupação, de forma articulada à atualização do levantamento cadastral dos moradores e remoção das famílias ocupantes e desfazimento da ocupação. Alerta que não prospera a alegação da agravante de prazo exíguo para cumprimento da liminar, visto que tal prazo não pode ser considerado pequeno, especialmente diante do tempo em que o problema se perpetra. Expõe que, conforme informação prestada pelo Cartório de Registro de Imóveis de São Vicente, a ocupação desordenada estabeleceu-se sobre área particular e pública de concessão da ALL – América Latina Logística Malha Paulista S/A. Argumenta que, não obstante grande parte da área ocupada pertencer a ICIPAR EMPREENDIMENTOS E PARTICIPAÇÕES, o Município de São Vicente merece figurar no polo passivo da ação civil pública, em razão da inobservância ao disposto no art. 182 da Constituição Federal e nas Leis 10257/2001 (lei federal) e Lei Complementar nº 917 do Município de São Vicente – Plano Diretor, no tocante à política urbana. Relata que, em 24.01.2014, foi realizada reunião, da qual participou o procurador do Município-agravante, na qual foram acordados diversos pontos, cabendo ao munícipio várias medidas. Menciona que, do exame do teor das reuniões do GAEMA/BS, de 24.01.14 e 03.03.2014, e da vistoria técnica realizada por peritos do Ministério Público de São Paulo, em 15.08.16, depreende-se que apesar da situação de precariedade das ocupações e da irregularidade ambiental latente, o Município de São Vicente não cumpriu os compromissos firmados, redundando no agravamento da situação habitacional de diversas famílias, desprovidas de condições mínimas de moradia: domicílios abastecidos por redes clandestinas de água, ausência de rede de esgoto, ligações clandestinas de energia, inexistência de drenagem de águas pluviais urbanas e de serviço de coleta de resíduos sólidos. A par disso, assevera que não prospera a alegação de inexistência de interesse de agir sustentada pelo Município de São Vicente. Este firmou compromissos, em reuniões do GAEMA/BS, mas não os cumpriu. Desta feita, diante da probabilidade do direito e o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo, formulou-se pedido de tutela antecipada na presente ação civil pública. Declara que não há qualquer violação à separação dos Poderes, diante da manifesta ilegalidade na conduta do Município de São Vicente que se mantém omissa quanto às ocupações irregulares na área objeto desta ação civil pública. Frisa que o continuado incremento das ocupações irregulares na área do núcleo “Vila Samaritá ou Fazendinha” bem evidencia que as obrigações assumidas pelo Município de São Vicente/SP e pela União quanto ao convênio em questão não vem sendo cumpridas, o que, longe de justificar o afastamento da tutela de urgência deferida pela decisão agravada, em verdade reforça a necessidade de intervenção do Poder Judiciário para assegurar o cumprimento das obrigações legais dos referidos entes federativos, os quais permanecem em manifesto estado de inércia. Dessa forma, assinala que resta evidente que a decisão agravada não importou em violação à separação dos Poderes, sendo que somente houve atuação do Poder Judiciário em virtude da manifesta inércia dos entes federativos em agir para coibir ocupações irregulares na área em questão, o que vem possibilitando a ocorrência de danos ambientais e inadequado uso e ocupação do solo. Por fim, afirma que a urgência em assegurar o resultado útil da presente ação civil pública está nítida em virtude da manifesta inércia do Poder Público quanto à área em questão, que se arrasta por mais de uma década, bem como pelo ritmo explosivo do aumento das ocupações irregulares, que fica evidente pelas imagens que instruem a presente contraminuta. Assim, pede que seja mantida a decisão agravada. Acrescenta que, ao contrário do alegado pela agravante, o valor das astreintes fixadas pela decisão agravada não se mostra excessivo, sendo, ao contrário, muito inferior ao pleiteado pelo autor público. O d. representante do Ministério Público Federal, nesta Corte, manifestou-se pelo desprovimento do recurso. É o relatório.
ADVOGADO do(a) INTERESSADO: VICTOR PENITENTE TREVIZAN
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5026323-68.2019.4.03.0000 RELATOR: Gab. 12 - DES. FED. MARLI FERREIRA AGRAVANTE: MUNICIPIO DE SAO VICENTE Advogado do(a) AGRAVANTE: KARLA APARECIDA VASCONCELOS ALVES DA CRUZ - SP154465-A AGRAVADO: MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE SAO PAULO, MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP OUTROS PARTICIPANTES: INTERESSADO: UNIAO FEDERAL, ESTADO DE SAO PAULO, PLUMBUM COMERCIO E REPRESENTACOES DE PRODUTOS MINERAIS E INDUSTRIAIS LTDA., ICIPAR EMPREENDIMENTOS E PARTICIPACOES S.A, IRINEU PRADO BERTOZZO, RUMO MALHA PAULISTA S.A. ADVOGADO do(a) INTERESSADO: FABIANO LIMA DE MORAIS V O T O A Exma. Senhora Desembargadora Federal MARLI FERREIRA (Relatora): O recurso não comporta provimento. A decisão agravada restou assim proferida: “... Preambularmente, cumpre apreciar as questões preliminares suscitadas pelos réus, à exceção daquelas lançadas em contestação e outras ao final desta decisão expressamente ressalvadas. O artigo 5º da Lei nº 7.347/85 é expresso quanto aos legitimados ativos concorrentes para a propositura de ação civil pública, entre eles o Ministério Público e a União, os Estados e os Municípios. Frise-se, nesse ponto, não haver a lei feito distinção entre o Ministério Público Federal e o Estadual. Estabelece, ainda, o parágrafo 5º desse artigo: ‘(...) 5º. Admitir-se-á o litisconsórcio facultativo entre os Ministérios Públicos da União, do Distrito Federal e dos Estados na defesa dos interesses e direitos de que cuida esta lei.’. A possibilidade de atuação do Ministério Público Estadual nesta causa decorre da natureza difusa do direito a ser tutelado, pretendendo a lei a conjugação de esforços para obter uma eficaz reparação do dano causado, como também preconiza o artigo 14, § 1º, da Lei nº 6.938/81, no que se refere à questão ambiental objeto desta lide. De outra parte, se ao legitimado concorrente é possível a inclusão no polo ativo da demanda na qualidade de litisconsorte facultativo, também o é sua aceitação como parte processual. O interesse jurídico do MPSP está mais do que evidente, pois busca, também, a promoção da regularização fundiária e das soluções para o grave problema de moradia nos locais em análise. Não há hierarquia entre as divisões do Ministério Público, pois todos extraem sua competência de uma mesma fonte: a Constituição Federal. Os princípios da unidade, indivisibilidade e independência funcional são atributos internos de cada um dos Ministérios Públicos, não afastando a autonomia administrativa de cada órgão ministerial. Nesse sentido, confira-se, ainda, a seguinte ementa (g. n.): ... Conquanto sustente a ilegitimidade ativa do MPSP e a legitimidade ativa do Ministério Público Federal com fundamento na tutela de bem da União, esta, na sequência, alega sua ilegitimidade passiva, o que já demonstra aparente contradição da sua peça de defesa preliminar. Não há ainda que se cogitar no afastamento da legitimidade passiva da União porque: a) incontroversa a existência da ocupação desordenada sobre faixas de domínio de linha férrea e possivelmente sobre terrenos de marinha, tendo em vista que os documentos apresentados apontam que a área está sujeita às ações de elevação das marés. b) a própria legislação invocada reforça a necessidade de sua integração à lide (Lei nº 11.445/2007, artigo 48, II, VI e XI); e c) o Ministério Público Federal manifestou interesse no feito aduzindo que o Poder Público em todas as suas esferas foi omisso, na medida em que não garantiu a preservação do meio ambiente e também não exerceu o seu poder de polícia para garantir a regular ocupação do solo urbano. Justificada, portanto, está, a um só tempo, sua legitimidade passiva e a competência da Justiça Federal. A alegação de litispendência ventilada pela União e reconhecida em parte pelo Ministério Público Federal não merece acolhida, ao menos por ora, pois as informações constantes dos autos indicam que além de distintas as partes, também são distintos os pedidos, que nesta ação consiste em implantação de programa habitacional, além de recuperação de área de preservação ambiental e no feito em trâmite perante a Justiça Federal de Santos trata de recuperação e utilização de ferrovia concedida. As alegações de falta de interesse processual e de ilegitimidade passiva, tal como declinadas pelo Município de São Vicente, Estado de São Paulo, Rumo Malha Paulista S.A. e Plumbum Comércio e Representações de Produtos Minerais e Industriais Ltda. confundem-se com o mérito da ação, de modo que serão apreciadas no momento oportuno. Passo, nessa medida, à análise dos requerimentos de tutela de urgência. A área objeto deste processo corresponde a um núcleo de habitação surgido na área continental de São Vicente. Os documentos constantes dos autos indicam que a ocupação irregular do núcleo habitacional ‘Vila Samaritá ou Fazendinha’ teve início no ano de 2007. O início da apuração realizada pelo Ministério Público do Estado de São Paulo teve como ponto de partida ofício oriundo da Polícia Militar Ambiental que encaminhava diversos autos de infração ambiental consistente em supressão de vegetação nativa e impedimento de regeneração natural, sem autorização do órgão competente, além de construção de moradias irregulares, documento id 1356579. A partir desses dados, foram realizadas diligências por técnicos a requerimento do órgão ministerial (documento id 1359490) e outras informações foram, ao longo dos trabalhos de apuração, prestadas pelo Município de São Vicente, pela SABESP – Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo, pela CPFL – Companhia Piratininga de Força e Luz, pela CEF – Caixa Econômica Federal, além do Cartório de Registro de Imóveis de São Vicente. Pelo menos oito reuniões foram realizadas sob a coordenação do Ministério Público do Estado de São Paulo e uma tentativa de conciliação pelo Núcleo Permanente de Métodos Consensuais de Solução de Conflitos do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Ao final, constatou-se que não havia programa ou política pública alguma para o local, de nenhuma das esferas de governo, aí incluídas as demandas habitacionais, de saúde, ambientais ou de saneamento básico, conquanto reconhecidos os problemas pelo Município de São Vicente. As pessoas jurídicas de direito privado também não apresentaram solução a invasão das áreas sob sua responsabilidade. A partir da comprovação desses fatos, torna-se imperativo, de outro lado, reconhecer a existência de comandos constitucionais e legais que impõem a parte dos réus, pessoas jurídicas de direito público, obrigações no que se refere: a) à preservação do meio ambiente, especialmente dos mangues e demais áreas de preservação permanente situados nos locais em questão (Constituição Federal – CF/1988, artigos 23, VI, e 225, § 1º, e Lei nº 12.651/2012, artigo 1º-A); b) à execução da política de desenvolvimento urbano e a promoção de programas de habitação (CF/1988, artigos 23, IX, 30, VIII, e 182, Lei nº 10.257/2001, artigos 2º a 4º, e Lei nº 11.124/2005); c) à regulamentação e execução da Política Nacional do Meio Ambiente (Lei nº 6.938/81, especialmente artigos 2º e 4º a 6º); e d) à promoção e execução de programas e serviços de saúde e saneamento (Lei nº 8.080/90, em especial os artigos 2º, 3º, 6º, 9º, 13 e 15/18); Como se vê, conquanto seja mais evidente a responsabilidade do poder público municipal sobre a deficiência no poder de polícia no que respeita o uso e ocupação do solo sobre área situada em seus limites, incumbindo-lhe impedir a implantação de construções em desconformidade com a lei, sem licenças e em locais não loteados ou destinados a finalidades públicas, à União e ao Estado também são imputadas obrigações e, nesse passo, impostas as medidas concretas para solução dos problemas constatados originados da omissão dos réus por mais de uma década, a julgar pelo PRIMAHD de 2005. No caso da União, acresça-se o fato da ocupação avançar sobre faixa de domínio de linha férrea concedida e possivelmente sobre terrenos de marinha e acrescidos de marinha. Embora esteja em pleno vigor o princípio da separação dos poderes, inscrito no artigo 2º da Constituição Federal, e deva ser reconhecida a limitação da disponibilidade financeira dos três réus, em especial do Município de São Vicente, para cumprir satisfatoriamente todas as suas obrigações legais e constitucionais e proporcionar à população vicentina o gozo dos seus direitos mais elementares, como saúde, habitação e educação, não se pode olvidar a ausência manifesta de medidas palpáveis para equalizar os graves problemas enumerados na petição inicial. Nessa medida, impõe-se, diante do descumprimento da lei e conforme autorizam as regras do Estado Democrático de Direito (CF, artigo 1º), a imposição das obrigações necessárias e impostergáveis, de um poder sobre o outro, não se tratando de violação ao princípio da discricionariedade do administrador. Destaca-se que o princípio da separação dos poderes possui como contrapeso o princípio da harmonia dos poderes, o que não só possibilita, mas também impõe, a fim de evitar o exercício abusivo de qualquer deles, a fiscalização e o controle de uns pelos sobre os outros, pela Teoria dos freios e contrapesos, idealizada, inicialmente por Montesquieu. Desse modo, vislumbrando-se o abuso pelo Poder Executivo no exercício de suas funções, no caso, da função do Poder de Polícia a ele inerente, faz-se necessária a intervenção do Poder Judiciário, quando provocado, a fim de manter-se a harmonia entre os três poderes. Inaplicável o princípio da reserva do possível no caso dos autos, especialmente quando contraposto ao princípio do mínimo existencial. A consulta ao anexo e a observação das fotografias que o acompanham são suficientes para concluir que não há possibilidade de impor as medidas requeridas diretamente às famílias invasoras, sem falar na gravidade da situação que assola a região. Conforme narrado são dezenas de milhares de famílias envolvidas. O Município de São Vicente não demonstrou a efetividade do seu poder de polícia administrativa no que se refere à degradação ambiental e permanente apossamento irregular de terrenos situados nesse núcleo, de maneira que tanto o interesse processual faz-se presente nesta lide quanto o deferimento dos pedidos liminares deduzidos pelo MPSP mostram-se necessários na exata medida do que preconiza o artigo 300 do Código de Processo Civil, ou seja, a fim de evitar risco ao resultado útil do processo. Ressalte-se que, embora seja amplo e demasiadamente complexo o objeto da ação, a pretensão cautelar do autor destina-se, em síntese, a impedir o avanço das invasões mediante a demonstração de um controle mínimo sobre os limites das áreas de preservação permanente e dos loteamentos vizinhos, sem o qual qualquer medida posterior de efetiva recuperação ambiental, regularização fundiária ou solução para habitação das pessoas destes locais será inviável e temporária. Não assiste razão ao Município ao sustentar a impossibilidade da concessão da tutela de urgência contra os entes federados porque as demandas requeridas em caráter provisório não se confundem com os pedidos finais. E não há, como entende o Município, contradição alguma entre o deferimento de medida antecipatória e o reexame necessário da sentença garantido aos réus precisamente porque os artigos 300 e seguintes do CPC não fazem qualquer ressalva às pessoas jurídicas de direito público. Quanto ao Estado de São Paulo, verifica-se que cabe à Polícia Militar Ambiental a prevenção e repressão às infrações cometidas contra o meio ambiente, sem prejuízo da atuação da Polícia Militar. Assim, de rigor a concessão das obrigações requeridas a título de liminar (fls. 59 e 60, documento id 1356188), com as seguintes observações: 1) o controle e fiscalização do uso e ocupação do solo e das áreas de preservação permanente deverão ser realizadas diretamente pelo Município com auxílio do Estado de São Paulo por intermédio da Polícia Militar e da Polícia Militar Ambiental; 2) a elaboração e execução do processo administrativo de demarcação dos núcleos será realizado pelo Município, por meio de suas secretarias municipais, requisitando auxílio de servidores do Estado de São Paulo e da União Federal sempre que necessário e devidamente justificado; 3) os custos extraordinários para realização dessas tarefas (não inclusos, portanto, a despesa de servidores e custos materiais já destinados aos trabalhos dos órgãos executores pelas respectivas leis orçamentárias) deverão ser rateados em 1/3 para cada réu (União, Estado e Município), e reembolsados ao réu que houver comprovado e justificado o pagamento. Esclareço que as despesas serão oportunamente balanceadas entre todos os réus, na medida de suas responsabilidades. Deixo de determinar a expedição de ofícios ao IBAMA, à CETESB e ao Oficial de Registro de Imóveis local, tal como requerido às fls. 68, por entender que as medidas concedidas em tutela não interferem diretamente na atribuição desses entes, sem prejuízo de sua posterior intimação, caso haja necessidade. Vale lembrar ainda que a Polícia Militar Ambiental executará diretamente os serviços e comunicará ao Município e ao MPSP o resultado de suas diligências e que a regularização fundiária não faz parte dos requerimentos de tutela. No que se refere ao prazo para execução das medidas, assiste razão ao Município quando assevera a exiguidade do prazo, haja vista a dimensão dos trabalhos a serem feitos, a estrutura e as regras a que está sujeita a administração pública e ainda as dificuldades financeiras pelas quais passam todos os entes federados hodiernamente, de modo que devem ser alargados os prazos declinados à fl. 60. Por fim, resta afirmar que a imposição de multa por descumprimento da tutela faz-se imperativa, sob pena de tornar ineficaz a determinação judicial e fazer prevalecer os argumentos dos réus acima já afastados. Ressalte-se que a quantia depositada a esse título deve ser recolhida ao Fundo Estadual de Reparação de Interesses Difusos Lesados ou outro destino deverá ser indicado pelo MPSP. Todavia, reputo exorbitante o valor pleiteado na inicial (1.000 UFESP´s, equivalente a R$ 26.530,00 por dia), o que imporia demasiado sacrifício dos cofres públicos. Dessa forma, sem deixar de observar a finalidade da multa, arbitro-a em R$ 26.530,00 por mês para cada réu implicado nesta decisão (União, Estado e Município). Isto posto, com fulcro nos artigos 300 e 301 do Código de Processo Civil (CPC), defiro a tutela de urgência a fim de determinar: a) ao Município de São Vicente que inicie, no prazo de 30 dias a contar da intimação desta decisão e até a sentença, o efetivo controle e fiscalização semanal do uso e ocupação do solo e das áreas de preservação permanente situados no núcleo Vila Samaritá ou Fazendinha, de modo a promover o ‘congelamento’ da atual situação habitacional, para o que deverá praticar todos os atos administrativos eficazes à repreensão, prevenção e correção das infrações, como impedir, interditar, embargar e demolir novas construções e obras irregulares observadas a partir de então, notificar infratores, apreender instrumentos, materiais de construção, equipamentos, maquinários e ferramentas; b) à Polícia Militar Ambiental, no mesmo prazo da letra “a”, que realize nos locais em questão ao menos duas diligências de fiscalização mensais. c) à Policia Militar do Estado de São Paulo que preste auxílio ao Município e à Polícia Militar Ambiental para cumprimento das medidas acima indicadas, sempre que requisitado para tanto e sem necessidade de expedição de ofício para cada diligência; d) ao Município de São Vicente que inicie, no prazo de 120 dias a contar da intimação desta decisão, processo administrativo de demarcação urbanística do núcleo Vila Samaritá ou Fazendinha, no qual seja providenciado: 1. um levantamento técnico das áreas, com planta e memorial descritivo; 2. a demarcação e delimitação dos imóveis públicos e privados ocupados irregularmente; 3. a identificação completa das construções irregulares e de seus ocupantes, inclusive no que se refere à natureza e tempo de posse, e 4. a comunicação efetiva do processo de ‘congelamento’ da área aos seus ocupantes atuais mediante placas, avisos e mobilização das associações de moradores interessadas, autorizada a requisição de auxílio de servidores do Estado de São Paulo e da União Federal sempre que necessário e devidamente justificado; e) aos três réus (União, Estado e Município) que arquem com os custos extraordinários para realização dessas tarefas (não inclusos, portanto, a despesa de servidores e custos materiais já destinados aos trabalhos dos órgãos executores pelas respectivas leis orçamentárias) na proporção de 1/3 para cada réu, devendo reembolsar ao réu que houver comprovado e justificado o pagamento, sem prejuízo de futura compensação com os demais réus, mediante apuração das respectivas responsabilidades. A demonstração do cumprimento dessas medidas deverá ser feito mediante a entrega de relatórios bimestrais diretamente ao MPSP (10ª PJ Natural de Meio Ambiente de São Vicente) e ao MPF, sem prejuízo da prestação de informações complementares, a requerimento do Parquet. O réu que descumprir essas medidas deverá pagar multa de R$ 26.530,00 por mês comprovado de descumprimento (União, Estado e Município). Sem prejuízo, intimem-se: O Ministério Público Estadual e o Ministério Público Federal para que apresentem documentos, caso existam, que comprovem a apuração de eventual crime ambiental, além do favorecimento das invasões por parte de integrantes da administração pública; A Rumo Malha Paulista S.A., Icipar Empreendimentos e Participações Ltda. e Irineu Prado Bertazzo para que apresentem cópia das petições iniciais e certidões de objeto e pé referentes aos pedidos de reintegração de posse relativos à área objeto do presente feito; A Plumbum Comércio e Representações de Produtos Minerais e Industriais Ltda para que se manifeste acerca do documento id 1356819. Por fim, determino a expedição de ofício ao SPU para que informe, no prazo de 15 (quinze) dias, sobre a existência de RIP referente à área objeto desta ação, bem como o tipo de regime (ocupação ou enfiteuse). Nas hipóteses em que a área está parcialmente inserida em terreno da União, deverá ser esclarecida a respectiva proporção da parte inserida em terreno de marinha e da parte alodial, se for o caso. Na hipótese de não haver o referido registro, em igual prazo, o SPU deverá apresentar informação técnica, instruída com mapas, nos quais constem elementos objetivos que revelem ser imóvel integrante de área considerada como patrimônio da União, com as respectivas demarcações da LPM e LLTM. Citem-se e intimem-se, oportunidade em que os réus deverão manifestar interesse na realização de audiência de conciliação ou mediação. ...” Conforme se extrai da transcrição supra, o provimento recorrido encontra-se devidamente fundamentado, tendo dado à lide a solução mais consentânea possível, à vista dos elementos contidos nos autos. Desta feita, não tendo o recurso apresentado pela agravante trazido nada de novo que pudesse infirmar o quanto decidido, de rigor a manutenção da decisão agravada, por seus próprios fundamentos. Registre-se, por oportuno, que a adoção, pelo presente julgado, dos fundamentos externados na sentença recorrida - técnica de julgamento "per relationem" -, encontra amparo em remansosa jurisprudência das Cortes Superiores, mesmo porque não configura ofensa ao artigo 93, IX, da CF/88, segundo o qual "todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade (...)". Confiram-se, nesse sentido, os seguintes julgados: "EMBARGOS DE DECLARAÇÃO - INOCORRÊNCIA DE CONTRADIÇÃO, OBSCURIDADE OU OMISSÃO - PRETENDIDO REEXAME DA CAUSA - CARÁTER INFRINGENTE - INADMISSIBILIDADE - INOCORRÊNCIA DE CONSUMAÇÃO, NA ESPÉCIE, DA PRESCRIÇÃO PENAL - INCORPORAÇÃO, AO ACÓRDÃO, DAS RAZÕES EXPOSTAS PELO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL - MOTIVAÇÃO "PER RELATIONEM" - LEGITIMIDADE JURÍDICO- CONSTITUCIONAL DESSA TÉCNICA DE FUNDAMENTAÇÃO - DEVOLUÇÃO IMEDIATA DOS AUTOS, INDEPENDENTEMENTE DA PUBLICAÇÃO DO ACÓRDÃO, PARA EFEITO DE PRONTA EXECUÇÃO DA DECISÃO EMANADA DA JUSTIÇA LOCAL - POSSIBILIDADE - EMBARGOS DE DECLARAÇÃO REJEITADOS. (...) - Reveste-se de plena legitimidade jurídico-constitucional a utilização, pelo Poder Judiciário, da técnica da motivação ‘per relationem’, que se mostra compatível com o que dispõe o art. 93, IX, da Constituição da República. A remissão feita pelo magistrado - referindo-se, expressamente, aos fundamentos (de fato e/ou de direito) que deram suporte a anterior decisão (ou, então, a pareceres do Ministério Público ou, ainda, a informações prestadas por órgão apontado como coator) - constitui meio apto a promover a formal incorporação, ao ato decisório, da motivação a que o juiz se reportou como razão de decidir. Precedentes." (STF, AI 825520 AgR-ED, Relator Ministro CELSO DE MELLO, Segunda Turma, j. 31/05/2011, DJe 09/09/2011) “AGRAVO INTERNO. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. FUNDAMENTAÇÃO PER RELATIONEM. POSSIBILIDADE. 1. Consoante o entendimento pacificado do Superior Tribunal de Justiça, não há que se falar em nulidade por ausência de fundamentação ou por negativa de prestação jurisdicional a decisão que se utiliza da fundamentação per relationem. Precedentes. Incidência da Súmula n° 83/STJ. 2. Não se admite o recurso especial quando a questão federal nele suscitada não foi enfrentada no acórdão recorrido. Incidem as Súmulas 282 e 356 do Supremo Tribunal Federal (STF). 3. Agravo interno a que se nega provimento.” (STJ, AgInt no AREsp 1322638/DF, Relatora Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, j. 11/12/2018, DJe 18/12/2018) "AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. DENUNCIAÇÃO CALUNIOSA. TEMPESTIVIDADE DO RECURSO ESPECIAL COMPROVADA NO AGRAVO. POSSIBILIDADE. ACÓRDÃO COM FUNDAMENTAÇÃO PER RELATIONEM. AUSÊNCIA DE NULIDADE. PROCESSO ADMINISTRATIVO INSTAURADO. TIPICIDADE. DOLO. NECESSIDADE DE INCURSÃO VERTICAL NA ANÁLISE DAS PROVAS. SÚMULA 7. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. Não há cogitar nulidade do acórdão por ausência de fundamentação ou ofensa ao artigo 93, IX, da Constituição Federal 1988, se o órgão julgador na origem, ao apreciar a apelação, se utiliza de trechos de decisão anterior ou de parecer ministerial como razão de decidir, não configura ofensa ao princípio constitucional da motivação das decisões judiciais (APn n. 536/BA, Corte Especial, Dje 4/4/2013). (...) 5. Agravo regimento não provido." (STJ, AgRg no REsp 1482998/MT, Relator Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, j. 13/11/2018, DJe 03/12/2018) "PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. APLICABILIDADE. VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CPC. INOCORRÊNCIA. OMISSÃO E CONTRADIÇÃO. NÃO CARACTERIZAÇÃO. MOTIVAÇÃO PER RELATIONEM. LEGITIMIDADE JURÍDICO-CONSTITUCIONAL DESSA TÉCNICA DE FUNDAMENTAÇÃO. VALIDADE. DIREITO AMBIENTAL. ART. 10 DA LEI N. 6.938/81. COMPETÊNCIA PARA LICENCIAMENTO. PODER FISCALIZATÓRIO. IBAMA. POSSIBILIDADE. ÁREAS DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. DIREITO ADQUIRIDO. FATO CONSUMADO EM MATÉRIA AMBIENTAL. AUSÊNCIA. REVISÃO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA N. 7/STJ. INCIDÊNCIA. SENTENÇA ABSOLUTÓRIA. AUSÊNCIA DE PROVAS. INCOMUNICABILIDADE DAS ESFERAS ADMINISTRATIVA E PENAL. ARGUMENTOS INSUFICIENTES PARA DESCONSTITUIR A DECISÃO ATACADA. HONORÁRIOS RECURSAIS. NÃO CABIMENTO. APLICAÇÃO DE MULTA. ART. 1.021, § 4º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. DESCABIMENTO. (...) IV - O Supremo Tribunal Federal chancelou a técnica da motivação per relationem, por entender que se reveste de plena legitimidade jurídico-constitucional e se mostra compatível com o que dispõe o artigo 93, IX, da Constituição Federal. A remissão feita pelo magistrado - referindo-se, expressamente, aos fundamentos (de fato e/ou de direito) que deram suporte à anterior decisão (ou, então, a pareceres do Ministério Público ou, ainda, a informações prestadas por órgão apontado como coator) - constitui meio apto a promover a formal incorporação, ao ato decisório, da motivação a que o juiz se reportou como razão de decidir. Precedentes. (...) XII - Agravo Interno improvido." (AgInt no REsp 1283547/SC, Relatora Ministra REGINA HELENA COSTA, PRIMEIRA TURMA, j. 23/10/2018, DJe 31/10/2018) Anote-se que, tendo em vista que a controvérsia versa sobre responsabilidade civil ambiental, leva-se em conta a tutela do direito à qualidade de vida, o direito de viver em meio ambiente ecologicamente equilibrado. Por isso, além das medidas protetivas e preservativas a Constituição Federal (§ 1º, incisos I a VII, do artigo 225) prevê a responsabilização dos agentes causadores do dano ao meio ambiente tanto na esfera administrativa, quanto nas esferas civil e penal (§ 3º, do referido artigo). A responsabilidade pelo dano ambiental é objetiva, isto é, independe da existência culpa (art. 14, §1º, da Lei n. 6.938/81), mormente quando comprovado o nexo causal entre a conduta e o dano. Vide precedentes: REsp 1307938/GO, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, DJe 16/09/2014; AgRg no AREsp 165.201/MT, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 22/06/2012; REsp 570.194/RS, Rel. Ministra Denise Arruda, Primeira Turma, DJ 12/11/2007. Dessarte, a ação civil pública pode ser proposta contra todos responsáveis diretos e indiretos pelos danos causados, ou apenas contra algum ou alguns deles, no caso aqui, proposta contra o poder público municipal, o que não o impede de exercer o direito de regresso em ação autônoma, na hipótese de eventual procedência do pedido. A par disso, não há como a alegação de ilegitimidade passiva e de que área discutida é de propriedade de particular e/ou da União Federal, sobretudo, em razão à responsabilização da agravante quanto à função fiscalizatória referente ao ordenamento urbano. No presente caso, tal como asseverado pela decisão agravada, não há como acolher a alegação quanto à fixação de prazo exíguo para adoção das medidas impostas, uma vez que a questão quanto ao local situado na área do Município-agravante já está sendo debatida desde 2007. Pelos mesmos motivos também não há como acolher a alegação da recorrente que vêm tomando as devidas medidas, dentro dos limites de sua atuação, diante dos fatos narrados, os quais demonstram que as referidas medidas não foram suficientes para evitar a continuidade do dano ambiental. Além disso, em situações que tratam de dano ambiental devem ser aplicados os princípios da precaução e da prevenção, certamente observados pela decisão recorrida. Nesse sentido, calha transcrever o seguinte julgado: “PROCESSUAL CIVIL E AMBIENTAL. MANDADO DE SEGURANÇA. DESMATAMENTO ILEGAL. CASTANHEIRA (BERTHOLLETIA EXCELSA). TRANSPORTE E COMÉRCIO IRREGULAR DE MADEIRA. ESTADO DE DIREITO AMBIENTAL. INFRAÇÃO.INTERDIÇÃO/EMBARGO E SUSPENSÃO ADMINISTRATIVOS, PREVENTIVOS OU SUMÁRIOS, PARCIAIS OU TOTAIS, DE OBRA, EMPREENDIMENTO OU ATIVIDADE.LACRE DE ESTABELECIMENTO COMERCIAL. ART. 72, INCISOS VII E IX, DA LEI 9.605/1998. ART. 45 DA LEI 9.784/1999. ART. 70 DA LEI 12.651/2012. LISTA NACIONAL OFICIAL DE ESPÉCIES DA FLORA AMEAÇADAS DE EXTINÇÃO (PORTARIA 443/2014 DO MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE). LAVANDERIAS FLORESTAIS. HISTÓRICO DA DEMANDA ... 7. Fundado nos princípios da prevenção e da precaução, o embargo administrativo preventivo (ou sumário) - medida temporária de restrição da liberdade econômica e de prevalência do interesse público sobre o privado, financeiro ou não - impõe-se como instrumento cautelar a cargo da Administração para estancar, de imediato, conduta danosa ou que ponha em risco futuro o bem jurídico tutelado pela norma em questão, aplicável não só em infrações permanentes como nas instantâneas. O embargo sumário, total ou parcial, ao paralisar obra, empreendimento ou atividade, impede, além do risco de dano futuro, a continuidade, a repetição, o agravamento ou a consolidação de prejuízos coletivos ou individuais, patrimoniais ou extrapatrimonais, entre outras hipóteses a disparar sua aplicação. ... (REsp 1668652/PA, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 27/11/2018, DJe 08/02/2019) Ante o exposto, nego provimento ao agravo de instrumento. É como voto.
ADVOGADO do(a) INTERESSADO: VICTOR PENITENTE TREVIZAN
E M E N T A
AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CONSTITUCIONAL. TUTELA DE URGÊNCIA. DANO AMBIENTAL ILEGITIMIDADE PASSIVA. AFASTADA. MANTIDA A DECISÃO AGRAVADA.
1. O provimento recorrido encontra-se devidamente fundamentado, tendo dado à lide a solução mais consentânea possível, à vista dos elementos contidos nos autos, sendo certo, ainda, que o recurso apresentado pela agravante não trouxe nada de novo que pudesse infirmar o quanto decidido.
2. Decisão agravada mantida por seus próprios fundamentos.
3. Registre-se, por oportuno, que a adoção, pelo presente julgado, dos fundamentos externados na sentença recorrida - técnica de julgamento "per relationem" -, encontra amparo em remansosa jurisprudência das Cortes Superiores, mesmo porque não configura ofensa ao artigo 93, IX, da CF/88, que preceitua que "todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade (...)".
Precedentes do E. STF e do C. STJ.
4. A controvérsia versa sobre responsabilidade civil ambiental, devendo ser considerando, portanto, a a tutela do direito à qualidade de vida, o direito de viver em meio ambiente ecologicamente equilibrado.
5. Além das medidas protetivas e preservativas a Constituição Federal (§ 1º, incisos I a VII, do artigo 225) prevê a responsabilização dos agentes causadores do dano ao meio ambiente tanto na esfera administrativa, quanto nas esferas civil e penal (§ 3º, do referido artigo).
6. A responsabilidade pelo dano ambiental é objetiva, isto é, independe da existência culpa (art. 14, §1º, da Lei n. 6.938/81), mormente quando comprovado o nexo causal entre a conduta e o dano. Vide precedentes: REsp 1307938/GO, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, DJe 16/09/2014; AgRg no AREsp 165.201/MT, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 22/06/2012; REsp 570.194/RS, Rel. Ministra Denise Arruda, Primeira Turma, DJ 12/11/2007.
7. Dessa forma, a ação civil pública pode ser proposta contra todos responsáveis diretos e indiretos pelos danos causados, ou apenas contra algum ou alguns deles, no caso aqui, proposta contra o poder público municipal, o que não o impede de exercer o direito de regresso em ação autônoma, na hipótese de eventual procedência do pedido.
8. Afastada a alegação de ilegitimidade passiva da agravante.
9. Além disso, em situações que tratam de dano ambiental devem ser aplicados os princípios da precaução e da prevenção, certamente observados pela decisão recorrida.
10. Agravo de instrumento a que se nega provimento.