Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 0004464-83.2011.4.03.6104

RELATOR: Gab. 21 - DES. FED. JOHONSOM DI SALVO

APELANTE: ESTADO DE SAO PAULO, UNIÃO FEDERAL, INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVAVEIS, MINISTERIO PUBLICO FEDERAL

Advogado do(a) APELANTE: ORLANDO GONCALVES DE CASTRO JUNIOR - SP94962-A
Advogado do(a) APELANTE: FERNANDO GOMES BEZERRA - SP198751-A
Advogado do(a) APELANTE: MARINEY DE BARROS GUIGUER - SP152489-A

APELADO: MARCOS ANTONIO BERNAUER - EPP, COMPANHIA AMBIENTAL DO ESTADO DE SAO PAULO

Advogados do(a) APELADO: KARLA FERREIRA DE CAMARGO FISCHER - PR38672, GLENDA GONCALVES GONDIM - PR31043
Advogado do(a) APELADO: FERNANDO HENRIQUE GODOY VIRGILI - SP219340

OUTROS PARTICIPANTES:

ASSISTENTE: INSTITUTO CHICO MENDES DE CONSERVAÇÃO DA BIODIVERSIDADE
 

ADVOGADO do(a) ASSISTENTE: MARINEY DE BARROS GUIGUER

 


 

  

APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO (1728) Nº 0004464-83.2011.4.03.6104

RELATOR: Gab. 21 - DES. FED. JOHONSON DI SALVO

APELANTE: ESTADO DE SAO PAULO, UNIÃO FEDERAL, INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVAVEIS, MINISTERIO PUBLICO FEDERAL

Advogado do(a) APELANTE: ORLANDO GONCALVES DE CASTRO JUNIOR - SP94962-A
Advogado do(a) APELANTE: FERNANDO GOMES BEZERRA - SP198751-A
Advogado do(a) APELANTE: MARINEY DE BARROS GUIGUER - SP152489-A

APELADO: MARCOS ANTONIO BERNAUER - EPP, COMPANHIA AMBIENTAL DO ESTADO DE SAO PAULO

Advogados do(a) APELADO: KARLA FERREIRA DE CAMARGO FISCHER - PR38672, GLENDA GONCALVES GONDIM - PR31043
Advogado do(a) APELADO: FERNANDO HENRIQUE GODOY VIRGILI - SP219340

OUTROS PARTICIPANTES:

ASSISTENTE: INSTITUTO CHICO MENDES DE CONSERVAÇÃO DA BIODIVERSIDADE
 

ADVOGADO do(a) ASSISTENTE: MARINEY DE BARROS GUIGUER

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

O Excelentíssimo Senhor Desembargador Federal Johonsom di Salvo, Relator:

 

Trata-se de ação ordinária, com pedido de tutela antecipada, ajuizada em 16/05/2011 perante a Justiça Estadual, Comarca de Cananéia/SP, por MARCOS ANTONIO BERNAUER - EPP, denominado CENTRO NÁUTICO CANANÉIA, em face da COMPANHIA DE TECONOLOGIA DE SANEAMENTO AMBIENTAL - CETESB e do ESTADO DE SÃO PAULO, objetivando obter provimento jurisdicional que (i) imponha aos réus a realização de vistoria técnica no centro náutico e que indiquem, de forma clara, objetiva e transparente quais as pendências e as devidas providências que o autor deverá tomar para regularizar o seu estabelecimento, ou seja, para obter a licença ambiental de operação; (ii) determine ao Departamento Estadual de Recursos Naturais - DEPRN a elaboração de novo parecer, se necessário, precedido da abertura do devido procedimento administrativo, contemplando a utilidade pública e o interesse social do estabelecimento, bem como a inocorrência de dano em área de proteção permanente; e (iii) determine que a CETESB expeça a licença de operação em caráter definitivo, cumpridas as exigências legais pelo autor, desinterditando o estabelecimento de modo definitivo.

O autor narra que, vencedor do certame licitatório nº 01/99, realizado pelo Município de Cananéia para a construção de píer, rampa e escada para uso comunitário, obteve o direito de uso da área onde está erigido o Centro Náutico Cananéia (Avenida Beira Mar, s/nº, Retiro das Caravelas) pelo período de trinta anos.

Continua dizendo que, depois de firmado o contrato, ingressou com novo projeto junto à municipalidade e obteve alvará de licença para a construção de seu empreendimento que, dentre outros, contempla posto de abastecimento de combustível para embarcações.

Após, ingressou com pedido de licença junto aos demais órgãos competentes: Agência Nacional do Petróleo - ANP, Conselho Nacional do Meio Ambiente - CONAMA, Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial - INMETRO, Corpo de Bombeiros, Marinha do Brasil, IBAMA, Secretaria de Patrimônio da União - SPU, Departamento Estadual de Recursos Naturais - DEPRN e Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental - CETESB.

Conta que em agosto/2008 a CETESB lacrou as bombas de combustível por falta de licença ambiental, após a lavratura de três autos de infração.

Alega que a CETESB, "em seu legítimo direito", exige a manifestação prévia favorável do DEPRN, IBAMA, da Capitania dos Portos e da SPU para a concessão da licença ambiental. E que o IBAMA, a Capitania dos Portos e a SPU exigem parecer favorável do DEPRN, porém este, passados mais de sete anos do pedido, em 18/09/2008, emitiu parecer desfavorável à possibilidade de regularização do Centro Náutico e à desinterdição da área.

Sustenta que o parecer é arbitrário e que, cumpridos os requisitos da legislação, tem direito de operar seu estabelecimento.

Aduz que o abastecimento nacional de combustíveis é considerado de utilidade pública e que, muito embora o empreendimento esteja erigido em área da União, a SPU nunca se insurgiu durante os mais de sete anos de operação do centro náutico, estando ciente, desde 2002, de que a área de marinha estava ocupada sem a devida licença de ocupação, pois foi oficiada inúmeras vezes pela Promotoria de Justiça, sendo que protocolizou pedido de ocupação de área em 14.11.2002.

Alega que, pelas manifestações da SPU, a regularização da ocupação está condicionada apenas e tão-somente à prova de que o empreendimento "não compromete a integridade da área de proteção permanente".

Argumenta que a interdição do estabelecimento é arbitrária e ilegal porque foi fundamentada na falta de licença ambiental e não em dano causado ao meio ambiente, já que a CETESB não constatou qualquer irregularidade em suas instalações, especialmente nas bombas de abastecimento e nos tanques de armazenamento de combustível, conforme comprovam as inúmeras vistorias técnicas realizadas no local.

Aduz que já estava operando quando do advento da Resolução CONAMA nº 273/2000 e que, portanto, não iniciou suas atividades sem a obtenção das licenças devidas.

Alega que cumpriu as determinações da CETESB para instalação de tanque de combustível aéreo para evitar vazamento de óleo no mar, argumentando que se medidas suplementares de contingência devem ser tomadas, elas devem ser claramente identificadas pelo DEPRN e pela CETESB.

Insiste que o empreendimento é de utilidade pública e interesse social, conforme exaustivamente demonstrado nos autos da Ação Civil Pública nº 599/08, e que inexiste alternativa técnica e locacional, sendo impossível a instalação de posto de abastecimento náutico em área que não seja APP e de propriedade da União, já que Cananéia tem todo o seu território nessa condição.

Atribuiu à causa o valor de R$ 1.000,00.

Em audiência de justificação ocorrida em 02.03.2009, a CETESB concordou em realizar nova vistoria, apontando providências a serem cumpridas pelo autor (fls. 234/237).

Nova audiência foi realizada para a oitiva do representante legal do DERPN (fls. 240/242).

Manifestação do Ministério Público Estadual às fls. 243/247, na qual requereu a inclusão da UNIÃO e do IBAMA no polo passivo, arguiu a incompetência da Justiça Estadual e requereu a suspensão do feito até o julgamento dos autos nº 599/08 (Ação Civil Pública Ambiental).

Através da decisão de fls. 329/332, a Juíza de Direito da Vara Única de Cananéia considerou desnecessária a inclusão do IBAMA e da UNIÃO no polo passivo e, consequentemente, entendeu não ser o caso de remessa dos autos à Justiça Federal. E, considerando que todas as reformas exigidas pela CETESB na audiência de justificação foram realizadas, bem como a utilidade do posto, deferiu a tutela antecipada para autorizar a exploração do posto náutico, ficando o empresário obrigado a depositar em juízo, mensalmente, 30% de seu lucro líquido.

A CETESB apresentou contestação sustentando, em síntese, que: (i) diante da natureza e localização da atividade (em APP e APA Federal, mar territorial e área de uso comum do povo) são exigíveis no processo de licenciamento ambiental a manifestação prévia favorável do DEPRN, do IBAMA, da Capitania dos Portos e da SPU; (ii) a manifestação favorável do DEPRN é de rigor por se tratar de área de preservação permanente; (iii) o autor sofreu três autuações por estar operando fonte de poluição (posto de revenda de combustíveis para embarcação) sem a devida licença e, devido à persistência do funcionamento ilegal e o não atendimento das exigências da CETESB, houve a interdição temporária das bombas de combustível, filtros e tanque; e (iv) a atividade desenvolvida pelo autor, ao contrário do que ele sustenta, não é de utilidade pública (fls. 342/358).

O ESTADO DE SÃO PAULO contestou o feito sustentando, preliminarmente, a incompetência absoluta do juízo, por ser imprescindível a intervenção da União, já que o empreendimento está localizado em terreno de marinha. No mérito, aduz, em síntese, que o posto náutico está instalado em área de preservação permanente, sendo impossível o licenciamento ambiental porque não atende nenhuma das condições cumulativas elencadas nos arts. 2º e 3º da Res CONAMA nº 369 (fls. 549/557).

O Ministério Público Federal manifestou-se no feito, defendendo a competência da Justiça Federal (fls. 595/596).

Réplica às fls. 840/867.

Intimada, a UNIÃO manifestou interesse no feito por se tratar de empreendimento em terreno de marinha e área de preservação permanente (APP) - fls. 1101/1104.

Através da decisão de fls. 1108, a Juíza de Direito determinou a redistribuição do feito à Justiça Federal, o que ensejou a interposição de agravo de instrumento pelo autor, que não obteve êxito (fls. 1155/1157 e 1509/1510).

Os autos foram redistribuídos ao Juízo da 1ª Vara Federal de Santos.

A UNIÃO foi incluída no polo passivo e, citada, apresentou contestação argumentando que: (i) embora tenha sido incluída no polo passivo, não há pedido nenhum em seu desfavor, de modo que poderia perfeitamente, observando-se a melhor técnica jurídica, ingressar no feito na qualidade de assistente simples das rés; (ii) o empreendimento do autor abrange terreno de marinha em área de preservação permanente e inexiste título que legitime a sua ocupação, o que impede a regularização; e (iii) não é correto afirmar que a decisão favorável ao pleito do autor junto à SPU estaria dependendo apenas das decisões/pareceres dos órgãos ambientais estaduais quando é fato notório que existem outros pressupostos legais a serem observados e avaliação sob o prisma da conveniência e oportunidade da Administração (art. 18, II e § 5º da Lei nº 9.636/98).

O Ministério Público Federal manifestou-se pela revogação da tutela antecipada, pela improcedência do pedido e pela intimação do IBAMA para se manifestar sobre interesse no feito (fls. 1595/1597).

Através da decisão de fls. 1599/1601, o Juiz a quo, dentre outras medidas, ratificou a tutela antecipada e determinou que o autor promovesse a citação do IBAMA.

O autor apresentou réplica à contestação da União (fls. 1732/1739).

Citado, o IBAMA apresentou contestação sustentando, em preliminar: (i) existência de coisa julgada tendo em vista que os mesmos pedidos foram formulados nos autos nº 176/08; (ii) ilegitimidade passiva, pois não há qualquer pedido deduzido em face da autarquia, que não tem competência para licenciar o empreendimento, sendo certo que a administração da Área de Proteção Ambiental Cananéia-Iguape-Peruíbe (APA-CIP) cabe atualmente ao Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICM-Bio); (iii) impossibilidade jurídica do pedido, por falta de autorização da Secretaria do Patrimônio da União, sendo a ocupação promovida pelo autor clamorosamente ilícita. No mérito, aduz que: (i) o empreendimento não tem condições de ser regularizado, pois se assenta em área de domínio federal sem a competente autorização de ocupação pela SPU, que não pode ser compelida pelo Judiciário a expedir licença ambiental; (ii) o IBAMA não tem competência para expedir a licença ambiental requerida; (iii) o empreendimento foi instalado de forma irregular em área de domínio público federal (terreno de marinha), de preservação permanente, compreendendo área maior que 5% da área total do imóvel, não se enquadrando nos casos em de excepcionalidade previstos na legislação autorizadora de intervenção em APP (Res CONAMA nº 369/06); e (iv) a atividade desempenhada pelo autor causa dano ambiental e não pode ser caracterizada como de interesse social ou de utilidade pública, conforme ficou consignado na perícia realizada na ação civil pública nº 599/08 (fls. 1787/1809).

O INSTITUTO CHICO MENDES DE CONSERVAÇÃO DA BIODIVERSIDADE - ICMBio manifestou seu interesse no feito, requerendo sua admissão na qualidade de assistente simples dos réus. Em sua petição, defendeu que, tratando-se de Unidade de Conservação Federal, caberia ao empreendedor solicitar autorização direta do instituto, conforme art. 1º da Res CONAMA nº 428/2009 e Instruções Normativas ICMBio nº 04/2009 e 05/2009 ou, no mínimo, dar ciência ao instituto (caso se trate de empreendimento não sujeito a Estudo de Impacto Ambiental - EIA/RIMA) - (fls. 1814/1817).

Réplica às fls. 1838/1844.

Através da decisão de fls. 1845, o Juiz a quo deferiu o ingresso do ICMBio na qualidade de assistente simples dos réus e considerou desnecessária a dilação probatória por se tratar de controvérsia eminentemente de direito e por estar o feito suficientemente instruído.

O Ministério Público Federal manifestou-se pela extinção do processo, sem resolução de mérito, por força da coisa julgada (autos nº 176/08) e, no mérito, pela improcedência do pedido (fls. 1852/1854).

Em 03.06.2014, o Juiz a quo sentenciou o feito. Jugou extinto o processo, sem resolução de mérito, em relação ao IBAMA, com fulcro no art. 267, VI, do CPC/73, por ilegitimidade passiva, deixando de fixar honorários advocatícios porque a inclusão da autarquia no polo passivo foi determinada de ofício pelo Juízo. Julgou procedentes os pedidos para determinar (i) ao DEPRN a elaboração de novo parecer, em substituição àquele elaborado no procedimento administrativo nº SMA 85.034/1996, "com livre e explícita manifestação sobre o quanto apreciado na fundamentação desta sentença no que toca à utilidade pública, ao interesse social, à inexistência de alternativa técnica e locacional do estabelecimento, à existência de requerimento de regularização da ocupação pela autora junto ao SPU e à inocorrência de dano em área de preservação permanente"; e (ii) à CETESB que, cumpridas as determinações acima e outras aplicáveis à espécie, conceda a licença de operação definitiva ao autor, sem prejuízo de sua renovação e de eventual apuração de infrações ambientais nos termos da lei. Confirmou a liminar para autorizar o funcionamento do posto náutico da autora mediante retenção de 30% do lucro apurado. Condenou os réus ao pagamento de honorários advocatícios de 15% do valor da causa, cabendo a cada um deles arcar com um terço do ônus (fls. 1881/1887).

Sentença submetida ao reexame necessário.

Irresignado, o ESTADO DE SÃO PAULO interpôs apelação sustentando, em síntese, que (i) o posto náutico encontra-se situado em área de preservação permanente, sendo vedada pela legislação ambiental a instalação de atividades neste espaço protegido; (ii) o órgão ambiental não pode ser compelido pelo Poder Judiciário a realizar qualquer nova análise técnica ou mesmo a expedir licença ambiental quando já se manifestou contrário ao licenciamento, sob pena de violação aos arts. 2º e 34, VII, "c", da Constituição Federal; (iii) o caso submetido a julgamento teve apreciação conveniente e oportuna pelos órgãos ambientais, não havendo afronta à legalidade que permita reprovação judicial da atuação administrativa; (iv) a atividade não se insere nos casos de excepcionalidade previstos na legislação autorizadora de intervenção em área de preservação permanente; (v) a atividade de exploração de combustível implica em risco de dano ambiental, não se caracteriza como de interesse social ou de utilidade púbica, havendo nos autos comprovação de que a demolição das construções já erigidas e o abandono da área são as únicas medidas cabíveis para a tutela e preservação do meio ambiente local (fls. 1910/1919).

Também inconformada, a UNIÃO apelou defendendo que o empreendimento está localizado em terreno de marinha e inexiste outorga de uso, sendo ilícita a ocupação e incorreto afirmar que a decisão favorável ao pleito do autor junto à SPU estaria dependendo apenas das decisões/pareceres dos órgãos ambientais estaduais quando é fato notório que existem outros pressupostos legais a serem observados, além da avaliação sob o prisma da conveniência e oportunidade da Administração (art. 18, II e § 5º da Lei nº 9.636/98). Aduz, ainda, que o fato de a SPU não ter apreciado definitivamente o requerimento do autor em 12 anos não é suficiente para afastar a situação irregular. Por fim, sustenta que não deve arcar com a verba honorária cominada na sentença porque não há pedido algum deduzido em seu desfavor (fls. 1921/1927).

O IBAMA também interpôs apelação objetivando obter a condenação do autor ao pagamento de honorários advocatícios (fls. 1972/1976).

O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL também apelou. Nas razões recursais, sustenta, em preliminar, que a sentença é nula na parte em que determinou a elaboração de novo parecer, por julgamento extra petita, pois além de substituir indevidamente o órgão ambiental competente no processo de licenciamento ambiental, ainda determinou a elaboração de novo parecer em substituição ao elaborado no procedimento administrativo nº SMA 85.034/96 sem que houvesse pedido nesse sentido, violando o princípio da separação dos poderes ao delimitar o conteúdo do novo parecer. No mérito, aduz que (i) a área é de domínio da União, sendo imprescindível, para a obtenção da licença de operação que haja autorização da ocupação pela SPU; (ii) ao determinar que os réus procedam nova vistoria técnica, elaborem novo parecer e concedam a licença de operação definitiva o julgador agiu substituindo indevidamente o legislador e o órgão ambiental licenciador na tarefa de definir os critérios essenciais para o licenciamento e de definir a viabilidade do empreendimento; (iii) o licenciamento ambiental de postos de revenda de combustíveis é ato discricionário e precário do órgão ambiental, que possui margem subjetiva para avaliar o projeto proposto e refletir sobre a conveniência do empreendimento; (iv) o empreendimento está localizado em área de proteção permanente - APP e inserido na Área de Preservação Ambiental de Cananéia-Iguape-Peruíbe (APA-CIP), unidade de preservação que exige cuidados específicos para o fim de proteger a diversidade biológica e os recursos naturais; (v) o magistrado a quo não poderia determinar ao órgão licenciador o conteúdo do parecer a ser emitido, pois ao impor ao administrador que ignore o fato da inexistência de autorização da SPU para ocupação da área de domínio da União e considere como suprido tal requisito pelo simples fato da existência de requerimento de regularização da ocupação, o Poder Judiciário está determinando que o Poder Público atue em desacordo com a legislação, ou seja, está autorizando o descumprimento da lei; (vi) o magistrado também não poderia impor ao órgão licenciador a concessão da licença, retirando-lhe o poder/dever de analisar a possibilidade de outorgar ou não a licença de operação; (v) a exploração de posto de combustível é atividade potencialmente causadora de degradação ambiental, nos termos da Res CONAMA nº 273/2000, cabendo ao órgão licenciador, no bojo do procedimento específico, analisar as condições legais para a concessão da licença ambiental; (vi) a improcedência da ação de improbidade ajuizada em face do réu não ratifica a legalidade da concessão de uso da área, conforme encampado pelo magistrado a quo, pois a questão da anulação do procedimento licitatório não foi discutida na referida ação, ou seja, o Judiciário não apreciou a legalidade da concessão, limitando-se a afastar a improbidade por falta de dolo; e (v) a atividade desenvolvida pelo autor não é de utilidade pública (fls. 1985/1995).

O autor apresentou contrarrazões (fls. 1999/2008, 2014/2020 e 2026/2030).

Às fls. 2041/2095 o autor juntou aos autos acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça de São Paulo nos autos nº 0001394-04.2008.8.26.0118.

Intimei a CETESB e o ESTADO DE SÃO PAULO (DEPRN) para que se manifestassem conclusivamente sobre o documento de fls. 1935/1936 (fl. 2100), porém não houve resposta.

O ICMBio reiterou os termos da manifestação de fls. 2106/2107 (fl. 2113).

A Procuradoria Regional da República pugnou pela desconsideração da informação constante do despacho da CETESB acostado às fls. 1935/1936, pugnando pela abertura de novo prazo para oferecimento de parecer sobre o mérito da causa (fls. 2115/2116).

Em seu parecer, o Ministério Público Federal pugna pelo acolhimento da preliminar de nulidade da sentença, por extrapolar os limites do pedido pelo autor (extra petita). No mérito, aduz que o empreendimento está localizado em área de preservação permanente – APP e que, ao contrário do que afirma a CETESB em despacho proferido no processo de licenciamento nº 49/00147/07, a área não deixou de ser considerada APP diante da superveniência da Lei nº 12.651/2012. Diz que a CETESB vem sistematicamente negando vigência ao art. 3º, IX, “a”, da Res CONAMA nº 303/2002 por entender que o ato infralegal teria sido revogado pela Lei nº 12.651/2012, no entanto, trata-se de entendimento isolado e juridicamente questionável, que foi inclusive objeto da Ação Civil Pública nº 0000104-36.2016.4.03.6135. Defende que os fatos foram praticados sob a égide da Lei nº 4.771/65 e da Res CONAMA nº 303/2002, cujos dispositivos devem incidir no caso concreto por força dos princípios tempus regit actum e da proibição do retrocesso ambiental. Sustenta, ainda, que a suposta descaracterização do local como APP (restinga) foi enfrentada e rechaçada pelo TJSP no julgamento da ACP nº 0001394-04.2008.8.26.0118. Por fim, argumenta que a atividade desenvolvida pelo autor em APP não se caracteriza como de utilidade pública e que não se pode perder de vista que a regularização do empreendimento esbarra no fato de estar localizado em terreno de marinha, cuja utilização dependeria de prévia anuência da UNIÃO (ID nº 124727753).

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


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APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO (1728) Nº 0004464-83.2011.4.03.6104

RELATOR: Gab. 21 - DES. FED. JOHONSON DI SALVO

APELANTE: ESTADO DE SAO PAULO, UNIÃO FEDERAL, INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVAVEIS, MINISTERIO PUBLICO FEDERAL

Advogado do(a) APELANTE: ORLANDO GONCALVES DE CASTRO JUNIOR - SP94962-A
Advogado do(a) APELANTE: FERNANDO GOMES BEZERRA - SP198751-A
Advogado do(a) APELANTE: MARINEY DE BARROS GUIGUER - SP152489-A

APELADO: MARCOS ANTONIO BERNAUER - EPP, COMPANHIA AMBIENTAL DO ESTADO DE SAO PAULO

Advogados do(a) APELADO: KARLA FERREIRA DE CAMARGO FISCHER - PR38672, GLENDA GONCALVES GONDIM - PR31043
Advogado do(a) APELADO: FERNANDO HENRIQUE GODOY VIRGILI - SP219340

OUTROS PARTICIPANTES:

ASSISTENTE: INSTITUTO CHICO MENDES DE CONSERVAÇÃO DA BIODIVERSIDADE
 

ADVOGADO do(a) ASSISTENTE: MARINEY DE BARROS GUIGUER

 

 

 

V O T O

 

 

O Excelentíssimo Senhor Desembargador Federal Johonsom di Salvo, Relator:

 

Deve-se recordar que o recurso, assim como o reexame necessário, são regidos pela lei processual vigente ao tempo da publicação da decisão recorrida. Nesse sentido firmou-se a jurisprudência da Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça: EREsp 740.530/RJ, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, CORTE ESPECIAL, julgado em 01/12/2010, DJe 03/06/2011 - EREsp 615.226/DF, Rel. Ministro ARI PARGENDLER, CORTE ESPECIAL, julgado em 01/08/2006, DJ 23/04/2007, p. 227. Conforme a lição de Pontes de Miranda, a lei da data do julgamento regula o direito do recurso cabível, ("Comentários ao Código de Processo Civil", Forense, 1975. T. VII, p. 44).

Prossigo.

Primeiramente, afasto a preliminar de nulidade da sentença por julgamento extra petita aventada pelo Ministério Público Federal. Sim, pois o autor pleiteou que se determinasse ao DEPRN "a elaboração de novo parecer, se necessário, precedido da abertura do devido procedimento administrativo, contemplando a utilidade pública e o interesse social do estabelecimento, assim como a inexistência de alternativa técnica e locacional ao empreendimento (...), bem como a inocorrência de dano em área de proteção permanente" e a sentença determinou a elaboração de novo parecer, em substituição àquele elaborado no procedimento administrativo nº SMA 85.034/1996 em 18/09/2008, com livre e explícita manifestação sobre o quanto foi apreciado na fundamentação no que diz respeito à utilidade pública, ao interesse social, à inexistência de alternativa técnica e locacional do estabelecimento, à existência de requerimento de regularização da ocupação pela autora junto á SPU e à inocorrência de dano em área de proteção permanente. O fato de não haver pedido explícito no sentido da nulidade do parecer emitido pelo DEPRN no bojo do processo administrativo nº SMA 85.034/1996 não torna a sentença extra petita, mormente porque o parecer foi acoimado na petição inicial de evasivo, ilegal, arbitrário e imoral, demonstrando, à evidência, a pretensão de substituí-lo.

Tendo em vista o reexame necessário, confirmo a sentença no que tange ao afastamento da preliminar de coisa julgada.

O que se tem nos autos a respeito da ação ordinária nº 176/2008 é a contestação da CETESB (fls. 112/136) e dela se depreende que o autor objetivou a outorga de licença de operação argumentando que as autorizações do DEPRN, do IBAMA e do SPU seriam indevidamente exigidas. Há, ainda, um trecho da sentença proferida nos autos nº 176/2008 transcrito no agravo de instrumento interposto pelo Ministério Público Estadual (fl. 499), in verbis: "A demandante não pode adquirir um direito que fere o meio ambiente. Seu interesse particular não pode se sobrepor ao direito comum ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. Então, a MARCO ANTONIO BERNEUER ME deve solicitar pareceres dos órgãos mencionados pela CETESB, para que tenha a segurança de que sua atividade não coloca em risco o meio ambiente" (...) "Destarte, deve a autora solicitar pareceres ao IBAMA, à SPU e à Capitania dos Portos para tomar conhecimento do que precisa ser modificado e, enfim, regularizar sua situação".

Na presente demanda, por seu turno, a autora requer que o DEPRN e a CETESB realizem vistoria técnica no Centro Náutico Cananéia e que determinem de forma clara, objetiva e transparente quais as pendências e as devidas providências que deverá adotar para regularizar seu estabelecimento; que o DEPRN elabore novo parecer considerando a utilidade pública e o interesse social do estabelecimento, assim como a inexistência de alternativa técnica e locacional e a inocorrência de dano em área de preservação permanente e, por fim, que, cumpridas as exigências legais, a CETESB expeça licença de operação.

Verifica-se, pois, que neste feito a causa de pedir é diversa, já que o autor objetiva prévia vistoria da CETESB e do DEPRN e elaboração de novo parecer por este para que, cumpridos os requisitos legais, a CETESB outorgue a licença de operação.

Não há, pois, coisa julgada.

Passo ao mérito.

O autor sagrou-se vencedor em licitação realizada pelo Município de Cananéia para a construção de rampa comunitária de uso comum do povo para descida de embarcações e escada para pedestres em imóvel situado à Avenida Beira Mar, Loteamento Retiro das Caravelas, obtendo o direito real de uso do imóvel pelo prazo de trinta anos, com autorização para a exploração de atividades de turismo náutico, comércio de artigos para pesca e atividades correlatas.

A construção da estrutura para apoio a embarcações (rampa, píer e escada) obteve parecer favorável dos órgãos ambientais envolvidos e do Departamento Estadual de Proteção aos Recursos Naturais - DEPRN (fl. 85).

O contrato administrativo foi assinado no dia 09.02.2000 (fls. 68/82). Sucede que o projeto foi alterado para a ampliação da área construída e instalação de garagem náutica e posto de combustível, atividade potencialmente poluidora, nos termos da Resolução CONAMA nº 273, de 29/11/2000.

Há notícia nos autos de que o posto náutico foi construído em agosto/2000 (fls. 258 e 1285), sendo que em 14/08/2001 o Ministério Público do Estado de São Paulo instaurou Procedimento Preparatório de Inquérito Civil (Portaria nº 08/2001), "a fim de apurar eventual responsabilidade do Prefeito do Município de Cananéia, na Legislatura de 1997/2000, pela prática de ato de improbidade administrativa, por desvio de finalidade e prejuízo ao erário municipal, na construção de rampa, escada e píer em terreno de marinha, a princípio destinada a uso comunitário, mas que vem sendo explorada economicamente por Marcos Bernauer, sócio-proprietário do Centro Náutico Cananéia, para venda de combustíveis a embarcações, bem como a responsabilidade solidária deste" (fl. 86).

Em resposta ao Ministério Público, que solicitou informações sobre a regularização ambiental do empreendimento, o DEPRN expediu o Ofício nº 005/2002 declarando que "tal projeto não apresenta regularidade ambiental junto a este DEPRN, em relação à construção de infra-estrutura de apoio à comercialização de combustível (posto de abastecimento)" (fl. 86).

Em 18/11/2002, o autor protocolizou requerimento de regularização do posto de abastecimento junto ao DEPRN, que expediu o Ofício nº 032/2003 ao interessado, informando-o que o licenciamento ambiental requerido, por se tratar de posto de abastecimento náutico, deveria ser protocolizado junto à CETESB.

Novo requerimento foi protocolizado junto ao DEPRN em 11/09/2003 solicitando anuência prévia para obtenção de licença de operação perante a CETESB, o que ensejou a expedição do Ofício nº 261/2004, pelo qual o DEPRN informou que "o local onde hoje está instalado o posto de distribuição de combustíveis foi licenciado inicialmente para a prefeitura Municipal de Cananéia para a construção de uma escada, píer e rampa para uso comunitário" e que "não cabe a este DEPRN emitir mais nenhuma licença na área, porém, quanto à regularização do posto de distribuição de combustível V.S. deverá requerer diretamente junto à CETESB".

Em 20.02.2006, a CETESB convocou o estabelecimento do autor a providenciar seu licenciamento ambiental, nos termos da Resolução CONAMA nº 273, de 29/11/2000 (Processo Administrativo nº 49/00135/07), porém o autor não atendeu à Carta de Convocação nº 043/2006, o que, aliado ao fato de "estar operando fonte de poluição, posto de revenda de combustíveis para embarcação, sem a devida licença", ensejou a lavratura de auto de infração, com imposição de penalidade de advertência para a firma de imediato paralisar as atividades de posto de revenda de combustíveis de embarcações até a obtenção da licença de operação da CETESB (fl. 380).

Em 03/09/2007, o órgão licenciador informou ao autor que a continuidade da análise da solicitação de licença de operação dependeria da apresentação de (i) Certidão de uso do Serviço de Patrimônio da União; (ii) Autorização do Departamento Estadual de proteção dos Recursos Naturais - DEPRN; e (iii) Autorização do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis - IBAMA, exigências feitas por se tratar de empreendimento localizado às margens do Canal Grande de Cananéia, em Área de Proteção Ambiental Estadual e Federal, que realizou aterro das margens do canal (fls. 379 e 397).

No dia 03/10/2007 novo auto de infração foi lavrado pela CETESB "por ter instalado e estar operando fonte de poluição (posto de revenda de combustíveis para embarcação), sem a Licença de Operação da CETESB e não atendimento da Exigência Técnica constante no Auto de Infração Imposição de Penalidade de Advertência - AIIPA nº 49000206, de 05/07/2007", com aplicação de multa de 300 vezes o valor da UFESP (fl. 385).

O autor sofreu nova autuação em 23/11/2007 por permanecer a empresa em atividade, sem licença de operação da CETESB e por não ter atendido a exigência constante no Auto de Infração nº 49000045, de 03/10/2007 (fl. 397).

Por fim, em inspeção realizada no dia 05/08/2008, a CETESB lacrou as bombas de combustível, o filtro de diesel e o tanque aéreo, aplicando a penalidade de interdição temporária do empreendimento até a obtenção da licença de operação.

No dia 20/08/2008, a CETESB informou ao autor acerca das adequações necessárias para a continuidade do processo de licenciamento (as mesmas exigências foram feitas em audiência de justificação realizada em 09.03.2009 - fls. 235/237), dentre as quais está o parecer técnico do DEPRN.

Em 18.09.2008, o DEPRN emitiu parecer desfavorável à possibilidade de regularização do Centro Náutico Cananéia e à desinterdição da área autuada através do A.I.A nº 163.277/2004 por se tratar de área de preservação permanente (Restingas - art. 3º, IX, Resolução CONAMA nº 303/2002) e não se enquadrar o empreendimento nos casos de excepcionalidade previstos a legislação (utilidade pública, interesse social ou baixo impacto ambiental), ocupar área maior que 5% do total do imóvel (art. 11, § 2º, Resolução CONAMA nº 369/2006) e por não ter o requerente apresentado documentos demonstrando a regularidade do imóvel perante o S.P.U (fls. 85/94).

O parecer emitido pelo DERPN, acoimado de evasivo, ilegal, arbitrário e imoral pelo autor, dá conta de que imóvel se encontra contíguo ao corpo d'água do mar da Cananéia e que o empreendimento é composto de instalações construídas sobre o corpo d'água e sobre a parte seca, sendo que "a área do entorno do empreendimento encontra-se fortemente antropizada", pois para possibilitar a implantação do centro náutico foram executadas obras de terraplanagem em toda a extensão do imóvel, com supressão de vegetação nativa em área de preservação permanente fora das hipóteses excepcionais previstas em lei (utilidade pública, interesse social ou baixo impacto ambiental) e sem que o empreendedor apresentasse justificativas técnicas locacionais para a intervenção em área de preservação permanente. O parecer ainda deixa claro que o imóvel apresenta uma área de 975 m² e encontra-se totalmente inserido em terreno de marinha, sendo imprescindível a autorização do Serviço de Patrimônio da União (S.P.U). Por fim, o parecer dá conta de que a intervenção excede 5% da APP localizada na posse/propriedade, conforme previsto no art. 11, § 2º, da Resolução CONAMA nº 369/2006.

A análise dos elementos dos autos revela que as pendências que impedem o licenciamento ambiental estavam clara e precisamente definidas no bojo do Processo CETESB nº 49/00147/07 desde 20/08/2008, pois foram as mesmas providências exigidas pela CETESB em audiência de justificação. Destarte, o que se tem é o inconformismo do autor com os termos do parecer emitido pelo DEPRN, exigido pela CETESB para a concessão da licença de operação.

O autor busca que o Poder Judiciário imponha ao DEPRN a elaboração de novo parecer que contemple a utilidade pública e o interesse social do estabelecimento, assim como a inexistência de alternativa técnica e locacional ao empreendimento e a inocorrência de dano ambiental em área de preservação permanente.

Calha registrar que ao Poder Judiciário cabe o controle do ato administrativo apenas e tão-somente no que concerne aos aspectos da legalidade, não podendo interferir nas razões administrativas de decidir quando pautadas pela estrita legalidade e o ato esteja revestido de todos os pressupostos de validade, como é o caso dos autos, em que o parecer observou a legislação de regência e não pode ser acoimado de ilegal ou abusivo.

Com efeito, “no controle jurisdicional do processo administrativo, a atuação do Poder Judiciário limita-se ao campo da regularidade do procedimento, bem como à legalidade do ato, não sendo possível nenhuma incursão no mérito administrativo a fim de aferir o grau de conveniência e oportunidade” (RMS 33.671/RJ, Rel. Ministra REGINA HELENA COSTA, Rel. p/ Acórdão Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 12/02/2019, DJe 14/03/2019).

É fato admitido e patente que o empreendimento está integralmente localizado em terreno de marinha, na Área de Proteção Ambiental Cananéia-Iguape-Peruíbe (APA-CIP) e em área de preservação permanente (vegetação de restinga).

O laudo pericial produzido no bojo da Ação Civil Pública nº 118.01.2008.001394-7, que tramitou perante a 1ª Vara da Comarca de Cananéia/SP, dá conta de que o empreendimento encontra-se inserido em APP, conforme art. 3º, IX, da Res. CONAMA nº 303/2002, e de que a construção causou dano ambiental por força da supressão de vegetação secundária em estágio pioneiro de regeneração, sendo possível a reparação do dano mediante a demolição das construções erigidas no local e o abandono da área, havendo ainda risco de dano ambiental decorrente do exercício da atividade do posto náutico (fls. 1644/1724). Tudo isso é corroborado pelo depoimento do engenheiro agrônomo do DEPRN, segundo o qual a implantação do posto causou dano ambiental porque "suprimiu as gramíneas de vegetação do tipo restinga" e "a existência da construção impedirá a regeneração da área degradada" (fl. 241).

A área de preservação permanente - APP é "área protegida, coberta ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica e a biodiversidade, facilitar o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas" (art. 3º, II, da Lei nº 12.651/2012).

Tais áreas, pela sua singularidade e valor estratégico, são caracterizadas, em regra, pela intocabilidade e vedação de uso econômico direto, conforme esclarece a Resolução CONAMA nº 369/2008, sendo nelas vedada a intervenção ou a supressão de vegetação, salvo em hipóteses excepcionais de utilidade pública, interesse social ou baixo impacto ambiental, conforme estabelece o art. 8º, caput, da Lei nº 12.651/2012.

Cabe registrar que a vedação já existia à luz do antigo Código Florestal, que no seu art. 4º rezava que "a supressão de vegetação em área de preservação permanente somente poderá ser autorizada em caso de utilidade pública ou de interesse social, devidamente caracterizados e motivados em procedimento administrativo próprio, quando inexistir alternativa técnica e locacional ao empreendimento proposto".

E, em se tratando de área de restinga, o Novo Código Florestal somente autoriza a supressão de vegetação em caso de utilidade pública, conforme art. 8º, § 1º, que deve ser aplicado ao caso, pois "em tema de direito ambiental, não se cogita em direito adquirido à devastação, nem se admite a incidência do fato consumado" (REsp 1394025/MS, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 08/10/2013, DJe 18/10/2013).

É importante deixar claro que os casos de utilidade pública, interesse social e baixo impacto foram definidos pelo legislador em rol numerus clausus. Nesse sentido, transcrevo trecho do voto do Relator, Ministro HERMAN BENJAMIM, no RESP nº 1.245.149/MS:

"(...) a supressão de vegetação em APP é medida de rigorosa exceção, só justificável em casos expressamente previstos em lei, repita-se, listados em numerus causus, isto é, hipóteses legais incompatíveis com ampliação administrativa ou judicial. Sabe-se que uma das regras de ouro da hermenêutica do Estado Social de Direito traduz-se no axioma de que as exceções aos regimes jurídicos de proteção dos sujeitos e bens vulneráveis devem ser interpretadas restritivamente. É o caso, p. ex., dos conceitos de utilidade pública, do interesse social e do baixo impacto."

Pois bem, as hipóteses de utilidade pública foram definidas expressamente tanto no antigo (art. 1º, § 2º, IV) como no novo Código Florestal (art. 3º, VIII).

À luz do antigo Código Florestal, entendia-se por utilidade pública:

a) as atividades de segurança nacional e proteção sanitária;       (Incluído pela Medida Provisória nº 2.166-67, de 2001)

 b) as obras essenciais de infraestrutura destinadas aos serviços públicos de transporte, saneamento e energia e aos serviços de telecomunicações e de radiodifusão;         (Redação dada pela Lei nº 11.934, de 2009)

 c) demais obras, planos, atividades ou projetos previstos em resolução do Conselho Nacional de Meio Ambiente – CONAMA;   

Referido dispositivo foi regulamentado pela Resolução CONAMA nº 369, de 28/03/2006, nos seguintes termos:

Art. 2º O órgão ambiental competente somente poderá autorizar a intervenção ou supressão de vegetação em APP, devidamente caracterizada e motivada mediante procedimento administrativo autônomo e prévio, e atendidos os requisitos previstos nesta resolução e noutras normas federais, estaduais e municipais aplicáveis, bem como no Plano Diretor, Zoneamento Ecológico-Econômico e Plano de Manejo das Unidades de Conservação, se existentes, nos seguintes casos:

I - utilidade pública:

a) as atividades de segurança nacional e proteção sanitária;

b) as obras essenciais de infra-estrutura destinadas aos serviços públicos de transporte, saneamento e energia;

c) as atividades de pesquisa e extração de substâncias minerais, outorgadas pela autoridade competente, exceto areia, argila, saibro e cascalho;

d) a implantação de área verde pública em área urbana;

e) pesquisa arqueológica;

f) obras públicas para implantação de instalações necessárias à captação e condução de água e de efluentes tratados; e

g) implantação de instalações necessárias à captação e condução de água e de efluentes tratados para projetos privados de aqüicultura, obedecidos os critérios e requisitos previstos nos §§ 1º e 2º do art. 11, desta Resolução.

Já o rol da Lei nº 12.651/2012 define como utilidade pública:

a) as atividades de segurança nacional e proteção sanitária;

b) as obras de infraestrutura destinadas às concessões e aos serviços públicos de transporte, sistema viário, inclusive aquele necessário aos parcelamentos de solo urbano aprovados pelos Municípios, saneamento, gestão de resíduos, energia, telecomunicações, radiodifusão, instalações necessárias à realização de competições esportivas estaduais, nacionais ou internacionais, bem como mineração, exceto, neste último caso, a extração de areia, argila, saibro e cascalho;

c) atividades e obras de defesa civil;

d) atividades que comprovadamente proporcionem melhorias na proteção das funções ambientais referidas no inciso II deste artigo;

e) outras atividades similares devidamente caracterizadas e motivadas em procedimento administrativo próprio, quando inexistir alternativa técnica e locacional ao empreendimento proposto, definidas em ato do Chefe do Poder Executivo federal;

Registro, por oportuno, que no julgamento das ADI's nº 4901, 4902, 4903, 4937 e ADC nº 42, datado de 28/02/2018, o Supremo Tribunal Federal declarou a inconstitucionalidade das expressões "gestão de resíduos" e "instalações necessárias à realização de competições esportivas estaduais, nacionais ou internacionais", excluindo a intervenção em APP nesses casos, além dar interpretação conforme à Constituição ao art. 3º, VIII e IX, do Novo Código Florestal, de modo a condicionar qualquer intervenção por utilidade pública ou interesse social à inexistência de alternativa técnica e/ou locacional.

O que se constata é que a atividade de posto náutico (abastecimento de embarcações) não está contemplada no rol das atividades consideradas de utilidade pública pelo legislador, sequer configura atividade similar àquelas consideradas de utilidade pública pela legislação ambiental. Ademais, a hipótese da alínea "e" do art. 3º, VIII, do Novo Código Florestal exige que as "atividades similares" estejam definidas em ato do Presidente da República, inexistente in casu.

Como à luz do antigo Código Florestal não havia previsão semelhante à do art. 8º, § 1º, do atual, registro que o caso também não se enquadra em nenhuma hipótese de interesse social prevista pelo legislador no art. 1º, V, da Lei nº 4.771/65 e no art. 3º, IX, da Lei nº 12.651/2012, sequer se trata de atividade eventual ou de baixo impacto ambiental.

O fato de o posto náutico atender a grande número de pessoas em Cananéia e de ser importante para as atividades de pesca e turismo desenvolvidas na região não permitem o enquadramento da atividade no rol daquelas consideradas de utilidade pública ou de interesse social, pois "em respeito ao princípio da legalidade, é proibido ao órgão ambiental criar direitos de exploração onde a lei previu deveres de preservação" (REsp 1245149/MS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 09/10/2012, DJe 13/06/2013).

Vale registrar, ainda, que "causa dano ecológico in re ipsa, presunção legal definitiva que dispensa produção de prova técnica de lesividade específica, quem, fora das exceções legais, desmata, ocupa ou explora APP, ou impede sua regeneração" (REsp 1245149/MS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 09/10/2012, DJe 13/06/2013).

Destaco que a atividade desempenhada pelo autor não se enquadra na autorização contida no art. 61-A do novo Código Florestal, não havendo que se falar em situação consolidada em APP.

Além disso, é fato incontroverso que a intervenção em APP excedeu 5% da área total do imóvel, afrontando o disposto no art. 11, § 2º, da Resolução CONAMA nº 369/2006.

Tendo em vista o documento de fls. 1935/1936, juntado aos autos pelo autor, de autoria da CETESB e com data posterior à sentença, contendo a informação de que "a área em questão deixou de ser considerada área de Preservação permanente - APP, assim como a vegetação em estágio pioneiro não é objeto de autorização da CETESB", considero necessárias algumas considerações.

Primeiramente, é preciso anotar que, nos termos do § 4º do art. 225 da Constituição Federal, os espaços territoriais especialmente protegidos somente poderão ser suprimidos ou alterados por lei e, no caso, não há notícia de lei nesse sentido. A área ocupada pelo empreendimento não deixou de ser considerada APP pelo simples fato da superveniência da Lei nº 12.651/2012, já que o CONAMA continua a ter competência para editar resoluções que visem à proteção do meio ambiente e dos recursos naturais (art. 6º, II, Lei nº 6.938/81 e art. 7º, VI e VIII do Decreto nº 99.274/90).

Ainda que assim não fosse, o Novo Código Florestal não poderia “retroagir para atingir o ato jurídico perfeito, os direitos ambientais adquiridos e a coisa julgada, tampouco para reduzir de tal modo e sem as necessárias compensações ambientais o patamar de proteção de ecossistemas frágeis ou espécies ameaçadas de extinção, a ponto de transgredir o limite constitucional intocável e intransponível da "incumbência" do Estado de garantir a preservação e a restauração dos processos ecológicos essenciais (art. 225, § 1º, I)” (AgRg no REsp 1434797/PR, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 17/05/2016, DJe 07/06/2016).

A propósito:

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. DIREITO AMBIENTAL. ANÁLISE DE PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS. IMPOSSIBILIDADE. OMISSÃO INEXISTENTE. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DANO AMBIENTAL. ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. TERRENO DE MARINHA. RESTINGA. COMPETÊNCIA DO CONAMA NA EDIÇÃO DE RESOLUÇÕES QUE OBJETIVEM O CONTROLE E A MANUTENÇÃO DO MEIO AMBIENTE. EDIFICAÇÃO EM DESACORDO COM A LEGISLAÇÃO AMBIENTAL. REVOLVIMENTO DE FATOS E PROVAS. IMPOSSIBILIDADE. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 7/STJ. APLICAÇÃO DO NOVO CÓDIGO FLORESTAL. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULAS 282 E 356 DO STF. IRRETROATIVIDADE. APLICAÇÃO IMEDIATA.

1. A apreciação de suposta violação a princípios constitucionais não é possível na via especial, nem à guisa de prequestionamento, porquanto matéria reservada, pela Carta Magna, ao Supremo Tribunal Federal.

2. Não há violação do art. 535 do CPC quando a prestação jurisdicional é dada na medida da pretensão deduzida, com enfrentamento e resolução das questões abordadas no recurso.

3. Trata-se de Ação de Civil Pública, objetivando a recuperação de local de preservação permanente (terreno de marinha - restinga) e a demolição do imóvel lá edificado.

4. O Código Florestal tem como escopo proteger não só as florestas existentes no território nacional como a fauna e as demais formas de vegetação nativas situadas em algumas de suas áreas, tais como na área de restinga. Embora não tenha como elemento primordial o resguardo de sítios e acidentes geográficos, estes o são por várias vezes protegidos em seu texto legal. O art. 2º, "f", do Código Florestal qualifica como área de preservação permanente (APP) não o acidente topográfico em si, mas a vegetação de restinga que lá se faz presente.

5. O Código Florestal, no art. 3º, dá ao Poder Público (por meio de Decreto ou Resolução do Conama ou dos colegiados estaduais e municipais) a possibilidade de ampliar a proteção aos ecossistemas frágeis.

6. Possui o CONAMA autorização legal para editar resoluções que visem à proteção do meio ambiente e dos recursos naturais, inclusive mediante a fixação de parâmetros, definições e limites de Áreas de Preservação Permanente.

7. A Resolução n. 303/02 do CONAMA não está substancialmente apartada da Resolução n. 04/85 do CONAMA, que lhe antecedeu e que é vigente à época dos fatos. Ambas consideram a restinga como espécie de acidente geográfico, encoberto por vegetação característica. Destarte, não há extrapolação de competência regulamentar do CONAMA em sua Resolução n. 303/02 no que se refere à definição de restinga, porquanto está de acordo com o definido na Lei n. 4.771/65 e nos estritos limites ali delineados.

8. Dentro do contexto fático delineado no acórdão recorrido, é inafastável a conclusão a que chegou o Tribunal de origem, no sentido de que a edificação foi promovida dentro de área de restinga, considerada de preservação permanente, sob pena de ferir o disposto na Súmula 7 do STJ.

9. A Corte a quo não analisou a matéria recursal à luz da aplicação do novo Código Florestal, que segundo as razões lançadas neste pleito, levaria à aplicação de sanções mais benéficas à parte. Ressalte-se, em que pese a oposição de vários embargos declaratórios, que a controvérsia não foi arguida como forma de suprir a omissão do julgado. Assim, incide, no caso, o enunciado das Súmulas n. 282 e 356 do Supremo Tribunal Federal.

10. "O novo Código Florestal não pode retroagir para atingir o ato jurídico perfeito, direitos ambientais adquiridos e a coisa julgada, tampouco para reduzir de tal modo e sem as necessárias compensações ambientais o patamar de proteção de ecossistemas frágeis ou espécies ameaçadas de extinção, a ponto de transgredir o limite constitucional intocável e intransponível da 'incumbência' do Estado de garantir a preservação e restauração dos processos ecológicos essenciais (art. 225, § 1º, I)." Recurso especial improvido.

(REsp 1462208/SC, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 11/11/2014, DJe 06/04/2015)

Além disso, eventual extinção da APP não implicaria no julgamento de procedência do pedido, mas sim na perda superveniente e parcial (já que restaria a questão do empreendimento em terreno de marinha) do interesse processual.

Não bastasse o empreendimento ter sido desenvolvido indevida e ilegalmente em área de preservação permanente, ainda está totalmente localizado em terreno de marinha sem que o autor tenha comprovado a existência de autorização de uso pelo Serviço de Patrimônio da União, como bem concluiu o parecer questionado.

O fato de estar pendente pedido de regularização da ocupação desde 2002 não autoriza concluir pela autorização tácita, até mesmo porque a autorização, a permissão e a concessão de uso de bem público são atos discricionários, sujeitos à análise da conveniência e oportunidade pela Administração e, destinando-se a empreendimento de fim lucrativo, a cessão de uso será onerosa e deverá ser precedida de licitação (art. 18, § 5º, Lei nº 9.636/98).

Por fim e obiter dictum, não se pode olvidar a necessidade de autorização do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, conforme art. 1º da Resolução CONAMA nº 428/2010, por se tratar de empreendimento em unidade de conservação federal.

Portanto, o autor não faz jus a obter nova vistoria técnica no Centro Náutico, já que as pendências estão clara e objetivamente definidas no bojo do Processo CETESB nº 49/00147/07 desde 20/08/2008. O Judiciário também não pode impor ao DERPN a elaboração de novo parecer, pois aquele já emitido observou a legislação de regência e é válido, não havendo qualquer vestígio de ilegalidade ou arbitrariedade. Por fim, é nenhum o direito do autor que o Judiciário imponha à CETESB a concessão de licença de operação em área de preservação permanente fora das hipóteses excepcionais estabelecidas expressamente em lei e em terreno de marinha ocupado ilicitamente.

Quanto ao IBAMA, em relação ao qual o processo foi extinto sem resolução do mérito por ilegitimidade passiva, embora a sua inclusão tenha sido determinada pelo Juízo a quo, entendo que a autarquia faz jus a honorários advocatícios, por força do princípio da sucumbência e da causalidade. Nesse sentido:

PROCESSUAL CIVIL. CRUZADOS BLOQUEADOS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. CONDENAÇÃO. PRINCÍPIOS DA SUCUMBÊNCIA E DA CAUSALIDADE.

I - Em ação que versava sobre a correção dos chamados ativos retidos, o acórdão recorrido deixou de condenar a autora ao pagamento de honorários em favor do Banco-recorrente, ao entendimento de que teria ele ingressado na lide por iniciativa do Juiz e, em sede de apelação, teria sido excluído do pólo passivo por ilegitimidade à causa.

II - A condenação em honorários advocatícios é uma decorrência lógica do princípio da sucumbência. Por disposição legal, o ônus dos honorários cabe ao vencido na demanda (artigo 20 do Código de Processo Civil).

III - "A imposição dos ônus processuais, no Direito Brasileiro, pauta-se pelo princípio da sucumbência, norteado pelo princípio da causalidade, segundo o qual aquele que deu causa à instauração do processo deve arcar com as despesas dele decorrentes" (REsp nº 642.107/PR, Rel. Min. LUIZ FUX, DJ de 29.11.2004).

IV - Como o autor deu causa à lide, deve arcar com os encargos dela decorrentes, em observância ao Princípio da Causalidade. Ademais, houve requerimento do autor para a citação do ora recorrente, donde se infere que a inclusão do Banco-recorrente na lide não pode ser creditada apenas à iniciativa do Juiz, como consignado no acórdão recorrido.

V - Recurso especial provido.

(REsp 864.904/SP, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 10/10/2006, DJ 14/12/2006, p. 316)

Considerando a jurisprudência atual do STJ ("a jurisprudência do STJ é pacífica no sentido de que a sucumbência é regida pela lei vigente na data da sentença" - REsp 1636124/AL, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 06/12/2016, DJe 27/04/2017, REsp 1683612/PR, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 26/09/2017, DJe 10/10/2017, AgInt no AREsp 1034509/SP, Rel. Ministro MOURA RIBEIRO, TERCEIRA TURMA, julgado em 06/06/2017, DJe 13/06/2017), por força da sucumbência, condeno o autor ao pagamento de honorários de R$ 50.000,00, quantia a ser atualizada a partir desta data e rateada entre os réus (inclusive o IBAMA), o que faço com fulcro no art. 20, § 4º, do CPC/73, tendo em vista a natureza da causa, o trabalho dos procuradores, bem como os princípios da razoabilidade e proporcionalidade.

Ante o exposto, rejeito a matéria preliminar e dou provimento às apelações e ao reexame necessário, condenando o autor ao pagamento de honorários advocatícios.

É como voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

DIREITO PROCESSUAL CIVIL E AMBIENTAL. PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA AFASTADA: JULGAMENTO ADSTRITO AO PEDIDO. COISA JULGADA INEXISTENTE: CAUSAS DE PEDIR DIVERSAS. LICITAÇÃO PARA CONSTRUÇÃO DE RAMPA, PÍER E ESCADA NO MUNICÍPIO DE CANANÉIA. ALTERAÇÃO DO PROJETO PARA AMPLIAÇÃO DA ÁREA CONSTRUÍDA E INSTALAÇÃO DE GARAGEM NÁUTICA E POSTO DE COMBUSTÍVEL. EMPREENDIMENTO LOCALIZADO EM TERRENO DE MARINHA, ÁREA DE PROTEÇÃO AMBIENTAL CANANÉIA-IGUAPE-PERUÍBE E ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. ATIVIDADE POTENCIALMENTE POLUIDORA. NECESSIDADE DE LICENÇA DE OPERAÇÃO, A SER CONCEDIDA PELA CETESB. DEFINIÇÃO CLARA DAS PENDÊNCIAS IMPEDITIVAS DO LICENCIAMENTO AMBIENTAL, DENTRE AS QUAIS, A NECESSIDADE DE PARECER TÉCNICO DO DEPRN, QUE EMITIU PARECER DESFAVORÁVEL POR SE TRATAR DE ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE – APP E NÃO SE ENQUADRAR O EMPREENDIMENTO NOS CASOS DE EXCEPCIONALIDADE PREVISTOS NA LEGISLAÇÃO DE REGÊNCIA, OCUPAR ÁREA MAIOR QUE 5% DO TOTAL DO IMÓVEL E POR FALTA DE REGULARIDADE DA OCUPAÇÃO PERANTE O SERVIÇO DE PATRIMÔNIO DA UNIÃO - SPU, EM QUE PESE SE TRATAR DE TERRENO DE MARINHA. IMPOSSIBILIDADE DE IMPOSIÇÃO, PELO PODER JUDICIÁRIO, DE ELABORAÇÃO DE NOVO PARECER AO DEPRN: INEXISTÊNCIA DE ILEGALIDADE OU ABUSIVIDADE. DANO AMBIENTAL EM APP (RESTINGA). EMPREENDIMENTO QUE NÃO SE SUBSOME ÀS HIPÓTESES DE UTILIDADE PÚBLICA, INTERESSE SOCIAL OU BAIXO IMPACTO AMBIENTAL. SUPERVENIÊNCIA DO NOVO CÓDIGO FLORESTAL: SUBSISTÊNCIA DA APP (RESTINGA) E IRRETROATIVIDADE. EMPREENDIMENTO EM TERRENO DE MARINHA: NECESSIDADE DE AUTORIZAÇÃO EXPRESSA DE USO PELO SERVIÇO DE PATRIMÔNIO DA UNIÃO. RECURSOS DE APELAÇÃO E REEXAME NECESSÁRIO PROVIDOS. CONDENAÇÃO DO AUTOR AO PAGAMENTO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS EM FAVOR DOS RÉUS, INCLUSIVE O IBAMA, POR FORÇA DA SUCUMBÊNCIA E DA CAUSALIDADE.

1. O autor pleiteou que se determinasse ao DEPRN "a elaboração de novo parecer, se necessário, precedido da abertura do devido procedimento administrativo, contemplando a utilidade pública e o interesse social do estabelecimento, assim como a inexistência de alternativa técnica e locacional ao empreendimento (...), bem como a inocorrência de dano em área de proteção permanente" e a sentença determinou a elaboração de novo parecer, em substituição àquele elaborado no procedimento administrativo nº SMA 85.034/1996 em 18/09/2008, com livre e explícita manifestação sobre o quanto foi apreciado na fundamentação no que diz respeito à utilidade pública, ao interesse social, à inexistência de alternativa técnica e locacional do estabelecimento, à existência de requerimento de regularização da ocupação pela autora junto á SPU e à inocorrência de dano em área de proteção permanente. O fato de não haver pedido explícito no sentido da nulidade do parecer emitido pelo DEPRN no bojo do processo administrativo nº SMA 85.034/1996 não torna a sentença extra petita, mormente porque o parecer foi acoimado na petição inicial de evasivo, ilegal, arbitrário e imoral, demonstrando, à evidência, a pretensão de substituí-lo.

2. Não há coisa julgada, pois na ação ordinária nº 176/2008 o autor objetivou a outorga de licença de operação pela CETESB argumentando que as autorizações do DEPRN, do IBAMA e do SPU seriam indevidamente exigidas. Na presente demanda, por seu turno, a autora requer que o DEPRN e a CETESB realizem vistoria técnica no Centro Náutico Cananéia e que determinem de forma clara, objetiva e transparente quais as pendências e as devidas providências que deverá adotar para regularizar seu estabelecimento; que o DEPRN elabore novo parecer considerando a utilidade pública e o interesse social do estabelecimento, assim como a inexistência de alternativa técnica e locacional e a inocorrência de dano em área de preservação permanente e, por fim, que, cumpridas as exigências legais, a CETESB expeça licença de operação. Verifica-se, pois, que neste feito a causa de pedir é diversa, já que o autor objetiva prévia vistoria da CETESB e do DEPRN e elaboração de novo parecer por este para que, cumpridos os requisitos legais, a CETESB outorgue a licença de operação.

3. O autor sagrou-se vencedor em licitação realizada pelo Município de Cananéia para a construção de rampa comunitária de uso comum do povo para descida de embarcações e escada para pedestres em imóvel situado à Avenida Beira Mar, Loteamento Retiro das Caravelas, obtendo o direito real de uso do imóvel pelo prazo de trinta anos, com autorização para a exploração de atividades de turismo náutico, comércio de artigos para pesca e atividades correlatas. Sucede que o projeto foi alterado para a ampliação da área construída e instalação de garagem náutica e posto de combustível, atividade potencialmente poluidora, nos termos da Resolução CONAMA nº 273, de 29/11/2000, tendo havido lavratura de diversos autos de infração pela CETESB e interdição temporária do empreendimento até obtenção de licença de operação.

4. O DEPRN emitiu parecer desfavorável à possibilidade de regularização do Centro Náutico Cananéia e à desinterdição da área autuada através do A.I.A nº 163.277/2004 por se tratar de área de preservação permanente (Restingas - art. 3º, IX, Resolução CONAMA nº 303/2002) e não se enquadrar o empreendimento nos casos de excepcionalidade previstos a legislação (utilidade pública, interesse social ou baixo impacto ambiental), ocupar área maior que 5% do total do imóvel (art. 11, § 2º, Resolução CONAMA nº 369/2006) e por não ter o requerente apresentado documentos demonstrando a regularidade do imóvel perante o S.P.U.

5. O parecer emitido pelo DERPN, acoimado de evasivo, ilegal, arbitrário e imoral pelo autor, dá conta de que imóvel se encontra contíguo ao corpo d'água do mar da Cananéia e que o empreendimento é composto de instalações construídas sobre o corpo d'água e sobre a parte seca, sendo que "a área do entorno do empreendimento encontra-se fortemente antropizada", pois para possibilitar a implantação do centro náutico foram executadas obras de terraplanagem em toda a extensão do imóvel, com supressão de vegetação nativa em área de preservação permanente fora das hipóteses excepcionais previstas em lei (utilidade pública, interesse social ou baixo impacto ambiental) e sem que o empreendedor apresentasse justificativas técnicas locacionais para a intervenção em área de preservação permanente. O parecer ainda deixa claro que o imóvel apresenta uma área de 975 m² e encontra-se totalmente inserido em terreno de marinha, sendo imprescindível a autorização do Serviço de Patrimônio da União (S.P.U). Por fim, o parecer dá conta de que a intervenção excede 5% da APP localizada na posse/propriedade, conforme previsto no art. 11, § 2º, da Resolução CONAMA nº 369/2006.

6. A análise dos elementos dos autos revela que as pendências que impedem o licenciamento ambiental estavam clara e precisamente definidas no bojo do Processo CETESB nº 49/00147/07 desde 20/08/2008, pois foram as mesmas providências exigidas pela CETESB em audiência de justificação. Destarte, o que se tem é o inconformismo do autor com os termos do parecer emitido pelo DEPRN, exigido pela CETESB para a concessão da licença de operação.

7. Ao Poder Judiciário cabe o controle do ato administrativo apenas e tão-somente no que concerne aos aspectos da legalidade, não podendo interferir nas razões administrativas de decidir quando pautadas pela estrita legalidade e o ato esteja revestido de todos os pressupostos de validade, como é o caso dos autos, em que o parecer observou a legislação de regência e não pode ser acoimado de ilegal ou abusivo. Com efeito, “no controle jurisdicional do processo administrativo, a atuação do Poder Judiciário limita-se ao campo da regularidade do procedimento, bem como à legalidade do ato, não sendo possível nenhuma incursão no mérito administrativo a fim de aferir o grau de conveniência e oportunidade” (RMS 33.671/RJ, Rel. Ministra REGINA HELENA COSTA, Rel. p/ Acórdão Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 12/02/2019, DJe 14/03/2019).

8. É fato admitido e patente que o empreendimento está integralmente localizado em terreno de marinha, na Área de Proteção Ambiental Cananéia-Iguape-Peruíbe (APA-CIP) e em área de preservação permanente (vegetação de restinga). Os elementos dos autos revelam que a construção causou dano ambiental por força da supressão de vegetação secundária em estágio pioneiro de regeneração.

9. A área de preservação permanente - APP é "área protegida, coberta ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica e a biodiversidade, facilitar o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas" (art. 3º, II, da Lei nº 12.651/2012).

10. Tais áreas, pela sua singularidade e valor estratégico, são caracterizadas, em regra, pela intocabilidade e vedação de uso econômico direto, conforme esclarece a Resolução CONAMA nº 369/2008, sendo nelas vedada a intervenção ou a supressão de vegetação, salvo em hipóteses excepcionais de utilidade pública, interesse social ou baixo impacto ambiental, conforme estabelece o art. 8º, caput, da Lei nº 12.651/2012. Referida vedação já existia à luz do antigo Código Florestal, que no seu art. 4º rezava que "a supressão de vegetação em área de preservação permanente somente poderá ser autorizada em caso de utilidade pública ou de interesse social, devidamente caracterizados e motivados em procedimento administrativo próprio, quando inexistir alternativa técnica e locacional ao empreendimento proposto".

11. E, em se tratando de área de restinga, o Novo Código Florestal somente autoriza a supressão de vegetação em caso de utilidade pública, conforme art. 8º, § 1º, que deve ser aplicado ao caso, pois "em tema de direito ambiental, não se cogita em direito adquirido à devastação, nem se admite a incidência do fato consumado" (REsp 1394025/MS, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 08/10/2013, DJe 18/10/2013).

12. Os casos de utilidade pública, interesse social e baixo impacto foram definidos pelo legislador em rol numerus clausus (RESP nº 1.245.149/MS), sendo certo que a atividade de posto náutico (abastecimento de embarcações) não está contemplada no rol das atividades consideradas de utilidade pública pelo legislador, sequer configura atividade similar àquelas consideradas de utilidade pública pela legislação ambiental. Ademais, a hipótese da alínea "e" do art. 3º, VIII, do Novo Código Florestal exige que as "atividades similares" estejam definidas em ato do Presidente da República, inexistente in casu. O caso também não se enquadra em nenhuma hipótese de interesse social prevista pelo legislador no art. 1º, V, da Lei nº 4.771/65 e no art. 3º, IX, da Lei nº 12.651/2012, sequer se trata de atividade eventual ou de baixo impacto ambiental. O fato de o posto náutico atender a grande número de pessoas em Cananéia e de ser importante para as atividades de pesca e turismo desenvolvidas na região não permitem o enquadramento da atividade no rol daquelas consideradas de utilidade pública ou de interesse social, pois "em respeito ao princípio da legalidade, é proibido ao órgão ambiental criar direitos de exploração onde a lei previu deveres de preservação" (REsp 1245149/MS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 09/10/2012, DJe 13/06/2013).

13. Ademais, "causa dano ecológico in re ipsa, presunção legal definitiva que dispensa produção de prova técnica de lesividade específica, quem, fora das exceções legais, desmata, ocupa ou explora APP, ou impede sua regeneração" (REsp 1245149/MS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 09/10/2012, DJe 13/06/2013).

14. Além disso, é fato incontroverso que a intervenção em APP excedeu 5% da área total do imóvel, afrontando o disposto no art. 11, § 2º, da Resolução CONAMA nº 369/2006.

15. O documento de autoria da CETESB juntado aos autos pelo autor contendo a informação de que “a área em questão deixou de ser considerada área de Preservação permanente – APP” não tem o condão de alterar o entendimento adotado, pois, nos termos do § 4º do art. 225 da Constituição Federal, os espaços territoriais especialmente protegidos somente poderão ser suprimidos ou alterados por lei e, no caso, não há notícia de lei nesse sentido. A área ocupada pelo empreendimento não deixou de ser considerada APP pelo simples fato da superveniência da Lei nº 12.651/2012, já que o CONAMA continua a ter competência para editar resoluções que visem à proteção do meio ambiente e dos recursos naturais (art. 6º, II, Lei nº 6.938/81 e art. 7º, VI e VIII do Decreto nº 99.274/90).

16. Ademais, o Novo Código Florestal não poderia “retroagir para atingir o ato jurídico perfeito, os direitos ambientais adquiridos e a coisa julgada, tampouco para reduzir de tal modo e sem as necessárias compensações ambientais o patamar de proteção de ecossistemas frágeis ou espécies ameaçadas de extinção, a ponto de transgredir o limite constitucional intocável e intransponível da "incumbência" do Estado de garantir a preservação e a restauração dos processos ecológicos essenciais (art. 225, § 1º, I)” (AgRg no REsp 1434797/PR, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 17/05/2016, DJe 07/06/2016).

17. O imóvel ainda está totalmente localizado em terreno de marinha sem que o autor tenha comprovado a existência de autorização de uso pelo Serviço de Patrimônio da União. O fato de estar pendente pedido de regularização da ocupação desde 2002 não autoriza concluir pela autorização tácita, até mesmo porque a autorização, a permissão e a concessão de uso de bem público são atos discricionários, sujeitos à análise da conveniência e oportunidade pela Administração e, destinando-se a empreendimento de fim lucrativo, a cessão de uso será onerosa e deverá ser precedida de licitação (art. 18, § 5º, Lei nº 9.636/98).

18. O IBAMA faz jus a honorários advocatícios, por força do princípio da sucumbência e da causalidade, embora sua inclusão no polo passivo tenha sido determinada pelo juiz a quo.

19. Considerando a jurisprudência atual do STJ ("a jurisprudência do STJ é pacífica no sentido de que a sucumbência é regida pela lei vigente na data da sentença" - REsp 1636124/AL, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 06/12/2016, DJe 27/04/2017, REsp 1683612/PR, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 26/09/2017, DJe 10/10/2017, AgInt no AREsp 1034509/SP, Rel. Ministro MOURA RIBEIRO, TERCEIRA TURMA, julgado em 06/06/2017, DJe 13/06/2017), por força da sucumbência, condena-se o autor ao pagamento de honorários de R$ 50.000,00, quantia a ser atualizada a partir desta data e rateada entre os réus (inclusive o IBAMA), o que se faz com fulcro no art. 20, § 4º, do CPC/73, tendo em vista a natureza da causa, o trabalho dos procuradores, bem como os princípios da razoabilidade e proporcionalidade.

20. Matéria preliminar rejeitada e apelações e reexame necessário providos.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sexta Turma, por unanimidade, rejeitou a matéria preliminar e deu provimento às apelações e ao reexame necessário, condenando o autor ao pagamento de honorários advocatícios, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.