Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0015392-04.2018.4.03.9999

RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES

APELANTE: M. C. D. S.

Advogado do(a) APELANTE: JOSE WAGNER CORREA DE SAMPAIO - SP152803-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

OUTROS PARTICIPANTES:

TERCEIRO INTERESSADO: LUCIENE CURCELLI
 

ADVOGADO do(a) TERCEIRO INTERESSADO: JOSE WAGNER CORREA DE SAMPAIO

 


 

  

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0015392-04.2018.4.03.9999

RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES

APELANTE: M. C. D. S.

Advogado do(a) APELANTE: JOSE WAGNER CORREA DE SAMPAIO - SP152803-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

Trata-se de ação objetivando a concessão de benefício assistencial de prestação continuada (LOAS) previsto pelo inciso V do artigo 203 da Constituição Federal à pessoa portadora de deficiência.

A sentença, prolatada em 04.12.2017, julgou improcedente o pedido inicial sob o fundamento de que não foi preenchido o requisito de miserabilidade, nos termos que seguem: “Posto isso, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados por MAYCON CURCELLI DA SILVA, representado por LUCIENE CURCELLI contra INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL INSS e, por consequência: Condeno a parte requerente ao pagamento das custas e demais despesas processuais, além de honorários advocatícios que fixo, equitativamente, em R$ 800,00 (artigo 85, §8º do Código de Processo Civil). Isento-a, entretanto, em virtude da concessão dos benefícios da justiça gratuita (fl. 130), ressalvada a demonstração, dentro do prazo legal (artigo 98, §3º do Código de Processo Civil), da hipótese preceituada no artigo 98, §2º do Código de Processo Civil. Por consequência, resolvo o processo, com apreciação de mérito, nos termos do artigo 487, I do Código de Processo Civil ("Art. 487. Haverá resolução de mérito quando o juiz: I - acolher ou rejeitar o pedido formulado na ação ou na reconvenção;").Por fim, com o advento do Novo Código de Processo Civil, o juízo de admissibilidade é efetuado pelo juízo ad quem, na forma de seu artigo 1.010, § 3º. Por sua vez, tendo em vista a expressa revogação do artigo 1.096 das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça (Provimento CG nº 17/2016), bem como diante da nova orientação trazida pelo Código de Processo Civil (artigo 1.010, §3º) as Unidades Judiciais de 1º Grau estão dispensadas de efetuar o cálculo do preparo. Assim, em caso de interposição de recurso de apelação, dê-se ciência à parte contrária para, querendo, apresentar contrarrazões no prazo de 15 dias úteis (§1º do artigo 1.010 do Código de Processo Civil). Após, subam os autos ao Egrégio Tribunal de Justiça, com nossas homenagens. P.I.C.”

Apela a parte autora alegando para tanto que preenche os requisitos necessários para a concessão do benefício assistencial.

Sem contrarrazões, os autos vieram a este Tribunal.

O Ministério Público Federal opinou pelo desprovimento do recurso da parte autora.

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 


APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0015392-04.2018.4.03.9999

RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES

APELANTE: M. C. D. S.

Advogado do(a) APELANTE: JOSE WAGNER CORREA DE SAMPAIO - SP152803-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

V O T O

 

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso de apelação.

O benefício de prestação continuada é devido ao portador de deficiência (§2º do artigo 20 da Lei nº 8.742/93, com a redação dada pela Lei nº 12.470/2011) ou idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais (artigo 34 da Lei nº 10.741/2003) que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família.

O artigo 20, § 3º da Lei 8742/93 considera incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011).

A constitucionalidade dessa norma foi questionada na ADI 1.232-1/DF, tendo o Plenário do Supremo Tribunal Federal, por maioria, decidido pela improcedência do pedido, ao fundamento que a fixação da renda per capita no patamar de ¼ do salário mínimo sugere a presunção absoluta de pobreza. Concluiu, contudo, que não é a única forma suscetível de se aferir a situação econômica da família do idoso ou portador de deficiência.

Posteriormente, a Corte Suprema enfrentou novamente a questão no âmbito da Reclamação 4374 - PE que, julgada em 18/04/2013, reconhecendo a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do § 3º, art. 20 da Lei 8.742/1993, decorrente de notórias mudanças fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios assistenciais por parte do Estado brasileiro).

Restou decidido que a norma é inconstitucional naquilo que não disciplinou, não tendo sido reconhecida a incidência taxativa de qualquer critério para aferição da hipossuficiência, cabendo ao legislador fixar novos parâmetros e redefinir a política pública do benefício assistencial a fim de suprimir o vício apontado.

Desta forma, até que o assunto seja disciplinado, é necessário reconhecer que o quadro de pobreza deve ser aferido em função da situação específica de quem pleiteia o benefício, pois, em se tratando de pessoa idosa ou com deficiência, é através da própria natureza de seus males, de seu grau e intensidade, que poderão ser mensuradas suas necessidades.

Não há como enquadrar todos os indivíduos em um mesmo patamar, nem tampouco entender que aqueles que contam com menos de ¼ do salário-mínimo fazem jus obrigatoriamente ao benefício assistencial ou que aqueles que tenham renda superior não o façam.

Com relação ao cálculo da renda per capita em si, o Superior Tribunal de Justiça, em sede de recurso repetitivo REsp 1.355.052/SP, em conformidade com a decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal no RE 580.963/PR, definiu que a se aplica,  por analogia, a regra do parágrafo único do artigo 34 do Estatuto do Idoso (Lei 10.741/03),  a pedido de benefício assistencial formulado por pessoa com deficiência, a fim de que qualquer benefício previdenciário recebido por idoso, no valor de um salário mínimo, não seja computado na sua aferição.

Por fim, entende-se por família, para fins de verificação da renda per capita, nos termos do §1º do artigo 20 da Lei nº 8.742/93, com a redação dada pela Lei nº 12.435/2011, o conjunto de pessoas composto pelo requerente, o cônjuge, o companheiro, a companheira, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto.

Contudo, em que pese a princípio os filhos casados ou que não coabitam sob o mesmo teto não integrarem o núcleo familiar para fins de aferição de renda per capita, nos termos da legislação específica, não se pode perder de vista que o artigo 203, V, da Constituição Federal estabelece que o benefício é devido quando o idoso ou deficiente não puder prover o próprio sustento ou tê-lo provido pela família. Por sua vez, a regra do artigo 229 da Lei Maior dispõe que os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade, premissa também assentada nos artigos 1694 a 1697 da lei Civil.

Depreende-se assim que o dever de sustento do Estado é subsidiário, não afastando a obrigação da família de prestar a assistência, pelo que, como já dito, o artigo 20, § 3º, da LOAS não pode ser interpretado de forma isolada na apuração da miserabilidade.

Tecidas tais considerações, no caso dos autos a sentença de primeiro grau julgou improcedente o pedido com base nos elementos contidos no estudo social, tendo se convencido não restar configurada a condição de hipossuficiência financeira ou miserabilidade necessárias para a concessão do benefício. Confira-se:

“No caso em tela, a parte autora pode ser considerada pessoa com deficiência mental, nos termos do que dispõe o artigo 2º da Lei n.º 13.146/2015, consoante se aferiu no laudo pericial (fl. 209). Registre-se, por oportuno, que deficiência não se confunde com incapacidade, mormente a parcial. Afere-se, no entanto, que o indeferimento administrativo se deu em razão do autor possuir renda per capita superior a ¼ (um quarto) do salário mínimo vigente. Com efeito, os documentos juntados pela parte requerida às fls. 217/225 demonstram que a genitora recebe atualmente salário superior a R$ 2.000,00, valor este diferente daquele que consta no estudo social (fls. 151/181). Dessa forma, analisando os documentos juntados pela parte requerida e de acordo com o estudo social, a família do requerente é composta por 05 pessoas e a renda per capita é de R$400,00. Desse modo, o caso do autor não se enquadra nos termos do disposto no artigo 20,§ 3º da Lei 8.742/1993 (Art. 20. (...) § 3o Considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo.). Registre-se que, conquanto essa Magistrada não entenda que os critérios da Lei n.º 8.742/93 devam ser absolutamente rígidos, permitindo certas flexibilizações a incluir situações que se aproximam daquelas retratadas nos requisitos legais, no caso ficou evidente o não cumprimento do primeiro requisito. Destarte, não é possível conceder à autora o benefício pretendido”

De fato, o estudo social (ID 87793893 – pág. 41/70), elaborado em 22.05.2017, revela que a parte autora reside em imóvel alugado com sua mãe, o padrasto e dois irmãos.

Informa que a renda da casa advém do salário da mãe do autor no valor de R$ 1.435,67, e que o pai do autor lhe paga pensão no valor de R$ 120,00.

Relata despesas com aluguel (R$ 600,00), condomínio (R$ 77,08), energia elétrica (R$ 53,30), alimentação (R$ 600,00), farmácia (R$ 200,00), roupas e sapatos (R$ 80,00) e tratamento ortodôntico (R$ 90,00 – 12 parcelas), perfazendo total de R$ 1.700,38.

Inicialmente aponto que o extrato do sistema CNIS ID 87793893 – pag. 106/114 indica que no momento da perícia a mãe do autor apresentava salário de contribuição de R$ 2.077,90.

Depreende-se da leitura do estudo social que não há indícios de que as necessidades básicas da parte autora não estejam sendo supridas. Nesse sentido, anoto que o laudo médico pericial indica que o autor refere que faz terapia ocupacional, fonoaudiologia e ecoterapia, evidenciando a existência de acompanhamento médico adequado.

Tem-se ainda que o genitor do autor paga pensão alimentícia a ele, sendo que lhe cabe também acudir o filho em caso de urgência.

 O grupo conta ainda com o apoio da avó da parte autora que se incube de cuidar das crianças enquanto a filha trabalha.

Ressalto que o benefício assistencial não se destina a complementar o orçamento doméstico, mas sim prover aqueles que se encontram em efetivo estado de necessidade.

Verifica-se, assim, que o MM. Juiz sentenciante julgou de acordo com as provas carreadas aos autos e não comprovada a condição de miserabilidade, pressuposto indispensável para a concessão do benefício, de rigor a manutenção da sentença de improcedência do pedido por seus próprios fundamentos.

Considerando o não provimento do recurso, de rigor a aplicação da regra do §11 do artigo 85 do CPC/2015, pelo que determino, a título de sucumbência recursal, a majoração dos honorários de advogado arbitrados na sentença em 2%, devendo ser observada, se for o caso, a suspensão da exigibilidade prevista no § 3º do artigo 98 daquele Codex.

Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO à apelação da parte autora e, com fulcro no §11º do artigo 85 do Código de Processo Civil, majoro os honorários de advogado em 2% sobre o valor arbitrado na sentença, nos termos da fundamentação exposta.

É o voto.

 

 

 

 

 

 

 



 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0015392-04.2018.4.03.9999

RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES

APELANTE: M. C. D. S.

Advogado do(a) APELANTE: JOSE WAGNER CORREA DE SAMPAIO - SP152803-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

 

EMENTA

 

APELAÇÃO CÍVEL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. HIPOSSUFICIÊNCIA/MISERABILIDADE NÃO DEMONSTRADA. SUCUMBÊNCIA RECURSAL.  

1. O benefício de prestação continuada é devido ao portador de deficiência (§2º do artigo 20 da Lei nº 8.742/93, com a redação dada pela Lei nº 12.470/2011) ou idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais (artigo 34 da Lei nº 10.741/2003) que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família, nos termos dos artigos 20, § 3º, da Lei nº 8.742/93.

2. Requisito de miserabilidade/hipossuficiência não preenchido. Laudo social indica que a parte autora encontra-se amparado pela família e não há evidência de que suas necessidades básicas não estejam sendo supridas. O benefício assistencial não se presta a complementação de renda.

3. Benefício assistencial indevido.

4. Sucumbência recursal. Honorários de advogado majorados em 2% do valor arbitrado na sentença. Artigo 85, §11, Código de Processo Civil/2015. Exigibilidade condicionada à hipótese prevista no § 3º do artigo 98 do Código de Processo Civil/2015.

5. Apelação da parte autora não provida.

 

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu negar provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.