APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 0000360-53.2018.4.03.6120
RELATOR: Gab. 15 - DES. FED. ANDRÉ NEKATSCHALOW
APELANTE: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP, IRENE TAVARES FERREIRA, NEUSELI FERREIRA SILVEIRA, MARIA CONCEICAO DE ANUNZIO MENDES
Advogados do(a) APELANTE: LEANDRO LUIZ NOGUEIRA - SP275175-A, GABRIELA AGUIAR FIGUEIRA - SP349638-A
Advogados do(a) APELANTE: LEANDRO LUIZ NOGUEIRA - SP275175-A, GABRIELA AGUIAR FIGUEIRA - SP349638-A
Advogados do(a) APELANTE: BIANCA CAVICHIONI DE OLIVEIRA - SP152874-N, JACIARA DE OLIVEIRA - SP318986-N
APELADO: MARIA CONCEICAO DE ANUNZIO MENDES, MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP
Advogados do(a) APELADO: BIANCA CAVICHIONI DE OLIVEIRA - SP152874-N, JACIARA DE OLIVEIRA - SP318986-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 0000360-53.2018.4.03.6120 RELATOR: Gab. 15 - DES. FED. ANDRÉ NEKATSCHALOW APELANTE: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP, IRENE TAVARES FERREIRA, NEUSELI FERREIRA SILVEIRA, MARIA CONCEICAO DE ANUNZIO MENDES Advogados do(a) APELANTE: LEANDRO LUIZ NOGUEIRA - SP275175-A, GABRIELA AGUIAR FIGUEIRA - SP349638-A APELADO: MARIA CONCEICAO DE ANUNZIO MENDES, MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP Advogados do(a) APELADO: BIANCA CAVICHIONI DE OLIVEIRA - SP152874-N, JACIARA DE OLIVEIRA - SP318986-N OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de apelações criminais interpostas pelo Ministério Público Federal e pelas rés Irene Tavares Ferreira, Neuseli Ferreira Silveira e Maria Conceição de Annunzio contra a sentença que: a) condenou Irene Tavares Ferreira às penas de 1 (um) ano, 6 (seis) meses e 20 (vinte) dias de reclusão, regime inicial aberto, e 13 (treze) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente ao tempo do fato, por prática do crime previsto no art. 171, § 3º, do Código Penal, substituída a pena privativa de liberdade por 2 (duas) penas restritivas de direitos consistentes em prestação pecuniária no valor de 1 (um) salário mínimo e prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas, pelo prazo da pena substituída; b) condenou Neuseli Ferreira Silveira às penas de 2 (dois) anos de reclusão, regime inicial aberto, e 13 (treze) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente ao tempo do fato, por prática do crime previsto no art. 171, § 3º, do Código Penal, substituída a pena privativa de liberdade por 2 (duas) penas restritivas de direitos consistentes em prestação pecuniária no valor de 1 (um) salário mínimo e prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas, pelo prazo da pena substituída; c) condenou Maria Conceição de Annunzio às penas de 3 (três) anos de reclusão, regime inicial aberto, e 13 (treze) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente ao tempo do fato, por prática do crime previsto no art. 171, § 3º, do Código Penal, substituída a pena privativa de liberdade por 2 (duas) penas restritivas de direitos consistentes em prestação pecuniária no valor de 1 (um) salário mínimo e prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas, pelo prazo da pena substituída (Id n. 125611498, pp. 37/38; Id n. 125611499, pp. 1/10). O Ministério Público Federal alega o que segue: a) a exasperação da pena-base para a ré Maria Conceição merece quantum superior ao da sentença, considerando que foi a mentora do crime, que premeditou de forma ardilosa, havendo contra a acusada dezenas de outras ações penais de casos em que empregou o mesmo modus operandi; b) a culpabilidade e a personalidade são mais reprováveis, ademais, porque Maria Conceição utilizou conhecimentos prévios, adquiridos quando trabalhava para o INSS, a fim de poder induzir a Autarquia Previdenciária em erro posteriormente; c) as circunstâncias da infração são mais graves porque o INSS foi mantido em erro por mais de 9 (nove) anos, havendo significativo prejuízo financeiro; d) ainda contra Maria Conceição, merece ser considerado o fato de que induziu uma senhora primária de quase 70 (setenta) anos de idade a praticar crime grave; e) a ré Maria Conceição é acusada em várias outras ações penais, ao menos 18 (dezoito) processos, alguns dos quais, caso já transitados em julgado, podem render ensejo à exasperação da pena-base pelos maus antecedentes; f) já há duas condenações em fase de execução provisória por fatos semelhantes contra Maria Conceição (Autos n. 0003884-97.2014.403.6120 e 0003885-82.2014.4.03.6120); g) na segunda fase da dosimetria, impõe-se reconhecer a agravante de pena prevista no art. 62, I, da Código Penal, para a ré Maria Conceição, que exerceu a direção da atividade criminosa; h) o Juízo a quo não avaliou de forma adequada o valor da pena pecuniária substitutiva, condenando todas as acusadas ao pagamento de 1 (um) salário mínimo, e, quanto a Maria Conceição, não foi levada em conta a situação econômica estável e o grave dano causado pelo crime, impondo-se a majoração da pena; i) a pena de multa não foi adequadamente majorada em proporção à quantidade de pena privativa de liberdade; j) requer a fixação do valor mínimo a título de reparação dos danos causados, em montante não inferior a R$ 91.968,59 (noventa e um mil, novecentos e sessenta e oito reais e cinquenta e nove centavos), descontado eventual ressarcimento, conforme pedido expresso na denúncia (Id n. 125611499, pp. 14/28). A ré Maria Conceição de Annunzio alega o que segue: a) “o conjunto probatório esclarece que a apelante apenas redigiu em seu escritório a declaração de separação de fato acostada às fls. 10, apenso I, recebendo os seus honorários para tanto, porém, não apresentou o requerimento do benefício” (cf. Id n. 125611500, p. 2); b) a declaração foi redigida segundo as informações prestadas pela corré Irene, não havendo prova concreta de que a apelante tenha agido mediante fraude; c) a procuração foi assinada mediante impressão digital da requerente Irene e diretamente protocolizada junto ao INSS, ausente prova de participação da apelante em relação a ambos os requerimentos de benefício previdenciário; d) os recibos de pagamento foram emitidos por serviços de consulta e preenchimento de documentos, não por apresentação de protocolo ou requerimento ao INSS; e) não há prova de que a apelante tenha orientado as corrés quanto à apresentação de declarações falsas, sendo os depoimentos de ambas confusos e contraditórios, evidenciando que mentiram em Juízo; f) a apelante não enganou nenhuma pessoa nem obteve proveito econômico, o que restou demonstrado, embora não tenha sido sequer analisado na sentença; g) caso seja mantida a condenação, impõe-se a redução da pena aplicada ao mínimo legal, pois injusta e desproporcional; h) a pretensão punitiva está prescrita; i) a apelante não dispõe de meios para efetuar a reparação dos danos aos quais não deu causa; j) requer a concessão dos benefícios da justiça gratuita (Id n. 125611500, pp. 1/10). As rés Irene Tavares Ferreira e Neuseli Ferreira Silveira alegam o que segue: a) não há elementos mínimos para a condenação e a apelante Irene realmente fazia jus ao benefício de prestação continuada à época dos fatos, ainda que casada, não estando portanto configuradas as elementares do tipo penal de estelionato; b) as apelantes não tinham consciência de que os documentos apresentados pela corré Maria destinavam-se ao cometimento de fraude, ausente conduta volitiva nesse sentido; c) é exigível o dolo da conduta, que não restou caracterizado no caso dos autos, tanto que o próprio Delegado de Polícia Federal salientou que Irene não dispunha de qualquer condição de compreender a fraude que, em tese, cometera; d) impõe-se a correção da dosimetria, pois não incidiu, para nenhuma das apelantes, a atenuante de pena prevista no art. 65, III, d, do Código Penal, ressaltando-se que sempre colaboraram com a justiça e que documentos por elas apresentados embasaram a condenação (recibos de pagamento à corré Maria) (Id n. 125611500, pp. 21/30). A ré Maria Conceição de Annunzio apresentou contrarrazões (Id n. 125611500, pp. 12/20). A defesa constituída das rés Irene Tavares Ferreira e Neuseli Ferreira Silveira, embora intimada (Id n. 125611499, pp. 29/30), deixou de apresentar contrarrazões. O Ministério Público Federal apresentou contrarrazões (Id n. 125611501, pp. 8/15). O Ilustre Procurador Regional da República, Dr. Sergei Medeiros Araújo, manifestou-se pelo: a) reconhecimento, de ofício, da prescrição da pretensão punitiva em relação à ré Neuseli Ferreira Silveira, prejudicando o recurso interposto pela acusada; b) desprovimento da apelação interposta por Irene Tavares Ferreira; c) parcial provimento do recurso da acusação, para que, quanto à pena aplicada à ré Maria Conceição de Annunzio, seja exasperada a pena-base pelas circunstâncias do crime, incida a agravante prevista no art. 62, I, do Código Penal, e sejam exasperadas as penas de prestação pecuniária e a de multa, em proporcionalidade à pena privativa de liberdade (Id n. 126300613, pp. 1/20). É o relatório. Encaminhem-se os autos ao Revisor, nos termos regimentais.
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Advogados do(a) APELANTE: BIANCA CAVICHIONI DE OLIVEIRA - SP152874-N, JACIARA DE OLIVEIRA - SP318986-N
APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 0000360-53.2018.4.03.6120 RELATOR: Gab. 15 - DES. FED. ANDRÉ NEKATSCHALOW APELANTE: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP, IRENE TAVARES FERREIRA, NEUSELI FERREIRA SILVEIRA, MARIA CONCEICAO DE ANUNZIO MENDES Advogados do(a) APELANTE: LEANDRO LUIZ NOGUEIRA - SP275175-A, GABRIELA AGUIAR FIGUEIRA - SP349638-A APELADO: MARIA CONCEICAO DE ANUNZIO MENDES, MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP Advogados do(a) APELADO: BIANCA CAVICHIONI DE OLIVEIRA - SP152874-N, JACIARA DE OLIVEIRA - SP318986-N OUTROS PARTICIPANTES: V O T O Imputação. Irene Tavares Ferreira, Neuseli Ferreira Silveira e Maria Conceição de Annunzio foram denunciadas por prática do crime previsto no art. 171, § 3º, do Código Penal, haja vista que, em comunhão de propósitos, obtiveram, para si e para outrem, vantagem ilícita em prejuízo do INSS, mantido em erro mediante apresentação de documentos ideologicamente falsos. A denúncia narra que, em data anterior a 21.11.07, Irene Tavares Ferreira, juntamente com sua filha Neuseli Ferreira Silveira, compareceu ao escritório de Maria Conceição de Annunzio, que intermediava requerimentos de benefícios previdenciários e assistenciais perante a Agência do INSS em Matão (SP). Em novembro de 2007, Maria Conceição de Annunzio providenciou requerimento de benefício de prestação continuada ao idoso em favor de Irene, elaborando, para tanto, uma falsa declaração de separação de fato, a qual foi assinada a rogo pela filha da requerente (denunciada Neuseli), com o objetivo de ocultar a renda percebida pelo esposo de Irene. Ademais, Maria Conceição solicitou documentos particulares de outra filha de Irene, chamada Roseli Ferreira, com o objetivo de comprovar a falsa informação de que Irene não mais residia com o esposo, mas com a filha. Ambos os documentos contendo declarações inverídicas foram apresentados à Agência do INSS em Matão (SP), o que resultou em concessão de benefício de amparo social ao idoso em favor de Irene (NB 526.618.817-9), pago durante o período de 27.11.07 a 28.02.17. No ano de 2015, Irene ajuizou ação previdenciária em que pleiteava o benefício de pensão por morte de seu marido, de quem, consoante restou apurado no curso do processo previdenciário, jamais havia de fato se separado. O pedido foi julgado procedente, mas com determinação de desconto, quanto ao montante em atraso, dos valores percebidos a título do benefício assistencial fraudulentamente obtido por Irene antes do reconhecimento de seu direito à pensão do marido. A acusação salienta que a denunciada Neuseli acompanhou a genitora (Irene) nas idas ao escritório da procuradora Maria Conceição e, posteriormente, da advogada que ajuizou a ação previdenciária em que se constatou a fraude, a indicar que Neuseli foi quem auxiliou diretamente Irene em sua solicitação de benefício assistencial – inclusive quanto à obtenção dos documentos solicitados por Maria Conceição, pois Irene é pessoa idosa e que não sabe ler. Quanto à denunciada Maria Conceição, houve vários outros casos de concessão fraudulenta de benefício de amparo ao idoso, mediante apresentação de falsas declarações de separação de fato e moradia com os filhos, os quais contaram com a assistência de Maria Conceição, a reforçar a conclusão de que estava ciente da fraude (Id n. 125611496, pp. 3/6). Estelionato previdenciário. Natureza do delito. Termo inicial da prescrição. Ressalvado meu entendimento, o Supremo Tribunal Federal tem jurisprudência firme quanto à distinção da natureza do delito de estelionato previdenciário conforme o papel desempenhado pelo agente. Portanto, cumpre diferenciar as seguintes situações: se o agente é o próprio beneficiário, o delito tem natureza permanente e o prazo prescricional se inicia com a cessação do recebimento indevido; se o autor do crime pratica a fraude em favor de outrem, o delito é instantâneo de efeitos permanentes, cujo termo inicial do prazo prescricional é o recebimento da primeira prestação do benefício indevido: PENAL. HABEAS CORPUS. ESTELIONATO PREVIDENCIÁRIO (ART. 171, § 3º, DO CÓDIGO PENAL. CRIME PERMANENTE. BENEFICIÁRIO. PRAZO PRESCRICIONAL. INÍCIO DA CONTAGEM. CESSAÇÃO DA PERMANÊNCIA. PRESCRIÇÃO EM PERSPECTIVA. TEMA NÃO APRECIADO NA ORIGEM. INCOGNOSCIBILIDADE. INSTITUTO NÃO ACOLHIDO PELO E. STF. 1. O agente que perpetra a fraude contra a Previdência Social recebe tratamento jurídico-penal diverso daquele que, ciente da fraude, figura como beneficiário das parcelas. O primeiro pratica crime instantâneo de efeitos permanentes; já o segundo pratica crime de natureza permanente, cuja execução se prolonga no tempo, renovando-se a cada parcela recebida da Previdência. 2. Consectariamente, em se tratando de crime praticado pelo beneficiário, o prazo prescricional começa a fluir da cessação da permanência. Precedentes: HC nº 99.112, rel. Min. Marco Aurélio, j. 20/4/2010, 1ª Turma; HC 101.481, rel. min. Dias Toffoli, j. 26/4/2011, 1ª Turma; HC 102.774/RS, rel. Min. Ellen Gracie, j. 14/12/2010, 2ª Turma, DJ de 7/2/2011. 3. In casu, narra a denúncia que a paciente participou não apenas da fraude à entidade de Previdência Social, por meio de conluio com servidores do INSS, mas figurou como destinatária dos benefícios previdenciários, que recebeu até 30/10/2006. 4. Dessa forma, forçoso reconhecer que o prazo prescricional teve início apenas na referida data, em que cessada a permanência. (...) 7. Parecer pela denegação da ordem. 8. Ordem denegada. (STF, 1ª Turma, HC n. 102491, Rel.: Ministro Luiz Fux, j. 10.05.11) AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. CRIME DE ESTELIONATO PREVIDENCIÁRIO. RÉU BENEFICIÁRIO DAS PARCELAS INDEVIDAS. CRIME PERMANENTE. PRESCRIÇÃO. TERMO INICIAL. HIGIDEZ DA PRETENSÃO PUNITIVA. PRECEDENTES. 1. Em tema de estelionato previdenciário, o Supremo Tribunal Federal tem uma jurisprudência firme quanto à natureza binária da infração. Isso porque é de se distinguir aquele que, em interesse próprio, recebe o benefício ilicitamente daquele que comete uma falsidade para permitir que outrem obtenha a vantagem indevida. No primeiro caso, a conduta, a despeito de produzir efeitos permanentes no tocante ao beneficiário da indevida vantagem, materializa, instantaneamente, os elementos do tipo penal. Já naquelas situações em que a conduta é cometida pelo próprio beneficiário e renovada mensalmente, o crime assume a natureza permanente, dado que, para além de o delito se protrair no tempo, o agente tem o poder de, a qualquer tempo, fazer cessar a ação delitiva. Precedentes. 2. Agravo regimental desprovido. (STF, 2ª Turma, ARE-AgR 663735, Rel.: Min. Ayres Britto, j. 07.02.12) Do caso dos autos. Para análise da prescrição da pretensão punitiva no presente caso, impõe-se diferenciar a situação de cada acusada: a) Irene é a própria beneficiária da vantagem indevida (benefício de prestação continuada assistencial), de modo que, para ela, o termo inicial da prescrição da pretensão punitiva é a data de cessação do benefício (28.02.17); b) Neuseli e Maria Conceição concorreram para o cometimento da fraude, mas não são as agentes titulares do benefício concedido de maneira irregular: para ambas, a data dos fatos a ser considerada é o dia 27.11.07, quando realizado o primeiro pagamento (e, portanto, consumado o delito de estelionato). Consigno que a denúncia foi recebida em 20.06.18 (Id n. 125611496, pp. 8/9) e a sentença condenatória foi publicada em 30.08.19 (Id n. 125611499, p. 11). Estabelecidas as devidas distinções e os sucessivos marcos interruptivos do prazo prescricional, impõe-se acolher a manifestação da Procuradoria Regional da República a fim de reconhecer a prescrição da pretensão punitiva apenas com relação à acusada Neuseli. Passo à análise da situação de cada ré quanto ao prazo prescricional. Prescrição. Maria Conceição. No que diz respeito à ré Maria Conceição, a acusação recorreu pleiteando a exasperação de sua condenação. Desse modo, considera-se o quantum abstrato máximo de pena para fins de exame da prescrição, que, no caso do estelionato majorado (CP, art. 171, § 3º), é de 6 (seis) anos e 8 (oito) meses de reclusão, a que corresponde o prazo prescricional de 12 (doze) anos, conforme o art. 109, III, do Código Penal. Não houve o decurso desse prazo (12 anos) entre os sucessivos marcos interruptivos, não havendo falar, portanto, em extinção da punibilidade com fundamento no art. 107, IV, do Código Penal. Prescrição. Neuseli. Diferente é o caso da ré Neuseli, contra quem não houve recurso da acusação para exasperação da pena privativa de liberdade. Nesse caso, com o trânsito em julgado do quantum da condenação, considera-se a pena aplicada, consistente em 2 (dois) anos de reclusão (CP, art. 110, § 1º), que resulta em prazo prescricional de 4 (quatro) anos, conforme o art. 109, V, do Código Penal. Entre a data dos fatos (27.11.07) e a do recebimento da denúncia (20.06.18), decorreu prazo superior a 4 (quatro) anos, restando, portanto, prescrita a pretensão punitiva, impondo-se a extinção da punibilidade para a ré Neuseli. Prescrição. Irene. A acusação também deixou de impugnar a quantidade de pena privativa de liberdade aplicada à ré Irene, de modo que transitou em julgado a condenação no que diz respeito ao quantum consistente em 1 (um) ano, 6 (seis) meses e 20 (vinte) dias de reclusão. Considerada essa quantidade de pena, conforme preceitua o art. 110, § 1º, c. c. o art. 109, V, do Código Penal, tem-se o prazo prescricional de 4 (quatro) anos, o qual, porém, é reduzido em metade no caso da ré Irene que, nascida em 17.04.40, já contava mais de 70 (setenta) anos de idade à época da sentença (CP, art. 115, parte final). Assim, a pretensão punitiva restaria prescrita caso excedido o prazo de 2 (dois) anos entre os sucessivos marcos interruptivos, o que não aconteceu: Irene percebeu o benefício até 28.02.17 (data final dos fatos para a beneficiária), a denúncia foi recebida em 20.06.18 e a sentença foi publicada em 30.08.19. Analisada a alegação de prescrição da pretensão punitiva, portanto, conclui-se que procede apenas com relação à ré Neuseli, cuja punibilidade resta extinta conforme o art. 107, IV, do Código Penal. Materialidade. A materialidade do delito está satisfatoriamente demonstrada em razão do que segue: a) cópias extraídas do Procedimento Administrativo do INSS n. 88/523.618.817-9 (Id n. 125611484, pp. 1/22); b) formulário de requerimento do benefício assistencial em favor de Irene, em que indicado o estado civil “outro” e, como endereço, a Rua Dante Pecorari, n. 166, onde residia a filha da requerente (Id n. 125611484, p. 6); c) cópia da declaração de separação de fato em nome de Irene Tavares Ferreira, datada de 21.11.07 e com impressão da digital do polegar direito da requerente, pessoa não alfabetizada (Id n. 125611367, p. 23); d) declaração de composição de renda em nome da requerente Irene, na qual omitida a fonte de renda oriunda da aposentadoria do marido (Id n. 125611484, p. 7). Autoria. A autoria do delito está demonstrada. Extrai-se da sentença proferida dos Autos n. 0003120-53.2015.4.03.632 que a ré Irene Tavares Ferreira ajuizou ação contra o INSS objetivando a concessão de pensão por morte de seu marido, José Antenor da Silva, falecido em 30.01.15, haja vista que o benefício previdenciário fora indeferido em sede administrativa porque Irene havia declarado estar separada de fato do cônjuge a fim de receber receber benefício de amparo ao idoso em seu próprio nome (Id n. 125611363, pp. 11/15). No curso da instrução da ação previdenciária, constatou-se que, à época do óbito, José Antenor continuava morando com Irene, havendo indícios de que a declaração de separação de fato apresentada anteriormente ao INSS era fraudulenta, destinando-se à obtenção ilegal de benefício assistencial de amparo ao idoso em favor de Irene (NB 523.618.817-9, concedido em 27.11.07). Quando ouvida perante o Juízo da ação previdenciária, a ré Irene foi expressamente indagada a respeito do conteúdo da declaração da separação de fato. Irene respondeu que se lembrava dessa declaração, mas que a advogada lhe informara apenas que precisava do endereço da filha da acusada, que serviria ao recebimento das “cartinhas” do INSS, e que a filha não precisaria comparecer. Ela pediu apenas o endereço da filha para a “cartinha” e não leu essa declaração de separação de fato. Irene disse que “não tem leitura” (não sabe ler), que a orientação foi dada por uma advogada e que outras pessoas já haviam obtido a aposentadoria com essa advogada. Não tinha conseguido a aposentadoria porque, embora tenha trabalhado muito, nunca foi registrada. Sabia apenas o nome da advogada, que se chamava Maria. Nunca esteve separada de fato do falecido esposo, José Antenor (Id n. 125611364). Na fase investigativa, acompanhada de sua advogada, a ré Irene Tavares Ferreira declarou que jamais esteve separada de fato de seu falecido esposo, José Antenor Ferreira. Tem baixa instrução e geralmente são seus filhos que cuidam de seus assuntos. A advogada de Irene, que a acompanhava na data da oitiva, esclareceu à Autoridade Policial que havia sido procurada por uma das filhas da ré para que requeresse a pensão por morte. Apenas quando sobreveio a negativa administrativa é que soube que Irene já recebia benefício de amparo assistencial ao idoso. O benefício de pensão por morte foi indeferido pelo INSS, mas, posteriormente, restou concedido por meio de processo judicial. O benefício de amparo foi requerido por procuradora chamada “Maria Anunciação de tal”, cujo escritório está fechado. Não conhecia o paradeiro de Maria Anunciação. A advogada concluiu dizendo que sua cliente não atuara de má-fé, pois carecia de instrução e não compreendia sequer qual era a irregularidade discutida a respeito do benefício assistencial (Id n. 125611363, p. 41). Após a oitiva de Irene, a Autoridade Policial consignou a possibilidade de que “Maria Anunciação” poderia tratar-se de Maria Conceição de Annunzio, que já era investigada nos autos do Inquérito Policial n. 268/17-DPF/AQA/SP por fato semelhante (Id n. 125611363, p. 40). Ouvida na fase investigativa, Maria Conceição de Annunzio declarou que não sabia esclarecer se atuara como procuradora de Irene. Disse que foi servidora municipal comissionada de 2000 a 2005 e que, nesse período, foi cedida pela Prefeitura ao INSS. Após o ano de 2005, passou a trabalhar em uma sala situada no escritório de Dra. Marguerita, onde atendia pessoas interessadas em benefícios previdenciários. Por volta de 2007, patrocinou em sede administrativa diversos pedidos de benefício assistencial – LOAS. Dava andamento aos pedidos conforme as informações eram repassadas pelos interessados. Era comum que os interessados comparecessem acompanhados de um filho ou outro parente, com a documentação já pronta. Havia casos, inclusive, em que já compareciam em seu escritório com a declaração de separação de fato preenchida. Não agiu ilicitamente em nenhum caso, não teve intenção de fraudar o benefício assistencial. Se houve alguma inserção de informação falsa, isso aconteceu exclusivamente com base em informação do próprio beneficiário ou de algum parente (Id n. 125611363, p. 57) A Autoridade Policial oficiou ao INSS a fim de que fosse esclarecido se Irene Tavares Ferreira havia sido representada por algum procurador ao requerer o benefício assistencial (Id n. 125611363, p. 60). A Autarquia Previdenciária respondeu que não havia localizado nenhuma procuração juntada ao processo administrativo, tampouco em cadastro junto ao sistema informatizado (Id n. 125611363, p. 61). A ré Irene Tavares Ferreira tornou a prestar esclarecimentos à Autoridade Policial. Na ocasião, ratificou as declarações prestadas anteriormente e disse que reconhecia a mulher da fotografia à fl. 46 dos autos físicos (ré Maria Conceição de Annunzio) como sendo a pessoa que contratara para requerer o benefício assistencial do INSS (Id n. 125611363, p. 71). Na mesma data, a ré Neuseli Ferreira Silveira, filha de Irene, prestou declarações à Autoridade Policial. Neuseli afirmou que Irene possuía ao todo 3 (três) filhas, todas responsáveis pelos cuidados da genitora, que vivia na casa ao lado da acusada. Por conta da proximidade de residências, era Neuseli quem mais cuidava da mãe. Há cerca de uma década, ouviram falar que uma mulher do Município de Matão (SP) estaria conseguindo aposentar pessoas acima de 60 (sessenta) anos que estavam com dificuldades junto ao INSS, isso é, que já haviam tentado sem sucesso a obtenção de benefício. A mulher em questão trabalhava no escritório de advocacia da Dra. Marguerita, que ficava ao lado do INSS em Matão (SP). Acompanhou a mãe, Irene, em visitas ao escritório mencionado, onde foram atendidas por Maria Conceição de Annunzio, que reconheceu como a pessoa da fotografia à fl. 47 dos autos físicos. Maria disse que daria entrada em requerimento em nome de Irene e pediu cópias dos documentos pessoais. Em nenhum instante ela disse que iria cometer alguma ilegalidade em relação ao benefício da genitora. Irene jamais se separou do marido (pai da depoente). Na ocasião de uma visita a Maria, a genitora Irene apôs sua digital em alguns documentos, mas a depoente não chegou a ver o teor de cada um deles. Indagada acerca de não ter verificado o teor dos documentos, respondeu que pensou ser algo desnecessário, pois estava em um escritório de advocacia. Não possui nenhum documento referente à contratação dos serviços de Maria ou procuração que lhe teria sido outorgada, mas apresentou recibos de pagamento por serviços prestados por Maria Conceição, alguns por ela assinados, outros com assinatura de Marina, filha de Maria (Id n. 125611363). Os recibos mencionados ao final do depoimento de Neuseli foram apreendidos e juntados aos autos (Id n. 125611363, pp. 73/74). Interrogada em Juízo, a ré Maria Conceição Annunzio declarou que não atuou sequer como procuradora no caso dos autos. Não se recorda das pessoas. Acredita que elas (as corrés) possam ter obtido informações junto ao próprio INSS, no sentido de que alguma pessoa, talvez um guarda, tenha dito que elas poderiam preencher a documentação “ali ao lado”, no escritório da requerente. Não se lembra da senhora ou da filha. Pode ser que elas tenham ido ao escritório para preencher a documentação e, por conta desse serviço, tenha sido cobrada uma taxa de custo. Não pode afirmar que foi isso o que aconteceu no caso. Os recibos nos autos provavelmente referem-se ao pagamento pelo serviço do preenchimento. Reconheceu sua assinatura e a de sua filha nos recibos juntados aos autos. Pode ser que tenham cobrado o preenchimento mediante a condição de que o benefício fosse aceito, elas devem ter aceitado essa condição de pagamento. Como não tem procuração nos autos, devem ter montado o processo e as próprias requerentes procuraram o INSS. Quando se trata de analfabeto, não podem dar entrada na procuração sem a presença física da pessoa. Provavelmente, ela deve ter assinado o contrato de prestação do serviço e foi a filha quem assinou. Procurou esse contrato, mas não achou. Tem o cadastro dos dados dos clientes, mas não encontrou nada da requerente. Provavelmente só montou o processo e foi a própria requerente quem esteve no INSS, onde a documentação deve ter sido lida para ambas, mãe e filha. Na maior parte dos casos, algum filho ou nora acompanha o requerente, a interrogada era procurada por pessoas que costumavam perguntar se os familiares tinham direito a benefício. Depois que passou a ser investigada, reviu seus casos e, em um deles, foi a própria interrogada quem constatou a irregularidade. A pessoa que a procurou estava muito alterada e o processo não estava em conformidade com os parâmetros do INSS, rejeitou a prestação dos serviços. Acredita que tenha acontecido algo assim no caso dos autos, mas não se lembra, não recorda se a requerente estava acompanhada da filha. Quando começou a prestar os serviços de requerimento de benefício, costumava ser procurada por pessoas que pretendiam obter aposentadoria rural. Pedia-lhes os documentos para verificar, primeiro a Carteira de Trabalho. Olhava e, se não havia registros ou tempo suficiente, dizia que não havia o tempo de contagem mínimo. Muitas vezes, algumas pessoas retornavam dizendo que para “fulano” havia dado certo, e que a mãe ou pai, assim como no caso de “fulano”, também não moravam juntos. Respondia-lhes que seria feita uma pesquisa pelo INSS, ainda que demorasse, para verificar se havia mesmo separação dos genitores. Algumas respostas de indeferimento eram rápidas, pois constava que na casa do requerente havia pessoas beneficiárias morando juntas. Orientava seus clientes sobre essas circunstâncias, já havia trabalhado no INSS e sabia que poderia ser processada. Conhece a lei, sabia muito bem do trabalho e obteve muitas informações de advogados que lidavam com questões e alertavam que era perigoso. Muitas vezes, era procurada por pessoas que diziam ter obtido a documentação, mas não sabiam montar o requerimento. Limitava-se a fazer esse trabalho de montagem, digitalizava o que era necessário. Em muitos casos, cobrou apenas por essa organização, não acompanhava os processos depois disso. Cobrava de 2 (dois) a 3 (três) valores de benefício pelos serviços prestados quando havia todo o trabalho de montagem e acompanhamento. Orientavam os clientes sobre a exigência de que para requerer o benefício precisava haver separação de fato. Na época, o valor percebido pelos filhos não interferia na concessão do benefício. Isso passou a ser observado posteriormente. Havia muitos indeferimentos no ato em virtude da composição familiar ser superior à mínima. Em alguns casos, davam entrada em requerimento mediante pedido judicial. Não tinha condições de verificar a realidade da situação dos clientes ou de ir atrás dos documentos para instruir requerimento fraudulento. Todos liam os documentos solicitados ou, se eles não liam, todo o teor era lido para eles. Lia a exigência da declaração de separação de fato com o alerta de que deveria ser de verdade, do contrário o caso iria para a justiça. Só mencionaria necessidade de testemunhas para caso de aposentadoria rural. Para analfabetos, a procuração era assinada e o filho firmava o compromisso com o escritório. Montava a documentação e a pessoa o acompanhava até o INSS, que nesse caso não aceita a ausência do requerente e requer a coleta da digital. O servidor do INSS, que no caso era Mauro ou Luciana, lia os documentos, esclarecia se havia separação de fato e perguntava se a pessoa entendia. Via muitas vezes o requerente olhar para o filho ou filha para confirmar se era aquilo mesmo e em seguida apunha a digital. Não tinha como dar início ao requerimento sem a pessoa em caso de analfabetismo. Às vezes eles mesmos iam até o INSS sozinhos, em casos em que contratavam apenas sua consulta. Todos os atendimentos foram feitos com consciência por parte dos clientes. Nunca imaginava que passaria por dificuldades financeiras por conta dessas situações. Não acha justo. Agiu corretamente com seus clientes. Exerceu cargo de confiança junto à Prefeitura. Como o INSS estava precisando de agentes, o Prefeito cedeu-a e lá trabalhou de 2000 a 2005. Depois disso, conversou com Dra. Marguerita e ela cedeu uma sala para que a interrogada pudesse trabalhar. Trabalhou lá até meados de 2010. Quando saiu do INSS, Luciana estava entrando. Teve mais contato com ela quando já trabalhava como procuradora. Luciana é bem reservada e seca, não é de muita conversa. Acha que responde a 18 (dezoito) processos análogos. Quanto às aposentadorias, não foi constatada nenhuma irregularidade. Acredita que, no caso dos autos, a pessoa a procurou apenas para a digitalização dos documentos. A declaração da separação de fato é lida para a pessoa. Se ela omite se é ou não casada, é problema dela. Como tem os recibos nos autos, a contratação do serviço deve ter sido apenas para preenchimento do requerimento e acompanhamento do processo. Não há como um analfabeto deixar de ir ao INSS para dar entrada em requerimento. A procuração em que conste aceitação do requerente mediante impressão digital não é válida para o INSS sem a presença física da pessoa (Id n. 127253034). Interrogada em Juízo, a ré Irene Tavares Ferreira disse que não leu a denúncia. O Juízo a quo leu a peça acusatória para a ré, que disse ter entendido pouco coisa da denúncia. Disse que é idosa e não entende direito. Não é verdade que fez declaração falsa porque não inventou a mentira, quem fez isso foi a advogada, Maria. A filha só a deixou no escritório e foi embora, ela tinha criança pequena para cuidar. A advogada disse que era fácil. Soube dela no consultório médico. A mulherada estava conversando e saiu esse assunto. Como não tinha conseguido a aposentadoria, foi no escritório dela e deu certo. Ela disse que estava tudo bem e daria certo. Ela mostrou um tanto de recibos que tinha feito e disse que era rapidinho, uns 20 (vinte) dias para receber, e assim aconteceu. Ela não explicou nada sobre perder o direito à pensão do marido caso ele falecesse. Ela não disse que aquele recibo mostrado dizia que era separada. Ela perguntou onde a interrogada morava, o endereço. Disse que residia no Popular. Ela perguntou com quem residia, respondeu que era com o marido. Uns 20 (vinte) dias depois, recebeu a carta do INSS. Ela não pediu os documentos da Roseli. Neuseli não ficou durante o atendimento. Ficaram só a ré Maria e a interrogada, não desconfiou de nada. Indagada sobre os documentos de Roseli, afirmou que tornou a procurar a advogada depois que recebeu o pagamento, pois tinha de pagar metade a ela. Ela não disse que deveria levar os comprovantes de endereço de Roseli ao INSS. Foi ao INSS acompanhada de Maria e da filha. Nesses dias, levou os documentos, RG e CPF. Levou os documentos de Roseli porque Maria pediu. Indagada sobre ter dito que não foram solicitados os documentos de Roseli, respondeu que está confusa e nervosa com esse caso, que já se estende há anos. Quando o marido faleceu, soube que não poderia receber a pensão dele por causa do benefício que percebia. Metade do que recebesse seria pago a Maria por 5 (cinco) meses. Recebia os pagamentos, sacava no banco, separava a metade e pagava no escritório dela, mediante recibo. Às vezes, a filha ia ao escritório para pagar. Acreditou na advogada porque não tem “leitura nenhuma”, é uma “pobretona e caipirona” (cf. 10min da mídia eletrônica). Depois que começou a pagar, ela disse que tinha que levar os documentos de Roseli. Nunca se separou de José Antenor. Nunca morou no lugar indicado na separação de fato. Não se lembra de ter impresso a digital na declaração de separação de fato. Acha que apôs a digital no INSS, mas não sabia o teor do documento. Confiou em Maria. Ela não perguntou se era separada. Ela não disse que teria de falar que era separada. Foi ao consultório de Maria umas duas ou três vezes. Ela não forneceu relação de documentos. No primeiro dia de atendimento do amparo que ela estava providenciando, ela comentou que tinha de levar os documentos. Na segunda vez, levou os documentos. Não se lembra de ter levado documento de Roseli nessa segunda vez. Ela pediu “uma filha que não morasse perto de mim” (cf. 15min da mídia eletrônica). A indicação de Neuseli não serviria porque moravam em casas geminadas. Indagada se reconhecia Maria, respondeu que achava tê-la visto sentada na mesa de audiências. A filha Neuseli esteve no escritório de Maria umas duas ou três vezes. Quando levou os documentos, Neuseli não estava junto. Ela sabia que a interrogada iria levar esses documentos para Maria. Uma mulher que trabalhava para um advogado de fora pediu a aposentadoria rural, isso foi antes de contratar Maria. Maria disse que era uma lei nova, que o governo havia arranjado e era mais uma vantagem para o idoso. Sabia que seria pedido um amparo. As filhas também sabiam. Quando foi ao INSS, Neuseli estava junto. Uma atendente recolheu a documentação. Ela não leu os documentos para a interrogada. Ninguém leu nada. A filha também não leu nada. Maria também não leu nada para que ficassem cientes do que estava acontecendo. A filha não leu, estava em uma correria naquele dia, e além disso são pessoas “do mato”, que não conhecem leis. A filha confiava. Neuseli levou os documentos ao cartório para autenticar. Ninguém perguntou sobre o endereço de Roseli no INSS. Para a interrogada, nada foi lido perante o INSS. Maria não disse em nenhum momento que deveria falar que estava separada (Ids ns. 127253032 e 127253033). Interrogada em Juízo, a ré Neuseli Ferreira Silveira declarou que não concorda com a denúncia porque foram cientificadas de que era algo autorizado por lei. Sempre acompanhou a mãe. Teve o primeiro filho, parou de trabalhar e passou a ficar em casa. Como os pais moravam ao lado, cuidava deles. Acompanhava a mãe, que tinha mais de 60 (sessenta) anos de idade, em consultas médicas. Em uma sala de espera, durante uma conversa típica dessas situações de espera, uma moça indicou o contato de Maria, disse que era uma advogada que estava aposentando idosos. Ela deu o endereço do escritório da Marguerita, que era ao lado do INSS. Nunca falou com Marguerita, só com Maria. A pessoa que indicou Maria falou que era muito rápido. Levou a mãe ao escritório de Maria, que disse que daria certo, era só trazer documentos pessoais e comprovante de residência. Também deveria levar seus próprios documentos e os de uma filha que não morasse no mesmo endereço da genitora porque precisavam de testemunhas. Estavam ao lado do INSS, era um escritório de advocacia. Nunca haviam entrado em um escritório antes. Só foi dito que precisavam dos documentos porque serviriam de testemunhas. O que Maria pediu, levou. Nunca foi ao INSS. Acompanhou a mãe sempre, mas nunca ao INSS. Não foi ao INSS por causa desse caso. Maria deixou tudo pronto, todos os documentos. Ela pediu que passassem no dia seguinte para colher a impressão digital da mãe. Não sabe se houve colheita de impressão digital no INSS. Não lembra se providenciou a autenticação de documentos. Se tiver algo assim, foi a interrogada quem fez porque costumava resolver essas coisas para a mãe. Nunca foi ao INSS. A genitora também não foi ao INSS, ela não anda sozinha. Só a levou ao escritório de advocacia, que divide parede com a agência do INSS. Sempre conversou com a Maria ou com a Marina, filha de Maria, sobre o caso. No primeiro dia, foram saber como fazer. No segundo dia, passaram no escritório para colher a digital da mãe. Ninguém leu os documentos, confiou. Só deixou a mãe no local, embora saiba que não é certo. Confiou, estava dentro de um escritório de advocacia. Além disso, não era só a própria genitora, havia muitas outras idosas sendo atendidas no local. Sabia que era um benefício ao qual a mãe tinha direito. Levou a mãe ao escritório e conversou com Maria. A filha dela atendia quando Maria não estava lá. No primeiro dia, Maria disse que a genitora Irene tinha direito ao benefício, mas que precisava de duas testemunhas. Não sabe se ela disse que era “aposentadoria”, sabe que ela disse que tinha direito ao benefício. Não sabe qual foi a palavra usada, mas era um salário mínimo por mês. Precisava de duas testemunhas, uma era a interrogada e a outra poderia ser um filho que não residisse com a genitora. Conversou com a irmã. Confiou, estava em um escritório de advocacia. A mãe já havia requerido aposentadoria rural. Não esteve no INSS para isso, foi uma pessoa de fora de Matão (SP) que passava de casa em casa vendo isso. Acha que o pagamento para Maria foi feito em 5 (cinco) vezes, a genitora ficava com metade e o restante era pago a Maria. Sempre acompanhou a genitora para realizar esses pagamentos. Às vezes era Marina quem recebia. Nunca esteve no INSS por causa do benefício da LOAS, que agora sabe do que se trata. Não sabe se Maria perguntou se a mãe era casada e qual era a composição familiar. Ela não perguntou sobre a mãe estar separada. Ela só pediu documento de um filho ou filha que não residisse com a mãe. Ela nunca disse que iria precisar de assinar algo, mas que nada aconteceria por causa disso. Maria disse que, como a mãe não assinava, precisava de duas pessoas para ceder os documentos. Assinou, acompanhava a genitora. Não leu nada, estava preocupada com o filho, o escritório tinha uma escada enorme e estava cuidando dele. Na placa em frente ao escritório dizia apenas que era consultório de Marguerita. A genitora não tem nenhum problema mental, ela só fica muito nervosa. Não sabe por que a genitora disse que esteve no INSS. Só estiveram no INSS para pedir a aposentadoria por morte do pai. A genitora é lúcida, mas está muito nervosa. Sempre procurou entender os assuntos da genitora, mas, no caso da LOAS, não tentou entender nada porque estavam em um escritório de advocacia. A mãe apôs digital em documento. Não sabe se a mãe forneceu procuração para Maria. Se a mãe disse que esteve no INSS, é porque está muito nervosa, e ela é pessoa muito simples (Id n. Id n. 127253035). A testemunha Ivanilda Dantas Silva declarou em Juízo que conhecia Irene, casada com o falecido José Antenor. Ela nunca esteve separada dele e jamais morou em outra casa, sempre residiu na casa que era geminada à de sua filha, Neuseli. Há muito tempo eles estavam morando no Popular, depois que compraram uma casa. É amiga de trabalho de Neuseli há muitos anos, desde que os filhos eram pequenos. Soube que a filha de Irene esteve em um escritório após tomar conhecimento desse local por meio de uma “conversa de mulherada”. Uma pessoa comentou que tinha se aposentado e recebia benefício, foi auxiliada por uma advogada que trabalhava perto do INSS. Então elas foram ao escritório dessa pessoa e a advogada disse que dava para se aposentar, ela conseguiu e passou a receber o benefício. Passado um tempo, depois do falecimento de Antenor, Irene procurou receber o benefício dele, que era maior. Foi então que soube desse “rolo” de que ela estava recebendo como se estivesse separada de Antenor, só que Irene jamais esteve separada dele. Sabe que o nome da advogada era Maria, desconhece o sobrenome, não é de guardar nomes. Pelo que sabe, foi dito que ela poderia se aposentar, que ela tinha o direito. Não sabe se ela teria que dizer que residia com algum filho. Sabe que pediram o endereço de filhos e Roseli era a única que residia em local diferente. (Id n. 12561504). A testemunha José Gonçalves da Silva Irmão declarou em Juízo que Irene foi casada com Antenor. Eles nunca se separaram. Irene jamais residiu com Roseli. Soube que Irene obteve um benefício do INSS. Não sabe se ela teve que mentir para conseguir o benefício. Não conheceu a ré Maria Conceição, só ouviu falar o nome dela e comentários, ficou até admirado com a história (Id n. 12561504). Roseli Ferreira, filha de Irene, afirmou em Juízo que a genitora jamais residiu consigo. Chegou a fornecer-lhe comprovante de endereço. Não acompanhou a genitora ao escritório da corré Maria. A genitora era casada e jamais foi separada. Soube da ida ao escritório de Maria Conceição quando lhe pediram documentos. Ela apenas disse que precisava do documento de uma filha com a qual não residisse. Neuseli e a mãe moravam em casas geminadas. Na casa da genitora, residiam apenas ela e o pai, que já era aposentado na época dos fatos. Não sabia se a genitora firmara uma declaração de separação de fato, só levaram os documentos e nada disseram. Quem pediu os documentos foi Maria, pessoa que não conheceu (Id n. 12561503). A testemunha Ana Lúcia do Carmo, servidora do INSS, declarou em Juízo que não conhecia as rés Irene e Neuseli, mas conhecia Maria Conceição da época em que trabalharam juntas no INSS. Não lembra qual era a função exercida por Maria Conceição no INSS. Depois que saiu do INSS, Maria passou a trabalhar como procuradora. Soube que alguns benefícios intermediados por ela deram problema. Não se lembra do caso de Irene (Id n. 12561502). A testemunha Luciana de Souza Rodrigues, servidora do INSS, declarou em Juízo que o procedimento de concessão de benefício a hipossuficiente não alfabetizado era feito da mesma forma, com diferença de que teria de coletar a digital do requerente no balcão. A documentação era igual, com a mesma tela e os mesmos documentos. Pelo que se lembra, a pessoa trazia a documentação preenchida, coletavam a digital lendo as informações dos formulários do INSS. O procedimento era de leitura do teor dos formulários, independentemente de ter ou não procurador nos autos (Id n. Id n. 127251831). Analisados os autos, resta demonstrado que Irene esteve no consultório de Maria Conceição, acompanhada da filha Neuseli, e lá recebeu as orientações a respeito da documentação necessária à obtenção do benefício de prestação continuada de forma fraudulenta, isso é, com indicação falsa de seu estado civil (separada de fato), do local onde residia (endereço de uma filha) e da composição da renda familiar, tudo voltado ao preenchimento dos requisitos para a concessão do amparo destinado ao idoso em situação da carência. Irene, na verdade, jamais esteve separada do marido José Antenor, nem residiu com a filha Roseli. Ainda assim, apresentou à Autarquia Previdenciária documentos que diziam ser essa a sua situação na época em que pleiteou o benefício. Não é crível que Irene e Neuseli tenham procurado a acusada Maria Conceição já cientes do meio espúrio pelo qual lograriam obter o benefício: extrai-se dos autos que Maria Conceição tinha certa fama de conseguir aposentadorias difíceis junto ao INSS, o que rende ensejo à conclusão de que Irene e Neuseli foram de fato orientadas por Maria Conceição, que não se limitou a preencher os requerimentos administrativos, apenas redigindo-os segundo os dados fornecidos pelas clientes, como sustentou em sua defesa. A ré Maria Conceição obteve experiência profissional junto ao INSS e passou a trabalhar como procuradora em requerimentos à Autarquia, muitos dos quais acabaram investigados por suspeita de fraude semelhante à tratada nestes autos (IPLs ns. 268/17 e 95/17, consoante mencionado pela Autoridade Policial, para além de diversas outras ações penais, como a própria acusada mencionou). A similitude de irregularidades não é mera coincidência, comprovando que a acusada logrou criar meio de obter vantagem ilícita em prejuízo do INSS mediante prestação de falsas informações. Logo, ainda que não tenha pessoalmente apresentado o requerimento ao INSS, a acusada Maria Conceição concorreu para a ação criminosa na medida em que orientou as corrés, fornecendo-lhes o meio de consumar a fraude – não há dúvida da contratação de Maria Conceição para esse fim, havendo demonstração de que recebeu os valores indicados nos recibos de pagamento juntados aos autos, do que se extrai que obteve proveito econômico com a fraude (Id n. 125611363, pp. 73/74). Em relação à acusada Irene, embora seja pessoa não alfabetizada, há nos autos elementos de convicção satisfatórios no sentido de que estaria suficientemente consciente de que faltava com a verdade perante o INSS. Nesse sentido, para além dos indícios decorrentes da contratação de pessoa conhecida por “conseguir aposentadorias com problemas”, está demonstrado que foi a própria acusada quem apresentou os documentos à Autarquia, havendo demonstração suficiente de que o conteúdo da declaração da separação de fato e dos demais dados qualificativos foram lidos e confirmados em sua presença, o que rende ensejo à conclusão de que estava ciente de que prestava dados pessoais falsos ao INSS. Anoto que, além do depoimento da servidora do INSS, há ofício da Autarquia esclarecendo que desde 2007 até a presente data, em casos de atendimento de requerimentos realizados por segurados analfabetos, é padrão a leitura dos documentos apresentados a fim de se verificar se têm consciência de seu conteúdo antes da colheita de impressão digital (Id n. 125611498, p. 17). Nesse contexto, a falta de instrução e a condição socioeconômica de Irene não implicam ausência de consciência da falsidade das afirmações sobre estado civil e residência, excluindo-se a hipótese de que teria sido enganada por Maria Conceição a fim de fornecer endereço diverso para mero recebimento de correspondência ou indicação de testemunhas, de forma que não teria agido com a vontade de obter vantagem indevida em prejuízo do INSS. A conduta de Irene, portanto, foi dolosa. Rejeito a alegação de que Irene faria jus ao benefício e, portanto, não haveria falar em tipicidade para a acusada: como salientado pela I. Procuradoria Regional da República em seu parecer (Id n. 126300613, pp. 13/14), não há nenhuma comprovação de que a acusada lograria obter o benefício caso houvesse declarado a correta composição de renda familiar, para a qual concorria a aposentadoria de seu marido que, ao que tudo indica, inviabilizaria a concessão do amparo. As rés, portanto, conluiaram-se a fim de obter o benefício assistencial ao idoso que resultou em fraude no montante de R$ 91.968,59 (noventa e um mil, novecentos e sessenta e oito reais e cinquenta e nove centavos), valor atualizado até março de 2017 (Id n. 125611363, p. 28). Resta, assim, mantida a condenação de ambas. Passo à análise da dosimetria. Dosimetria. Ré Maria Conceição. Foram consideradas negativas as consequências do crime, consistentes em prejuízo aos demais segurados previdenciários e dependentes do INSS, bem como aos cofres da Autarquia, calculado no valor de R$ 91.968,59 (noventa e um mil, novecentos e sessenta e oito reais e cinquenta e nove centavos), atualizado até março de 2017. O grau de reprovabilidade da conduta foi considerado alto, dado que era exigível da acusada outra conduta, considerando que era procuradora da requerente e ex-servidora da Autarquia. A pena-base foi assim fixada acima do mínimo legal, em 2 (dois) anos de reclusão, com base nas consequências e na culpabilidade da ré. A pena de multa foi inicialmente fixada em 10 (dez) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente ao tempo do fato. Na segunda fase, não foram reconhecidas atenuantes e incidiu a agravante prevista no art. 61, II, g, do Código Penal, em virtude de tratar-se de delito cometido mediante inobservância de dever inerente ao ofício ou profissão de procuradora de segurados. A pena foi elevada em 3 (três) meses, passando a 2 (dois) anos e 3 (três) meses de reclusão. Na terceira fase, não incidiram causas de diminuição. Foi aplicada a causa de aumento prevista no art. 171, § 3º, do Código Penal, na fração de 1/3 (um terço), e a pena foi majorada para 3 (três) anos de reclusão e 13 (treze) dias-multa, resultado definitivo. Foi fixado o regime inicial aberto (CP, art. 33, § 2º, c). A pena privativa de liberdade foi substituída por 2 (duas) penas restritivas de direitos consistentes em prestação pecuniária no valor de 1 (um) salário mínimo e prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas, pelo prazo da pena substituída. O Ministério Público Federal apela para que seja exasperada a pena-base; para que incida a agravante de pena prevista no art. 62, I, da Código Penal, pois a ré exerceu a direção da atividade criminosa; seja exasperada a pena pecuniária substitutiva; e seja exasperada a pena de multa, em proporcionalidade à pena privativa de liberdade. A ré Maria Conceição apela para que a pena seja reduzida ao mínimo legal, pois injusta e desproporcional. Assiste parcial razão a ambas as partes. Revejo a dosimetria. A maior reprovabilidade da conduta da acusada em virtude de ter prestado serviços ao INSS anteriormente, bem como por ter atuado como procuradora da beneficiária (nessa posição, haveria de ter pautado sua conduta em conformidade com a lei), já foi circunstância reconhecida na sentença, com suficiente exasperação da pena-base, e merece ser mantida. Igualmente suficiente foi a exasperação da pena-base pelas consequências do crime, incluindo o tempo durante o qual perdurou a fraude, que ensejou prejuízo financeiro de R$ 91.968,59 (noventa e um mil, novecentos e sessenta e oito reais e cinquenta e nove centavos). A acusação não se desincumbiu do ônus de indicar as ações penais aptas a caracterizar os maus antecedentes. Ademais, descabe valorar contra a acusada os demais inquéritos e ações penais em curso, a qualquer título (personalidade, conduta social ou maus antecedentes), conforme dispõe a Súmula n. 444 do Superior Tribunal de Justiça. No que diz respeito à cooptação da corré idosa para a prática do crime, deixo de valorar essa circunstância contra a acusada haja vista que, no caso dos autos, Irene é pessoa lúcida e contava com o auxílio e o aconselhamento da filha Neuseli, dispondo de condições concretas de se desvencilhar de eventual indução ao crime por parte de Maria Conceição. O pedido da ré, em contrapartida, não merece acolhimento dado que a fixação da pena-base no dobro do mínimo legal representa resposta adequada à gravidade concreta da conduta com base na culpabilidade e nas consequências do crime, como já explicitado. Logo, resta mantida a pena-base em 2 (dois) anos de reclusão. No tocante à pena de multa, dado que tanto a pena privativa de liberdade quanto a pena de multa sujeitam-se a critérios uniformes para a sua determinação, é adequada a exasperação proporcional da sanção pecuniária (TRF da 3ª Região, EI n. 0004791-83.2006.4.03.6110, Rel. Des. Fed. André Nekatschalow, j. 16.02.17; TRF da 3ª Região, ACR n. 0002567-55.2013.4.03.6102, Des. Fed. Cecilia Mello, j. 20.09.16; TRF da 3ª Região, ACR n. 0003484-24.2012.4.03.6130, Rel. Des. Fed. Mauricio Kato, j. 11.04.16). Assim, cabe fixar a pena de multa, nesta primeira fase, em 20 (vinte) dias-multa, em proporcionalidade à pena privativa de liberdade. Na segunda fase, não incidem atenuantes. Não é caso de aplicar a agravante prevista no art. 62, I, do Código Penal. Malgrado a comprovação do concurso de pessoas, não há satisfatória demonstração de que a ré de fato dirigisse as atividades das demais agentes. Quanto à agravante prevista no art. 61, II, g, do Código Penal (descumprimento de dever inerente a ofício), impõe-se exclui-la para evitar “bis in idem”, dado que, na primeira fase do cálculo, a exigibilidade de conduta diversa por força da profissão exercida pela ré (procuradora perante o INSS) já foi circunstância valorada em seu desfavor a título de culpabilidade. A pena intermediária, portanto, resta mantida em 2 (dois) anos de reclusão e 20 (vinte) dias-multa, pois não incidem circunstâncias agravantes ou atenuantes. Na terceira fase, não há causas de diminuição e incide a majorante do art. 171, § 3º, do Código Penal, de modo que a pena passa a 2 (dois) anos e 8 (oito) meses de reclusão e 26 (vinte e seis) dias-multa, resultado definitivo à míngua de outras circunstâncias incidentes sobre o cálculo. O valor unitário do dia-multa é estabelecido em 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente ao tempo do fato. Mantido o regime inicial aberto (CP, art. 33, § 2º, c). Seguem preenchidos os requisitos previstos no art. 44 do Código Penal, que mantenho na forma estabelecida na sentença (prestação pecuniária e prestação de serviços à comunidade). Porém, no que diz respeito ao quantum da pena pecuniária, entendo que assiste razão à acusação: à vista do prejuízo causado ao INSS, de valor superior a R$ 90.000,00 (noventa mil reais), cabe exasperá-lo para 5 (cinco) salários mínimos, o que reputo mais condizente com a gravidade do fato criminoso. Dosimetria. Ré Irene. Foram consideradas negativas as consequências do crime, consistentes em prejuízo aos demais segurados previdenciários e dependentes do INSS e aos cofres da Autarquia Previdenciária, calculado em R$ 91.968,59 (noventa e um mil, novecentos e sessenta e oito reais e cinquenta e nove centavos), valor atualizado até março de 2017. A natureza do crime (permanente) foi considerada circunstância negativa da ação. A pena-base foi por isso fixada acima do mínimo legal, em 1 (um) ano e 6 (seis) meses de reclusão. A pena de multa foi inicialmente fixada em 10 (dez) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente ao tempo do fato. Na segunda fase, não foram reconhecidas agravantes, mas incidiu a atenuante prevista no art. 65, I, do Código Penal, considerando que a acusada era maior de 70 (setenta) anos de idade na data da sentença. A pena foi reduzida em 4 (quatro) meses, passando a 1 (um) ano e 2 (dois) meses de reclusão. Na terceira fase, não incidiram causas de diminuição. Foi aplicada a causa de aumento prevista no art. 171, § 3º, do Código Penal, na fração de 1/3 (um terço), e a pena foi majorada para 1 (um) ano, 6 (seis) meses e 20 (vinte) dias de reclusão e 13 (treze) dias-multa, resultado definitivo. Foi fixado o regime inicial aberto (CP, art. 33, § 2º, c). A pena privativa de liberdade foi substituída por 2 (duas) penas restritivas de direitos consistentes em prestação pecuniária no valor de 1 (um) salário mínimo e prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas, pelo prazo da pena substituída. O Ministério Público insurge-se apenas em relação à pena de multa, fixada em desproporcionalidade à pena privativa de liberdade, e quanto à pena pecuniária substitutiva. A ré, a seu turno, pleiteia a incidência da atenuante da confissão. Assiste razão apenas à acusação. Revejo a dosimetria. À míngua de impugnação das partes, a pena-base resta mantida conforme a sentença, isso é, em 1 (um) ano e 6 (seis) meses de reclusão. Dado que tanto a pena privativa de liberdade quanto a pena de multa sujeitam-se a critérios uniformes para a sua determinação, é adequada a exasperação proporcional da sanção pecuniária (TRF da 3ª Região, EI n. 0004791-83.2006.4.03.6110, Rel. Des. Fed. André Nekatschalow, j. 16.02.17; TRF da 3ª Região, ACR n. 0002567-55.2013.4.03.6102, Des. Fed. Cecilia Mello, j. 20.09.16; TRF da 3ª Região, ACR n. 0003484-24.2012.4.03.6130, Rel. Des. Fed. Mauricio Kato, j. 11.04.16). Assim, mantidos os critérios de fixação da pena privativa de liberdade, tem-se que, na primeira fase, exasperada em 1/2 (metade), a pena de multa resta fixada em 15 (quinze) dias-multa;. Na segunda fase do cálculo, não é caso de reconhecer a confissão da ré (CP, art. 65, III, d), pois jamais admitiu a autoria delitiva, ainda que com incidência de alguma excludente de responsabilidade. O mero fornecimento dos recibos pelos serviços prestados por Maria Conceição não basta para que se considere ré confessa, pois não confessou ter prestado falsas declarações à Autarquia Previdenciária visando a obtenção da vantagem ilícita (BPC). No mais, não há agravantes a reconhecer e incide a atenuante de pena prevista no art. 65, I, do Código Penal. Na segunda fase, com a redução por incidência da atenuante do art. 65, I, do Código Penal, a pena intermediária é fixada em 1 (um) ano e 2 (dois) meses de reclusão e 11 (onze) dias-multa. Na terceira fase, sem causas de diminuição, incide a causa de aumento do art. 171, § 3º, do Código Penal, na fração de 1/3 (um terço), e a pena é majorada para 1 (um) ano, 6 (seis) meses e 20 (vinte) dias de reclusão e 14 (catorze) dias-multa, resultado definitivo. Restam mantidas as demais disposições acerca do valor unitário do dia-multa, 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente ao tempo do fato, bem como em relação ao regime inicial de cumprimento de pena adequado, que é o aberto, nos termos do art. 33, § 2º, c, do Código Penal. Restam preenchidos os requisitos para a substituição da pena privativa de liberdade por penas restritivas de direitos (CP, art. 44), que mantenho na forma estabelecida na sentença (prestação pecuniária e prestação de serviços à comunidade). Em relação ao quantum da pena pecuniária, no entanto, entendo que assiste razão à acusação: considerando o elevado valor do prejuízo causado ao INSS, consistente em R$ 91.968,59 (noventa e um mil, novecentos e sessenta e oito reais e cinquenta e nove centavos), cabe exasperá-lo para 5 (cinco) salários mínimos, o que reputo mais condizente com a gravidade do fato criminoso. Valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração. CPP, art. 387, IV. Pedido expresso antes das alegações finais. Exigibilidade. Ressalvado meu entendimento de que se trata de norma processual, define a competência do juiz criminal para determinar um valor mínimo, o Superior Tribunal de Justiça entende que a fixação de valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração, prevista no art. 387, IV, do Código de Processo Penal, com a redação da Lei n. 11.719/08, é norma de direito material, não tem efeitos retroativos e exige que seja deduzido pedido antes das alegações finais a fim de garantir o contraditório e o devido processo legal: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO (...). APLICABILIDADE DO INCISO IV DO ARTIGO 387 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. OFENSA REFLEXA AO TEXTO DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL (...). 2. In casu, o acórdão recorrido assentou: "(...) EXCLUSÃO DA INDENIZAÇÃO À VÍTIMA. SENTENÇA CONFIRMADA. (...) 2 Afasta-se a indenização à vítima quando o tema só é suscitado nas alegações finais do Ministério Público, ficando, portanto, infenso ao contraditório e à ampla defesa. 3 Apelações desprovidas." 3. Agravo regimental DESPROVIDO. (STF, ARE n. 694.158, Rel. Min. Luiz Fux, j. 25.03.14) RECURSO ESPECIAL (...). REPARAÇÃO DE DANOS À VÍTIMA. ART. 387, INCISO IV, CPP. PEDIDO EXPRESSO. NECESSIDADE. QUANTUM LÍQUIDO E CERTO. NÃO EXIGÊNCIA. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESSA EXTENSÃO, PROVIDO (...). 3 - A aplicação do instituto disposto no art. 387, inciso IV, do CPP, referente à reparação de natureza cível, quando da prolação da sentença condenatória, requer a dedução de um pedido expresso do querelante ou do Ministério Público, em respeito às garantias do contraditório e da ampla defesa. 4 - Neste caso houve pedido expresso por parte do Ministério Público, na exordial acusatória, o que é suficiente para que o juiz sentenciante fixe o valor mínimo a título de reparação dos danos causados pela infração. 5 - Assim sendo, não há que se falar em iliquidez do pedido, pois o quantum há que ser avaliado e debatido ao longo do processo, não tendo o Parquet o dever de, na denúncia, apontar valor líquido e certo, o qual será devidamente fixado pelo Juiz sentenciante. 6 - Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, provido. (STJ, REsp n. 1.265.707, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, j. 27.05.14) AGRAVO REGIMENTAL (...). REPARAÇÃO CIVIL MÍNIMA. ART. 387, IV, DO CPP. PEDIDO DO OFENDIDO OU DO ÓRGÃO MINISTERIAL. LEGALIDADE. MINISTÉRIO PÚBLICO PLEITEOU A FIXAÇÃO DE VALOR PARA A REPARAÇÃO DO DANO NA DENÚNCIA. POSSIBILIDADE. RESPEITADA A OPORTUNIDADE DE DEFESA AO RÉU. REVOLVIMENTO FÁTICO-PROBATÓRIO. SÚMULA 83/STJ. 1. A mais significativa inovação legislativa introduzida pela Lei n. 11.719/2008, que alterou a redação do inciso IV do art. 387 do Código de Processo Penal, possibilitou que na sentença fosse fixado valor mínimo para a reparação dos prejuízos sofridos pelo ofendido em razão da infração, a contemplar, portanto, norma de direito material mais rigorosa ao réu. 2. Para que seja fixado na sentença o início da reparação civil, com base no art. 387, IV, do Código de Processo Penal, deve haver pedido expresso do ofendido ou do Ministério Público e ser possibilitado o contraditório ao réu, sob pena de violação do princípio da ampla defesa (...). (STJ, AgRg no REsp n. 1.383.261, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 17.10.13) PENAL E PROCESSO PENAL (...). OFENSA AO ART. 387, IV, DO CPP. FIXAÇÃO DO QUANTUM MÍNIMO PARA REPARAÇÃO DE DANOS À VÍTIMA. NECESSIDADE DE PEDIDO FORMAL DO PARQUET OU DO OFENDIDO. ACÓRDÃO EM CONFORMIDADE COM A JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE. SÚMULA 83/STJ. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1 - Este Tribunal sufragou o entendimento de que deve haver pedido expresso e formal, feito pelo parquet ou pelo ofendido, para que seja fixado na sentença o valor mínimo de reparação dos danos causados à vítima, a fim de que seja oportunizado ao réu o contraditório e sob pena de violação ao princípio da ampla defesa. 2 - Agravo regimental a que se nega provimento. (STJ, AgRg no AREsp n. 389.234, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 08.10.13) Do caso dos autos. O Ministério Público Federal postula a fixação de quantia mínima para fins de indenização, conforme o art. 387, IV, do Código de Processo Penal. Indefiro o pedido, considerando que os fatos são de 27.11.07, anteriores portanto à introdução no ordenamento do dispositivo legal que autoriza a fixação de valor mínimo para fins de indenização pelos danos causados pela conduta. Logo, para evitar efeito retroativo indevido, é inviável a fixação pretendida. Cumpre consignar que nestes autos há ofício do INSS esclarecendo que parte do valor pago indevidamente foi descontado dos valores atrasados da pensão por morte concedida a Irene, de modo que a Autarquia aguardava orientação da Procuradoria Fiscal para realização da cobrança do valor restante, consistente em R$ 30.695,08 (trinta mil, seiscentos e noventa e cinco reais e oito centavos) (Id n. 125611498, p. 17). Custas. Réu pobre. Isenção. Ainda que beneficiário da assistência judiciária gratuita, deve ser mantida sua responsabilidade pelas despesas processuais e pelos honorários advocatícios decorrentes de sua sucumbência (CPC/15, art. 98, § 2º), ficando, no entanto, sobrestado o pagamento, enquanto perdurar a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão da gratuidade, pelo prazo de 5 (cinco) anos, ocorrendo, após, a extinção da obrigação (CPC/15, art. 98, § 3º). A isenção deverá ser apreciada na fase de execução da sentença, mais adequada para aferir a real situação financeira do condenado. Do caso dos autos. A ré Maria Conceição de Annunzio postula a isenção de pagamento das custas. Defiro-lhe os benefícios da justiça gratuita, haja vista a manifestação de hipossuficiência econômica, mas observado o disposto acima, ou seja, que resta mantida sua responsabilidade pelas despesas processuais e pelos honorários advocatícios decorrentes de sua sucumbência (CPC/15, art. 98, § 2º), ficando, no entanto, sobrestado o pagamento, enquanto perdurar a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão da gratuidade. Ante o exposto, ACOLHO o parecer da Procuradoria Regional da República para EXTINGUIR A PUNIBILIDADE da ré Neuseli Ferreira Silveira, com fundamento no art. 107, IV, c. c. o art. 109, V, e o art. 110, § 1º, do Código Penal, e JULGO PREJUDICADA a apelação interposta pela acusada; NEGO PROVIMENTO à apelação criminal da ré Irene Tavares Ferreira; DOU PARCIAL PROVIMENTO à apelação criminal da ré Maria Conceição de Annunzio, a fim de excluir a agravante prevista no art. 61, II, g, do Código Penal; e DOU PARCIAL PROVIMENTO à apelação criminal do Ministério Público Federal para exasperar a pena de multa e a pena pecuniária substitutiva da pena privativa de liberdade aplicadas às rés, de modo que a condenação de Maria Conceição de Annunzio passa a ser de 2 (dois) anos e 8 (oito) meses de reclusão e 26 (vinte e seis) dias-multa, e a condenação de Irene Tavares Ferreiras passa a ser de 1 (um) ano, 6 (seis) meses e 20 (vinte) dias de reclusão e 14 (catorze) dias-multa, para ambas as rés fixado o regime inicial aberto e substituída a pena privativa de liberdade por 2 (duas) penas restritivas de direitos consistentes em prestação pecuniária no valor de 5 (cinco) salários mínimos e prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas. É o voto.
Advogados do(a) APELANTE: LEANDRO LUIZ NOGUEIRA - SP275175-A, GABRIELA AGUIAR FIGUEIRA - SP349638-A
Advogados do(a) APELANTE: BIANCA CAVICHIONI DE OLIVEIRA - SP152874-N, JACIARA DE OLIVEIRA - SP318986-N
E M E N T A
PENAL. PROCESSO PENAL. ESTELIONATO CONTRA O INSS (CP, ART. 171, 3º). BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA AO IDOSO. ESTELIONATO PREVIDENCIÁRIO. NATUREZA DO DELITO. TERMO INICIAL DA PRESCRIÇÃO. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE COM RELAÇÃO À RÉ NEUSELI. PRESCRIÇÃO NÃO VERIFICADA PARA AS DEMAIS CORRÉS. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. CONDUTA DOLOSA. CONDENAÇÃO MANTIDA. DOSIMETRIA. PENA-BASE. EXASPERAÇÃO CONFORME A SENTENÇA. MULTA. PROPORCIONALIDADE À PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE. PENA DE MULTA REDUZIDA. EXCLUSÃO DA AGRAVANTE PREVISTA NO ART. 61, II, ‘G’, DO CÓDIGO PENAL PARA A RÉ MARIA CONCEIÇÃO. EXASPERAÇÃO DO QUANTUM DE PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA SUBSTITUTIVA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE. VALOR MÍNIMO PARA REPARAÇÃO DOS DANOS CAUSADOS PELA INFRAÇÃO. CPP, ART. 387, IV. PEDIDO EXPRESSO ANTES DAS ALEGAÇÕES FINAIS. EXIGIBILIDADE. CUSTAS. RÉU POBRE. ISENÇÃO. APELAÇÃO DA RÉ NEUSELI PREJUDICADA. APELAÇÃO DA RÉ IRENE DESPROVIDA. APELAÇÃO DA RÉ MARIA CONCEIÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA. APELAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL PARCIALMENTE PROVIDA.
1. Rés denunciadas e condenadas por prática do crime previsto no art. 171, § 3º, do Código Penal, haja vista que, em comunhão de propósitos, obtiveram, para si e para outrem, vantagem ilícita em prejuízo do INSS, mantido em erro mediante apresentação de documentos ideologicamente falsos (declarações falsas de separação de fato e residência em local diverso do verdadeiro, prestadas pela acusada Irene, beneficiária direta da fraude).
2. Ressalvado meu entendimento, o Supremo Tribunal Federal tem jurisprudência firme quanto à distinção da natureza do delito de estelionato previdenciário conforme o papel desempenhado pelo agente. Portanto, cumpre diferenciar as seguintes situações: se o agente é o próprio beneficiário, o delito tem natureza permanente e o prazo prescricional se inicia com a cessação do recebimento indevido; se o autor do crime pratica a fraude em favor de outrem, o delito é instantâneo de efeitos permanentes, cujo termo inicial do prazo prescricional é o recebimento da primeira prestação do benefício indevido (STF, 1ª Turma, HC n. 102491, Rel.: Ministro Luiz Fux, j. 10.05.11; 2ª Turma, ARE-AgR 663735, Rel.: Min. Ayres Britto, j. 07.02.12).
3. No caso dos autos, verificada a prescrição da pretensão punitiva apenas com relação à ré Neuseli, com base na pena aplicada (CP, art. 107, IV, art. 109, IV, e art. 110, § 1º).
4. Materialidade e autoria comprovadas em relação às rés Maria Conceição de Annunzio (procuradora e ex-funcionária do INSS) e Irene Tavares Ferreira (beneficiária direta da fraude), considerando a prova documental e os depoimentos colhidos em Juízo, os quais demonstram que da fraude resultou prejuízo significativo à Autarquia Previdenciária, dado que os pagamentos indevidos perduraram de 27.11.07 até 28.02.17.
5. Dosimetria. Pena-base fixada acima do mínimo legal para ambas as rés, em virtude do elevado prejuízo de R$ 91.968,59 (noventa e um mil, novecentos e sessenta e oito reais e cinquenta e nove centavos), valor atualizado até março de 2017. No mais, a culpabilidade da ré Maria Conceição também restou avaliada negativamente, justificando o aumento de sua pena inicial em quantidade superior à da corré Irene.
6. Na segunda fase do cálculo, para a ré Maria Conceição, não é caso de aplicar a agravante prevista no art. 62, I, do Código Penal, à míngua de satisfatória demonstração de que a ré de fato dirigisse as atividades das demais agentes. Quanto à agravante prevista no art. 61, II, g, do Código Penal (descumprimento de dever inerente a ofício), impõe-se exclui-la para evitar “bis in idem”, dado que, na primeira fase do cálculo, a exigibilidade de conduta diversa por força da profissão exercida pela ré (procuradora perante o INSS) já foi circunstância valorada em seu desfavor a título de culpabilidade.
7. Na segunda fase, para a acusada Irene, não é caso de reconhecer a confissão, pois jamais admitiu a autoria delitiva, ainda que com incidência de alguma excludente de responsabilidade. O mero fornecimento dos recibos pelos serviços prestados por Maria Conceição não basta para que se considere tratar-se de ré confessa, pois jamais admitiu ter prestado falsas declarações à Autarquia Previdenciária visando a obtenção da vantagem ilícita (BPC).
8. Quanto à substituição da pena privativa de liberdade por penas restritivas de direitos, especificamente a pena pecuniária, entendo que assiste razão à acusação: considerando o elevado valor do prejuízo causado ao INSS, cabe exasperá-la para 5 (cinco) salários mínimos, para ambas as acusadas, o que é mais condizente com a gravidade do fato criminoso.
9. Ressalvado meu entendimento de que se trata de norma processual, define a competência do juiz criminal para determinar um valor mínimo, o Superior Tribunal de Justiça entende que a fixação de valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração, prevista no art. 387, IV, do Código de Processo Penal, com a redação da Lei n. 11.719/08, é norma de direito material, não tem efeitos retroativos e exige que seja deduzido pedido antes das alegações finais a fim de garantir o contraditório e o devido processo legal (STF, ARE n. 694.158, Rel. Min. Luiz Fux, j. 25.03.14; STJ, REsp n. 1.265.707, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, j. 27.05.14; AgRg no REsp n. 1.383.261, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 17.10.13 e AgRg no AREsp n. 389.234, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 08.10.13). No caso dos autos, tratando-se de fato anterior à introdução do dispositivo legal, não cabe a fixação pretendida pela acusação.
10. Ainda que beneficiário da assistência judiciária gratuita, deve ser mantida sua responsabilidade pelas despesas processuais e pelos honorários advocatícios decorrentes de sua sucumbência (CPC/15, art. 98, § 2º), ficando, no entanto, sobrestado o pagamento, enquanto perdurar a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão da gratuidade, pelo prazo de 5 (cinco) anos, ocorrendo, após, a extinção da obrigação (CPC/15, art. 98, § 3º). A isenção deverá ser apreciada na fase de execução da sentença, mais adequada para aferir a real situação financeira do condenado.
11. Apelação da ré Neuseli Ferreira Silveira prejudicada pelo reconhecimento da prescrição da pretensão punitiva.
12. Apelação da ré Irene Tavares Ferreira desprovida.
13. Apelação da ré Maria Conceição de Annunzio parcialmente provida.
14. Apelação do Ministério Público Federal parcialmente provida.