Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0033504-30.2008.4.03.6100

RELATOR: Gab. 09 - DES. FED. NELTON DOS SANTOS

APELANTE: UNIÃO FEDERAL

APELADO: LOCALFRIO S.A. ARMAZENS GERAIS FRIGORIFICOS.

Advogado do(a) APELADO: GILBERTO VIEIRA DE ANDRADE - SP58126-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0033504-30.2008.4.03.6100

RELATOR: Gab. 09 - DES. FED. NELTON DOS SANTOS

APELANTE: UNIÃO FEDERAL

 

APELADO: LOCALFRIO S.A. ARMAZENS GERAIS FRIGORIFICOS.

Advogado do(a) APELADO: GILBERTO VIEIRA DE ANDRADE - SP58126-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

 

O Senhor Desembargador Federal Nelton dos Santos (Relator): Trata-se de embargos de declaração opostos pela União, em face do acórdão (Id 122611706), que, à unanimidade, negou provimento à apelação, concluindo pelo direito da apelada, na condição de depositária das mercadorias abandonadas e/ou apreendidas e colocadas à disposição da União Federal, de cobrar a tarifa de armazenagem correspondente.

Eis a ementa do julgado:

“ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. ADUANEIRO. TARIFA DE ARMAZENAGEM. MERCADORIA ABANDONADA. PENA DE PERDIMENTO APLICADA. RESPONSABILIDADE DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL. DECRETO-LEI 1.455/1976. ALEGAÇÃO DE PRESCRIÇÃO. AFASTADA. APELAÇÃO DA UNIÃO DESPROVIDA.

Caso em que a parte autora visa provimento jurisdicional que declare a obrigação da União ao pagamento das despesas com a taxa de armazenagem dos bens apreendidos e abandonados, mantidos sob o depósito da primeira.

O termo inicial para a contagem do prazo prescricional no caso sub judice é a decisão final do processo administrativo em qual foi requerido o pagamento das importâncias inerentes às tarifas de armazenagem. Dessa forma, fica afastada a referida alegação, porquanto não esgotado o prazo prescricional quinquenal, no caso concreto.

No que se refere à preliminar de ilegitimidade passiva da União e de legitimidade passiva do importador, no presente caso, a parte autora, ora apelada, postula a declaração de crédito referente à taxa de armazenagem de mercadorias abandonadas que já estavam à disposição da Receita Federal do Brasil, razão pela qual somente a União Federal deve permanecer como parte da relação processual. Isso porque do momento do recebimento da mercadoria no recinto alfandegado até a declaração de seu abandono a responsabilidade é, de fato, do importador. No entanto, o que se discute no presente caso é o período posterior à declaração do perdimento até a sua destinação - momento em que a mercadoria passou aos cuidados da Receita Federal do Brasil, razão pela qual a despesa com armazenamento deverá ser arcada eventualmente pela União Federal.

A apelada, permissionária de serviço público em instalação portuária de zona primária, realiza a movimentação e o depósito de mercadorias importadas ou destinadas à exportação, nos termos do que dispõe o Regulamento Aduaneiro.

Assim, o armazenamento de mercadorias importadas é uma das atividades da autora, como permissionária. E, nessa qualidade, também possui a obrigação, determinada na legislação aduaneira, de comunicar à Secretaria da Receita Federal as ocorrências de mercadorias abandonadas por decurso de prazo e mantê-las sob sua guarda até a final destinação das mesmas.

Dessa forma, no caso de mercadorias apreendidas por desconformidade com aquilo que foi declarado na guia de importação deverá mantê-las sob sua custódia.

Considera-se mercadoria abandonada, nos termos dos artigos 642 e 644 do Decreto 6.759/09, os produtos que permanecerem em recinto alfandegado sem que o seu despacho de importação seja iniciado no decurso dos prazos estabelecidos nos referidos artigos. Após o depósito das mercancias em seu recinto, a prestadora do serviço/autora deve observar rigorosamente o controle dos prazos de armazenamento e comunicar à Secretaria da Receita Federal as mercadorias que estiverem abandonadas por seu decurso e/ou apreendidas pelo fisco. Por tal atividade, a legislação aduaneira prevê o pagamento de despesas das referidas armazenagens.

Conforme se verifica do artigo 31 do Decreto-lei nº 1.455/76, após a devida comunicação, é responsabilidade da Secretaria da Receita Federal realizar o pagamento ao depositário da tarifa de armazenagem.

Assim, o equilíbrio econômico financeiro entre a permissionária e a administração fica resguardado, uma vez que a partir do depósito efetuado e com o vencimento do período de permanência da mercadoria estrangeira em recinto alfandegado, sem o respectivo despacho aduaneiro, surge a obrigação do pagamento da tarifa. O Decreto nº 6.759/2009, em seu artigo 647, explicitou a forma e o modo pelo qual esse pagamento deve se realizar.

As mercadorias tidas por abandonadas e/ou apreendidas, quando objeto da pena de perdimento, são vendidas em hasta pública, ou são destinadas à incorporação a órgãos da Administração Pública ou a entidades filantrópicas, científicas ou educacionais. Como os ingressos decorrentes de tais as alienações configurarão receita da União, na rubrica orçamentária do FUNDAF, o legislador determinou que as despesas de armazenagem fossem suportadas pela Secretaria da Receita Federal, com os recursos provenientes do próprio FUNDAF.

Tal determinação advém do fato de que não é permitido à permissionária tomar as mercadorias abandonadas para si, de modo a se ressarcir de tais despesas.

Portanto, a legislação aduaneira, ao tratar de mercadorias abandonadas pelo importador, previu o pagamento das despesas de armazenagem. Os referidos dispositivos impõem à Secretaria da Receita Federal o dever de efetuá-lo até a data em que ela retirar a mercadoria, com recursos do FUNDAF. Basta, para tanto, que o depositário comunique à Secretaria da Receita Federal, no prazo de 05 (cinco) dias a contar da configuração do abandono (90 dias, após a descarga da mercadoria, sem que tenha sido iniciado o despacho aduaneiro).

E é esse o caso dos autos, pois pretende a autora, ora apelada, o ressarcimento dos valores dos custos operacionais envolvidos na prestação dos serviços de guarda e armazenagem, custos estes que devem ser suportados pela Administração Pública.

Ressalte-se que a armazenagem demanda custos de espaço ocupado, de guarnição e movimentação, além de medidas relativas à sua segurança.

Ainda, não há que se falar em exigência de prévia licitação para a "contratação do serviço de armazenagem", tendo em vista que a prestação do serviço decorre de imposição legal, de modo que é possível aplicar a ressalva prevista na primeira parte do inciso XXI do artigo 37 da Constituição Federal.

Dessa forma, há de se concluir que a apelada, na condição de depositária das mercadorias abandonadas e/ou apreendidas e colocadas à disposição da União Federal, tem o direito de cobrar a tarifa de armazenagem correspondente.

Apelação da União desprovida.”

Alega a embargante que o acórdão incorreu em omissão, uma vez que:

a) o aresto deveria ter reconhecido a ilegitimidade da União para figurar no polo passivo da demanda, se4ndo que a responsabilidade seria do importador;

b) as mercadorias abandonas deveriam estar relacionadas “mencionando todos os elementos necessários à identificação dos volumes e do veículo transportador”;

c) a recorrida não cumpriu o prazo legal de comunicação do abandono de mercadorias, pois não demonstrou quando ocorrera o recebimento da documentação supostamente encaminhada à Receita.

 

Não houve apresentação de resposta aos embargos interpostos.

É o relatório.

 

 


APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0033504-30.2008.4.03.6100

RELATOR: Gab. 09 - DES. FED. NELTON DOS SANTOS

APELANTE: UNIÃO FEDERAL

 

APELADO: LOCALFRIO S.A. ARMAZENS GERAIS FRIGORIFICOS.

Advogado do(a) APELADO: GILBERTO VIEIRA DE ANDRADE - SP58126-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

 

 

O Senhor Desembargador Federal Nelton dos Santos (Relator):

É cediço que os embargos de declaração têm cabimento apenas quando a decisão atacada contiver vícios de omissão, obscuridade ou contradição, vale dizer, não podem ser opostos para sanar o inconformismo da parte.

Ao argumento da ocorrência de omissão, pretende a embargante a reforma do acórdão que concluiu pelo direito da apelada, na condição de depositária das mercadorias abandonadas e/ou apreendidas e colocadas à disposição da União Federal, de cobrar a tarifa de armazenagem correspondente.

Ocorre que, no presente caso, não há qualquer vício a ser sanado, vez que o acórdão se encontra suficientemente claro, nos limites da controvérsia, e devidamente fundamentado de acordo com o entendimento esposado por esta E. Turma.

O julgado consignou expressamente, com fundamento na legislação e na jurisprudência das Cortes Superiores, que: “[...]No que se refere à preliminar de ilegitimidade passiva da União e de legitimidade passiva do importador, no presente caso, a parte autora, ora apelada, postula a declaração de crédito referente à taxa de armazenagem de mercadorias abandonadas que já estavam à disposição da Receita Federal do Brasil, razão pela qual somente a União Federal deve permanecer como parte da relação processual. Isso porque do momento do recebimento da mercadoria no recinto alfandegado até a declaração de seu abandono a responsabilidade é, de fato, do importador. No entanto, o que se discute no presente caso é o período posterior à declaração do perdimento até a sua destinação – momento em que a mercadoria passou aos cuidados da Receita Federal do Brasil, razão pela qual a despesa com armazenamento deverá ser arcada eventualmente pela União Federal. [...] In casu, a apelante cobra valores devidos por força de armazenamento de mercadoria abandonada (FMA n.º 00228/98, em data de 10/03/1998 GMCI n.° 218964-8/1997, em data de 18/11/1997 FMA n.° 00013/00, em data de 10/02/2000 GMCI n.° 167164-6/1999, em data de 06/11/1999 FMA n.° 00414/98, em data de 13/08/1998 GMCI n.° 075365-7/1998, em data de 13/05/1 998 FMA n.° 00146/98, em data de 16/02/1998 GMCI n.° 205501-4/1997, em data de 01/11/1997.). Comprovou a apelada que notificou tempestivamente a Secretaria da Receita Federal acerca do abandono com o protocolo das FMAs (f. 28-31). Destarte, a União deve arcar com a tarifa até a data da retirada do recinto alfandegado, nos termos do art. 31, caput e §1º, do Decreto-Lei nº 1.455/76, não havendo que se falar em mácula aos princípios da supremacia do interesse público, da indisponibilidade do interesse público, da legalidade, da isonomia e da vinculação ao instrumento convocatório, pois trata-se de obrigação imposta em lei e nada mais justo que a União, titular dos bens abandonados, arque com os custos de armazenagem deles, sob pena de enriquecimento sem causa. [...] No caso dos autos, reforce-se que a documentação juntada aos autos comprova que a apelada realizou todo o procedimento requerido na legislação de regência, emissão das Fichas de Mercadoria Abandonada e a emissão das notas fiscais com a notificação da Secretaria da Receita Federal, informando tempestivamente ao órgão local da Secretaria da Receita Federal que as mercadorias se encontravam em situação de abandono, bem assim como o pedido de pagamento perante à autoridade pública responsável. .”

 

Como se vê, o decisum embargado manifestou-se claramente sobre a contenda posta nos autos, analisando todas as questões veiculadas em sede recursal, encontrando-se livre de omissões e contradições.

É pacífico o entendimento segundo o qual os embargos de declaração têm cabimento para eliminar "contradição interna" - ou seja, aquela existente entre as proposições e conclusões do próprio julgado - e não eventual antagonismo entre o que se decidiu e o almejado pela parte.

No caso, não se vislumbra a existência de pontos conflitantes no aresto. Ao que parece, o presente recurso visa engendrar rediscussão sobre o mérito da causa, o que não é permitido em sede de embargos declaratórios.

Os argumentos expendidos demonstram, na verdade, o inconformismo da parte embargante em relação aos fundamentos do decisum, os quais não podem ser atacados por meio de embargos de declaração, por apresentarem nítido caráter infringente.

Nesse sentido, ensinam Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery, in verbis:

"Os EDcl têm finalidade de completar a decisão omissa ou, ainda, de aclará-la, dissipando obscuridades ou contradições. Não têm caráter substitutivo da decisão embargada, mas sim integrativo ou aclaratório. Prestam-se, também à correção de erro material. Como regra, não têm caráter substitutivo, modificador ou infringente do julgado [...].

Os EDcl podem ter, excepcionalmente, caráter infringente quando utilizados para: a) correção de erro material manifesto; b) suprimento de omissão; c) extirpação de contradição. A infringência do julgado pode ser apenas a consequência do provimento dos EDcl, mas não seu pedido principal, pois isso caracterizaria pedido de reconsideração, finalidade estranha aos EDcl. Em outras palavras, o embargante não pode deduzir, como pretensão recursal dos EDcl, pedido de infringência do julgado, isto é, da reforma da decisão embargada. A infringência poderá ocorrer quando for consequência necessária ao provimento dos embargos [...]". (Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery, Comentários ao Código de Processo Civil - Novo CPC - Lei 13.105/2015, RT, 2015).

Na mesma senda, vale trazer à colação recente julgado do colendo Superior Tribunal de Justiça:

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. INEXISTÊNCIA DOS REQUISITOS DO ART. 1.022 E INCISOS DO CPC DE 2015. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO REJEITADOS. 1. Depreende-se do artigo 1.022, e seus incisos, do novo Código de Processo Civil que os embargos de declaração são cabíveis quando constar, na decisão recorrida, obscuridade, contradição, omissão em ponto sobre o qual deveria ter se pronunciado o julgador, ou até mesmo as condutas descritas no artigo 489, parágrafo 1º, que configurariam a carência de fundamentação válida. Não se prestam os aclaratórios ao simples reexame de questões já analisadas, com o intuito de meramente dar efeito modificativo ao recurso. 2. No caso dos autos não ocorre nenhuma das hipóteses previstas no artigo 1.022 do novo CPC, pois o acórdão embargado apreciou as teses relevantes para o deslinde do caso e fundamentou sua conclusão. (...) (EDcl no AgRg no AREsp 823.796/PR, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 21/06/2016, DJe 24/06/2016)

 

No tocante ao prequestionamento, diga-se que é desnecessária a referência expressa aos princípios e aos dispositivos legais e constitucionais tidos por violados, pois o exame da controvérsia, à luz dos temas invocados, é mais que suficiente para viabilizar o acesso às instâncias superiores, como expresso no artigo 1.025 do Código de Processo Civil.

Ainda que os embargos tenham como propósito o prequestionamento da matéria, faz-se imprescindível, para eventual acolhimento do recurso, que se alegue e constate efetivamente a existência de quaisquer dos vícios acima mencionados. Nesse sentido:

"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PEDIDO DE GRATUIDADE DA JUSTIÇA. NECESSIDADE DE PETIÇÃO AVULSA. AUSÊNCIA DE OMISSÃO OBSCURIDADE, CONTRADIÇÃO OU ERRO MATERIAL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO REJEITADOS.

[...]

2. "Esta c. Corte já tem entendimento pacífico de que os embargos declaratórios, mesmo para fins de prequestionamento, só serão admissíveis se a decisão embargada ostentar algum dos vícios que ensejariam o seu manejo (omissão, obscuridade ou contradição)." EDcl no AgRg nos EDcl nos EREsp 1003429/DF, Relator Ministro Felix Fischer, Corte Especial, julgado em 20.6.2012, DJe de 17.8.2012.

3. Não havendo omissão, obscuridade, contradição ou erro material, merecem ser rejeitados os embargos declaratórios interpostos com o propósito infringente.

4. Embargos de declaração rejeitados."

(EDcl nos EDcl no AgRg no AREsp 445431/SP, Relator Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, STJ - Segunda Turma, DJE DATA:26/08/2014) (grifei)

Portanto, a insurgência contra questões que em nada apontam para a necessidade de integração do julgado conduz à rejeição dos aclaratórios.

Ante o exposto, REJEITO os embargos de declaração.

É como voto.



E M E N T A

 

PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA DE OMISSÃO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO REJEITADOS.

1. É cediço que os embargos de declaração têm cabimento apenas quando a decisão atacada contiver vícios de omissão, obscuridade ou contradição, vale dizer, não podem ser opostos para sanar o inconformismo da parte.

2. O aresto embargado abordou a questão de forma suficientemente clara, nos limites da controvérsia, não restando vício a ser sanado.

3. Recurso que visa engendrar rediscussão sobre o mérito da causa, o que não é permitido em sede de embargos declaratórios.

4. Ainda que o propósito seja o de prequestionar matérias, faz-se imprescindível, para o acolhimento do recurso, a constatação de efetiva ocorrência de omissão, contradição, obscuridade ou erro material, inocorrentes na espécie.

5.Embargos de declaração rejeitados.

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Terceira Turma, por unanimidade, rejeitou os embargos de declaração, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.