Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 6209913-07.2019.4.03.9999

RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA

APELANTE: SANDRA LONGHI CORDEIRO, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

Advogado do(a) APELANTE: EMERSON BARJUD ROMERO - SP194384-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, SANDRA LONGHI CORDEIRO

Advogado do(a) APELADO: EMERSON BARJUD ROMERO - SP194384-N

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 6209913-07.2019.4.03.9999

RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA

APELANTE: SANDRA LONGHI CORDEIRO, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

Advogado do(a) APELANTE: EMERSON BARJUD ROMERO - SP194384-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, SANDRA LONGHI CORDEIRO

Advogado do(a) APELADO: EMERSON BARJUD ROMERO - SP194384-N

OUTROS PARTICIPANTES:

  

 

R E L A T Ó R I O

 

A SENHORA DESEMBARGADORA FEDERAL THEREZINHA CAZERTA (RELATORA): Trata-se de apelações interpostas pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS e por SANDRA LONGHI CORDEIRO em face da r. sentença proferida em ação previdenciária que objetiva o reconhecimento da especialidade dos períodos laborais de 14/10/1996 a 01/03/1997, de 03/03/1997 a 17/10/2002 e de 26/07/2016 a 27/12/2016, durante os quais a parte autora exerceu suas atividades profissionais como enfermeira, para fins de concessão do benefício de aposentadoria especial.

A r. sentença, integrada por embargos de declaração, julgou parcialmente procedente o pedido e resolveu o mérito com fundamento no art. 487, I, do Código de Processo Civil tão somente para reconhecer a especialidade da atividade laboral nos períodos de 14/10/1996 a 01/03/1997 e de 03/03/1997 a 17/10/2002. Deixou de determinar a implantação da aposentadoria especial por entender que a autora não atingiu tempo de serviço em condições especiais suficiente para a concessão do benefício, na forma do art. 52 da Lei nº 8.23/91. Revogou o benefício da justiça gratuita anteriormente concedido em favor da autora e acolheu a impugnação ao valor da causa apresentada pela autarquia, para fixa-lo em R$ 11.244,00. Ante a sucumbência recíproca, condenou as partes ao pagamento das despesas processuais em partes iguais, observadas aquelas eventualmente não abrangidas pela isenção de que goza o réu, bem como em honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor da condenação, até a data sentença, observada a Súmula STJ nº 111. Não havendo créditos a executar, os honorários advocatícios da parte autora foram fixados em R$ 1.000,00, nos termos do art. 85, § 8º, do CPC. Sentença não submetida a reexame necessário (IDs 108483345 e 108483357).

Apela a autarquia previdenciária sustentando, em síntese, que os formulários de PPP apresentados pela autora foram emitidos em desacordo com a legislação previdenciária, na medida em que ora não indicam o responsável legal da empresa emitente, ora não apontam o responsável técnico encarregado da aferição dos registros ambientais, sendo considerados extemporâneos. Requer seja dado provimento ao recurso para que seja reformada a sentença (ID 108483362).

Em suas razões recursais a autora alega que o PPP anexado aos autos, que serviu para o reconhecimento da especialidade dos períodos acolhidos na sentença, comprova o labor em condições especiais também em relação ao interstício de 26/07/2016 a 27/12/2016, em razão da exposição a agentes nocivos biológicos. Em relação aos honorários advocatícios, aduz que a Súmula STJ nº 111 deve ser afastada, posto que não se coaduna com o art. 85 do atual Código de Processo Civil, que adota o proveito econômico auferido pela parte como base de cálculo da verba honorária. Requer seja dado provimento ao recurso para que, reformando-se a sentença, seja julgado procedente o pedido, com a condenação do réu em honorários advocatícios sem a incidência da Súmula STJ nº 111 e fixação de honorários recursais na forma do art. 85, § 11, do CPC (ID 108483364).

A Autora apresentou contrarrazões alegando, em preliminar, violação ao art. 1.014 do CPC, por inovação da tese de defesa em sede recursal. No mérito, aduz que o Laudo Técnico das Condições do Ambiente de Trabalho que embasa o PPP foi emitido extemporaneamente à época do labor, razão pela qual não há indicação dos responsáveis técnicos pelos registros ambientais do período. Argumenta que a emissão extemporânea de laudos ambientais não compromete o reconhecimento do trabalho em condições especiais e que a exposição a agentes agressivos biológicos é inerente à sua atividade profissional. Requer o desprovimento do apelo, com a majoração dos honorários advocatícios na forma do art. 85, § 11, do CPC (ID 10843370).

Regularmente intimado, o INSS deixou de apresentar contrarrazões (ID 108483374).

Subiram os autos a esta E. Corte.

É o relatório.

 

 


APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 6209913-07.2019.4.03.9999

RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA

APELANTE: SANDRA LONGHI CORDEIRO, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

Advogado do(a) APELANTE: EMERSON BARJUD ROMERO - SP194384-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, SANDRA LONGHI CORDEIRO

Advogado do(a) APELADO: EMERSON BARJUD ROMERO - SP194384-N

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

V O T O

 

"EMENTA"

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. ENFERMEIRA. AGENTES AGRESSIVOS BIOLÓGICOS. PREENCHIDOS OS REQUISITOS PARA A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. TERMO INICIAL. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA PROVIDA. APELAÇÃO DO INSS DESPROVIDA.

- A questão vertida nos autos cinge-se na possibilidade de se reconhecer o trabalho especificado na inicial em condições especiais, para fins de concessão de aposentadoria especial.

- É possível o reconhecimento da atividade especial no interstício de 14/10/1996 a 01/03/1997, de 03/03/1997 a 17/10/2002 e de 26/07/2016 a 27/12/2016, durante os quais a autora exerceu as funções de enfermeira, com exposição a agentes agressivos biológicos, conforme formulários de PPP acostados aos autos.

- Há previsão expressa no item 2.1.3, do quadro anexo, do Decreto nº 53.831/64 e do Decreto nº 83.080/79, Anexo II e item 3.0.1, do Decreto nº 2.172/97, a categoria profissional dos médicos, dentistas e enfermeiros, de modo que é inegável a natureza especial da ocupação da parte autora. Ademais, a atividade desenvolvida pela autora enquadra-se no item 1.3.4 do Anexo I, do Decreto nº 83.080/79 que contemplava os trabalhos em que haja contato permanente com doentes ou materiais infecto-contagiantes, privilegiando os trabalhos permanentes nesse ambiente.

- No tocante aos agentes biológicos, a jurisprudência firmou entendimento no sentido de considerar a especialidade do trabalho em razão da potencialidade do risco de contato com esses agentes e não do contato propriamente dito.

- O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição, substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo laborado em condições especiais.

- Consoante jurisprudência desta E. Oitava Turma, o laudo (ou PPP) não contemporâneo ao exercício das atividades não impede a comprovação de sua natureza especial, desde que não tenha havido alteração expressiva no ambiente de trabalho; ademais, se em data posterior ao trabalho realizado foi constatada a presença de agentes nocivos, é de bom senso imaginar que a sujeição dos trabalhadores à insalubridade não era menor à época do labor, haja vista os avanços tecnológicos e a evolução da segurança do trabalho que certamente sobrevieram com o passar do tempo.

- O uso de equipamento de proteção individual - EPI não descaracteriza a natureza especial da atividade, uma vez que tal tipo de equipamento não elimina os agentes nocivos à saúde que atingem o segurado em seu ambiente de trabalho, mas somente reduz seus efeitos.

- Assentados esses aspectos e feitos os cálculos, tem-se que, considerando-se os períodos de atividade especial ora reconhecidos, somados àqueles outros reconhecidos no âmbito administrativo, a parte autora cumpriu a contingência, ou seja, o tempo de serviço por período superior a 25 (vinte e cinco) anos, de modo a satisfazer o requisito temporal previsto no art. 57, da Lei nº 8.213/91.

- O termo inicial da aposentadoria especial deve ser fixado na data do requerimento administrativo (27/12/2016 – ID 108483230), momento em que a autarquia tomou ciência da pretensão da parte autora.

- Não há que se falar em prescrição, posto que entre a data do pedido administrativo e o ajuizamento da ação   (18/09/2018) não transcorreu o prazo de 5 (cinco) anos previsto no art. 103, parágrafo único, da Lei nº 8.213/91.

- No tocante aos juros e correção monetária sobre as parcelas em atraso, deve ser observado o julgamento proferido pelo E. Supremo Tribunal Federal no RE nº 870.947, bem como o Manual de Orientação de Procedimentos para Cálculos na Justiça Federal em vigor por ocasião da execução do julgado.

- Apelação da autora provida.

- Apelação do INSS desprovida.

 

A SENHORA DESEMBARGADORA FEDERAL THEREZINHA CAZERTA (RELATORA): A questão vertida nos autos cinge-se na possibilidade de se reconhecer o trabalho especificado na inicial em condições especiais, para fins de concessão de aposentadoria especial.

O tema da atividade especial e sua conversão, palco de debates infindáveis, está disciplinado pelos arts. 57, 58 e seus §§, da Lei nº 8.213/91, para os períodos laborados posteriormente à sua vigência e, para os pretéritos, pelo art. 35 § 2º da antiga CLPS.

Observe-se que a possibilidade dessa conversão não sofreu alteração alguma, desde que foi acrescido o § 4º ao art. 9º, da Lei nº 5.890 de 08/06/1973, até a edição da MP nº 1.663-10/98 que revogava o § 5º do art. 57 da Lei nº 8.213/91, e deu azo à edição das OS 600/98 e 612/98. A partir de então, apenas teriam direito à conversão os trabalhadores que tivessem adquirido direito à aposentadoria até 28/05/1998. Depois de acirradas discussões, a questão pacificou-se através da alteração do art. 70 do Decreto nº 3.048 de 06/05/99, cujo § 2º hoje tem a seguinte redação: " As regras de conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de atividade comum constantes deste artigo aplicam-se ao trabalho prestado em qualquer período". (Incluído pelo Decreto nº 4.827 de 03/09/2003).

Não obstante o Decreto nº 6.945, de 21 de agosto de 2009, tenha revogado o Decreto nº 4.827/03, que alterou a redação do artigo 70, não foi editada norma alguma que discipline a questão de modo diverso do entendimento aqui adotado.

Por outro lado, o benefício é regido pela lei em vigor no momento em que reunidos os requisitos para sua fruição e mesmo em se tratando de direitos de aquisição complexa, a lei mais gravosa não pode retroagir exigindo outros elementos comprobatórios do exercício da atividade insalubre, antes não exigidos, sob pena de agressão à segurança jurídica.

Fica afastado, ainda, o argumento segundo o qual somente em 1980 surgiu a possibilidade de conversão do tempo especial em comum, pois o que interessa é a natureza da atividade exercida em determinado período, sendo que as regras de conversão serão aquelas em vigor à data em que se efetive o respectivo cômputo.

Acerca do tempo da atividade especial, pacífica a jurisprudência no sentido de que a legislação aplicável para a respectiva caracterização é a vigente no período em que desempenhada, razão pela qual, neste caso, incidente o regramento dos Decretos 53.831/64 e 83.080/79, até 05/03/1997 e, após, o Decreto 2.172/97.

Por sinal, os Decretos 53.831/64 e 83.080/79 vigeram de forma simultânea, não havendo revogação do primeiro pelo segundo, de forma que, na eventual divergência entre as duas normas, deverá prevalecer a disciplina mais favorável ao segurado. Nesse sentido: STJ, REsp 412.351/RS; Rel. Min. Laurita Vaz; DJ: 17/11/2003; TRF 3ª Região, 10ª Turma, ApCiv 5001534-85.2018.4.03.6128, Rel. Desembargador Federal Nelson Porfirio, p. em 11/10/2019.

Assim, desimportante que, eventualmente, o segurado não tenha completado o tempo mínimo de serviço para se aposentar à época em que foi editada a Lei 9.032/95.

Ademais o art. 58 da Lei nº 8.213/91 dispunha, em sua redação original:

“Art. 58. A relação de atividades profissionais prejudiciais à saúde ou à integridade física será objeto de lei específica”.

Até o advento da Lei nº 9.032, de 28 de abril de 1995, presume-se a especialidade do labor pelo simples exercício de profissão que se enquadre no disposto nos anexos dos regulamentos acima referidos, exceto para os agentes nocivos ruído, poeira e calor, para os quais sempre se exigiu a apresentação de laudo técnico.

Já entre os lapsos de 28/05/1995 e 11/10/1996, se consolidou o entendimento de ser suficiente, para a caracterização da atividade especial, a apresentação dos informativos SB-40 e DSS-8030, com a ressalva dos agentes nocivos ruído, calor e poeira.

Editada a Medida Provisória nº 1.523, em 11/10/1996, o dispositivo legal supracitado mudou de redação, com a inclusão dos parágrafos 1º, 2º, 3º e 4º, na seguinte conformidade (“verbis”):

“Art. 58. A relação dos agentes nocivos químicos, físicos e biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física considerados para fins de concessão da aposentadoria especial de que trata o artigo anterior será definida pelo Poder Executivo.

§ 1º a comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos será feita mediante formulário, na forma estabelecida pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, emitido pela empresa ou seu preposto, com base em laudo técnico de condições ambientais do trabalho expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho.

[...]”

Conclui-se, portanto, que tanto na redação original do art. 58 da Lei nº 8.213/91 como na trazida pela Medida Provisória nº 1.523/96, objeto de sucessivas reedições até ser convertida na Lei nº 9.528/97, não foram relacionados os agentes prejudiciais à saúde, sendo que tal relação somente foi definida com a edição do Decreto nº 2.172, de 05/03/1997 (art. 66 e Anexo IV).

Ocorre que, em face de matéria reservada à lei, tal Decreto somente passou a ter eficácia a partir da edição da Lei nº 9.528, de 10/12/1997, razão pela qual somente para atividades exercidas a partir de então se tornou exigível a apresentação de laudo técnico. Neste diapasão: STJ, Resp 436661/SC; p.em 02/08/2004; TRF 3ª Região, 8ª Turma, Ap.Civ 5000938-89.2017.4.03.6111, Rel. Desembargador Federal David Dantas, p. em 08/11/2019.

Destarte, a atividade desenvolvida até 10/12/1997 pode ser considerada especial, mesmo sem a apresentação de laudo técnico, pois em razão da legislação de regência até então, era suficiente para a respectiva caracterização o enquadramento pela categoria profissional (até 28/04/1995 - Lei nº 9.032/95) e/ou a apresentação dos informativos SB-40 e DSS-8030.

Na espécie, a autora ajuizou a presente ação postulando o reconhecimento da especialidade dos períodos de 14/10/1996 a 01/03/1997, 03/03/1997 a 17/10/2002 e 26/07/2016 a 27/12/2016.

Com efeito, é possível o reconhecimento da atividade especial nos interstícios de:

- 14/10/1996 a 01/03/1997 – empregador: Prefeitura Municipal de Mogi Mirim – função: enfermeira – atribuições: prestar assistência aos pacientes da UBS e em domicílio; realizar consultas; prescrever ações e procedimentos de maior complexidade; manter contato diário com pacientes; dentre outras – agentes agressivos (vírus), conforme PPP ID 108483260 – págs. 19/20 – período em que a especialidade era decorrente do mero enquadramento legal da atividade laborativa;

- 03/03/1997 a 17/10/2002 e 26/07/2016 a 27/12/2016 – empregador: Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de Mogi Guaçu – função: enfermeira – atribuições: prestar atendimento de enfermagem em ambiente aberto e fechado nas alas hospitalares; executar processos de tratamentos nos pacientes – agentes agressivos biológicos (bactérias por contato com microrganismos patogênicos) de modo habitual e permanente, conforme PPP ID 108483260 – págs. 22/23.

Há previsão expressa no item 2.1.3, do quadro anexo, do Decreto nº 53.831/64 e do Decreto nº 83.080/79, Anexo II e item 3.0.1, do Decreto nº 2.172/97, a categoria profissional dos médicos, dentistas e enfermeiros, de modo que é inegável a natureza especial da ocupação da parte autora. Ademais, a atividade desenvolvida pela autora enquadra-se no item 1.3.4 do Anexo I, do Decreto nº 83.080/79 que contemplava os trabalhos em que haja contato permanente com doentes ou materiais infecto-contagiantes, privilegiando os trabalhos permanentes nesse ambiente.

No tocante aos agentes biológicos, a jurisprudência firmou entendimento no sentido de considerar a especialidade do trabalho em razão da potencialidade do risco de contato com esses agentes e não do contato propriamente dito. Nesse sentido, trago à colação os seguintes precedentes:

“PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE ESPECIAL. RUÍDO. AGENTES QUÍMICOS. APOSENTADORIA ESPECIAL. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS.

I- No que se refere ao reconhecimento da atividade especial, a jurisprudência é pacífica no sentido de que deve ser aplicada a lei vigente à época em que exercido o trabalho, à luz do princípio tempus regit actum.

II- Em se tratando do agente nocivo ruído, a atividade deve ser considerada especial se exposta a ruídos acima de 80 dB, nos termos do Decreto nº 53.831/64. No entanto, após 5/3/97, o limite foi elevado para 90 dB, conforme Decreto nº 2.172. A partir de 19/11/03 o referido limite foi reduzido para 85 dB, nos termos do Decreto nº 4.882/03.

III- Em se tratando de agentes químicos, impende salientar que a constatação dos mesmos deve ser realizada mediante avalição qualitativa e não quantitativa, bastando a exposição do segurado aos referidos agentes para configurar a especialidade do labor.

IV- A documentação apresentada permite o reconhecimento da atividade especial dos períodos pleiteados.

V- Com relação à aposentadoria especial, houve o cumprimento dos requisitos previstos no art. 57 da Lei nº 8.213/91.

VI- Com relação aos índices de atualização monetária e taxa de juros, deve ser observado o julgamento proferido pelo C. Supremo Tribunal Federal na Repercussão Geral no Recurso Extraordinário nº 870.947.

VII- Apelação do INSS parcialmente provida.”

(TRF 3ª Região, 8ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5000677-47.2019.4.03.6114, Rel. Desembargador Federal NEWTON DE LUCCA, julgado em 27/11/2019, Intimação via sistema DATA: 29/11/2019)

“PREVIDENCIÁRIO. REMESSA OFICIAL. SÚMULA 490 DO C. STJ. CABIMENTO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL. AGENTES BIOLÓGICOS.POSSIBILIDADE. REQUISITOS PREENCHIDOS. VÍNCULOS ANOTADOS EM CTPS. PRESUNÇÃO. BENEFÍCIO CONCEDIDO.

- Inexistindo, in casu, valor certo a ser considerado, é cabível a remessa oficial, em consonância com a Súmula nº 490 do Colendo Superior Tribunal de Justiça.

 - O conjunto probatório dos autos revela o exercício de labor com exposição ao agente nocivo no intervalo indicado, devendo ser reconhecida a especialidade.

 - No tocante aos agentes biológicos, a jurisprudência tem se direcionado no sentido de ser dada maior flexibilidade ao conceito de permanência, de sorte a considerar a especialidade do trabalho em razão da potencialidade do risco de contato com esses agentes e não do contato propriamente dito.  Precedentes.  

- Consoante remansosa jurisprudência, os registros efetuados em carteira profissional constituem prova plena do trabalho realizado, dado que gozam de presunção iuris tantum de veracidade, que somente pode ser afastada por irregularidade devidamente comprovada nos autos.

- Preenchidos os requisitos legais, é devida a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição integral a partir da data do requerimento administrativo.

- Juros e correção monetária em conformidade com os critérios legais compendiados no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, observadas as teses fixadas no julgamento final do RE 870.947, de relatoria do Ministro Luiz Fux.

- Quanto às custas processuais, delas está isenta a Autarquia Previdenciária, nos termos das Leis Federais n. 6.032/74, 8.620/93 e 9.289/96, bem como nas Leis Estaduais n. 4.952/85 e 11.608/03 (Estado de São Paulo).

- Conhecida e improvida à remessa oficial. Parcial provimento à apelação da parte autora.”

(TRF 3ª Região, 9ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 0004527-60.2011.4.03.6120, Rel. Juiz Federal Convocado VANESSA VIEIRA DE MELLO, julgado em 05/11/2019, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 11/11/2019)

Assim, o requerente faz jus ao cômputo do labor exercido em condições agressivas, nos interstícios mencionados.

De outra parte, o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição, substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo laborado em condições especiais.

Ressalta-se, ainda, consoante jurisprudência desta E. Oitava Turma, que o laudo (ou PPP) não contemporâneo ao exercício das atividades não impede a comprovação de sua natureza especial, desde que não tenha havido alteração expressiva no ambiente de trabalho; ademais, se em data posterior ao trabalho realizado foi constatada a presença de agentes nocivos, é de bom senso imaginar que a sujeição dos trabalhadores à insalubridade não era menor à época do labor, haja vista os avanços tecnológicos e a evolução da segurança do trabalho que certamente sobrevieram com o passar do tempo (ApCiv 5794378-06.2019.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal Newton de Lucca, p. em 29/11/2019; ApCiv 0008421-44.2014.4.03.6183, Rel. Desembargador Federal Luiz Stefanini, p. em 10/10/2019, ApCiv 5006325-63.2017.4.03.6183, Rel. Desembargador Federal David Dantas, p. em 30/09/2019).

É verdade que os documentos apresentados pela parte autora noticiam a utilização de Equipamento de Proteção Individual – EPI.

O uso de equipamento de proteção individual - EPI não descaracteriza a natureza especial da atividade, uma vez que tal tipo de equipamento não elimina os agentes nocivos à saúde que atingem o segurado em seu ambiente de trabalho, mas somente reduz seus efeitos.

O fornecimento de EPI poderia levar o intérprete à conclusão de que referido equipamento seria apto a anular os efeitos nocivos dos agentes insalubres/nocivos e retirar do segurado o direito ao reconhecimento do labor em condições especiais. 

Essa interpretação, no meu sentir, não pode prevalecer dado que a elaboração do PPP e a declaração de eficácia do EPI é feita unilateralmente pelo empregador e com objetivo de obtenção de benesses tributárias, como bem observou o E. Ministro Teori Zavascki, no julgamento da Repercussão Geral em RE nº 664.335/SC, do qual destaco o seguinte trecho: 

“Temos que fazer – e isso é fundamental, no meu entender, nessa matéria -, duas distinções importantes. A primeira distinção é sobre as diferentes relações jurídicas que estão nesse contexto, que não podem ser examinadas como se fossem uma só. Há a relação jurídica que se estabelece entre o empregador e o INSS, que é a relação jurídica tributária. Para fazer jus a uma alíquota tributária menor, o empregador faz declaração de que fornece equipamento eficaz. Essa é uma relação de natureza tributária. E essa declaração do empregador sobre o perfil profissiográfico previdenciário, PPP, é uma declaração que está inserida no âmbito da relação tributária entre o INSS e o empregador contribuinte. Portanto, o empregado não tem nenhuma participação nisso, e nem pode ter. Assim, obviamente, a declaração (PPP) não o afeta. 

A conclusão do Ministro Barroso, no final, de que essa declaração não vincula ao empregado está corretíssima, porque se trata de uma declaração no âmbito de uma relação jurídica de natureza tributária de que ele não participa. 

(...) 

No meu entender, o que estamos discutindo é apenas a questão de direito relativa à relação jurídica previdenciária, não à relação jurídica tributária. Não tem pertinência alguma com a declaração do empregador, para efeito de contribuição previdenciária, mas apenas a relação do empregado segurado em relação ao INSS.” 

Desse modo, tal declaração – de eficácia na utilização do EPI – é elaborada no âmbito da relação tributária existente entre o empregador e o INSS e não influi na relação jurídica de direito previdenciário existente entre o segurado e o INSS. 

Poder-se-ia argumentar que, à míngua de prova em sentido contrário, deveria prevalecer o PPP elaborado pelo empregador, em desfavor da pretensão do empregado. E que caberia a ele, empregado, comprovar: a) que o equipamento utilizado era utilizado; b) e que, utilizado, anularia os agentes insalubres/nocivos. 

No entanto, aplicando-se as regras do ônus da prova estabelecidas no CPC, tem-se que: 

“Art. 373. O ônus da prova incumbe: 

I - ao autor, quanto ao fato constitutivo de seu direito; 

II - ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor.” 

Do texto legal pode-se inferir que ao segurado compete o ônus da prova de fato constitutivo do seu direito, qual seja, a exposição a agentes nocivos/insalubres de forma habitual e permanente e ao INSS (réu) a utilização de EPI com eficácia para anular os efeitos desses agentes, o que não se verificou na hipótese dos autos, onde o INSS não se desincumbiu dessa prova, limitando-se a invocar o documento (PPP) unilateralmente elaborado pelo empregador para refutar o direito ao reconhecimento da especialidade, o que não se pode admitir sob pena de subversão às regras do ônus probatório tal como estabelecidas na legislação processual civil.

Assentados esses aspectos e feitos os cálculos, tem-se que, considerando-se os períodos de atividade especial ora reconhecidos, somados àqueles outros reconhecidos e no âmbito administrativo, a parte autora cumpriu a contingência, ou seja, o tempo de serviço por período superior a 25 (vinte e cinco) anos, de modo a satisfazer o requisito temporal previsto no art. 57, da Lei nº 8.213/91.

O termo inicial da aposentadoria especial deve ser fixado na data do requerimento administrativo (27/12/2016 – ID 108483230), momento em que a autarquia tomou ciência da pretensão da parte autora.

Não há que se falar em prescrição, posto que entre a data do pedido administrativo e o ajuizamento da ação (18/09/2018) não transcorreu o prazo de 5 (cinco) anos previsto no art. 103, parágrafo único, da Lei nº 8.213/91.

No tocante aos juros e correção monetária sobre as parcelas em atraso, deve ser observado o julgamento proferido pelo E. Supremo Tribunal Federal no RE nº 870.947, bem como o Manual de Orientação de Procedimentos para Cálculos na Justiça Federal em vigor por ocasião da execução do julgado.

Acrescente-se que o Plenário do STF, em sessão realizada no dia 03/10/2019, decidiu, por maioria de votos, rejeitar todos os embargos de declaração opostos no mencionado recurso extraordinário e não modular os efeitos da decisão anteriormente proferida.

Consoante orientação firmada pela C. Oitava Turma desta Corte, nas ações de natureza previdenciária, a verba honorária deve ser fixada em 10% sobre o valor da condenação, até a presente decisão (Súmula nº 111 do STJ), tendo em vista que a r. sentença julgou improcedente o pedido que ensejou o recurso da parte autora.

Por essas razões, dou provimento à apelação da autora e nego provimento ao apelo do INSS, nos termos da fundamentação supra.

Independentemente do trânsito em julgado, determino, com fundamento no art. 497 do Código de Processo Civil de 2015, a expedição de ofício ao INSS, por meio eletrônico, instruído com documentos da segurada SANDRA LONGHI CORDEIRO, para que cumpra a obrigação de fazer consistente na imediata concessão do benefício de aposentadoria especial, com data de início - DIB 27/12/2016 (data do requerimento do benefício na via administrativa – ID 108483230), e renda mensal inicial - RMI a ser apurada na forma do art. 57, § 1º, da Lei nº 8.213/91.

É como voto.



E M E N T A

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. ENFERMEIRA. AGENTES AGRESSIVOS BIOLÓGICOS. PREENCHIDOS OS REQUISITOS PARA A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. TERMO INICIAL. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA PROVIDA. APELAÇÃO DO INSS DESPROVIDA.

- A questão vertida nos autos cinge-se na possibilidade de se reconhecer o trabalho especificado na inicial em condições especiais, para fins de concessão de aposentadoria especial.

- É possível o reconhecimento da atividade especial no interstício de 14/10/1996 a 01/03/1997, de 03/03/1997 a 17/10/2002 e de 26/07/2016 a 27/12/2016, durante os quais a autora exerceu as funções de enfermeira, com exposição a agentes agressivos biológicos, conforme formulários de PPP acostados aos autos.

- Há previsão expressa no item 2.1.3, do quadro anexo, do Decreto nº 53.831/64 e do Decreto nº 83.080/79, Anexo II e item 3.0.1, do Decreto nº 2.172/97, a categoria profissional dos médicos, dentistas e enfermeiros, de modo que é inegável a natureza especial da ocupação da parte autora. Ademais, a atividade desenvolvida pela autora enquadra-se no item 1.3.4 do Anexo I, do Decreto nº 83.080/79 que contemplava os trabalhos em que haja contato permanente com doentes ou materiais infecto-contagiantes, privilegiando os trabalhos permanentes nesse ambiente.

- No tocante aos agentes biológicos, a jurisprudência firmou entendimento no sentido de considerar a especialidade do trabalho em razão da potencialidade do risco de contato com esses agentes e não do contato propriamente dito.

- O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição, substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo laborado em condições especiais.

- Consoante jurisprudência desta E. Oitava Turma, o laudo (ou PPP) não contemporâneo ao exercício das atividades não impede a comprovação de sua natureza especial, desde que não tenha havido alteração expressiva no ambiente de trabalho; ademais, se em data posterior ao trabalho realizado foi constatada a presença de agentes nocivos, é de bom senso imaginar que a sujeição dos trabalhadores à insalubridade não era menor à época do labor, haja vista os avanços tecnológicos e a evolução da segurança do trabalho que certamente sobrevieram com o passar do tempo.

- O uso de equipamento de proteção individual - EPI não descaracteriza a natureza especial da atividade, uma vez que tal tipo de equipamento não elimina os agentes nocivos à saúde que atingem o segurado em seu ambiente de trabalho, mas somente reduz seus efeitos.

- Assentados esses aspectos e feitos os cálculos, tem-se que, considerando-se os períodos de atividade especial ora reconhecidos, somados àqueles outros reconhecidos no âmbito administrativo, a parte autora cumpriu a contingência, ou seja, o tempo de serviço por período superior a 25 (vinte e cinco) anos, de modo a satisfazer o requisito temporal previsto no art. 57, da Lei nº 8.213/91.

- O termo inicial da aposentadoria especial deve ser fixado na data do requerimento administrativo (27/12/2016 – ID 108483230), momento em que a autarquia tomou ciência da pretensão da parte autora.

- Não há que se falar em prescrição, posto que entre a data do pedido administrativo e o ajuizamento da ação (18/09/2018) não transcorreu o prazo de 5 (cinco) anos previsto no art. 103, parágrafo único, da Lei nº 8.213/91.

- No tocante aos juros e correção monetária sobre as parcelas em atraso, deve ser observado o julgamento proferido pelo E. Supremo Tribunal Federal no RE nº 870.947, bem como o Manual de Orientação de Procedimentos para Cálculos na Justiça Federal em vigor por ocasião da execução do julgado.

- Apelação da autora provida.

- Apelação do INSS desprovida.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por unanimidade, decidiu dar provimento à apelação da autora e negar provimento ao apelo do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.