APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0034826-47.2016.4.03.9999
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: TATSUO OKUYAMA
Advogado do(a) APELANTE: MARIO TARDELLI DA SILVA NETO - SP291134-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELADO: ANDRESSA GURGEL DE OLIVEIRA GONZALEZ ALVES - SP270356-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0034826-47.2016.4.03.9999 RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO APELANTE: TATSUO OKUYAMA Advogado do(a) APELANTE: MARIO TARDELLI DA SILVA NETO - SP291134-N APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS Advogado do(a) APELADO: ANDRESSA GURGEL DE OLIVEIRA GONZALEZ ALVES - SP270356-N OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR): Trata-se de apelação interposta por TATSUO OKUYAMA em ação ajuizada em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural. A r. sentença (ID 105224834, p. 187-188) julgou improcedente o pedido inicial e condenou a autora no pagamento dos ônus da sucumbência, suspensa a exigibilidade em razão dos benefícios da assistência judiciária gratuita. Em razões recursais (ID 105224834, p. 192-207), pugna a autora pela reforma da sentença com o acolhimento do pedido, uma vez comprovado o trabalho rural pelo período necessário ao cumprimento da carência. Intimado, deixou o INSS de oferecer contrarrazões. Devidamente processado o recurso, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal. É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0034826-47.2016.4.03.9999 RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO APELANTE: TATSUO OKUYAMA Advogado do(a) APELANTE: MARIO TARDELLI DA SILVA NETO - SP291134-N APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS Advogado do(a) APELADO: ANDRESSA GURGEL DE OLIVEIRA GONZALEZ ALVES - SP270356-N OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR): Até a promulgação da Lei n.º 8.213/91 (LBPS), a regulamentação dos benefícios devidos ao trabalhador rural estava estabelecida nas Leis Complementares n.ºs 11/1971 e 16/1973, relativas ao Programa de Assistência ao Trabalhador Rural (PRORURAL), que assim disciplinavam: "Lei Complementar n.º 11/1971 "Art. 3º São beneficiários do Programa de Assistência instituído nesta Lei Complementar o trabalhador rural e seus dependentes. § 1º Considera-se trabalhador rural, para os efeitos desta Lei Complementar: a) a pessoa física que presta serviços de natureza rural a empregador, mediante remuneração de qualquer espécie. b) o produtor, proprietário ou não, que sem empregado, trabalhe na atividade rural, individualmente ou em regime de economia familiar, assim entendido o trabalho dos membros da família indispensável à própria subsistência e exercido em condições de mutua dependência e colaboração. [...] Art. 4º A aposentadoria por velhice corresponderá a uma prestação mensal equivalente a 50% (cinqüenta por cento) do salário-mínimo de maior valor no País, e será devida ao trabalhador rural que tiver completado 65 (sessenta e cinco) anos de idade. Parágrafo único. Não será devida a aposentadoria a mais de um componente da unidade familiar, cabendo apenas o benefício ao respectivo chefe ou arrimo" Lei Complementar n.º 16/73 "Art. 5º A caracterização da qualidade de trabalhador rural, para efeito da concessão das prestações pecuniárias do PRORURAL, dependerá da comprovação de sua atividade pelo menos nos três últimos anos anteriores à data do pedido do benefício, ainda, que de forma descontínua." Com a promulgação da Constituição de 1988, entendo que a distinção entre o trabalhador e a trabalhadora rural, referente à qualidade de chefe ou arrimo de família, não foi recepcionada pelo ordenamento jurídico, ante os direitos de igualdade entre homem e mulher garantidos tanto no artigo 5º, quanto, especificamente, no artigo 226, § 5º, ambos da Carta, como, também, os direitos sociais previstos em seu artigo 7º, inciso XXIV. Ainda, com a vigência da Constituição de 1988, a aposentadoria por idade passou a ser assegurada aos trabalhadores rurais que completassem 60 anos, se homem, ou 55 anos, se mulher, na forma do artigo 202, I, na sua redação original; bem como, restou assegurada a renda mensal de benefício em valor não inferior a um salário mínimo (artigo 201, § 5º, na redação original). Registra-se, em que pese posicionamento pessoal diverso deste Relator, que as alterações no regime de Previdência do trabalhador ou trabalhadora rural prevista na Carta não tiveram sua aplicação de forma imediata, tendo o Plenário do E. Supremo Tribunal Federal, em sede embargos de divergência julgados em 29/10/1997, fixado o entendimento de que tais normas constitucionais não eram autoaplicáveis e dependiam de regulamentação em lei: "Embargos de divergência. Previdência Social. Aposentadoria por idade. Rurícola. Divergência caracterizada entre o acórdão embargado e os julgados do Plenário nos Mandados de Injunção nºs 183 e 306. Não-auto-aplicabilidade do artigo 202, I, da Constituição Federal. Embargos de divergência conhecidos e providos." (STF, Pleno, EDv/RE 175520, relator Ministro Moreira Alves, DJ 06.02.1998) Dada sua relevância, ressalto trecho do voto condutor do relator Ministro Moreira Alves: "[...] essa aposentadoria foi assegurada, pelo "caput" do artigo 202 NOS TERMOS DA LEI, a todos os trabalhadores rurais, não só abaixando os limites de idade como também modificando, em virtude dessa extensão, o direito a aposentadoria dessa natureza, que, pela legislação anterior - a Lei Complementar n° 11/71 alterada parcialmente pela Lei Complementar n° 16/73 ¬, só era concedida ao chefe ou arrimo da unidade familiar, ou - de acordo com o Decreto 73.617/74, que regulamentou esse programa de assistência - ao trabalhador que não fizesse parte de nenhum unidade familiar. E mais: por causa dessa ampla extensão teriam de ser modificadas as normas - e o foram pelas Leis 8.212 e 8.21É -, relativas às fontes de custeio, passando-se a exigir contribuição do empregado rural e período de carência para o gozo desse direito. Não houve, portanto, apenas uma redução de idade com a continuação da aplicação do sistema especial anterior que era o do Programa de Assistência ao Trabalhador Rural, mas, sim, uma modificação de sistema com a inclusão dos trabalhadores rurais no sistema previdenciário geral." Tendo nascido em 27/01/1927 (ID 105224834, p. 16), o demandante completou 60 anos de idade em 27/01/1987, época em que a idade mínima ainda era de 65 anos, os quais somente foram atingidos em 1992, de modo que somente com a edição da Lei n.º 8.213/91 e em conformidade com as disposições da Constituição de 1988, implementou o requisito etário. Não se trata, aqui, vale dizer, de aplicação retroativa das disposições da Lei n.º 8.213/91, mas, sim, de efetiva aplicação da legislação vigente à época da implementação do requisito etário para fim de avaliação do direito à aposentação por idade rural. O autor deveria, portanto, comprovar nos autos o exercício do labor rural, em período imediatamente anterior a 1991, ao longo de, ao menos, 60 (sessenta) meses, conforme determinação contida no art. 142 da Lei nº 8.213/91. A fim de comprovar a atividade rural exercida, coligiu aos autos cópias de escritura indicando a aquisição de imóvel rural pelo autor em 1952, na qual ele foi qualificado como lavrador (ID 105224834, p. 18-21); de declarações de ITR de 1998 a 2015, acompanhadas dos respectivos recibos de entrega, em nome do autor (ID 105224834, p. 31-118); e de notas fiscais, emitidas entre 1969 e 2015, indicando a comercialização de produtos agrícolas (ID 105224834, p. 119-160). Tais documentos constituem início de prova material de labor rural em regime de economia familiar. Contudo, as testemunhas relataram que o autor costumava contratar diaristas nos períodos de colheita. Levando-se em conta esses depoimentos, bem como o fato de que a maioria das notas refere-se à comercialização de caqui - fruto com período de safra bastante restrito -, pode-se concluir que a maior parte do trabalho se realizava com a colaboração de mão de obra de terceiros. Além disso, o autor sequer residia no sítio, mas em endereço localizado em zona urbana, conforme se verifica das próprias declarações de ITR apresentadas. Logo, diante da apreciação da totalidade do conjunto probatório, resta evidenciada a descaracterização do labor rural em regime de economia familiar. Desse modo, não restou demonstrado o exercício de labor rural no período imediatamente anterior ao implemento do requisito etário, deixando de ser atendida, portanto, a exigência referente à imediatidade. Isso porque o C. STJ estabeleceu, no julgamento do REsp autuado sob nº 1.354.908/SP, sob a sistemática dos recursos representativos de controvérsia repetitiva, a necessidade da demonstração do exercício da atividade campesina em período imediatamente anterior ao implemento do requisito etário, verbis: "PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE RURAL NO PERÍODO IMEDIATAMENTE ANTERIOR AO REQUERIMENTO. REGRA DE TRANSIÇÃO PREVISTA NO ARTIGO 143 DA LEI 8.213/1991. REQUISITOS QUE DEVEM SER PREENCHIDOS DE FORMA CONCOMITANTE. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. 1. Tese delimitada em sede de representativo da controvérsia, sob a exegese do artigo 55, § 3º combinado com o artigo 143 da Lei 8.213/1991, no sentido de que o segurado especial tem que estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural, momento em que poderá requerer seu benefício. Se, ao alcançar a faixa etária exigida no artigo 48, § 1º, da Lei 8.213/1991, o segurado especial deixar de exercer atividade rural, sem ter atendido a regra transitória da carência, não fará jus à aposentadoria por idade rural pelo descumprimento de um dos dois únicos critérios legalmente previstos para a aquisição do direito. Ressalvada a hipótese do direito adquirido em que o segurado especial preencheu ambos os requisitos de forma concomitante, mas não requereu o benefício. 2. Recurso especial do INSS conhecido e provido, invertendo-se o ônus da sucumbência. Observância do art. 543-C do Código de Processo Civil." (REsp nº 1.354.908/SP, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, 1ª Seção, julgado em 09/09/2015, DJe 10/02/2016) - grifos nossos. Dito isso, entendo que o conjunto probatório não se mostrou hábil à comprovação da atividade campesina pelo período de carência exigido em lei, sendo de rigor, portanto, o indeferimento do benefício. Ante o exposto, nego provimento à apelação da parte autora, nos termos da fundamentação. Mantenho a condenação da parte autora no pagamento das despesas processuais e dos honorários advocatícios, observados os benefícios da assistência judiciária gratuita (arts. 11, §2º, e 12, ambos da Lei 1.060/50, reproduzidos pelo §3º do art. 98 do CPC. Encaminhe-se a mídia à Subsecretaria da Turma para descarte após a interposição de recurso excepcional ou a certificação do trânsito em julgado. É como voto.
E M E N T A
CONSTITUCIONAL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. PROVA TESTEMUNHAL FRÁGIL. CONJUNTO PROBATÓRIO INSUFICIENTE PARA DEMONSTRAR O LABOR RURAL ATÉ O IMPLEMENTO DO REQUISITO ETÁRIO. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA DESPROVIDA.
1 - A aposentadoria por idade do trabalhador rural encontra previsão no art. 48, §§1º e 2º, da Lei nº 8.213/91.
2 - Tendo nascido em 27/01/1927, o demandante completou 60 anos de idade em 27/01/1987, época em que a idade mínima ainda era de 65 anos, os quais somente foram atingidos em 1992, de modo que somente com a edição da Lei n.º 8.213/91 e em conformidade com as disposições da Constituição de 1988, implementou o requisito etário.
3 - A fim de comprovar a atividade rural exercida, coligiu aos autos cópias de escritura indicando a aquisição de imóvel rural pelo autor em 1952, na qual ele foi qualificado como lavrador; de declarações de ITR de 1998 a 2015, acompanhadas dos respectivos recibos de entrega, em nome do autor; e de notas fiscais, emitidas entre 1969 e 2015, indicando a comercialização de produtos agrícolas. Tais documentos constituem início de prova material de labor rural em regime de economia familiar.
4 - Contudo, as testemunhas relataram que o autor costumava contratar diaristas nos períodos de colheita
5 - Logo, evidenciada a descaracterização do labor rural em regime de economia familiar.
6 - Conclui-se, desse modo, que o conjunto probatório constante nos autos é insuficiente para comprovar o exercício de labor rural, pelo período de carência exigido em lei, sendo de rigor, portanto, o indeferimento do benefício.
7 - Mantida a condenação da parte autora no pagamento das despesas processuais e dos honorários advocatícios, observados os benefícios da assistência judiciária gratuita (arts. 11, §2º, e 12, ambos da Lei 1.060/50, reproduzidos pelo §3º do art. 98 do CPC).
8 - Apelação desprovida.