Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL (199) Nº 5030295-16.2018.4.03.6100

RELATOR: Gab. 14 - DES. FED. MARCELO SARAIVA

PARTE AUTORA: LEONIA PAULA PEREIRA RODRIGUES MANO

Advogados do(a) PARTE AUTORA: CARLA TOSI DOS SANTOS - SP387752-A, FERNANDO FABIANI CAPANO - SP203901-A, SANDRA REGINA DE MELLO BERNARDO - SP200924-A

PARTE RE: UNIAO FEDERAL, UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL (199) Nº 5030295-16.2018.4.03.6100

RELATOR: Gab. 14 - DES. FED. MARCELO SARAIVA

PARTE AUTORA: LEONIA PAULA PEREIRA RODRIGUES MANO

Advogados do(a) PARTE AUTORA: CARLA TOSI DOS SANTOS - SP387752-A, FERNANDO FABIANI CAPANO - SP203901-A, SANDRA REGINA DE MELLO BERNARDO - SP200924-A

PARTE RÉ: UNIAO FEDERAL, UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

Trata-se de mandado de segurança impetrado por LEONIA PAULA PEREIRA RODRIGUES MANO contra ato do DELEGADO DA POLÍCIA FEDERAL DE CONTROLE DE IMIGRAÇÃO, objetivando a isenção das taxas para emissão da certidão de nascimento e para emissão do RNE.

Alega que é natural de Portugal, residir no Brasil desde o ano de 1976. Informa, todavia, ter perdido alguns de seus documentos (entre os quais, RNE, passaporte e carteira de trabalho) no início de 2017, em razão da inundação de seu imóvel.

Aduz que ao tentar obter a segunda vai do RNE, foram-lhe exigidos o pagamento de taxa no valor de R$ 301,66 (trezentos e um reais e sessenta centavos) e sua certidão de nascimento, cuja emissão também se condiciona ao recolhimento de taxa (no valor de R$ 143,89).

Sustenta que tem direito à isenção, consideradas a sua condição de hipossuficiência econômica e a necessidade de regularização de sua permanência em território nacional.

Foi deferido o pedido liminar.

Notificada, a autoridade impetrada prestou informações. 

Por meio da sentença (ID 90291139), o MM. Juiz a quo, concedeu a segurança para assegurar à parte impetrante o processamento de seu pedido de expedição de documento de identificação de estrangeiro em território nacional, independentemente do pagamento de taxas, inclusive em relação à certidão de nascimento exigida para sua instrução, restando reconhecida a isenção. Sem condenação em verba honorária, a teor do artigo 25 da Lei n. 12.016/09. A r. sentença foi submetida ao reexame necessário.

Não houve apresentação de recursos voluntários.

O MPF em seu parecer (ID 122745319), opinou pelo desprovimento da remessa oficial.

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL (199) Nº 5030295-16.2018.4.03.6100

RELATOR: Gab. 14 - DES. FED. MARCELO SARAIVA

PARTE AUTORA: LEONIA PAULA PEREIRA RODRIGUES MANO

Advogados do(a) PARTE AUTORA: CARLA TOSI DOS SANTOS - SP387752-A, FERNANDO FABIANI CAPANO - SP203901-A, SANDRA REGINA DE MELLO BERNARDO - SP200924-A

PARTE RÉ: UNIAO FEDERAL, UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

 

caput, do art. 5º da Carta Magna, assim dispõe:

"Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes".

De acordo com a citada norma, aos estrangeiros residentes no país são assegurados os mesmos direitos fundamentais que o nacional, ressalvados direitos não fundamentais decorrentes da cidadania.

Denota-se que o benefício da gratuidade na obtenção de determinados documentos pessoais e certidões é dirigido aos reconhecidamente pobres, não fazendo a Constituição Federal distinção acerca da nacionalidade de quem ostenta tal condição, conforme se verifica nos incisos XXXIV, LXXVI e LXXVII do art. 5º da Constituição Federal.

Assim, revejo meu posicionamento para assegurar aos estrangeiros que comprovarem a insuficiência econômica da família a isenção do pagamento de taxas para a renovação do Registro Nacional de Estrangeiro (RNE), taxas estas que não conseguiria arcar e ofenderiam a dignidade humana, já que se trata de documento indispensável para o exercício de direitos fundamentais como a educação, o trabalho, o transporte e a saúde.

Ademais, a Lei nº 13.445/2017 (Lei da Migração) tornou expressa a isenção de taxas para expedição de documento de identificação quando o estrangeiro se encontrar em situação de hipossuficiência econômica, conforme dispõe o art. 113, § 3º, in verbis:

Art. 113. As taxas e emolumentos consulares são fixados em conformidade com a tabela anexa a esta Lei.

§ 3º Não serão cobrados taxas e emolumentos consulares pela concessão de vistos ou para a obtenção de documentos para regularização migratória aos integrantes de grupos vulneráveis e indivíduos em condição de hipossuficiência econômica.

Com efeito, denota-se que a nova lei revogou o antigo Estatuto do estrangeiro (Lei nº 6.815/1980) que estabelecia as taxas para emissão do documento de identificação em seu art. 33, parágrafo único.

No mais, o C. Superior Tribunal de Justiça já se pronunciou sobre o tema e entendeu que "A Cédula de Identidade de estrangeiro é essencial para identificação da pessoa. Sua ausência impede o exercício da cidadania. Não há vida digna se a pessoa não pode identificar-se. Assim, tratando-se de direito fundamental, aplicável a regra que garante a gratuidade ao estrangeiro que resida no país" (REsp. nº 1470712/RS, REsp. nº 1438068/RS, REsp. nº 1388603/RS).

No caso, a impetrante comprovou sua situação de hipossuficiência.

Desse modo, deve ser mantida a r. sentença que afastou as cobranças das taxas dos documentos correspondentes ao pedido de permanência, registro nacional do estrangeiro e a emissão de Cédula de Identidade de Estrangeiro, em virtude do nova Lei da Migração, do princípio da dignidade da pessoa humana, bem como dos direitos fundamentais garantidos constitucionalmente.

Nesse mesmo sentido, colaciono julgado desta E. Corte:

"ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. APELAÇÃO. CÉDULA DE IDENTIDADE DE ESTRANGEIRO. EXPEDIÇÃO. GRATUIDADE. REMESSA OFICIAL E APELAÇÃO IMPROVIDAS.

1. O artigo 5º, LXXVI, da Constituição Federal dispõe que "são gratuitas as ações de habeas-corpus e habeas-data, e, na forma da lei, os atos necessários ao exercício da cidadania".

2. A Cédula de Identidade de estrangeiro sendo um documento de essencial importância para o exercício da cidadania, conclui-se que o inciso supracitado autoriza a sua expedição de forma gratuita na hipótese de a pessoa não ter condições de pagar, em respeito ao princípio da dignidade da pessoa humana.

3. A Cédula de Identidade de estrangeiro constitui documento que identifica o estrangeiro perante a sociedade e possibilita o exercício de praticamente todos os atos da vida civil, não sendo razoável condicionar a sua emissão ao recolhimento de taxa naquelas hipóteses em que ficar demonstrada a hipossuficiência econômica do requerente. Precedentes.

4. No presente caso, comprovada a hipossuficiência do impetrante, inclusive estando representada nestes autos pela Defensoria Pública da União, fica afastada a cobrança da taxa e/ou multa para a renovação da cédula de identidade de estrangeiro, em virtude do princípio da dignidade da pessoa humana e dos direitos fundamentais garantidos constitucionalmente.

5. Remessa Oficial e Apelação improvidas." (TRF 3ª Região, AMS 0025753-45.2015.4.03.6100, Sexta Turma, Rel. Juiza Convocada Leila Paiva, j. 22.09.2016, e-DJF3 Judicial 1 04.10.2016).

"DIREITO CONSTITUCIONAL. CARTEIRA DE REGISTRO DE ESTRANGEIRO. DIREITO BÁSICO À IDENTIDADE E INDIVIDUALIDADE. RISCO DE CLANDESTINIDADE E MARGINALIDADE JURÍDICA. TAXAS DE EMISSÃO. DIREITO À GRATUIDADE PELA HIPOSSUFICIÊNCIA E VULNERABILIDADE SOCIAL. DEFESA BASEADA EM FATO IMPEDITIVO, MODIFICATIVO OU EXTINTIVO DO DIREITO POSTULADO. INEXISTÊNCIA DA RESPECTIVA PROVA. SENTENÇA CONFIRMADA. 1. Embora impugnado o relatório social, com base no qual o direito foi postulado, sob a alegação de que pesquisa, em banco de dados do Ministério da Fazenda, indicaria a existência de CNPJ, nome e endereço comercial em favor do autor, a defesa da ré não tem lastro em prova do fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito postulado e, assim, inviável o acolhimento de sua pretensão. 2. Ainda que tivesse sido produzida tal prova, resta claro, de todo modo, que o exercício de atividade como a de comerciante viário - conforme licença que possuía e foi cassada no Município de Santos/SP, onde, segundo a apelante, não mais residiria, em razão de situação cadastral que remete ao Município de São José dos Campos/SP -, não seria capaz de provar a suficiência econômica, nem elidir a vulnerabilidade social atrelada às circunstâncias pessoais do autor, seja porque estrangeiro ou idoso, seja porque portador de deficiência em membro inferior. 3. Irrelevante, por sua vez, a afirmação de que assistente social não tem habilitação legal para produzir diagnóstico médico, pois não é disto que se tratou no relatório social juntado aos autos, que se limitou a descrever situação de fato, perceptível e que não exige conhecimento técnico nem significa o exercício ilegal de profissão, por se tratar de relato vinculado à descrição de situação social, feito em atenção a pedido da Defensoria Pública da União que, inclusive, atuou em sua defesa processual, justamente por conta de tal hipossuficiência econômica e social. 4. A prova dos autos, ao contrário do alegado pela apelante, existe e ampara a pretensão deduzida, tal qual acolhida pela sentença que nada mais fez do que reconhecer que, para além da pretensão fiscal do Estado à satisfação de taxa para a prestação de serviço público, o que existe a ser tutelado, em razão de sua supremacia no cotejo constitucional, é o direito básico à identidade e à individualidade, contra os riscos e danos da clandestinidade e da marginalidade jurídica, a ser assegurado mediante emissão de registro de estrangeiro para o gozo de outros direitos fundamentais, sem que possa tal exercício ser obstado pela exigência de taxas, uma vez que esteja provada, como na espécie, a hipossuficiência e a vulnerabilidade econômica e social do autor, com base em laudo social, cujo teor, informação e veracidade não logrou a ré elidir ou desconstituir, tal qual necessário, em se tratando de alegação de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito postulado. 5. Desprovimento da apelação e da remessa oficial." (TRF 3ª Região, Terceira Turma, APELREEX 0003344-92.2013.4.03.6311, Rel. Des. Fed. Carlos Muta, j. 28.01.2016, e-DJF3 Judicial 1 01.02.2016) .

Ante o exposto, nego provimento à remessa oficial.

É como voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

AGRAVO DE INSTRUMENTO. MANDADO DE SEGURANÇA. ISENÇÃO DE TAXA PARA EMISSÃO DE CARTEIRA DE IDENTIDADE DE ESTRANGEIRO. POSSIBILIDADE. COMPROVADA HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA. NOVA LEI DA MIGRAÇÃO.

1. De acordo com o art. 5º, caput, da CF aos estrangeiros residentes no país são assegurados os mesmos direitos fundamentais que o nacional, ressalvados direitos não fundamentais decorrentes da cidadania.

2. Denota-se que o benefício da gratuidade na obtenção de determinados documentos pessoais e certidões é dirigido aos reconhecidamente pobres, não fazendo a Constituição Federal distinção acerca da nacionalidade de quem ostenta tal condição, conforme se verifica nos incisos XXXIV, LXXVI e LXXVII do art. 5º da CF.

3. Revejo meu posicionamento para assegurar aos estrangeiros que comprovarem a insuficiência econômica da família a isenção do pagamento de taxas para a renovação do Registro Nacional de Estrangeiro (RNE), taxas estas que não conseguiriam arcar e ofenderiam a dignidade humana, já que se trata de documento indispensável para o exercício de direitos fundamentais como a educação, o trabalho, o transporte e a saúde.

4. A Lei nº 13.445/2017 (Lei da Migração) tornou expressa a isenção de taxas para expedição de documento de identificação quando o estrangeiro se encontrar em situação de hipossuficiência econômica, conforme dispõe o art. 113, § 3º,

5. No caso, a impetrante comprovou sua situação de hipossuficiência.

6. Remessa oficial improvida.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, A Quarta Turma, à unanimidade, decidiu negar provimento à remessa oficial, nos termos do voto do Des. Fed. MARCELO SARAIVA (Relator), com quem votaram os Des. Fed. ANDRÉ NABARRETE e MARLI FERREIRA., nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.