Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000332-54.2018.4.03.6102

RELATOR: Gab. 07 - DES. FED. NERY JÚNIOR

APELANTE: EYEHOME COMERCIO DE PRODUTOS MEDICOS LTDA - EPP

Advogados do(a) APELANTE: FABIO HIDEO MORITA - SP217168-A, PAULO RENATO DE FARIA MONTEIRO - SP130163-A, JOSE HENRIQUE DONISETE GARCIA DE CAMPOS - SP155640-A

APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000332-54.2018.4.03.6102

RELATOR: Gab. 07 - DES. FED. NERY JÚNIOR

APELANTE: EYEHOME COMERCIO DE PRODUTOS MEDICOS LTDA - EPP

Advogados do(a) APELANTE: FABIO HIDEO MORITA - SP217168-A, PAULO RENATO DE FARIA MONTEIRO - SP130163-A, JOSE HENRIQUE DONISETE GARCIA DE CAMPOS - SP155640-A

APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

 

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R E L A T Ó R I O

 

Cuida-se de apelação em Mandado de Segurança, impetrado contra o Ilmo. Delegado da Receita Federal do Brasil de Ribeirão Preto - SP com o escopo de afastar a incidência do IPI na transferência e revenda de produtos por ela importados e não submetidos a nenhum processo de industrialização.

Informa a impetrante que pretende a o afastamento da exigência do IPI na ocasião da revenda de seus produtos importados.

O pedido liminar foi indeferido (ID nº 8109828).

O MM Juízo a quo julgou improcedente e denegou a ordem para declarar a incidência do IPI na transferência e revenda dos produtos importados, não submetidos a qualquer processo de industrialização (ID nº 8110742).

Apelou a impetrante e, repisando os termos narrados na peça inaugural, argumentou que a nova incidência ofende o Princípio da isonomia e vedação ao “bis in iden”. Afirmou, em apertada síntese, que não se vislumbra qualquer modificação da natureza, funcionamento ou finalidade do produto, bem como que a dupla incidência onera indevidamente demasiadamente o estabelecimento importador. Pugnou pela restituição dos valores indevidamente pagos a título de IPI. Colacionou precedentes jurisprudenciais.

Com contrarrazões, o douto representante do Ministério Público Federal se manifestou pela regularidade formal do feito e seu prosseguimento.

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 


APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000332-54.2018.4.03.6102

RELATOR: Gab. 07 - DES. FED. NERY JÚNIOR

APELANTE: EYEHOME COMERCIO DE PRODUTOS MEDICOS LTDA - EPP

Advogados do(a) APELANTE: FABIO HIDEO MORITA - SP217168-A, PAULO RENATO DE FARIA MONTEIRO - SP130163-A, JOSE HENRIQUE DONISETE GARCIA DE CAMPOS - SP155640-A

APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

 

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V O T O

 

 

Cinge-se a controvérsia quanto à não incidência do IPI na transferência e revenda de produtos por ela importados e não submetidos a nenhum processo de industrialização.

O IPI incide sobre produtos industrializados no exterior, hipótese em que o fato gerador se dá com o seu desembaraço aduaneiro no território nacional, de acordo com o estabelecido nas letras do inciso I do art. 46 do CTN.

Assim, os impostos, de competência da União, têm como fato gerador o seu desembaraço aduaneiro, quando de procedência estrangeira. O que se tributa pelo IPI não é o produto importado, mas sim o seu ingresso no circuito nacional, equiparando-os, para efeitos fiscais, ao produto industrializado nacional.

O despacho aduaneiro é um procedimento administrativo fiscal que objetiva o desembaraço aduaneiro de mercadorias de procedência estrangeira que se pode traduzir como o ato pelo qual, uma vez satisfeitas as exigências regulamentares, permitem a saída das mercadorias. Muitas vezes o despacho se confunde com o desembaraço, pois fazem parte do mesmo processo, mas vale lembrar que este ultima o procedimento administrativo fiscal.

Tem como objetivo a livre saída da mercadoria importada. Na repartição, se realizam várias solenidades ou formalidades com a finalidade de possibilitar a tradição do produto do exportador para o importador. Dá-se a transferência de propriedade, com a circulação da mercadoria.

Por sua vez, a operação de venda e o desembaraço aduaneiro de um produto são duas operações separadas e independentes. Devem ser considerados fatos geradores diferentes para o mesmo imposto. O IPI deve incidir tanto na importação quanto na venda do produto, conforme se decidiu no EREsp 1403532/SC, firmando jurisprudência neste sentido:

EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL. DIREITO TRIBUTÁRIO. RECURSO REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. ART. 543-C, DO CPC. IMPOSTO SOBRE PRODUTOS INDUSTRIALIZADOS - IPI . FATO GERADOR. INCIDÊNCIA SOBRE OS IMPORTADORES NA REVENDA DE PRODUTOS DE PROCEDÊNCIA ESTRANGEIRA. FATO GERADOR AUTORIZADO PELO ART. 46, II, C/C 51, PARÁGRAFO ÚNICO DO CTN. SUJEIÇÃO PASSIVA AUTORIZADA PELO ART. 51, II, DO CTN, C/C ART. 4º, I, DA LEI N. 4.502/64. PREVISÃO NOS ARTS. 9, I E 35, II, DO R IPI /2010 (DECRETO N. 7.212/2010).

1. Seja pela combinação dos artigos 46, II e 51, parágrafo único do CTN - que compõem o fato gerador, seja pela combinação do art. 51, II, do CTN, art. 4º, I, da Lei n. 4.502/64, art. 79, da Medida Provisória n. 2.158-35/2001 e art. 13, da Lei n. 11.281/2006 - que definem a sujeição passiva, nenhum deles até então afastados por inconstitucionalidade, os produtos importados estão sujeitos a uma nova incidência do IPI quando de sua saída do estabelecimento importador na operação de revenda, mesmo que não tenham sofrido industrialização no Brasil.

2. Não há qualquer ilegalidade na incidência do IPI na saída dos produtos de procedência estrangeira do estabelecimento do importador, já que equiparado a industrial pelo art. 4º, I, da Lei n. 4.502/64, com a permissão dada pelo art. 51, II, do CTN.

3. Interpretação que não ocasiona a ocorrência de bis in idem, dupla tributação ou bitributação, porque a lei elenca dois fatos geradores distintos, o desembaraço aduaneiro proveniente da operação de compra de produto industrializado do exterior e a saída do produto industrializado do estabelecimento importador equiparado a estabelecimento produtor, isto é, a primeira tributação recai sobre o preço de compra onde embutida a margem de lucro da empresa estrangeira e a segunda tributação recai sobre o preço da venda, onde já embutida a margem de lucro da empresa brasileira importadora. Além disso, não onera a cadeia além do razoável, pois o importador na primeira operação apenas acumula a condição de contribuinte de fato e de direito em razão da territorialidade, já que o estabelecimento industrial produtor estrangeiro não pode ser eleito pela lei nacional brasileira como contribuinte de direito do IPI (os limites da soberania tributária o impedem), sendo que a empresa importadora nacional brasileira acumula o crédito do imposto pago no desembaraço aduaneiro para ser utilizado como abatimento do imposto a ser pago na saída do produto como contribuinte de direito (não-cumulatividade), mantendo-se a tributação apenas sobre o valor agregado.

4. Precedentes: REsp. n. 1.386.686 - SC, Segunda Turma, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 17.09.2013; e REsp. n. 1.385.952 - SC, Segunda Turma, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 03.09.2013. Superado o entendimento contrário veiculado nos EREsp. nº 1.411749-PR, Primeira Seção, Rel. Min. Sérgio Kukina, Rel. p/acórdão Min. Ari Pargendler, julgado em 11.06.2014; e no REsp. n. 841.269 - BA, Primeira Turma, Rel. Min. Francisco Falcão, julgado em 28.11.2006.

5. Tese julgada para efeito do art. 543-C, do CPC: "os produtos importados estão sujeitos a uma nova incidência do IPI quando de sua saída do estabelecimento importador na operação de revenda, mesmo que não tenham sofrido industrialização no Brasil".

6. Embargos de divergência em Recurso especial não providos. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução STJ 08/2008.

(EREsp 1403532/SC, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, Rel. p/ Acórdão Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 14/10/2015, DJe 18/12/2015)

TRIBUTÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. IMPOSTO SOBRE PRODUTOS INDUSTRIALIZADOS. IMPORTADOR COMERCIANTE. DESEMBARAÇO ADUANEIRO. SAÍDA DO ESTABELECIMENTO/REVENDA. INCIDÊNCIA DO IMPOSTO.

1. Segundo o Tribunal de origem, é devido o Imposto sobre Produtos Industrializados - IPI no desembaraço aduaneiro de produto industrializado, assim como na saída do estabelecimento comercial, equiparado a industrial, compensando-se o que for devido na última operação com o que foi pago na primeira, por força do princípio constitucional da não cumulatividade.

2. O acórdão recorrido está conformado ao entendimento da Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça adotado no julgamento dos EREsp nº 1.403.532/SC, sob a sistemática do art. 543-C do CPC: "os produtos importados estão sujeitos a uma nova incidência do IPI quando de sua saída do estabelecimento importador na operação de revenda, mesmo que não tenham sofrido industrialização no Brasil" (DJe de 18.12.2015).

3. Agravo regimental desprovido.

(AgRg no AgRg no REsp 1411408/RS, Rel. Ministro OLINDO MENEZES (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TRF 1ª REGIÃO), PRIMEIRA TURMA, julgado em 23/02/2016, DJe 02/03/2016)

Interessante mencionar que se a incidência do IPI ocorresse em apenas um dos momentos, o quadro tributário seria mais benéfico aos importadores do que à indústria nacional que arcaria com os todos os custos de produção.

O min. Mauro Campbell diz que o IPI no desembaraço aduaneiro incide sobre o preço final do produto vendido por outra empresa, inclusive com suas margens de lucro. O IPI incidente sobre a venda leva em conta outra situação jurídica, com novo preço e novas margens de ganho. "Essa incidência do IPI não caracteriza bis in idem, dupla tributação ou bitributação", escreveu. "A lei elenca dois fatos geradores distintos, o desembaraço aduaneiro proveniente da operação de compra de produto industrializado do exterior e a saída do produto industrializado do estabelecimento importador equiparado a estabelecimento produtor, isto é, a primeira tributação recai sobre o preço de compra onde embutida a margem de lucro da empresa estrangeira e a segunda tributação recai sobre o preço da venda, onde já embutida a margem de lucro da empresa brasileira importadora."

O Ministro Marco Aurélio, considerando em regime de repercussão geral, julgou ser devido o IPI na saída do estabelecimento importador no RE 946648:

IMPOSTO SOBRE PRODUTO INDUSTRIALIZADO - IPI - DESEMBARAÇO ADUANEIRO - SAÍDA DO ESTABELECIMENTO IMPORTADOR - INCIDÊNCIA - ARTIGO 150, INCISO II, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL - ISONOMIA - ALCANCE - RECURSO EXTRAORDINÁRIO - REPERCUSSÃO GERAL CONFIGURADA. Possui repercussão geral a controvérsia relativa à incidência do Imposto sobre Produtos Industrializados - IPI na saída do estabelecimento importador de mercadoria para a revenda, no mercado interno, considerada a ausência de novo beneficiamento no campo industrial.
(RE 946648 RG, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, julgado em 30/06/2016, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-212 DIVULG 04-10-2016 PUBLIC 05-10-2016)

Isto posto, nego provimento à apelação.

É como voto.

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

TRIBUTÁRIO - IMPOSTO SOBRE PRODUTOS INDUSTRIALIZADOS - IPI - DESEMBARAÇO - INCIDÊNCIA - SAÍDA DO ESTABELECIMENTO IMPORTADOR SEM PROCESSO DE INDUSTRIALIZAÇÃO - FATO GERADOR DO IMPOSTO

1.Nos termos do artigo 46, I, do CTN, o imposto, de competência da União, sobre produtos industrializados, tem como fato gerador o seu desembaraço aduaneiro, quando de procedência estrangeira.

2.O princípio da isonomia não se aplica ao IPI , o qual por força de sua própria definição constitucional estabelecida no artigo 153, § 3º, da Constituição Federal, é seletivo, podendo o legislador optar por conferir tratamento diferenciado aos produtos.

3.O IPI é um tributo previsto no artigo 153, inciso IV, da Constituição Federal e, de acordo com o artigo 46, inciso I, do Código Tributário Nacional, possui como fato gerador o desembaraço aduaneiro de produto ainda que tenha não tenha sido submetido a qualquer operação que lhe modifique a natureza ou a finalidade, ou o aperfeiçoe para o consumo, quando de procedência estrangeira

4.Observa-se a incidência do IPI na revenda dos produtos de origem estrangeiros. Não há bis in idem, pois a lei elenca dois fatos geradores distintos, o desembaraço aduaneiro proveniente da operação de compra de produto industrializado do exterior e a saída do produto industrializado do estabelecimento importador.

5.A questão do tributo incidir sobre o produto industrializado significa somente que é necessário e relevante que essa operação de industrialização, em algum momento, tenha ocorrido.

6.Apelação não provida.

 

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Terceira Turma, por unanimidade, negou provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.