Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5001551-74.2019.4.03.6100

RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO

APELANTE: SINCO ENGENHARIA S.A., MONTARQIS EMPREITEIRA DE MAO DE OBRA LTDA., UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

Advogado do(a) APELANTE: NELSON WILIANS FRATONI RODRIGUES - SP128341-A
Advogado do(a) APELANTE: NELSON WILIANS FRATONI RODRIGUES - SP128341-A

APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL, MONTARQIS EMPREITEIRA DE MAO DE OBRA LTDA., SINCO ENGENHARIA S.A.

Advogado do(a) APELADO: NELSON WILIANS FRATONI RODRIGUES - SP128341-A
Advogado do(a) APELADO: NELSON WILIANS FRATONI RODRIGUES - SP128341-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO (1728) Nº 5001551-74.2019.4.03.6100

RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO

APELANTE: SINCO ENGENHARIA S.A., MONTARQIS EMPREITEIRA DE MAO DE OBRA LTDA., DELEGADO DA RECEITA FEDERAL EM SAO PAULO, UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

Advogado do(a) APELANTE: NELSON WILIANS FRATONI RODRIGUES - SP128341-A
Advogado do(a) APELANTE: NELSON WILIANS FRATONI RODRIGUES - SP128341-A

APELADO: DELEGADO DA RECEITA FEDERAL EM SAO PAULO, UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL, MONTARQIS EMPREITEIRA DE MAO DE OBRA LTDA., SINCO ENGENHARIA S.A.

Advogado do(a) APELADO: NELSON WILIANS FRATONI RODRIGUES - SP128341-A
Advogado do(a) APELADO: NELSON WILIANS FRATONI RODRIGUES - SP128341-A

  

 

R E L A T Ó R I O

 

O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS FRANCISCO (Relator): Trata-se de mandado de segurança em que se pretende afastar a exigibilidade das contribuições ao SAT e a terceiros, incidentes sobre pagamentos efetuados a empregados, a título de a) primeira quinzena de afastamento por doença ou acidente; b) terço constitucional de férias; c) aviso prévio indenizado; d) parcela do décimo-terceiro salário incidente sobre o aviso prévio indenizado. Pugna, ainda, pelo reconhecimento do direito à compensação dos valores assim recolhidos com débitos próprios, vencidos ou vincendos, relativos a quaisquer tributos ou contribuições administrados pela Receita Federal do Brasil, sem as restrições estabelecidas pelo artigo 170-A do Código Tributário Nacional.

A r. sentença concedeu parcialmente a segurança, para declarar a não incidência das referidas contribuições sobre as verbas pagas sob as rubricas a) primeira quinzena de afastamento por doença ou acidente; b) terço constitucional de férias; e c) aviso prévio indenizado. Reconheceu, ainda, o direito da impetrante de proceder à compensação dos valores indevidamente recolhidos a tais títulos no quinquênio anterior ao ajuizamento da demanda, a ser exercido após o trânsito em julgado da sentença, observando-se as disposições do art. 89 da Lei nº 8.212/1991, art. 74 da Lei nº 9.430/1996 e do art. 26-A da Lei nº 11.457/2007. Sentença submetida ao reexame necessário.

Apela a União, aduzindo, em síntese, que as verbas pagas sob as rubricas terço constitucional de férias, aviso prévio indenizado e quinze primeiros dias de afastamento por doença ou acidente não estão elencadas nas exceções do art. 28, § 9º da Lei nº 8.212/1991, constituindo, portanto, base de cálculo da contribuição previdenciária.

A impetrante também interpõe apelação, sustentando que a verba paga a título de décimo-terceiro salário proporcional ao aviso prévio indenizado não constitui remuneração pelo trabalho, devido à sua natureza indenizatória, de modo que não se sujeita à tributação nos moldes do art. 195, I, “a”, da Constituição e do art. 22 da Lei 8.212/1991.

Com contrarrazões, subiram os autos a esta Corte, tendo o Ministério Publico Federal oferecido parecer, manifestando a ausência de repercussão social a justificar sua intervenção no presente feito.

É o breve relatório. Passo a decidir.

 

 

 

 

 

 

 

 


APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO (1728) Nº 5001551-74.2019.4.03.6100

RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO

APELANTE: SINCO ENGENHARIA S.A., MONTARQIS EMPREITEIRA DE MAO DE OBRA LTDA., DELEGADO DA RECEITA FEDERAL EM SAO PAULO, UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

Advogado do(a) APELANTE: NELSON WILIANS FRATONI RODRIGUES - SP128341-A
Advogado do(a) APELANTE: NELSON WILIANS FRATONI RODRIGUES - SP128341-A

APELADO: DELEGADO DA RECEITA FEDERAL EM SAO PAULO, UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL, MONTARQIS EMPREITEIRA DE MAO DE OBRA LTDA., SINCO ENGENHARIA S.A.

Advogado do(a) APELADO: NELSON WILIANS FRATONI RODRIGUES - SP128341-A
Advogado do(a) APELADO: NELSON WILIANS FRATONI RODRIGUES - SP128341-A

 

 

 

V O T O

 

 

O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS FRANCISCO (Relator): Quanto ao tema central, a lide posta nos autos versa sobre a interpretação dos conceitos constitucionais de empregador, trabalhador, folha de salários, e demais rendimentos do trabalho, e ganhos habituais, expressos no art. 195, I e II, e art. 201, § 4º, ambos do ordenamento de 1988 (agora, respectivamente, no art. 195, I, “a”, e II, e art. 201, § 11, com as alterações da Emenda 20/1998).

Para se extrair o comando normativo contido em dispositivo da Constituição Federal relativo à Seguridade Social, vários elementos e dados jurídicos devem ser considerados no contexto interpretativo, dentre os quais a lógica o caráter contributivo em vista da igualdade e da solidariedade no financiamento do sistema de seguro estruturado no Regime Geral de Previdência Social (RGPS).

Para o que importa ao presente recurso, os conceitos constitucionais de empregador, trabalhador, folha de salários, rendimentos do trabalho e ganhos habituais gravitam em torno de pessoa física que presta serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário, inserindo-se no contexto do art. 3º da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Portanto, havendo relação de emprego, é imperioso discutir se os valores pagos se inserem no âmbito constitucional de salário, demais rendimentos do trabalho e ganhos habituais.

Salário é espécie do gênero remuneração paga em decorrência de relação de emprego tecnicamente caracteriza (marcada pela subordinação). O ordenamento constitucional de 1988 emprega sentido amplo de salário, de modo que está exposta à incidência de contribuição tanto o salário propriamente dito quanto os demais ganhos habituais do empregado, pagos a qualquer título (vale dizer, toda remuneração habitual, ainda que em montantes variáveis). Essa amplitude de incidência é manifesta após a edição da Emenda 20/1998, que, introduzindo o art. 195, I, “a”, da Constituição, previu contribuições para a seguridade exigidas do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei, incidentes sobre a folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo empregatício. Essa amplitude se verifica também em relação a essa exação exigida do trabalhador e dos demais segurados da previdência social, em conformidade com o art. 195, II, da Constituição (tanto na redação da Emenda 20/1998 quanto na da Emenda 103/2019).

Além disso, a redação originária do art. 201, § 4º, da Constituição de 1988, repetida no art. 201, § 11 do mesmo ordenamento (com renumeração dada pela Emenda 20/1998, prevê que a previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, sendo que “Os ganhos habituais do empregado, a qualquer título, serão incorporados ao salário para efeito de contribuição previdenciária e conseqüente repercussão em benefícios, nos casos e na forma da lei.”

Portanto, o texto constitucional confiou à União Federal amplo campo de incidência para exercício de sua competência tributária, compreendendo o conjunto das verbas remuneratórias habituais (ou seja, salários e demais ganhos), o que por si só não se traduz em exigência tributária concreta, uma vez que caberá à lei ordinária estabelecer a hipótese de incidência hábil para realizar as necessárias imposições tributárias, excluídas as isenções que a própria legislação estabelecer.

Porém, nem tudo o que o empregador paga ao empregado pode ser tributado como salário ou rendimento do trabalho, pois há verbas que não estão no campo constitucional de incidência (p. ex., por terem natureza de indenizações), além das eventuais imunidades previstos pelo sistema constitucional.

Atualmente, a conformação normativa da imposição das contribuições patronais para o sistema de seguridade está essencialmente consolidada na Lei 8.212/1991 (notadamente em seu art. 22), muito embora demais diplomas normativos sirvam para a definição e alcance da legislação tributária (art. 109 e art. 110 do CTN), dentre ele os recepcionados arts. 457 e seguintes da CLT, prevendo que a remuneração do empregado compreende o salário devido e pago diretamente pelo empregador, como contraprestação do serviço, as gorjetas que receber, e demais remunerações. É verdade que o art. 457-A, da CLT (introduzido pela MP 905/2019) estabelece que gorjetas não são receitas do empregador, mas ainda assim estão no conteúdo amplo de salário estabelecido pela pelo art. 195, I, “a”, e II, Constituição para a incidência de contribuições previdenciárias (patronais e do trabalhador).

Para fins trabalhistas (que repercutem na área tributária em razão do contido no art. 110 do CTN), integram o salário não só a importância fixa estipulada, como também as comissões, percentagens, gratificações ajustadas, diárias para viagens e abonos pagos pelo empregador. O meio de pagamento da remuneração pode ser dinheiro, alimentação, habitação, vestuário ou outras prestações “in natura” que o empregador utilizar para retribuir o trabalho do empregado, desde que o faça habitualmente (vedadas as bebidas alcoólicas e demais drogas).

Embora pessoalmente admita a possibilidade de a natureza jurídica de certas verbas não estarem inseridas no conceito de salário em sentido estrito, estaremos diante de verba salarial em sentido amplo quando se tratar de pagamentos habituais decorrentes da relação de emprego, abrigado pelo art. 195 e pelo art. 201 da Constituição (nesse caso, desde sua redação originária) para a imposição de contribuições previdenciárias. E tudo o que foi dito em relação à incidência de contribuição previdenciária se aplica ao adicional dessa mesma exação calculado pelo segundo o regramento do Fator Acidentário de Prevenção (FAP) e dos Riscos Ambientais de Trabalho (RAT).

À evidência, não há que se falar em exercício de competência residual, expressa no § 4º do art. 195, da Constituição, já que a exação em tela encontra conformação na competência originária constante desde a redação originária do art. 195, I, e do art. 201, ambos do texto de 1988 (não alterados nesse particular pela Emenda 20/1998 ou pela Emenda 103/2019).

O E.STF, no RE 565160, Pleno, v.u., Rel. Min. Marco Aurélio, j. 29/03/2017, firmou a seguinte Tese no Tema 20: “A contribuição social a cargo do empregador incide sobre ganhos habituais do empregado, quer anteriores ou posteriores à Emenda Constitucional 20/1998”. Nesse RE 565160, o Pretório Excelso cuidou da incidência de contribuição previdenciária sobre adicionais (de periculosidade e insalubridade), gorjetas, prêmios, adicionais noturnos, ajudas de custo e diárias de viagem (quando excederem 50% do salário recebido), comissões e quaisquer outras parcelas pagas habitualmente (ainda que em unidades), previstas em acordo ou convenção coletiva ou mesmo que concedidas por liberalidade do empregador não integrantes na definição de salário, afirmando o sentido amplo de salário e de rendimento do trabalho. 

Por sua vez, o art. 28, § 9º, da Lei 8.212/1991 traz rol de situações nas quais a contribuição ora em tela não é exigida, contudo, sem apresentar rigoroso critério distintivo de hipóteses de não incidência (p. ex., por se tratar de pagamento com natureza indenizatória) ou de casos de isenção (favor fiscal). Por óbvio, o efeito prático de verba expressamente indicada nesse preceito legal é a desoneração tributária, o que resulta na ausência de interesse de agir (salvo se, ainda assim, o ente estatal resistir à legítima pretensão do contribuinte).

É verdade que o total das remunerações pagas pelo empregador está sujeita não só a contribuições previdenciárias mas também a outras incidências escoradas em fundamentos constitucionais e legais diversos. A esse respeito, emergem contribuições sociais gerais (tais como salário-educação) e também contribuições de intervenção no domínio econômico (como a exação devida ao SEBRAE), denominadas resumidamente como contribuições “devidas a terceiros” ou ainda ao “Sistema S”.

Embora cada uma dessas imposições tributárias tenha autonomia normativa, todas estão na competência tributária da União Federal, que as unificou para fins de delimitação da base tributável. Além de previsões específicas (p. ex., na Lei 2.613/1955, na Lei 9.424/1996 e na Lei 9.766/1999), essa unificação está clara na Lei 11.457/2007 e em atos normativos da administração tributária (notadamente no art. 109 da IN RFB 971/2009, com alterações e inclusões, em especial pela IN RFB 1.071/2010), razão pela qual as conclusões aplicáveis às contribuições previdenciárias também são extensíveis às exações “devidas a terceiros” ou “Sistema S”.

No caso dos autos, discute-se a incidência de contribuições sobre pagamentos efetuados a título de:

a) 15 primeiros dias do auxílio-doença;

b) 15 primeiros dias do auxílio-acidente;

c) Terço constitucional de férias;

d) Aviso prévio indenizado;

e) Décimo terceiro proporcional incidente sobre reflexos do aviso prévio indenizado.

Para a análise desses pontos, creio apropriado fazer análises agrupadas nos termos que se seguem.

15 PRIMEIROS DIAS DO AUXÍLIO-DOENÇA

No que tange ao auxílio-doença, é certo que o empregador não está sujeito à contribuição em tela no que tange à complementação ao valor do auxílio-doença após o 16º dia do afastamento (desde que esse direito seja extensivo à totalidade dos empregados da empresa), conforme expressa previsão do art. 28, § 9º, “n”, da Lei 8.212/1991. Já no que tange à obrigação legal de pagar o auxílio-doença nos 15 primeiros dias do afastamento, a jurisprudência se consolidou no sentido de que tal verba tem caráter previdenciário (mesmo quando paga pelo empregador), descaracterizando a natureza salarial para afastar a incidência de contribuição social. Nesse sentido, anoto julgamento do E. STJ:

PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. PRIMEIROS QUINZE DIAS DE AUXÍLIO-DOENÇA. NÃO INCIDÊNCIA.

1. No julgamento do Recurso Especial 1.230.957/RS, sob o rito dos recursos repetitivos, o STJ firmou o entendimento de que sobre a importância paga pelo empregador ao empregado durante os primeiros quinze dias de afastamento por motivo de doença não incide a contribuição previdenciária, por não se enquadrar na hipótese de incidência da exação, que exige verba de natureza remuneratória. (REsp 1.230.957/RS, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, DJe 18/3/2014).

2. Dessume-se que o acórdão recorrido está em sintonia com o atual entendimento do STJ, razão pela qual incide, in casu, o princípio estabelecido na Súmula 83/STJ: "Não se conhece do Recurso Especial pela divergência, quando a orientação do Tribunal se firmou no mesmo sentido da decisão recorrida".

3. Agravo Interno provido para não conhecer do Recurso Especial da União.

(AgInt no REsp 1701325/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 19/11/2019, DJe 19/12/2019)

15 PRIMEIROS DIAS DE AUXÍLIO-ACIDENTE

O auxílio-acidente é benefício previdenciário, nos termos do art. 86, § 2º, da Lei n. 8.212/1991, de maneira que não há falar em incidência de contribuição previdenciária. A empresa é responsável pelo pagamento dos 15 (quinze) primeiros dias a partir da data do acidente, e a Previdência Social é responsável pelo pagamento a partir do 16º dia da data do afastamento da atividade.

Todavia, caso o empregador faça pagamentos a título de liberalidade extensível a todos os empregados nessa situação excepcional, não obstante os termos do art. 111 do CTN e atentando para a elevada solidariedade contemplada pelo sistema constitucional, justifica-se a extensão da isenção nos mesmos termos da prevista no art. 28, § 9º, “n” da Lei 8.212/1991, a título de complementação ao valor do auxílio-doença (frise-se, desde que esse direito seja extensivo à totalidade dos empregados da empresa).

No que concerne ao auxílio-acidente, tem-se o seguinte posicionamento da jurisprudência do E. STJ:

TRIBUTÁRIO. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. NÃO INCIDÊNCIA SOBRE A IMPORTÂNCIA PAGA NOS QUINZE DIAS QUE ANTECEDEM O AUXÍLIO-ACIDENTE, E NÃO SOBRE O AUXÍLIO EM SI.

1. Não incide contribuição previdenciária patronal sobre os valores referentes aos primeiros quinze dias de afastamento que antecedem o auxílio-acidente. Precedentes.

2. Agravo interno a que se nega provimento.

(AgInt no AREsp 1177168/SP, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEGUNDA TURMA, julgado em 12/11/2019, DJe 19/11/2019)

1/3 CONSTITUCIONAL DE FÉRIAS

No que tange ao adicional de um terço de férias a que se refere o art. 7º, XVII, da Constituição Federal, parece-me clara a inserção dessas verbas no campo de incidência das contribuições incidentes sobre a folha de salários. Diversamente da natureza manifestamente indenizatória do montante decorrente da venda de um terço dos dias de férias (bem como a média correspondente), paga nos moldes do art. 143 e do art. 144 da CLT e desonerada da imposição de contribuições pelo art. 28, § 9º, da Lei 8.212/1991, os pagamentos do adicional constitucional de um terço de férias de que cuida o art. 7º, XVII, da Constituição são inerentes à relação de emprego, pagos com habitualidade e sem qualquer natureza indenizatória.

Contudo, admito que a orientação jurisprudencial caminhou em outro sentido, como se nota da posição adotada pelo E. STJ:

TRIBUTÁRIO. AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. INCIDÊNCIA SOBRE AS PARCELAS RECEBIDAS A TÍTULO DE 13o. (DÉCIMO TERCEIRO) SALÁRIO, AUXÍLIO-MATERNIDADE, HORAS-EXTRAS, ADICIONAIS DE INSALUBRIDADE, NOTURNO E PERICULOSIDADE, REPOUSO SEMANAL. AUXÍLIO-ALIMENTAÇÃO PAGO EM ESPÉCIE. NÃO INCIDÊNCIA SOBRE O ABONO ASSIDUIDADE CONVERTIDO EM PECÚNIA. AGRAVO INTERNO DA EMPRESA DESPROVIDO. 1. A Primeira Seção desta Corte, no julgamento dos Recursos Especiais 1.358.281/SP e 1.230.957/RS, sob o rito dos recursos repetitivos previsto art. 543-C do CPC, entendeu que não incide a Contribuição Previdenciária sobre o adicional de um terço de férias, sobre o aviso prévio indenizado e sobre os primeiros quinze dias de auxílio-doença e auxílio-acidente; incidindo sobre o adicional noturno e de periculosidade, sobre os salários maternidade e paternidade, e sobre as horas-extras.

2. Consolidou-se na Seção de Direito Público desta Corte o entendimento de que incide Contribuição Previdenciária sobre a verba relativa aos adicionais de periculosidade, insalubridade, décimo-terceiro salário, abono pecuniário, repouso semanal, auxílio-alimentação pago em espécie e adicional de sobreaviso.

3. A jurisprudência desta Corte assentou o entendimento de que incide Contribuição Previdenciária sobre o valor pago a título de faltas abonadas. Todavia, de natureza indenizatória são as verbas pagas a título de abono assiduidade convertido em pecúnia, uma vez que tem por objetivo premiar o empregado que desempenha de forma exemplar as suas funções, de modo que não integram o salário de contribuição para fins de incidência da Contribuição Previdenciária.

4. Também já se encontra consolidado nesta Corte a orientação de que o adicional de transferência possui natureza salarial, conforme firme jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho, pois, da leitura do § 3o. do art. 463 da CLT, extrai-se que a transferência do empregado é um direito do empregador, sendo que do exercício regular desse direito decorre para o empregado transferido, em contrapartida, o direito de receber o correspondente adicional de transferência (REsp. 1.581.122/SC, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, DJe 31.5.2016). No mesmo sentido, citam-se: REsp. 1.217.238/MG, Rel. Min. MAURO CAMPBELL MARQUES, DJe de 3.2.2011; AgRg no REsp. 1.432.886/RS, Rel. Min. OG FERNANDES, DJe de 11.4.2014).

5. Quanto à verba recebida a título de prêmio desempenho, é firme o entendimento de que, configurado o caráter permanente ou a habitualidade da verba recebida, bem como a natureza remuneratória da rubrica, incide Contribuição Previdenciária sobre as parcelas recebidas pelo empregado.

6. Agravo Interno da Empresa desprovido.

(AgInt nos EDcl no REsp 1566704/SC, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 17/12/2019, DJe 19/12/2019)

No mesmo caminho estão diferenças pagas a título de 1/3 de férias, decorrentes de correções de cálculos, as quais também não devem ter incidência de contribuição previdenciária.

AVISO PRÉVIO INDENIZADO

No tocante ao aviso prévio indenizado, está previsto no parágrafo 1º do artigo 487 da Consolidação das Leis do Trabalho: “A falta do aviso prévio por parte do empregador dá ao empregado o direito aos salários correspondentes ao prazo do aviso, garantida sempre a integração desse período no seu tempo de serviço”. Como se vê, trata-se de uma penalidade imposta ao empregador que demite seu empregado sem observar o prazo do aviso prévio, o que revela a natureza indenizatória da verba.

É verdade que a Lei 9.528/1997 e o Decreto 6.727/2009, ao alterar o disposto no art. 28, § 9º, da Lei 8.212/1991 e no art. 214, § 9º, do Decreto 3.048/1999, excluíram, do elenco das importâncias que não integram o salário-de-contribuição, aquela paga a título de aviso prévio indenizado. Todavia, não a incluiu entre os casos em que a lei determina expressamente a incidência da contribuição previdenciária. Vale, portanto, a conclusão no sentido de que a verba recebida pelo empregado a título de aviso prévio indenizado (integral ou proporcional) não é pagamento habitual, nem mesmo retribuição pelo seu trabalho, mas indenização imposta ao empregador que o demitiu sem observar o prazo de aviso, sobre ela não podendo incidir a contribuição previdenciária.

Nesse sentido, já decidiu o Egrégio Superior Tribunal de Justiça:

TRIBUTÁRIO. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. CONTRIBUIÇÕES DESTINADAS A TERCEIROS. SAT/RAT. MESMA SISTEMÁTICA DAS CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. NÃO INCIDÊNCIA SOBRE O AVISO PRÉVIO INDENIZADO. PRECEDENTES.

1. Esta Corte no julgamento do REsp 1.230.957/RS, sob o rito dos Recursos Repetitivos, Relator Min. Mauro Campbell Marques, decidiu que não incide contribuição previdenciária sobre o aviso prévio indenizado.

2. As contribuições destinadas a terceiros (sistema "S" e outros), em razão da identidade de base de cálculo com as contribuições previdenciárias (vide art. 3º, §2º, da Lei n. 11.457/2007 - "remuneração paga, devida ou creditada a segurados do Regime Geral de Previdência Social"), devem seguir a mesma sistemática destas, não incidindo sobre as rubricas que já foram consideradas por este Superior Tribunal de Justiça como de caráter indenizatório, vale dizer: auxílio-doença, aviso prévio indenizado, terço de férias e vale transporte. Precedentes: AgInt no REsp 1.602.619/SE, Rel. Min. Franciso Falcão, Segunda Turma, Dje 26/03/2019; AgInt no REsp n. 1.750.945/MG, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 12/2/2019.

3. Agravo interno não provido.

(AgInt no REsp 1823187/RS, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 07/10/2019, DJe 09/10/2019)

Por óbvio que não incidirá a tributação se o montante indenizado do aviso prévio tiver como parâmetro o contido na Lei 12.506/2011.

No que concerne aos reflexos do aviso prévio, por óbvio que a não exigência das combatidas contribuições somente se dará dependendo da natureza da verba em relação a qual se verifica o reflexo. Note-se que o tempo de trabalho correspondente ao período de aviso prévio não altera a natureza das verbas pagas em razão desse período (ou seja, reflexos de aviso prévio não serão pagos a título de aviso prévio, mas sim em razão da natureza da verba pertinente a esse reflexo).

Assim, se o reflexo do aviso prévio se dá em verbas que, por si só não são tributadas (p. ex., 1/3 constitucional e férias indenizadas), também haverá desoneração, ao passo em que se o aviso prévio indenizado refletir em verbas tributadas, com razão haverá tributação (adicionais salariais como gratificações remuneratórias, p. ex.).

DÉCIMO TERCEIRO PROPORCIONAL INCIDENTE SOBRE REFLEXOS DO AVISO PRÉVIO INDENIZADO

Os reflexos quantitativos seguem a mesma orientação aplicada às verbas das quais se originam, daí porque devem ser tributadas ou desoneradas por iguais fundamentos. Porque há exigência tributária legítima no que concerne a décimo terceiro salário, também haverá tributação proporcional incidente sobre seus reflexos no aviso prévio indenizado.

TRIBUTÁRIO. AGRAVO INTERNO. ENUNCIADO ADMINISTRATIVO Nº 3 DO STJ. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. DÉCIMO TERCEIRO SALÁRIO PROPORCIONAL INCIDENTE SOBRE OS REFLEXOS DO AVISO PRÉVIO INDENIZADO. INCIDÊNCIA.

PRECEDENTES. 1. Esta Corte já se manifestou no sentido de que os valores relativos ao 13º proporcional ao aviso prévio indenizado por possuem natureza remuneratória (salarial), e nessa qualidade sujeitam-se à incidência da contribuição previdenciária. Nesse sentido: AgRg no REsp 1.383.613/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 10/10/2014; AgRg nos EDcl nos EDcl no REsp 1.379.550/RS, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 13/04/2015.

2. Impende registrar que não é possível a esta Corte, em sede de recurso especial, aferir violação a dispositivo constitucional, sob pena de usurpação da competência do Supremo Tribunal Federal no âmbito do recurso extraordinário.

3. Agravo interno não provido.

(AgInt no REsp 1764999/DF, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 11/12/2018, DJe 14/12/2018)

Por fim, observada a prescrição quinquenal (art. 168 do CTN, na interpretação dada pelo E.STF no RE 566621/RS, e pelo E.STJ no REsp 1269570/MG), emerge o direito à recuperação do indébito devidamente comprovado por documentação que vier a ser acostada aos autos em fase de execução, ou for apresentada ao Fisco nos moldes de pedido de compensação viabilizado na via administrativa (conforme firmado em tema semelhante na Primeira Seção do E.STJ, REsp 1.111.003/PR, Rel. Min. Humberto Martins, DJe 25/05/2009). Esses valores deverão ser acrescidos de correção monetária e de juros conforme critérios indicados no Manual de Cálculos da Justiça Federal.

Ainda na esteira do entendimento consolidado pela Primeira Seção do E.STJ (Resp 1.137.738/SP, Rel. Min. Luiz Fux, v. u., DJe: 01/02/2010), as regras para recuperar o indébito são as vigentes no momento do ajuizamento desta ação. Contudo, deve ser assegurado o direito de a parte-autora compensar o indébito ora reconhecido na via administrativa, quando então restará sujeita aos termos normativos aplicados pela Receita Federal.

Portanto, cumpridos o art. 170 e o art. 170-A, ambos do CTN, e diante do pacificado pelo E.STJ (Segunda Turma, Resp nº 1.235.348/PR, Rel. Min. Herman Benjamin, v.u., Dje: 02/05/2011), bem como satisfeitos os critérios fixados por atos normativos da Receita Federal do Brasil (notadamente o art. 84 e seguintes da IN SRF 1.717/2017 e alterações, legitimados pelos padrões suficientes fixados na legislação ordinária da qual derivam), utilizando a GFIP para apuração das contribuições previdenciárias, os indébitos poderão ser compensados apenas com contribuições previdenciárias devidas correspondentes a períodos subsequentes (ainda que os créditos sejam oriundos de estabelecimentos diversos da empresa), em conformidade com o art. 89 da Lei 8.212/1991; utilizando o eSocial e a DCTFWeb, os indébitos podem se valer da compensação unificada entre créditos e débitos previdenciários ou fazendários, nos termos do art. 74 da Lei 9.430/1996, com as restrições do art. 26-A, §1º, da Lei 11.457/2007 (introduzido pela Lei 13.670/2018).

Ante o exposto, nego provimento à apelação da União e à remessa oficial, bem como ao apelo da impetrante.

É o voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS PATRONAIS. SALÁRIO E GANHOS HABITUAIS DO TRABALHO. VERBAS INDENIZATÓRIAS. RECUPERAÇÃO DE INDÉBITO.

- O texto constitucional confiou à União Federal amplo campo de incidência para exercício de sua competência tributária no tocante à contribuição previdenciária patronal, compreendendo o conjunto das verbas remuneratórias habituais (salários e demais rendimentos do trabalho), cuja conformação normativa está essencialmente consolidada na Lei 8.212/1991 (notadamente em seu art. 22). Todavia, não estão no campo constitucional de incidência e nem nas imposições legais verbas com conteúdo indenizatório, em face das quais não pode incidir contribuição previdenciária.

- Cada uma das contribuições “devidas a terceiros” ou para o “Sistema S” possui autonomia normativa, mas a União Federal as unificou para fins de delimitação da base tributável (p. ex., na Lei 2.613/1955, na Lei 9.424/1996, na Lei 9.766/1999 e na Lei 11.457/2007, regulamentadas especialmente no art. 109 da IN RFB 971/2009, com alterações e inclusões), razão pela qual as conclusões aplicáveis às contribuições previdenciárias também lhes são extensíveis.

- O auxílio-doença e o auxílio-acidente pago ao empregado, nos quinze primeiros dias do afastamento, constitui verba de caráter previdenciário (mesmo quando paga pelo empregador), o que descaracteriza a natureza salarial para fins de incidência de contribuição social.

- O adicional de um terço de férias também não sofre incidência de contribuição previdenciária, conforme a atual orientação jurisprudencial.

- A verba recebida pelo empregado a título de aviso prévio indenizado (integral ou proporcional) não é pagamento habitual, nem mesmo retribuição pelo seu trabalho, mas indenização imposta ao empregador que o demitiu sem observar o prazo de aviso, sobre ela não podendo incidir a contribuição previdenciária.

- Os reflexos quantitativos seguem a mesma orientação aplicada às verbas das quais se originam, daí porque devem ser tributadas ou desoneradas por iguais fundamentos. Porque há exigência tributária legítima no que concerne a décimo terceiro salário, também haverá tributação proporcional incidente sobre seus reflexos no aviso prévio indenizado.

- Observada a prescrição quinquenal (art. 168 do CTN), a recuperação do indébito tem os acréscimos do Manual de Cálculos da Justiça Federal, e as regras para compensar são as vigentes no momento do ajuizamento da ação, assegurado o direito de a parte-autora viabilizá-la na via administrativa segundo o modo lá aplicável. Cumpridos os termos do art. 170 e do art. 170-A, ambos do CTN, e os critérios fixados por atos normativos da Receita Federal do Brasil (notadamente o art. 84 e seguintes da IN SRF 1.717/2017 e alterações, legitimados pelos padrões suficientes fixados na legislação ordinária da qual derivam), utilizando a GFIP, os indébitos poderão ser compensados apenas com contribuições previdenciárias; utilizando o eSocial e a DCTFWeb, os indébitos podem se valer da compensação unificada entre créditos e débitos previdenciários ou fazendários, nos termos do art. 74 da Lei 9.430/1996, com as restrições do art. 26-A, §1º, da Lei 11.457/2007 (introduzido pela Lei 13.670/2018).

- Apelação da União, remessa oficial e apelo da impetrante aos quais se nega provimento.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Segunda Turma decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação da União Federal e à remessa oficial, bem como à apelação da impetrante, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.