APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 0015736-82.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: IZILDA FERREIRA LINHARES
Advogado do(a) APELADO: JOHNNY ROBERTO DOS SANTOS MARIANO - SP382572-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 0015736-82.2018.4.03.9999 RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS APELADO: IZILDA FERREIRA LINHARES Advogado do(a) APELADO: JOHNNY ROBERTO DOS SANTOS MARIANO - SP382572-N OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de ação objetivando a concessão de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença. A sentença (ID89040809), proferida em 20/10/2017, julgou procedente o pedido, condenando o réu à concessão do benefício de aposentadoria por invalidez, com DIB fixada em 25/06/2014 (data do requerimento administrativo). As parcelas em atraso serão acrescidas de juros de mora, nos termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal. Honorários advocatícios fixados em 10% do valor atribuído à causa. Concedida a tutela antecipada. Sentença submetida ao reexame necessário. Apela o INSS pugnando pela reforma da sentença, alegando para tanto que a parte autora não preenche os requisitos para concessão do benefício quanto à carência. Subsidiariamente, requer a alteração do termo inicial do benefício, dos critérios de juros de mora e correção monetária e verba honorária e suspensão dos efeitos da tutela Com contrarrazões da autarquia, subiram os autos à esta Corte. É o relatório.
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 0015736-82.2018.4.03.9999 RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS APELADO: IZILDA FERREIRA LINHARES Advogado do(a) APELADO: JOHNNY ROBERTO DOS SANTOS MARIANO - SP382572-N OUTROS PARTICIPANTES: V O T O Embora não seja possível, de plano, aferir-se o valor exato da condenação, pode-se concluir, pelo termo inicial do benefício (25/06/2014), seu valor aproximado e a data da sentença (20/10/2017), que o valor total a condenação será inferior à importância de 1.000 (mil) salários mínimos estabelecida no inciso I do §3º do artigo 496 do Código de Processo Civil de 2015. Afinal, o valor que superaria a remessa oficial é equivalente a 14 anos de benefícios calculados no valor máximo, o que certamente não será o caso dos autos. Assim, é nítida a inadmissibilidade, na hipótese em tela, da remessa necessária. Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso de apelação. A Lei nº 8.213/91, no artigo 42, estabelece os requisitos necessários para a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez, quais sejam: qualidade de segurado, cumprimento da carência, quando exigida, e moléstia incapacitante e insuscetível de reabilitação para atividade que lhe garanta a subsistência. O auxílio-doença, por sua vez, tem seus pressupostos previstos nos artigos 59 a 63 da Lei nº 8.213/91, sendo concedido nos casos de incapacidade temporária. É dizer: a incapacidade total e permanente para o exercício de atividade que garanta a subsistência enseja a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez; a incapacidade total e temporária para o exercício de atividade que garanta a subsistência justifica a concessão do benefício de auxílio-doença e a incapacidade parcial e temporária somente legitima a concessão do benefício de auxílio-doença se impossibilitar o exercício do labor ou da atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias pelo segurado. A condição de segurado (obrigatório ou facultativo), requisito para a concessão dos benefícios por incapacidade, decorre da inscrição no regime de previdência pública, cumulada com o recolhimento das contribuições correspondentes. O artigo 15 da Lei nº 8.213/91 dispõe sobre as hipóteses de manutenção da qualidade de segurado, independentemente de contribuições; trata-se do denominado período de graça, durante o qual remanesce o direito a toda a cobertura previdenciária. Confira-se: “Art. 15. Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições: I - sem limite de prazo, quem está em gozo de benefício; II - até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem remuneração; III - até 12 (doze) meses após cessar a segregação, o segurado acometido de doença de segregação compulsória; IV - até 12 (doze) meses após o livramento, o segurado retido ou recluso; V - até 3 (três) meses após o licenciamento, o segurado incorporado às Forças Armadas para prestar serviço militar; VI - até 6 (seis) meses após a cessação das contribuições, o segurado facultativo. § 1º O prazo do inciso II será prorrogado para até 24 (vinte e quatro) meses se o segurado já tiver pago mais de 120 (cento e vinte) contribuições mensais sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado. § 2º Os prazos do inciso II ou do § 1º serão acrescidos de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social. § 3º Durante os prazos deste artigo, o segurado conserva todos os seus direitos perante a Previdência Social." A doutrina e a jurisprudência são pacíficas no sentido de que não flui o período de graça, não perdendo a qualidade de segurado o trabalhador que deixou de contribuir para o RGPS por se encontrar impossibilitado de exercer atividades laborativas em decorrência da sua condição de saúde, e que teve seu benefício de auxílio doença ou aposentadoria por invalidez cessado indevidamente, ou ainda negada a sua concessão, quando comprovadamente se encontrava incapacitado. No que toca à prorrogação do período de graça ao trabalhador desempregado, não obstante a redação do §2º do artigo 15 da Lei nº. 8.213/1991 mencionar a necessidade de registro perante o Ministério do Trabalho e da Previdência Social para tanto, o Superior Tribunal de Justiça, em sede de Incidente de Uniformização de Interpretação de Lei Federal (Pet. 7.115), firmou entendimento no sentido de que a ausência desse registro poderá ser suprida quando outras provas constantes dos autos, inclusive a testemunhal, se revelarem aptas a comprovar a situação de desemprego. A perda da qualidade de segurado está disciplinada no §4º desse dispositivo legal, ocorrendo no dia seguinte ao do término do prazo para recolhimento da contribuição referente ao mês de competência imediatamente posterior ao final dos prazos para manutenção da qualidade de segurado. Depreende-se, assim, que o segurado mantém essa qualidade por mais um mês e meio após o término do período de graça, independente de contribuição, mantendo para si e para os seus dependentes o direito aos benefícios previdenciários. Anote-se que a eventual inadimplência das obrigações trabalhistas e previdenciárias acerca do tempo trabalhado como empregado deve ser imputada ao empregador, responsável tributário, conforme preconizado na alínea a do inciso I do artigo 30 da Lei nº 8.213/91, não sendo cabível a punição do empregado urbano pela ausência de recolhimentos, computando-se, assim, o período laborado para fins de verificação da qualidade de segurado. Quanto à carência, a redação original do artigo 25, inciso I, da Lei de Benefícios exige o cumprimento de 12 (doze) contribuições mensais para a concessão de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença, in verbis: "Art. 25. A concessão das prestações pecuniárias do Regime Geral de Previdência Social depende dos seguintes períodos de carência, ressalvado o disposto no art. 26:I - auxílio-doença e aposentadoria por invalidez: 12 (doze) contribuições mensais;". Na hipótese de perda da qualidade de segurado, o parágrafo único do artigo 24 da mencionada lei previa que as contribuições anteriores a essa data só seriam computadas para efeito de carência depois que o segurado contasse, a partir da nova filiação à Previdência Social, com, no mínimo, 1/3 (um terço) do número de contribuições exigidas para o cumprimento da carência definida para o benefício a ser requerido. Tal disposição foi revogada pela Medida Provisória nº 739/2016, de 07 de julho de 2016, que incluiu o parágrafo único no artigo 27 da Lei nº 8.213/91, dispondo que “No caso de perda da qualidade de segurado, para efeito de carência para a concessão dos benefícios de auxílio-doença, de aposentadoria por invalidez e de salário-maternidade, o segurado deverá contar, a partir da nova filiação à Previdência Social, com os períodos previstos nos incisos I e III do caput do art. 25”. Todavia, essa norma não foi convertida em lei dentro do prazo de 120 dias (05 de novembro de 2016), tendo perdido a eficácia com efeitos retroativos à data da edição, nos termos do §3º do artigo 62 da Constituição Federal de 1988, voltando, portanto, a viger a norma anterior. Anote-se que não tendo sido editado o decreto legislativo previsto no mencionado §3º, apenas as relações jurídicas constituídas e decorrentes de atos praticados sob a sua vigência conservar-se-ão por ela regidas, conforme disposto no §11 do mesmo artigo 62 da Lei Maior. Em 06 de janeiro de 2017, entrou em vigor a Medida Provisória nº 767/2017, que novamente revogou o parágrafo único do artigo 24, disciplinando a matéria por meio da inclusão do artigo 27-A na Lei nº 8.213/91, repetindo o texto da Medida Provisória nº 739/2016. Convertida na Lei nº 13.457/2017, a norma do art. 27-A foi modificada para exigir o recolhimento de metade das contribuições exigidas para a carência dos benefícios por incapacidade (para todos os segurados) e do salário-maternidade (para as seguradas contribuinte individual e facultativa). Na sequência, houve nova alteração do texto do artigo 27-A pela Medida Provisória nº 871/2019, de 18 de janeiro de 2019, que retomou a necessidade do cumprimento dos períodos integrais de carência previstos nos incisos I, III e IV do caput do art. 25. Por fim, convertida na Lei nº 13.846, de 2019, houve o restabelecimento da exigência da metade das contribuições, conforme anteriormente fixado na Lei nº 13.457/2017. Em resumo, na hipótese de perda da qualidade de segurado, para readquirir a carência necessária para fins da concessão dos benefícios de auxílio-doença, e de aposentadoria por invalidez, o segurado deverá, quando da data do requerimento administrativo, ter vertido: I) até 05/01/2017, 4 contribuições; II) de 06/01/2017 a 26/06/2017 (MP 767/2017), 12 contribuições; III) 27/06/2017 a 17/01/2019 (Lei 13.457/2017), 6 contribuições; IV) de 18/01/2019 a 17/06/2019 (MP 871/2019), 12 contribuições; e V) a partir de 18/06/2019, 6 contribuições. No caso dos autos, a parte autora, assistente administrativa, 59 anos na data da perícia, afirma ser portadora de patologias de natureza ortopédicas e clinicas, estando incapacitada para o trabalho. Os laudos médicos periciais na área de ortopedia e reumatologia, realizados em 09/11/2015 e 08/03/2017 (ID89040808) não atestaram incapacidade quanto às patologias alegadas. Ao exame físico realizado pelo segundo perito a autora apresentou queixa relacionada ao seu estado emocional que teria iniciado após a perda de seu marido e filho em condições trágicas (homicídio e suicídio). Sugeriu avaliação por médico psiquiatra. O laudo médico psiquiátrico, realizado em 21/08/2017 (ID 89040808), atesta que a parte autora é portadora de transtorno depressivo recorrente grave, sem sintomas psicóticos (CID 10 F33.2). Conclui pela incapacidade total e permanente para o trabalho. Estabelece o início da doença em fevereiro de 2012, com grande piora a partir de setembro/2012. O extrato do sistema CNIS (fls.18 – ID89040809) indica que a parte autora ingressou no RGPS em 1990, mantendo vínculos empregatícios, de forma descontínua, no período de 09/10/1990 a 08/2001, sendo o último vínculo, no período de 06/11/2001 a 25/09/2013; verteu contribuições como facultativo, em 11/2014; 05/2015; 04/2016; 11/2016; 05/2017 e 10/2017. Considerando o último vínculo empregatício cessado em 25/09/2013, o que lhe garantiu a qualidade de segurado até 15/11/2014, tem-se que na data do requerimento administrativo formulado em 25/06/2014, o autor preenchia os requisitos da qualidade de segurado e o cumprimento da carência. Assim, constatada a qualidade de segurado, o cumprimento da carência e a existência de incapacidade laboral total e permanente, com restrição para o trabalho, de rigor a concessão/manutenção a aposentadoria por invalidez. Quanto ao termo inicial do benefício, a Súmula n. 576 do STJ assim firmou entendimento: “Ausente requerimento administrativo no INSS, o termo inicial para a implantação da aposentadoria por invalidez concedida judicialmente será a data da citação válida. (Súmula 576, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 22/06/2016, DJe 27/06/2016)” Desta feita, havendo requerimento administrativo em 25/06/2014 - fls. 13, este é o termo inicial do benefício. No que tange aos critérios de atualização do débito, verifico que a sentença desborda do entendimento firmado pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no RE nº 870.947, tema de repercussão geral nº 810, em 20.09.2017, Relator Ministro Luiz Fux. Assim, as parcelas vencidas deverão ser atualizadas monetariamente e acrescidas de juros de mora pelos índices constantes do Manual de Orientação para a elaboração de Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta, observando-se, em relação à correção monetária, a aplicação do IPCA-e em substituição à TR – Taxa Referencial. Anoto que os embargos de declaração opostos perante o STF que objetivavam a modulação dos efeitos da decisão supra, para fins de atribuição de eficácia prospectiva, foram rejeitados no julgamento realizado em 03.10.2019. Por fim, é plenamente possível a antecipação dos efeitos da tutela contra a Fazenda Pública nas causas de natureza previdenciária e assistencial. Precedentes (STF, Rcl 1067 / RS, Tribunal Pleno, Relatora Min. Ellen Gracie, j. 05/9/2002, v.u., DJ 14/02/2003, p. 60; STJ, RESP 539621, Sexta Turma, Relator Min. Hamilton Carvalhido, j. 26/5/2004, v.u., DJ 02/8/2004, p. 592). Em relação ao pedido de suspensão da tutela antecipada, o mesmo não deve ser acolhido, visto que a mencionada antecipação foi concedida na sentença, conforme avaliação do Juízo "a quo", que entendeu configurados os requisitos autorizadores da concessão do benefício, nos termos do artigo 300 do Código de Processo Civil/2015, o que torna possível o recebimento da apelação apenas no efeito devolutivo, nos termos do art. 1012, § 1º, inciso V do CPC/2015. Ressalte-se que a presente ação é de natureza alimentar, o que por si só evidencia o risco de dano irreparável, tornando viável a antecipação dos efeitos da tutela. Os honorários advocatícios devem ser fixados em 10% do valor da condenação até a data da prolação da sentença, de acordo com a Súmula n.º 111 do Superior Tribunal de Justiça e o disposto §§ 2º e 3º do artigo 85 do Código de Processo Civil/2015, sendo este o entendimento pacífico desta E. Seção, mantenho, entretanto, conforme fixado na sentença, a fim de evitar prejuízo ao recorrente. Considerando o não provimento do recurso do INSS, de rigor a aplicação da regra do §11 do artigo 85 do CPC/2015, pelo que determino, a título de sucumbência recursal, a majoração dos honorários de advogado arbitrados na sentença em 2%. Ante o exposto, não conheço do reexame necessário, nego provimento ao apelo do INSS e, de ofício, corrijo a sentença para fixar os critérios de atualização do débito, nos termos da fundamentação. Mantida a tutela. É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. REEXAME NÃO CONHECIDO. APELAÇÃO CÍVEL. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. REQUISITOS PREENCHIDOS. TERMO INICIAL. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. MANUAL DE CÁLCULOS NA JUSTIÇA FEDERAL. HONORÁRIOS DE ADVOGADO.
1. O valor total a condenação será inferior à importância de 1.000 (mil) salários mínimos estabelecida no inciso I do §3º do artigo 496 do Código de Processo Civil de 2015. Reexame não conhecido.
2. Qualidade de segurado e carência comprovados pelo extrato CNIS. Laudo médico pericial e demais documentos do conjunto probatório indicam a existência de incapacidade, com restrição para a atividade laborativa. Aposentadoria por invalidez concedida.
3. Havendo requerimento administrativo este é o termo inicial do benefício.
4. Juros e correção monetária pelos índices constantes do Manual de Orientação para a elaboração de Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta, observando-se, em relação à correção monetária, a aplicação do IPCA-e em substituição à TR – Taxa Referencial, consoante decidido pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no RE nº 870.947, tema de repercussão geral nº 810, em 20.09.2017, Relator Ministro Luiz Fux.
5. Sucumbência recursal. Aplicação da regra do §11 do artigo 85 do CPC/2015. Majoração dos honorários de advogado arbitrados na sentença em 2%.
6.Reexame não conhecido. Apelação do INSS não provida. Sentença corrigida de ofício. Tutela mantida.