Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0017473-57.2017.4.03.9999

RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: MARIA AUGUSTA DE CARVALHO

Advogado do(a) APELADO: DIANA CRISTINA FERREIRA AYRES DE OLIVEIRA - SP269683-N

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0017473-57.2017.4.03.9999

RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: MARIA AUGUSTA DE CARVALHO

Advogado do(a) APELADO: DIANA CRISTINA FERREIRA AYRES DE OLIVEIRA - SP269683-N

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

R E L A T Ó R I O

 

Trata-se de ação em que se objetiva a concessão de benefício assistencial de prestação continuada, previsto no artigo 203, V, da Constituição Federal à pessoa idosa.

A sentença, prolatada em 20.05.2016, julgou procedente o pedido inicial e condenou o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS à concessão do benefício à parte autora conforme dispositivo que ora transcrevo: “Ante o exposto, nos termos do art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO PROCEDENTE o pedido para conceder a MARIA AUGUSTA DE CARVALHO o benefício da prestação continuada de um salário mínimo mensal, a contar da data da citação do requerido, ou seja, 21 de outubro de 2014, sendo: Os juros de mora, contados desde a citação conforme a seguinte sistemática 1) no patamar de 0,5% ao mês, nos termos dos arts. 1062 do Código Civil de 1916 e 219 do Código de Processo Civil até a entrada em vigor do Novo Código Civil, ou seja, até 11/01/2003; 2) a partir desta data, juros de 1% ao mês, de acordo com o artigo 406 do novo Código Civil c.c. artigo 161, § 1º, do Código Tributário Nacional, até 30/06/2009 (quando entrou em vigora Lei nº 11.960/09); 3) a partir disso, juros moratórios calculados com base no índice oficial de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança, nos termos do disposto no art. 1º - F da Lei 9.494/97, com redação dada pela Lei 11.960/2009. Correção monetária, sobre as prestações em atraso, desde as respectivas competências, da seguinte forma 1) pelo INPC, a partir de 11/08/2006 até 30/06/2009,conforme art. 31, da Lei nº 10741/2003, c.c. o art. 41-A, da Lei nº 8.213/91 (redação dada pela MP 316/06 convertida na Lei nº 11.340, de 26/12/2006); 2) após 30/06/2009, com base no índice oficial de remuneração básica da caderneta de poupança (TR), nos termos da Emenda Constitucional nº 62/2009, até 2503/2015; 3) após 25/03/2015, Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial (IPCA-E), de acordo com decisão do Supremo Tribunal Federal em questão de ordem nas ADIs 4357 e 4425. Condeno o réu ao pagamento de honorários advocatícios que fixo em 10% sobre o valor da condenação, considerando-se as parcelas vencidas até a prolação da sentença, a teor da Súmula 111, do STJ. Isento o vencido do pagamento das custas processuais, nos termos do artigo 8º, § 1º, da Lei nº 8.620/93, não havendo reembolso de despesas, posto ser a autora beneficiária da Justiça Gratuita. Concedo a tutela antecipada, nos termos da fundamentação. Oficie-se nominalmente ao Gerente de Agência de Previdência de Demandas Judicias competente, para que no prazo de sessenta (60) dias, proceda a implantação do benefício previdenciário em favor da parte autora, sob pena de fixação de multa diária pelo descumprimento, sem prejuízo da abertura de inquérito policial para apuração de responsabilidade pelo crime de desobediência à ordem judicial. Ciência ao Ministério Púbico. Publique-se. Registre-se. Intimem-se.”

Apela o Instituto Nacional do Seguro Social – INSS requerendo a reforma da sentença ao fundamento que não restou comprovada a existência de miserabilidade da parte autora a amparar a concessão do benefício. Subsidiariamente, pugna pela:

- fixação do termo inicial do benefício na data da juntada do laudo pericial;

- redução da verba honorária;

- atualização do débito nos termos da Lei n. 11.960/2009;

Com contrarrazões da parte autora, subiram os autos a esta Corte.

O Ministério Público Federal, em seu parecer, opinou pela extinção do feito sem resolução do mérito, haja vista a falta de interesse de agir. Subsidiariamente, pelo provimento do recurso. Na hipótese dessa E. Turma entender que o benefício deva ser concedido, requer-se a exclusão da condenação o pagamento de honorários advocatícios ou que eles sejam suportados pelo orçamento do Poder Judiciário.

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 


APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0017473-57.2017.4.03.9999

RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

APELADO: MARIA AUGUSTA DE CARVALHO

Advogado do(a) APELADO: DIANA CRISTINA FERREIRA AYRES DE OLIVEIRA - SP269683-N

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V O T O

 

 

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso do INSS.

Rejeito a questão preliminar arguida pelo Ministério Público Federal.

É verdade que o art. 5º, XXXV, da Constituição, assegura o pleno acesso ao Poder Judiciário para a proteção dos cidadãos em caso de lesão ou ameaça a direito. Contudo, essa garantia fundamental não deixa de trazer em si a exigência da existência de uma lide, justificando a atuação do Poder Judiciário como forma democrática de composição de conflitos, o que também se revela como interesse de agir (necessidade e utilidade da intervenção judicial).

Existindo lide (provável ou concreta), é perfeitamente possível o acesso direto à via judicial, sem a necessidade de prévio requerimento na via administrativa.

Contudo, em casos nos quais a lide não está claramente caracterizada, vale dizer, em situações nas quais é potencialmente possível que o cidadão obtenha a satisfação de seu direito perante a própria Administração Pública, é imprescindível o requerimento na via administrativa, justamente para a demonstração da necessidade da intervenção judicial e, portanto, do interesse de agir que compõe as condições da ação. Imprescindível, assim, a existência do que a doutrina processual denomina de fato contrário, a caracterizar a resistência à pretensão do autor.

Deveras, de acordo com o entendimento jurisprudencial adotado por esta Corte Regional, tratando-se de ação de cunho previdenciário, ainda que não se possa condicionar a busca da prestação jurisdicional ao exaurimento da via administrativa, tem-se por razoável exigir que o autor tenha ao menos formulado um pleito administrativo - e recebido resposta negativa - de forma a demonstrar a necessidade de intervenção do Poder Judiciário ante a configuração de uma pretensão resistida.

Conclui-se, assim, pela aplicação aos segurados da exigência de prévia provocação da instância administrativa para obtenção do benefício e, somente diante de sua resistência, viabilizar a propositura de ação judicial.

Aliás, é nesse sentido a decisão do Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário 631.240/MG, com repercussão geral reconhecida:

"RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO E INTERESSE EM AGIR.

1. A instituição de condições para o regular exercício do direito de ação é compatível com o art. 5º, XXXV, da Constituição. Para se caracterizar a presença de interesse em agir, é preciso haver necessidade de ir a juízo.

2. A concessão de benefícios previdenciários depende de requerimento do interessado, não se caracterizando ameaça ou lesão a direito antes de sua apreciação e indeferimento pelo INSS, ou se excedido o prazo legal para sua análise. É bem de ver, no entanto, que a exigência de prévio requerimento não se confunde com o exaurimento das vias administrativas.

3. A exigência de prévio requerimento administrativo não deve prevalecer quando o entendimento da Administração for notória e reiteradamente contrário à postulação do segurado.

4. Na hipótese de pretensão de revisão, restabelecimento ou manutenção de benefício anteriormente concedido, considerando que o INSS tem o dever legal de conceder a prestação mais vantajosa possível, o pedido poderá ser formulado diretamente em juízo - salvo se depender da análise de matéria de fato ainda não levada ao conhecimento da Administração -, uma vez que, nesses casos, a conduta do INSS já configura o não acolhimento ao menos tácito da pretensão.

5. Tendo em vista a prolongada oscilação jurisprudencial na matéria, inclusive no Supremo Tribunal Federal, deve-se estabelecer uma fórmula de transição para lidar com as ações em curso, nos termos a seguir expostos.

6. Quanto às ações ajuizadas até a conclusão do presente julgamento (03.09.2014), sem que tenha havido prévio requerimento administrativo nas hipóteses em que exigível, será observado o seguinte: (i) caso a ação tenha sido ajuizada no âmbito de Juizado Itinerante, a ausência de anterior pedido administrativo não deverá implicar a extinção do feito; (ii) caso o INSS já tenha apresentado contestação de mérito, está caracterizado o interesse em agir pela resistência à pretensão; (iii) as demais ações que não se enquadrem nos itens (i) e (ii) ficarão sobrestadas, observando-se a sistemática a seguir.

7. Nas ações sobrestadas, o autor será intimado a dar entrada no pedido administrativo em 30 dias, sob pena de extinção do processo. Comprovada a postulação administrativa, o INSS será intimado a se manifestar acerca do pedido em até 90 dias, prazo dentro do qual a Autarquia deverá colher todas as provas eventualmente necessárias e proferir decisão. Se o pedido for acolhido administrativamente ou não puder ter o seu mérito analisado devido a razões imputáveis ao próprio requerente, extingue-se a ação. Do contrário, estará caracterizado o interesse em agir e o feito deverá prosseguir.

8. Em todos os casos acima - itens (i), (ii) e (iii) -, tanto a análise administrativa quanto a judicial deverão levar em conta a data do início da ação como data de entrada do requerimento, para todos os efeitos legais.

9. Recurso extraordinário a que se dá parcial provimento, reformando-se o acórdão recorrido para determinar a baixa dos autos ao juiz de primeiro grau, o qual deverá intimar a autora - que alega ser trabalhadora rural informal - a dar entrada no pedido administrativo em 30 dias, sob pena de extinção. Comprovada a postulação administrativa, o INSS será intimado para que, em 90 dias, colha as provas necessárias e profira decisão administrativa, considerando como data de entrada do requerimento a data do início da ação, para todos os efeitos legais. O resultado será comunicado ao juiz, que apreciará a subsistência ou não do interesse em agir." (Tribunal Pleno, Rel. Min. Roberto Barroso,DJe 10/11/2014)

Contudo, nas ações ajuizadas em data anterior à essa decisão, há que se observar as regras de transição nele estabelecidas.

No caso, o feito foi ajuizado em 13.06.2014, data anterior ao julgamento do paradigma de repercussão geral. O Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, por sua vez, apresentou contestação, o que, consoante a modulação de efeitos ali consignada, caracteriza o interesse de agir consubstanciado na resistência à lide.

Ademais, verifica-se que o feito se encontra sentenciado com análise de mérito, tendo sido julgada procedente a pretensão do autor com a concessão do benefício pretendido. Desta forma, ainda que não tenha havido o requerimento administrativo prévio, que em um primeiro momento poderia se caracterizar como um impeditivo para o prosseguimento do feito, nesta fase processual não se mostra aceitável a sua exigência, posto que mais do que constituída a lide, já foi declarado o direito.

Passo ao exame do mérito

Considerando que a sentença se enquadra entre as hipóteses de exceção de submissão ao reexame necessário previstas nos § 3º e 4º do artigo 496 do CPC/2015, restrinjo o julgamento apenas à insurgência recursal.

O benefício assistencial de prestação continuada, previsto no artigo 203, V, da Constituição Federal, é devido ao portador de deficiência (§2º do artigo 20 da Lei nº 8.742/93, com a redação dada pela Lei nº 12.470/2011) ou idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais (artigo 34 da Lei nº 10.741/2003) que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família.

O artigo 20, § 3º da Lei 8742/93 considera incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011).

A constitucionalidade dessa norma foi questionada na ADI 1.232-1/DF, tendo o Plenário do Supremo Tribunal Federal, por maioria, decidido pela improcedência do pedido, ao fundamento que a fixação da renda per capita no patamar de ¼ do salário mínimo sugere a presunção absoluta de pobreza. Concluiu, contudo, que não é a única forma suscetível de se aferir a situação econômica da família do idoso ou portador de deficiência.

Posteriormente, a Corte Suprema enfrentou novamente a questão no âmbito da Reclamação 4374 - PE que, julgada em 18/04/2013, reconhecendo a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do § 3º, art. 20 da Lei 8.742/1993, decorrente de notórias mudanças fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios assistenciais por parte do Estado brasileiro).

Restou decidido que a norma é inconstitucional naquilo que não disciplinou, não tendo sido reconhecida a incidência taxativa de qualquer critério para aferição da hipossuficiência, cabendo ao legislador fixar novos parâmetros e redefinir a política pública do benefício assistencial a fim de suprimir o vício apontado.

Desta forma, até que o assunto seja disciplinado, é necessário reconhecer que o quadro de pobreza deve ser aferido em função da situação específica de quem pleiteia o benefício, pois, em se tratando de pessoa idosa ou com deficiência, é através da própria natureza de seus males, de seu grau e intensidade, que poderão ser mensuradas suas necessidades.

Não há como enquadrar todos os indivíduos em um mesmo patamar, nem tampouco entender que aqueles que contam com menos de ¼ do salário-mínimo fazem jus obrigatoriamente ao benefício assistencial ou que aqueles que tenham renda superior não o façam.

Com relação ao cálculo da renda per capita em si, o Superior Tribunal de Justiça, em sede de recurso repetitivo REsp 1.355.052/SP, em conformidade com a decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal no RE 580.963/PR, definiu que a se aplica,  por analogia, a regra do parágrafo único do artigo 34 do Estatuto do Idos0 (Lei 10.741/03),  a pedido de benefício assistencial formulado por pessoa com deficiência, a fim de que qualquer benefício previdenciário recebido por idoso, no valor de um salário mínimo, não seja computado na sua aferição.

Por fim, entende-se por família, para fins de verificação da renda per capita, nos termos do §1º do artigo 20 da Lei nº 8.742/93, com a redação dada pela Lei nº 12.435/2011, o conjunto de pessoas composto pelo requerente, o cônjuge, o companheiro, a companheira, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto.

Contudo, em que pese a princípio os filhos casados ou que não coabitem sob o mesmo teto não integrem o núcleo familiar para fins de aferição de renda per capita, nos termos da legislação específica, não se pode perder de vista que o artigo 203, V, da Constituição Federal estabelece que o benefício é devido quando o idoso ou deficiente não puder prover o próprio sustento ou tê-lo provido pela família. Por sua vez, a regra do artigo 229 da Lei Maior dispõe que os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade, premissa também assentada nos artigos 1694 a 1697 da lei Civil.

Depreende-se assim que o dever de sustento do Estado é subsidiário, não afastando a obrigação da família de prestar a assistência, pelo que, como já dito, o artigo 20, § 3º, da LOAS não pode ser interpretado de forma isolada na apuração da miserabilidade.

Tecidas tais considerações, no caso dos autos a sentença de primeiro grau julgou procedente o pedido com base nos elementos contidos no estudo social, produzido pelo perito do Juízo, tendo se convencido restarem configuradas as condições necessárias para a concessão do benefício. Confira-se:

“A ação é procedente.Com efeito, o relatório social (fls. 42/46) e documentos de fls. 08 e 13/15evidenciam que, além de idosa, o núcleo familiar da autora é composto por quatro pessoas, cuja renda per capita é de R$ 247,00 (duzentos e quarenta e sete reais), proveniente da aposentadoria do marido da autora, no valor de R$ 788,00 (setecentos e oitenta e oito reais), amoldando-se, portanto, às exigências da Lei n° 8.742/93.E, ainda que assim não fosse, de mais a mais, reputo inconstitucional a exigência contida no artigo 20, § 3º, da Lei 8.742/93, no sentido de que a o benefício assistencial somente seja deferido a pessoa cuja renda mensal familiar seja inferior a um quarto do salário mínimo. É que dentre os fundamentos da República Federativa do Brasil, insculpidos no artigo 1o., da Constituição Federal, encontra-se o da dignidade humana. Neste diapasão, exsurge hialino que a exigência contida na Lei n.º 8.742/93 não pode prevalecer, pois ofende frontalmente ao princípio da dignidade da pessoa humana, agasalhado constitucionalmente, inviabilizando a implementação do dispositivo constitucional, tornando-o totalmente inócuo e inoperante, o que é inadmissível. Válido, nestes termos, transcrever a seguinte ementa jurisprudencial: “É inconstitucional a norma contida no artigo 20 da Lei n.º 8.742/93, que impõe a necessidade de comprovação de que a renda própria ou familiar per capita seja inferior a ¼ do salário mínimo”(TRF 3a. Região AC 03068000-96, Rel. Juiz Aricê Amaral).Insta salientar, por oportuno, que não há necessidade de cumprimento do período de carência, visto que o benefício tem natureza assistencial, nos termos do artigo 203, da Constituição Federal, combinado com o artigo 20 da Lei 8.742/93.Portanto, a autora preenche os requisitos legais e faz jus à percepção do benefício de prestação continuada objeto destes autos, cujo termo a quo será a data da citação (art. 219 do Código de Processo Civil)”

Por sua vez, o estudo social (ID 87778946 – pág. 50/54), elaborado em 07.2015, revela que a parte autora reside com seu marido, uma filha e uma neta (menor de idade) em imóvel alugado, com dois quartos, sala, cozinha, banheiro e área de serviço. A casa está adequadamente guarnecida com mobiliário em bom estado de uso.

A renda da casa advém da aposentadoria do marido da autora no valor de um salário mínimo (R$ 788,00). Consta ainda que a neta da autora recebe pensão alimentícia no valor de R$ 200,00. Também recebem R$ 102,00 do programa social Bolsa Família.

Relataram despesas com aluguel (R$ 330,00) energia (R$ 56,00), água (R$ 40,00), gás (R$ 45,00), farmácia (R$ 100,00), alimentação básica (R$ 350,00) e empréstimo bancário (R$153,00), perfazendo total de R$ 1.074,00.

A perita social emitiu parecer nos termos que seguem: “Entendo que mesmo a renda per capta ultrapassar do valor permitido por Lei para o recebimento do BPC (Benefício de Prestação Continuada) a requerente deve receber o benefício, pois além de ser idosa, vive em situação de vulnerabilidade social.”

Consta ainda que: “A requerente apresenta vários problemas de saúde como coração, falta de ar que dificulta para andar e realizar os afazeres de casa, osteoporose, hipertensão, diabetes, colesterol, problemas no intestino (necessitando de medicamentos para evacuar) no momento está com bactéria no estomago. Toma vários medicamentos como: ASS- circulação, 46 e Plantalyve - laxante, Sinvastatina-colesterol, Sustrate- coração, Bissulfato de Clopidogrel - coração,Tenolon e Hidroctorotiazida- Hipertensão, Clonezepam O2mg e Diazepan lOmg -calmante, Cloridrato de Metomorfina- diabetes, Lansoprazol 330mg + Claritrimicina 500mg + Amoxilina tridratada 500mg, omeprazol, hidróxido de aluminio, cemitidina, Glibenclamida 5mg = estomago. Narciso o esposo é hipertenso, a filha e a neta não tomam medicamentos. Os afazeres domésticos são realizados pela filha, pois a requerente não consegue devido aos problemas de saúde que possui.”.

Nota-se que a renda do casal é insuficiente para o pagamento das despesas básicas e que a autora depende dos cuidados que a filha que com eles reside dispensa ao casal.

Verifica-se, assim, que o MM. Juiz sentenciante julgou de acordo com as provas carreadas aos autos e, demonstrada a vulnerabilidade socioeconômica e hipossuficiência da parte autora, de rigor a manutenção da sentença de procedência do pedido por seus próprios fundamentos.

Quanto ao termo inicial da benesse, é firme a jurisprudência no sentido de o termo inicial do benefício assistencial deve ser fixado na data do seu pedido administrativo e, na sua ausência, na data da citação.

Nesta seara, ausente o requerimento administrativo, o termo inicial do benefício deve ser mantido na data da citação (21.10.2014 – ID 8778946 – pag. 29).

No que tange aos critérios de atualização do débito, verifico que a sentença desborda do entendimento firmado pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no RE nº 870.947, tema de repercussão geral nº 810, em 20.09.2017, Relator Ministro Luiz Fux.

Assim, tratando-se de matéria cognoscível de ofício (AgRg no AREsp 288026/MG, AgRg no REsp 1291244/RJ), corrijo a sentença e estabeleço que as parcelas vencidas deverão ser atualizadas monetariamente e acrescidas de juros de mora pelos índices constantes do Manual de Orientação para a elaboração de Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta, observando-se, em relação à correção monetária, a aplicação do IPCA-e em substituição à TR – Taxa Referencial. Anoto que os embargos de declaração opostos perante o STF que objetivavam a modulação dos efeitos da decisão supra, para fins de atribuição de eficácia prospectiva, foram rejeitados no julgamento realizado em 03.10.2019.

Os honorários de advogado foram corretamente fixados em 10% do valor da condenação, consoante o entendimento desta Turma e o disposto §§ 2º e 3º do artigo 85 do Código de Processo Civil/2015, considerando as parcelas vencidas até a data da sentença, nos termos da Súmula nº 111 do Superior Tribunal de Justiça.

Diante do exposto, de ofício, corrijo a sentença para fixar os critérios de atualização do débito, rejeito a preliminar arguida pelo Ministério Público Federal e, no mérito, NEGO PROVIMENTO à apelação do INSS, nos termos da fundamentação exposta.

É o voto.


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



 

 

 

 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0017473-57.2017.4.03.9999

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Advogado do(a) APELADO: DIANA CRISTINA FERREIRA AYRES DE OLIVEIRA - SP269683-N

 

 

 

EMENTA
 
 

APELAÇÃO CÍVEL. PRELIMINAR FALTA DE INTERESSE DE AGIR REJEITADA. AUSÊNCIA DE PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. FEITO CONTESTADO E SENTENCIADO COM ANÁLISE DE MÉRITO. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. ASSISTÊNCIA SOCIAL. IDOSO. HIPOSSUFICIÊNCIA/MISERABILIDADE. REQUISITO PREENCHIDO. TERMO INICIAL DO BENEFÍCIO. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. MANUAL DE CÁLCULOS DA JUSTIÇA FEDERAL. HONORÁRIOS DE ADVOGADO.

1. Preliminar de falta de interesse de agir rejeitada. Na presente demanda verifica-se que o Instituto Nacional do Seguro Social – INSS apresentou contestação, o que caracteriza o interesse de agir consubstanciado na resistência à lide.  RE 631.240/MG. Acrescenta-se que o feito se encontra sentenciado com análise de mérito, tendo sido julgada procedente a pretensão da parte autora com a concessão do benefício pretendido. Incabível a exigência do prévio requerimento administrativo nesta fase processual, posto que mais do que constituída a lide e já foi declarado o direito.

2. O benefício assistencial de prestação continuada, previsto no artigo 203, V, da Constituição Federal, é devido ao portador de deficiência (§2º do artigo 20 da Lei nº 8.742/93, com a redação dada pela Lei nº 12.470/2011) ou idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais (artigo 34 da Lei nº 10.741/2003) que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família.

3. Requisito de miserabilidade/hipossuficiência preenchido. Laudo social indica que a parte autora encontra-se sem condições de suprir suas necessidades básicas ou de tê-las supridas por sua família.

4. Termo inicial do benefício mantido na data da citação. Precedentes STJ.

5. Critérios de atualização do débito corrigidos de ofício.

6. Honorários de advogado mantidos em 10% do valor da condenação, consoante o entendimento desta Turma e o disposto §§ 2º e 3º do artigo 85 do Código de Processo Civil/2015 e Súmula nº 111 do Superior Tribunal de Justiça. 

7. Sentença corrigida de ofício. Preliminar arguida pelo Ministério Público Federal rejeitada. Apelação do INSS não provida.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu de ofício corrigir a sentença para fixar os critérios de atualização do débito rejeitar a questão preliminar arguida pelo Ministério Público Federal e negar provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.