Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 0008242-42.2003.4.03.6104

RELATOR: Gab. 10 - DES. FED. ANTONIO CEDENHO

APELANTE: UNIAO FEDERAL, INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVAVEIS

Advogado do(a) APELANTE: VERIDIANA BERTOGNA - SP210268

APELADO: MUNICIPIO DE SAO VICENTE, MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP

Advogado do(a) APELADO: FLAVIA DA CUNHA LIMA - SP134557

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 


 

  

APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO (1728) Nº 0008242-42.2003.4.03.6104

RELATOR: Gab. 10 - DES. FED. ANTONIO CEDENHO

APELANTE: UNIAO FEDERAL, INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVAVEIS

Advogado do(a) APELANTE: VERIDIANA BERTOGNA - SP210268

APELADO: MUNICIPIO DE SAO VICENTE, MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP

Advogado do(a) APELADO: FLAVIA DA CUNHA LIMA - SP134557

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

 

 

Trata-se de Embargos de Declaração opostos pela UNIÃO FEDERAL, contra o v. acórdão assim ementado, ID n.° 107861575:

 

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. RETORNO DOS AUTOS DO C. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. DETERMINAÇÃO DE NOVO JULGAMENTO. EFEITOS INFRINGENTES. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DANO AMBIENTAL. ATRIBUIÇÕES DO IBAMA. EXIGÊNCIA DE EIA/RIMA. PEDIDO DE VISTORIAS EM TODO ESPAÇO COMPREENDIDO PELA PRAIA E PELO MAR DOS MUNICÍPIOS LITORÂNEOS DA 4ª SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DA 3ª REGIÃO. EXTENSÃO DA ÁREA. RECURSOS FINANCEIROS DO IBAMA. EMBARAÇO AO DIREITO DE DEFESA. DETERMINAÇÃO DE AUTO DE INFRAÇÃO. DISCRICIONARIEDADE ADMINISTRATIVA. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO ACOLHIDOS COM EFEITO MODIFICATIVO.

1. Trata-se de ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público Federal em face da União Federal e do Ibama, visando, resumidamente, que os réus sejam impedidos de edificar ou autorizar edificações, de quaisquer espécies, sem a prévia aprovação do estudo de impacto ambiental (EIA/RIMA) e que realizem vistorias no espaço compreendido pela praia e pelo mar dos municípios abrangidos pela jurisdição da 4ª Subseção Judiciária da 3ª Região.

2. Aduz o Ministério Público Federal que o IBAMA está adotando conduta omissiva no desempenho de suas atribuições, uma vez que deixa de exigir estudo de impacto ambiental (EIA/RIMA), consoante a Lei n.° 7.661/88, no tocante às edificações realizadas na orla da praia, notadamente na Praia do Itararé, no Município de São Vicente, e na Plataforma do Emissário Submarino, no Município de Santos.

3. A r. sentença julgou parcialmente procedentes os pedidos, para determinar, em síntese, que os réus sejam impedidos de edificarem ou autorizarem edificações, obras ou atividades, de quais espécies, sem a prévia autorização do EIA/RIMA, e que realizem vistorias no espaço compreendido pela praia e no mar de todos os municípios litorâneos da 4ª Subseção Judiciária.

4. A Colenda Terceira Turma do Egrégio Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, deu provimento à remessa oficial e às apelações da União Federal e do Ibama para extinguir o feito, sem a resolução do mérito, sob o fundamento de impossibilidade jurídica do pedido.

5. O Ministério Público Federal apresentou embargos de declaração, a fim de sanar as contradições, obscuridades e omissões apontadas, julgando-se improcedentes os recursos interpostos e a remessa necessária para manter a r. sentença de 1° grau.

6. Ademais, o "parquet" ofereceu recurso especial, requerendo a reforma do v. acórdão que julgou extinto o feito, sem a resolução do mérito, e determinando o retorno dos autos à origem para que sejam supridas as falhas apontadas.

7. O Colendo Superior Tribunal de Justiça deu provimento ao recurso especial e determinou a devolução dos autos a esta Corte, para novo julgamento dos embargos de declaração, a fim de sanar as omissões, contradições e obscuridades apontadas pelo Ministério Público Federal.

8. O Superior Tribunal de Justiça atestou que "em se tratando de ação civil pública que envolve direitos difusos, verifico que a questão referente ao disposto na legislação infraconstitucional invocada como violada, principalmente quanto ao tema da distinção dos pedidos cumulativos elencados na inicial, não foi suficientemente analisada no acórdão questionado."

9. O caráter infringente dos embargos somente é admitido a título excepcional, quando a eliminação da contradição ou da omissão decorrer, logicamente, a modificação do julgamento embargado. No caso em comento, realmente a questão merece esclarecimento.

10. Deve o IBAMA agir a fim de evitar e reprimir a degradação ambiental, podendo ser demandado na hipótese de omissão na fiscalização ambiental ou atuação deficiente, pois o art. 3º, IV, da Lei n.º 6.938/81 define poluidor como sendo a pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável, direta ou indiretamente, pela atividade de degradação ambiental.

11. O princípio da prevenção ambiental, extraído do art. 225 da Constituição Federal, impõe a realização do EIA/RIMA como condicionante ao licenciamento de todas atividades que potencialmente venham a acarretar danos ambientais.

12. O estudo de impacto ambiental é um instrumento basilar na defesa do meio ambiental, considerando os aspectos e repercussões antes da realização da obra potencialmente degradadora, seguindo as diretrizes fixadas na Lei n.° 6.938/81.

13. Necessário acolher a pretensão do Ministério Público de impedir os réus de edificarem ou autorizarem edificações, de obras ou atividades que potencialmente venham a acarretar danos ambientais, permanente ou sazonal, sem a prévia aprovação do EIA/RIMA, nos termos da Lei n.° 7.661/88.

14. No caso em comento, o Ministério Público Federal requer a declaração de que as áreas originalmente ocupadas pelas praias, e que tenham sido descaracterizadas artificial e ilegalmente, permanecem como bens de uso comum do povo, merecendo a tutela relativa ao EIA/RIMA, ao livre e franco acesso e à restrição para destinação prevista na Lei n.° 9.636/98.

15. O artigo 20, inciso IV, da Carta Magna menciona que as praias marítimas são bens da União e o artigo 10 da Lei n.° 7.661/98 dispõe que as praias são bens públicos de uso comum do povo, sendo assegurado, sempre, livre e franco acesso a elas e ao mar.

16. O artigo 18 da Lei n.° 9.636/98 dispõe que, na destinação à execução de empreendimento de fim lucrativo, a cessão será onerosa e, sempre que houver condições de competitividade, serão observados os procedimentos licitatórios previstos em lei, em consonância com o valor de mercado, em razão de eventual exploração econômica.

17. Por outro lado, a pretensão do Ministério Público Federal de compelir a União e o Ibama a realizarem vistorias, no espaço compreendido pela praia e pelo mar de todos os municípios litorâneos da 4ª Subseção Judiciária da 3ª Região, com apresentação de documentos e informações, deve ser julgado improcedente.

18. Ao estabelecer o pedido de realização de vistorias em todo o espaço compreendido pela praia e pelo mar de todos os municípios litorâneos da 4ª Subseção Judiciária da 3ª Região, com prazo e modos determinados, o Ministério Público Federal busca realizar a própria atividade do IBAMA e da União.

19. Importa ressaltar que os danos ambientais não podem ser presumidos ou hipotéticos para todo o espaço compreendido pela praia e pelo mar de todos os municípios litorâneos da 4ª Subseção Judiciária da 3ª Região, razão pela qual necessitam de indícios para embasar a pretensão e delimitar a área de realização das vistorias.

20. Chega-se à conclusão de que, além de tornar excessivamente incerto o objeto da ação, acarreta evidente embaraço ao exercício do direito de defesa pelo Ibama e pela União, sendo inviável rebater, precisamente, a pretensão do "parquet", conforme o art. 300 do CPC/73.

21. Acerca do pedido de realização de vistorias, o juízo "a quo" reconheceu que "a complexidade na execução denota-se pelos anos e anos de ocupação irregular, não se sabendo, ao certo, por quem nem por quantos; ademais, sem sujeição a qualquer fiscalização".

22. Além disso, o pedido de realização de vistorias em todo o espaço compreendido pela praia e no mar de todos os municípios litorâneos da 4ª Subseção Judiciária da 3ª Região, no período de 36 (trinta e seis) meses, interfere nos próprios recursos financeiros do Ibama.

23. Tendo em vista que o Ministério Público Federal requereu a realização de vistorias sem especificações mínimas para o Ibama e a União identificarem a pretensão, considerando a extensão da praia e do mar de todos os municípios litorâneos da 4ª Subseção Judiciária da 3ª Região, ocasionando embaraço ao exercício do direito de defesa, cumpre atestar a improcedência do pedido.

24. Outrossim, deve ser julgado improcedente o pedido do "parquet" no sentido do Ibama e da União serem compelidos a lavrar autos de infração, em relação às edificações que tenham sido implantadas sem o prévio conhecimento da União e/ou do Ibama.

25. Há de se ter em mente a indevida interferência do Ministério Público Federal e do Poder Judiciário na discricionariedade administrativa, afrontando o princípio da separação dos poderes.

26. Importante registrar que a administração necessita de uma certa margem discricionária no exercício de suas funções e na adequação dos casos concretos aos interesses administrativos.

27. O juízo de discricionariedade é meio de exteriorização da vontade administrativa, correspondendo à liberdade para, diante da situação concreta, optar por uma solução possível, desde que amparada na legislação correlata.

28. Convém mencionar que o duplo grau de jurisdição não impede os efeitos da antecipação da tutela, confirmada pela sentença, mesmo que sujeita ao reexame necessário, conforme a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça.

29. Além do mais, a parte apelante não traz nenhum argumento concreto que justifique a concessão do efeito suspensivo. Isto é, trata-se de alegações genéricas, que não são suficientes a justificar a aplicação da excepcionalidade do efeito suspensivo ao recurso de apelação, consoante o artigo 14 da Lei n.° 7.347/85.

30. Ressalta-se que a jurisprudência do E. Superior Tribunal de Justiça é consolidada no sentido da não condenação ao pagamento de honorários advocatícios em ação civil pública, salvo em caso de litigância de má-fé do Ministério Público Federal.

31. Com efeito, cumpre determinar que a União Federal e o Ibama sejam impedidos de edificarem ou autorizarem edificações de quaisquer espécies, permanentes ou sazonais, de obras ou atividades que potencialmente venham a acarretar danos ambientais, sem a prévia aprovação do EIA/RIMA, nos termos da Lei n.° 7.661/88, bem como que a União seja impedida de ceder espaços no mar e nas praias, sem observar os parâmetros do artigo 18 da Lei n.° 9.636/98, exigindo também o valor de mercado, em razão de eventual exploração econômica, conforme o artigo 4° do mesmo diploma legal, sob pena de multa diária no valor de R$ 20.000,00 (vinte mil reais).

32. Ante todo o exposto, acolho os embargos de declaração para fins de sanar as omissões, contradições e obscuridades apontadas e, atribuindo-lhes efeitos infringentes, superando todas as preliminares, dar parcial provimento à remessa oficial e aos recursos de apelação da União e do Ibama.

33. Embargos de declaração acolhidos, com efeito modificativo, para dar provimento parcial à remessa oficial e aos recursos de apelação da União e do Ibama.

 

Em síntese, a parte embargante aduz que o v. acórdão foi omisso em relação ao argumento da União de que a área em análise é terreno de marinha, e não zona costeira, bem como sobre o art. 3° da Resolução CONAMA n.° 237/97, destacando que cabe ao órgão competente da Administração Pública, dentro dos limites da oportunidade e conveniência, valer-se de outro instrumento para o estudo do impacto ambiental.

Ressaltou ainda a parte embargante que por não se configurar a área como sendo de Zona Costeira, mas sim bem dominical da apelante, deve se interpretar de forma diferenciada, principalmente no que tange ao parágrafo 1°, inciso IV do art. 225 da lei Maior (exigência do EIA).”

O Ministério Público Federal se manifestou no ID.  n. 122279862 e nada requereu.

É o breve relatório.

Passo a decidir.

 

 

 

 

 

 

 

 


APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO (1728) Nº 0008242-42.2003.4.03.6104

RELATOR: Gab. 10 - DES. FED. ANTONIO CEDENHO

APELANTE: UNIAO FEDERAL, INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVAVEIS

Advogado do(a) APELANTE: VERIDIANA BERTOGNA - SP210268

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Advogado do(a) APELADO: FLAVIA DA CUNHA LIMA - SP134557

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

 

 

No caso em comento, nota-se que não há qualquer vício no julgado a justificar os presentes embargos de declaração.

Em verdade, o que pretende a parte embargante é que seja proferida nova decisão acerca da matéria apreciada no v. acórdão, por se mostrar inconformada com julgamento contrário ao seu interesse.

A parte embargante alega que cabe ao órgão competente da Administração Pública, dentro dos limites da oportunidade e conveniência, valer-se de outro instrumento para o estudo do impacto ambiental.

Todavia, o v. acórdão atestou que o artigo 7º da Lei Complementar n.º 140 de 2011 determina que é ação administrativa da União promover o licenciamento ambiental de empreendimentos e atividades, localizados ou desenvolvidos no mar territorial, na plataforma continental ou na zona econômica exclusiva:

 

Art. 7o  São ações administrativas da União: 

XIV - promover o licenciamento ambiental de empreendimentos e atividades: 

a) localizados ou desenvolvidos conjuntamente no Brasil e em país limítrofe; 

b) localizados ou desenvolvidos no mar territorial, na plataforma continental ou na zona econômica exclusiva; 

c) localizados ou desenvolvidos em terras indígenas; 

d) localizados ou desenvolvidos em unidades de conservação instituídas pela União, exceto em Áreas de Proteção Ambiental (APAs); (Destacamos)

 

Além disso, o princípio da prevenção ambiental, extraído do art. 225 da Constituição Federal, impõe a realização do EIA/RIMA como condicionante ao licenciamento de todas as atividades que potencialmente venham a acarretar danos ambientais.

Nota-se que o estudo de impacto ambiental é um instrumento basilar na defesa do meio ambiente, considerando os aspectos e repercussões antes da realização de obra potencialmente degradadora, seguindo as diretrizes fixadas na Lei n.° 6.938/81.

No tocante às atividades e obras com significativo impacto ambiental, vale transcrever os artigos 6° e 40 da Lei n.° 7.661/88, em relação ao Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro:

 

 

Art. 6º. O licenciamento para parcelamento e remembramento do solo, construção, instalação, funcionamento e ampliação de atividades, com alterações das características naturais da Zona Costeira, deverá observar, além do disposto nesta Lei, as demais normas específicas federais, estaduais e municipais, respeitando as diretrizes dos Planos de Gerenciamento Costeiro.

§ 1º. A falta ou o descumprimento, mesmo parcial, das condições do licenciamento previsto neste artigo serão sancionados com interdição, embargo ou demolição, sem prejuízo da cominação de outras penalidades previstas em lei.

§ 2º Para o licenciamento, o órgão competente solicitará ao responsável pela atividade a elaboração do estudo de impacto ambiental e a apresentação do respectivo Relatório de Impacto Ambiental - RIMA, devidamente aprovado, na forma da lei.

(...)

Art. 42. Serão reservadas, na forma do regulamento, áreas necessárias à gestão ambiental, à implantação de projetos demonstrativos de uso sustentável de recursos naturais e dos ecossistemas costeiros, de compensação por impactos ambientais, relacionados com instalações portuárias, marinas, complexos navais e outros complexos náuticos, desenvolvimento do turismo, de atividades pesqueiras, da aqüicultura, da exploração de petróleo e gás natural, de recursos hídricos e minerais, aproveitamento de energia hidráulica e outros empreendimentos considerados de interesse nacional. (Destacamos)

 

Dentro desse contexto, em uma interpretação sistemática, a análise do caso em comento deve ser no sentido de favorecer a proteção ao meio ambiente, fim perseguido pelo legislador constituinte, que é de interesse de toda a coletividade.

A ação civil pública intentada almeja justamente que seja cumprida os deveres legalmente preceituados e impostos aos corréus, cada um na medida de sua responsabilidade, em relação à realização do EIA/RIMA, como condicionante ao licenciamento das atividades que podem ocasionar danos ambientais.

No que tange a exigência do EIA/RIMA, vale trazer à baila precedentes desta E. Corte:

 

PROCESSUAL CIVIL - AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - QUEIMA DE PALHA DA CANA-DE-AÇÚCAR - EXIGÊNCIA DE EIA/RIMA - POSSIBILIDADE - AUSÊNCIA DE PLAUSIBILIDADE E DE PERIGO DE DANO - RECURSO IMPROVIDO.

I - A Constituição da República exige que para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente seja realizado estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade (art. 225, § 1º, IV). Trata-se do EIA/RIMA, o primeiro, estudos que compreendem levantamento da literatura científica e legal, trabalhos de campo, análises de laboratório, enquanto o segundo se cuida do relatório que esclarece as vantagens e consequências do empreendimento e/ou atividade, dando publicidade àquele.

II - É inquestionável que a queima da palha da cana-de-açúcar configura atividade causadora de degradação ao meio ambiente, à saúde humana e à fauna local. Sendo evidente e conhecidos os efeitos nocivos da prática da queima da palha da cana-de-açúcar, há que se reconhecer que, ao menos em tese, o direito postulado em caráter de urgência na ação civil pública é plausível e se encontra presente o perigo de dano, previstos no artigo 300 do CPC.

III - Precedentes desta Corte.

IV - A Lei nº 12.651/12 revogou expressamente o anterior Código Florestal (Lei nº 4.771/65). Com isso, o Decreto nº 2.661/98, que regulamentava o parágrafo único do artigo 27 desta lei, perdeu seu suporte normativo.

V - Agravo de instrumento improvido.

(TRF 3ª Região, 3ª Turma, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 5003179-65.2019.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal CECILIA MARIA PIEDRA MARCONDES, julgado em 08/08/2019, Intimação via sistema DATA: 12/08/2019) (Destacamos)

 

AÇÃO CIVIL PÚBLICA. APELAÇÕES E REEXAME NECESSÁRIO. LEGITIMIDADE ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL. LEGITIMIDADE PASSIVA DO IBAMA. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. CONTROLE INCIDENTAL DE CONSTITUCIONALIDADE SOBRE LEGISLAÇÃO ESTADUAL. POSSIBILIDADE. MÉRITO. QUEIMA CONTROLADA DA PALHA DE CANA DE AÇÚCAR. LICENÇA AMBIENTAL PELO ÓRGÃO ESTADUAL. ATIVIDADE DOTADA DE RISCOS À SAÚDE E AO MEIO AMBIENTE. PRÉVIA ELABORAÇÃO DE EIA/RIMA. NECESSIDADE. RESPEITO À NORMATIZAÇÃO IMPOSTA PELA CONSTITUIÇÃO FEDERAL E POLÍTICA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE. ATRIBUIÇÃO SUPLETIVA DO IBAMA. RECONHECIMENTO. PRECEDENTES DA E. SEXTA TURMA.

(...)

- O IBAMA detém atribuição supletiva em matéria de licenciamento ambiental, nos termos da Política Nacional do Meio Ambiente (Lei 6.938/81), razão pela qual, se lhe é imputada omissão ou desídia em relação às licenças concedidas pelos Estados-membros, exsurge a respectiva legitimidade passiva ad causam para figurar nas ações em que essas condutas são discutidas.

(...)

- Mesmo que não houvesse prova cabal desses riscos ou danos, o princípio da prevenção, extraível da proteção integral que constitucionalmente recai sobre o meio ambiente (art. 225 CFR), impõe a realização de EIA/RIMA como condicionante ao licenciamento de todas atividades que potencialmente venham a acarretar danos ambientais, ainda que a constatação dessa lesividade advenha de probabilidade e não seja certa a sua ocorrência.

- Tratando-se de atividade com significante impacto ambiental, com potencial de extrapolar os limites da localidade em que praticada, se mostra correta e afinada com os ditames da Carta Magna e da Política Nacional do Meio Ambiente a condenação da CETESB e do Estado de São Paulo para que se abstenham a conceder novas licenças de queima controlada da palha de cana-de-açúcar na área compreendida pela Subseção Judiciária de Araraquara, sem prévio EIA/RIMA. Nessa esteira, impõe-se reconhecer, na mesma medida, o acerto da condenação do IBAMA para que fiscalize a exigência de licenciamento e prévio EIA/RIMA para as atividades da espécie desenvolvidas no território da referida Subseção.

- Os danos morais difusos, segundo a jurisprudência da E. Corte Superior de Justiça, têm como pressupostos (1) a conduta antijurídica (ação ou omissão) do agente, pessoa física ou jurídica; (2) a ofensa a interesses jurídicos fundamentais, de natureza extrapatrimonial, titularizados por uma determinada coletividade (comunidade, grupo, categoria ou classe de pessoas); (3) a intolerabilidade da ilicitude, diante da realidade apreendida e da sua repercussão social; (4) o nexo causal observado entre a conduta e o dano correspondente à violação do interesse coletivo ("lato sensu").

- Patente a conduta antijurídica dos órgãos públicos que, atrelados às correspondentes atribuições, deveriam zelar pela preservação do meio ambiente e, especificamente, exigirem a elaboração do EIA/RIMA para que, eventualmente, fosse concedida licença para a atividade de queima da cana, sendo que a violação a esses deveres configurou afronta direta ao art. 225, caput, § 1º, incisos IV e V, da Constituição da República.

(...)

(TRF 3ª Região, SEXTA TURMA, ApReeNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 1625987 - 0011027-50.2008.4.03.6120, Rel. JUIZA CONVOCADA LEILA PAIVA, julgado em 21/07/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:02/08/2016 ) (Destacamos)

 

 

A parte embargante sustenta ainda que a área em comento não compreende zona costeira, mas sim terreno acrescido de marinha, que não se classifica como bem de uso comum do povo, e sim bem dominical da embargante.

Sobreleva consignar, no entanto, que o v. acórdão atestou que as áreas originalmente ocupadas pelas praias, e que tenham sido descaracterizadas artificial e ilegalmente, permanecem como bens de uso comum do povo, de acordo com o artigo 20, incisos IV e VII, da Carta Magna:

 

Art. 20. São bens da União:

IV as ilhas fluviais e lacustres nas zonas limítrofes com outros países; as praias marítimas; as ilhas oceânicas e as costeiras, excluídas, destas, as que contenham a sede de Municípios, exceto aquelas áreas afetadas ao serviço público e a unidade ambiental federal, e as referidas no art. 26, II;   

(...)

VII - os terrenos de marinha e seus acrescidos; (Destacamos)

 

 

Além do artigo 20 da Carta Magna estabelecer que as praias marítimas são bens da União, destaca-se o artigo 10 da Lei n.° 7.661/98, que dispõe que as praias são bens públicos de uso comum do povo:

 

Art. 10. As praias são bens públicos de uso comum do povo, sendo assegurado, sempre, livre e franco acesso a elas e ao mar, em qualquer direção e sentido, ressalvados os trechos considerados de interesse de segurança nacional ou incluídos em áreas protegidas por legislação específica.

§ 1º. Não será permitida a urbanização ou qualquer forma de utilização do solo na Zona Costeira que impeça ou dificulte o acesso assegurado no caput deste artigo.

§ 2º. A regulamentação desta lei determinará as características e as modalidades de acesso que garantam o uso público das praias e do mar.

§ 3º. Entende-se por praia a área coberta e descoberta periodicamente pelas águas, acrescida da faixa subseqüente de material detrítico, tal como areias, cascalhos, seixos e pedregulhos, até o limite onde se inicie a vegetação natural, ou, em sua ausência, onde comece um outro ecossistema. (Destacamos)

 

A esse respeito, o juízo “a quo” esclareceu que as áreas do caso em tela constituem praias, em consonância com o artigo 10, parágrafo 3°, da Lei n.° 7.661/98:

 

De outra parte, também a União Federal não vem se conduzindo de forma como se espera em relação ao mar e à praia objetos desta ação, pois constata-se a sua conduta omissiva quanto à cessão de espaços de uso comum do povo sem observância aos respectivos dispositivos legais.

(...)

Diferente do que alega a União Federal nestes autos, as aludidas áreas constituem praias, nos termos do artigo 10, parágrafo 3°, da Lei n. 7.661/98. (Destacamos)

 

Vale transcrever ainda o artigo 1° do Decreto-Lei n.° 9.760/46, que dispõe sobre os bens imóveis da União e dá outras providências:

 

Art. 1º Incluem-se entre os bens imóveis da União:

        a) os terrenos de marinha e seus acréscidos ;

        b) os terrenos marginais dos rios navegáveis, em Territórios Federais, se, por qualquer título legítimo, não pertencerem a particular;

        c) os terrenos marginais de rios e as ilhas nestes situadas na faixa da fronteira do território nacional e nas zonas onde se faça sentir a influência das marés;

 

Chega-se à conclusão de que os fundamentos do v. acórdão são cristalinos, inexistindo questões a serem esclarecidas, de forma que a decisão apreciou todas as questões relevantes ao deslinde da controvérsia de modo integral e adequado, apenas não adotando as teses apresentadas pela parte embargante.

Inexiste qualquer afronta à prestação jurisdicional, tendo em vista que é prescindível o exame aprofundado e pormenorizado de cada alegação ou prova trazida pelas partes, pois, caso contrário, estaria inviabilizada a própria prestação da tutela jurisdicional, de forma que não há violação ao artigo 93, IX, da Lei Maior quando o julgador declina fundamentos, acolhendo ou rejeitando determinada questão deduzida em juízo, desde que suficientes, ainda que sucintamente, para lastrear sua decisão.

Por conseguinte, o julgador não está obrigado a discorrer acerca de todas as teses sustentadas pela defesa, se a fundamentação no acórdão é clara e suficiente para respaldar a conclusão alcançada, segundo a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:

 

PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. RECURSO MANEJADO SOB A ÉGIDE DO NCPC. VIOLAÇÃO DO ART. 1.022 DO NCPC. OMISSÃO. NÃO CONFIGURADA. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO REJEITADOS.

1. Aplicabilidade do NCPC a este julgamento ante os termos do Enunciado nº 3 aprovado pelo Plenário do STJ na Sessão de 9/3/2016: Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC.

2. De acordo com o NCPC considera-se omissa a decisão que deixa de se manifestar sobre tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em incidente de assunção de competência aplicável ou incorra em qualquer das condutas descritas no art. 489, § 1º, do NCPC.

3. A omissão que enseja o oferecimento de embargos de declaração consiste na falta de manifestação expressa sobre algum fundamento de fato ou de direito ventilado nas razões recursais e sobre o qual deveria manifestar-se o juiz ou o tribunal, e que, nos termos do NCPC, é capaz, por si só, de infirmar a conclusão adotada para o julgamento do recurso (arts. 1.022 e 489, § 1º, do NCPC).

4. Não foi demonstrado nenhum vício na decisão embargada a ensejar a integração do julgado, porquanto a fundamentação adotada no acórdão é clara e suficiente para respaldar a conclusão alcançada, ou seja, a não comprovação do recesso forense por documento idôneo.

5. A simples indicação da existência de provimento suspendendo os prazos no Tribunal de origem não supre a exigência de comprovação por documento idôneo, como expressamente consignado na decisão embargada 6. Os aclaratórios não se prestam à manifestação de inconformismo ou à rediscussão do julgado.

7. Embargos de declaração rejeitados.

(EDcl no AgRg no AREsp 677.625/SP, Rel. Ministro MOURA RIBEIRO, TERCEIRA TURMA, julgado em 19/05/2016, DJe 24/05/2016) (Destacamos)

 

Com efeito, não almeja a parte embargante suprir vícios no julgado, buscando, em verdade, externar seu inconformismo com a solução adotada, que lhe foi desfavorável, pretendendo vê-la alterada. Não é esse, contudo, o escopo dos embargos declaratórios.

Por fim, cumpre asseverar que o escopo de prequestionar a matéria para efeito de interposição de recurso especial ou extraordinário perde a relevância, em sede de embargos de declaração, se não demonstrada a ocorrência de qualquer das hipóteses previstas no artigo 1.022, do Código de Processo Civil.

Salienta-se que o artigo 1.025 do novo Código de Processo Civil esclarece que os elementos suscitados pela parte embargante serão considerados incluídos no acórdão "para fins de pré-questionamento, ainda que os embargos de declaração sejam inadmitidos ou rejeitados, caso o tribunal superior considere existentes erro, omissão, contradição ou obscuridade."

Ante todo o exposto, voto por rejeitar os embargos de declaração.

É o voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 


 

E M E N T A

 

 

 

PROCESSO CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. AUSÊNCIA DE OBSCURIDADE, CONTRADIÇÃO OU OMISSÃO. DANO AMBIENTAL. ATRIBUIÇÕES DO IBAMA. EXIGÊNCIA DE EIA/RIMA. BENS DA UNIÃO. BENS PÚBLICOS DE USO COMUM DO POVO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO REJEITADOS.

1. Em síntese, a parte embargante aduz que o v. acórdão foi omisso em relação ao argumento da União de que a área em análise é terreno de marinha, e não zona costeira, bem como sobre o art. 3° da Resolução CONAMA n.° 237/97, destacando que cabe ao órgão competente da Administração Pública, dentro dos limites da oportunidade e conveniência, valer-se de outro instrumento para o estudo do impacto ambiental.

2. Ressaltou ainda a parte embargante que “por não se configurar a área como sendo de Zona Costeira, mas sim bem dominical da apelante, deve se interpretar de forma diferenciada, principalmente no que tange ao parágrafo 1°, inciso IV do art. 225 da lei Maior (exigência do EIA).”

3. Todavia, o v. acórdão atestou que o artigo 7º da Lei Complementar n.º 140 de 2011 determina que é ação administrativa da União promover o licenciamento ambiental de empreendimentos e atividades, localizados ou desenvolvidos no mar territorial, na plataforma continental ou na zona econômica exclusiva.

4. O princípio da prevenção ambiental, extraído do art. 225 da Constituição Federal, impõe a realização do EIA/RIMA como condicionante ao licenciamento de todas as atividades que potencialmente venham a acarretar danos ambientais.

5. Nota-se que o estudo de impacto ambiental é um instrumento basilar na defesa do meio ambiente, considerando os aspectos e repercussões antes da realização de obra potencialmente degradadora, seguindo as diretrizes fixadas na Lei n.° 6.938/81.

6. Dentro desse contexto, em uma interpretação sistemática, a análise do caso em comento deve ser no sentido de favorecer a proteção ao meio ambiente, fim perseguido pelo legislador constituinte, que é de interesse de toda a coletividade.

7. A ação civil pública intentada almeja justamente que seja cumprida os deveres legalmente preceituados e impostos aos corréus, cada um na medida de sua responsabilidade, em relação à realização do EIA/RIMA, como condicionante ao licenciamento das atividades que podem ocasionar danos ambientais.

8. O v. acórdão atestou ainda que as áreas originalmente ocupadas pelas praias, e que tenham sido descaracterizadas artificial e ilegalmente, permanecem como bens de uso comum do povo.

9. O artigo 20 da Carta Magna estabelece que são bens da União as ilhas fluviais e lacustres nas zonas limítrofes com outros países; as praias marítimas; as ilhas oceânicas e as costeiras, excluídas, destas, as que contenham a sede de Municípios, exceto aquelas áreas afetadas ao serviço público e a unidade ambiental federal.

10. Consoante o artigo 10 da Lei n.° 7.661/98, as praias são bens públicos de uso comum do povo, sendo assegurado, sempre, livre e franco acesso a elas e ao mar, em qualquer direção e sentido, ressalvados os trechos considerados de interesse de segurança nacional ou incluídos em áreas protegidas por legislação específica.

11. Chega-se à conclusão de que os fundamentos do v. acórdão são cristalinos, inexistindo questões a serem esclarecidas, de forma que a decisão apreciou todas as questões relevantes ao deslinde da controvérsia de modo integral e adequado, apenas não adotando as teses apresentadas pela parte embargante.

12. Inexiste qualquer afronta à prestação jurisdicional, tendo em vista que é prescindível o exame aprofundado e pormenorizado de cada alegação ou prova trazida pelas partes, pois, caso contrário, estaria inviabilizada a própria prestação da tutela jurisdicional, de forma que não há violação ao artigo 93, IX, da Lei Maior quando o julgador declina fundamentos, acolhendo ou rejeitando determinada questão deduzida em juízo, desde que suficientes, ainda que sucintamente, para lastrear sua decisão.

13. Com efeito, não almeja a parte embargante suprir vícios no julgado, buscando, em verdade, externar seu inconformismo com a solução adotada, que lhe foi desfavorável, pretendendo vê-la alterada. Não é esse, contudo, o escopo dos embargos declaratórios.

14. Cumpre asseverar que o escopo de prequestionar a matéria para efeito de interposição de recurso especial ou extraordinário perde a relevância, em sede de embargos de declaração, se não demonstrada a ocorrência de qualquer das hipóteses previstas no artigo 1.022, do Código de Processo Civil.

15. Embargos de declaração rejeitados.

 


  ACÓRDÃO
 
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Terceira Turma, por unanimidade, rejeitou os embargos de declaração., nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.