APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002100-97.2019.4.03.6128
RELATOR: Gab. 12 - DES. FED. MARLI FERREIRA
APELANTE: MUNICIPIO DE CAMPO LIMPO PAULISTA
Advogado do(a) APELANTE: ERON DA ROCHA SANTOS - SP196582
APELADO: CAIXA ECONOMICA FEDERAL
Advogado do(a) APELADO: ANA LUIZA ZANINI MACIEL - SP206542-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002100-97.2019.4.03.6128 RELATOR: Gab. 12 - DES. FED. MARLI FERREIRA APELANTE: MUNICIPIO DE CAMPO LIMPO PAULISTA Advogado do(a) APELANTE: ERON DA ROCHA SANTOS - SP196582 APELADO: CAIXA ECONOMICA FEDERAL Advogado do(a) APELADO: ANA LUIZA ZANINI MACIEL - SP206542-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O A Excelentíssima Senhora Desembargadora Federal MARLI FERREIRA (Relatora): Trata-se de embargos à execução fiscal opostos pela Caixa Econômica Federal contra execução fiscal da dívida ativa movida pela Prefeitura Municipal de Campo Limpo Paulista, atinente a débitos de IPTU dos exercícios de 2015 a 2017. Valor da execução: R$ 2.733,24. Ao proferir a sentença, o MM. Magistrado a quo julgou procedentes os presentes embargos a fim de afastar a responsabilidade tributária da embargante, em razão de sua condição de credora fiduciária. Condenou O Município em honorários advocatícios fixando-os em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, nos termos do art. 85, do CPC. Em apelação, a Municipalidade de Campo Limpo Paulista sustenta, em apertada síntese, que a Caixa exerce a posse indireta do imóvel o que a legitimaria a figurar na exação, não havendo que se falar em ilegalidade do feito sob pena e ofensa ao art. 30, I, da CF, e da Súmula 393 do STJ. Requer o provimento do recurso. Com contrarrazões, subiram os autos a este Tribunal para julgamento. É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002100-97.2019.4.03.6128 RELATOR: Gab. 12 - DES. FED. MARLI FERREIRA APELANTE: MUNICIPIO DE CAMPO LIMPO PAULISTA Advogado do(a) APELANTE: ERON DA ROCHA SANTOS - SP196582 APELADO: CAIXA ECONOMICA FEDERAL Advogado do(a) APELADO: ANA LUIZA ZANINI MACIEL - SP206542-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O A Excelentíssima Senhora Desembargadora Federal MARLI FERREIRA (Relatora): A alienação fiduciária de imóvel restou instituída pela Lei nº 9.514/97 que, naquilo em que interessa ao deslinde da presente causa, dispõe que: "Art. 17. As operações de financiamento imobiliário em geral poderão ser garantidas por: I - hipoteca; II - cessão fiduciária de direitos creditórios decorrentes de contratos de alienação de imóveis; III - caução de direitos creditórios ou aquisitivos decorrentes de contratos de venda ou promessa de venda de imóveis; IV - alienação fiduciária de coisa imóvel. § 1º As garantias a que se referem os incisos II, III e IV deste artigo constituem direito real sobre os respectivos objetos. (...). Art. 22. A alienação fiduciária regulada por esta Lei é o negócio jurídico pelo qual o devedor, ou fiduciante, com o escopo de garantia, contrata a transferência ao credor , ou fiduciário , da propriedade resolúvel de coisa imóvel. (...) Art. 23. Constitui-se a propriedade fiduciária de coisa imóvel mediante registro, no competente Registro de Imóveis, do contrato que lhe serve de título. Parágrafo único. Com a constituição da propriedade fiduciária , dá-se o desdobramento da posse, tornando-se o fiduciante possuidor direto e o fiduciário possuidor indireto da coisa imóvel. (...)." Tem-se, assim, que a alienação fiduciária de bem imóvel é a operação através da qual o devedor/fiduciante, visando a garantia de determinada obrigação frente ao credor/fiduciário, concede a este a propriedade resolúvel de um imóvel (art. 22), cuja posse fica desdobrada entre o devedor, que passa a ser possuidor direto, e o credor que se torna possuidor indireto do bem (art. 23). Dessarte, ante a clareza da norma de regência, nenhuma dúvida há que, registrado o contrato de alienação fiduciária, o credor torna-se proprietário fiduciário e possuidor indireto do imóvel. De outro turno, acerca do Imposto Predial e Territorial Urbano, prevê o Código Tributário Nacional que: "Art. 32. O imposto, de competência dos Municípios, sobre a propriedade predial e territorial urbana tem como fato gerador a propriedade, o domínio útil ou a posse de bem imóvel por natureza ou por acessão física, como definido na lei civil, localizado na zona urbana do Município. (...) Art. 34. Contribuinte do imposto é o proprietário do imóvel, o titular do seu domínio útil, ou o seu possuidor a qualquer título." À vista dos referidos regramentos, forçoso concluir que o credor fiduciário não pode ser considerado como proprietário do imóvel para fins de sujeição passiva do IPTU, na medida em que proprietário, como definido na lei civil - artigo 1.228 do Código Civil -, é aquele possuidor dos direitos de uso, gozo e disposição do bem, o que não ocorre no caso de propriedade, onde não se fazem presentes nenhum desses direitos. De outro vértice, o argumento no sentido de que o credor fiduciário é possuidor indireto do imóvel e que, nessa condição, seria contribuinte do imposto, ex vi do artigo 34 do CTN acima transcrito, também não comporta acolhimento. Isso porque, conforme entendimento jurisprudencial sedimentado, o referido dispositivo deve ser interpretado à luz do inciso I do artigo 156 da Constituição Federal, segundo o qual "compete aos Municípios instituir impostos sobre a propriedade predial e territorial urbana". Desse modo, entende-se que a posse apta a ensejar a incidência do IPTU, somente seria aquela qualificada pelo animus domini, não incidindo sobre a posse exercida de forma precária e que não tem por objeto a efetiva aquisição da propriedade, tal como acontece nos casos do credor fiduciário que, possuindo a posse indireta do imóvel, não tem por objetivo a aquisição definitiva da propriedade do bem. Confiram-se, a respeito do tema, mutatis mutandis, os seguintes julgados: "TRIBUTÁRIO. BEM PÚBLICO. IMÓVEL. (RUAS E ÁREAS VERDES). CONTRATO DE CONCESSÃO DE DIREITO REAL DE USO. CONDOMÍNIO FECHADO. IPTU. NÃO-INCIDÊNCIA. POSSE SEM ANIMUS DOMINI. AUSÊNCIA DO FATO GERADOR DO TRIBUTO (ARTS. 32 E 34, CTN). 1. A controvérsia refere-se à possibilidade ou não da incidência de IPTU sobre bens públicos (ruas e áreas verdes) cedidos com base em contrato de concessão de direito real de uso a condomínio residencial. 2. O artigo 34 do CTN define como contribuinte do IPTU o proprietário do imóvel, o titular do seu domínio útil ou o seu possuidor a qualquer título. Contudo, a interpretação desse dispositivo legal não pode se distanciar do disposto no art. 156, I, da Constituição Federal. Nesse contexto, a posse apta a gerar a obrigação tributária é aquela qualificada pelo animus domini, ou seja, a que efetivamente esteja em vias de ser transformada em propriedade, seja por meio da promessa de compra e venda, seja pela posse ad usucapionem. Precedentes. 3. A incidência do IPTU deve ser afastada nos casos em que a posse é exercida precariamente, bem como nas demais situações em que, embora envolvam direitos reais, não estejam diretamente correlacionadas com a aquisição da propriedade. 4. Na hipótese, a concessão de direito real de uso não viabiliza ao concessionário tornar-se proprietário do bem público, ao menos durante a vigência do contrato, o que descaracteriza o animus domini. 5. A inclusão de cláusula prevendo a responsabilidade do concessionário por todos os encargos civis, administrativos e tributários que possam incidir sobre o imóvel não repercute sobre a esfera tributária, pois a instituição do tributo está submetida ao princípio da legalidade, não podendo o contrato alterar a hipótese de incidência prevista em lei. Logo, deve-se reconhecer a inexistência da relação jurídica tributária nesse caso. 6. Recurso especial provido." (STJ, REsp 1091198/PR, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, j. 24/05/2011, DJe 13/06/2011) "TRIBUTÁRIO. IPTU. CONTRIBUINTE. ARTS. 32 E 34 DO CTN. IMÓVEL PÚBLICO PERTENCENTE Á UNIÃO. CONTRATO DE CESSÃO DE USO. CESSIONÁRIO É POSSUIDOR POR RELAÇÃO DE DIREITO PESSOAL. IMPOSSIBILIDADE DE FIGURAR NO PÓLO PASSIVO DA OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA. 1. Os impostos caracterizam-se pela compulsoriedade que encerram, sem a necessidade da comprovação de contraprestação específica, por isso que, tratando-se de IPTU, o seu fato gerador, à luz do art. 32 do CTN, é a propriedade, o domínio útil ou a posse. 2. O cessionário do direito de uso não é contribuinte do IPTU, haja vista que é possuidor por relação de direito pessoal, não exercendo animus dominii, sendo possuidor do imóvel como simples detentor de coisa alheia. Precedentes: AgRg no Ag 1207082/RJ, Rel. Ministro HAMILTON CARVALHIDO, PRIMEIRA TURMA, DJe 14/04/2010; AgRg no Ag 1243867/RJ, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, DJe 12/03/2010; AgRg no REsp 885.353/RJ, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, DJe 06/08/2009; AgRg no Ag 1129472/SP, Rel. Ministra DENISE ARRUDA, PRIMEIRA TURMA, DJe 01/07/2009; REsp 933.699/RJ, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, DJe 28/03/2008; AgRg no REsp 947267/RJ, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, PRIMEIRA TURMA, DJ 18/10/2007; REsp 681406/RJ, Rel. Ministro JOSÉ DELGADO, PRIMEIRA TURMA, DJ 28/02/2005; REsp 325489/SP, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, DJ 24/02/2003. 3. O STF consolidou o mesmo entendimento, no seguintes termos: 'Recurso Extraordinário. 2. IPTU. Imóvel da União destinado à exploração comercial. 3. Contrato de concessão de uso. Posse precária e desdobrada. 4. Impossibilidade de a recorrida figurar no pólo passivo da obrigação tributária. Precedente. Recurso extraordinário a que se nega provimento.' (RE 451152, Relator(a): Min. GILMAR MENDES, Segunda Turma, DJ 27-04-2007) 4. A doutrina assevera que 'O preceito do CTN que versa a sujeição passiva do IPTU não inova a Constituição, 'criando por sua conta' um imposto sobre a posse e o domínio útil. Não é qualquer posse que deseja ver tributada. Não é a posse direta do locatário, do comodatário, do arrendatário de terreno, do administrador de bem de terceiro, do usuário ou habitador (uso e habitação) ou do possuidor clandestino ou precário (posse nova etc.). A posse prevista no Código Tributário como tributável é a de pessoa que já é ou pode ser proprietária da coisa' Corolário desse entendimento é ter por inválida a eleição dos meros detentores de terras públicas como contribuintes do imposto.' (Aires Barreto in Curso de Direito Tributário, Coodenador Ives Gandra da Silva Martins, 8ª Edição - Imposto Predial e Territorial Urbano, p.736/737) 5. Agravo regimental desprovido." (STJ, AgRg no REsp 1205250/RJ, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, j. 26/10/2010, DJe 16/11/2010) "Recurso Extraordinário. 2. IPTU. Imóvel da União destinado à exploração comercial. 3. Contrato de concessão de uso. Posse precária e desdobrada. 4. Impossibilidade de a recorrida figurar no pólo passivo da obrigação tributária. Precedente. Recurso extraordinário a que se nega provimento." (STF, RE 451152, Relator Ministro Gilmar Mendes, j. 22/08/2006, DJe- 27/04/2007) Agregue-se, ademais, que este Tribunal tem entendido que, no tocante à responsabilidade tributária do credor fiduciário de imóvel, deve ser observado o quanto disposto no § 8º do artigo 27 da Lei nº 9.514/97, segundo o qual: "Art. 27. Uma vez consolidada a propriedade em seu nome, o fiduciário, no prazo de trinta dias, contados da data do registro de que trata o § 7º do artigo anterior, promoverá público leilão para a alienação do imóvel. (...) § 8º Responde o fiduciante pelo pagamento dos impostos, taxas, contribuições condominiais e quaisquer outros encargos que recaiam ou venham a recair sobre o imóvel, cuja posse tenha sido transferida para o fiduciário , nos termos deste artigo, até a data em que o fiduciário vier a ser imitido na posse. (Incluído pela Lei nº 10.931, de 2004)" O entendimento firmado centra-se no argumento de que a referida disposição é exceção àquela prevista no artigo 123 do CTN, segundo a qual "salvo disposições de lei em contrário, as convenções particulares, relativas à responsabilidade pelo pagamento de tributos, não podem ser opostas à Fazenda Pública, para modificar a definição legal do sujeito passivo das obrigações tributárias correspondentes." Confiram-se, a propósito, os seguintes julgados: "AGRAVO LEGAL. TRIBUTÁRIO. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. IPTU. COBRANÇA INDEVIDA. ILEGITIMIDADE DA CEF . 1. A análise da matrícula 136.834 perante o 8º Cartório de Registro de Imóveis da Comarca de São Paulo revela que a Caixa Econômica Federal é proprietária do imóvel que ensejou a cobrança do ISS na condição de credora fiduciária desde 20 de julho de 2010. 2. Nestes termos, aplicável à espécie o disposto no art. 27, § 8º da Lei n.º 9.514/97, segundo o qual: Responde o fiduciante pelo pagamento dos impostos, taxas, contribuições condominiais e quaisquer outros encargos que recaiam ou venham a recair sobre o imóvel, cuja posse tenha sido transferida para o fiduciário, nos termos deste artigo, até a data em que o fiduciário vier a ser imitido na posse. 3. Tal previsão, ao atribuir ao devedor fiduciante a responsabilidade pelo pagamento de tributos que recaiam sobre o imóvel, quando no exercício da posse direta, constitui-se em exceção à regra exposta no art. 123 do CTN, que trata da 'inoponibilidade de convenções particulares à Fazenda Pública que pretendam modificar a definição legal do sujeito passivo de obrigação tributária'. 4. Não há elementos novos capazes de alterar o entendimento externado na decisão monocrática. 5. Agravo legal improvido". (AC 0016228-89.2012.4.03.6182, Relatora Desembargado Federal Consuelo Yoshida, Sexta Turma, j. 24/04/2014, v.u., D.E. 09/05/2014) "TRIBUTÁRIO. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. PARÁGRAFO 8º DO ARTIGO 27 DA LEI 9.514/97. CAIXA ECONÔMICA FEDERAL. CREDORA FIDUCIÁRIA . ILEGITIMIDADE. - A questão da responsabilidade quanto aos tributos que recaiam ou venham a recair sobre o imóvel cuja posse tenha sido transferida por meio de alienação fiduciária encontra previsão específica na Lei n.º 9.514/97, na redação dada pela Lei 10.931/2004, especificamente no parágrafo 8º de seu artigo 27. - In casu, observa-se da Certidão de Registro de Imóveis de fls. 21/23, que o imóvel ao qual se refere a taxa objeto da execução fiscal foi alienado fiduciariamente à Caixa Econômica Federal que, nos termos do referido parágrafo 8º do artigo 27 da Lei 9.514/97, figura como proprietária tão somente na condição de credora fiduciária, o que exclui sua legitimidade para figurar no polo passivo da execução. - Na condição de mera credor a fiduciária, não se caracteriza a instituição financeira como usuária, ainda que potencial, da Taxa de Resíduos Sólidos Domiciliares - TRSD, o que reafirma sua ilegitimidade. - Outrossim, a regra inserta no parágrafo 2º do artigo 86 da Lei Municipal n.º 13.478/02, que prevê os proprietários não usuários devem requer sua exclusão do cadastro fiscal para fins de responsabilização fiscal, não tem o condão de se sobrepor à Lei n.º 9.514/97, à vista de sua hierarquia federal. - Não há que se falar em violação aos artigos 1º e 30 da Constituição Federal e 77 e 123 do CTN, na medida em que a Lei n.º 9.514/97 foi concebida para regular as situações jurídicas ocorridas no âmbito da alienação fiduciária de imóveis e, por tal razão, se caracteriza como uma exceção às regras gerais tributárias constantes do Código Tributário Nacional. - Apelação desprovida." (AC nº 0010763-7.2009.4.03.6182, Relatora Juíza Federal Convocada Simone Schroder Ribeiro, Quarta Turma, j. 27/02/2014, v.u., D.E. 25/03/2014) "PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO FISCAL. MUNICÍPIO DE SÃO PAULO. TAXA DE RESÍDUOS SÓLIDOS DOMICILIARES - TRSD. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA - CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CREDORA FIDUCIÁRIA. ILEGITIMIDADE. 1. Por força do art. 109 do Código Tributário Nacional, deve-se buscar o conceito de propriedade fiduciária no direito privado, o qual preceitua que se trata de propriedade de caráter temporário, de titularidade do credor, com a finalidade de garantir uma dívida. 2. A alienação fiduciária de bens imóveis trata-se de um negócio jurídico pelo qual o devedor-fiduciante contrata a transferência da propriedade de coisa imóvel ao credor-fiduciário com o objetivo de garantia. Conclui-se que, de fato, a Caixa Econômica Federal é proprietária do imóvel, mas tal propriedade equivale a um direito real de garantia, visto que o uso e o gozo do bem ficam a cargo da devedora-fiduciante, agindo como se proprietária fosse. 3. Aplica-se à espécie o disposto no art. 27, § 8º, da Lei n.º 9.514/97, na redação dada pela Lei 10.931/2004, segundo o qual: 'Responde o fiduciante pelo pagamento dos impostos, taxas, contribuições condominiais e quaisquer outros encargos que recaiam ou venham a recair sobre o imóvel, cuja posse tenha sido transferida para o fiduciário, nos termos deste artigo, até a data em que o fiduciário vier a ser imitido na posse.' 4. Existindo previsão legal acerca do tema, entende-se que deve ser analisada como exceção à regra prevista no art. 123 do CTN ('Art. 123. Salvo disposições de lei em contrário, as convenções particulares, relativas à responsabilidade pelo pagamento de tributos, não podem ser opostas à Fazenda Pública, para modificar a definição legal do sujeito passivo das obrigações tributárias correspondentes.') Deste modo, a responsabilidade pelo pagamento de tributos que recaiam sobre o imóvel objeto da alienação fiduciária deve ficar a cargo do devedor fiduciante. 5. O artigo 86 da Lei Municipal nº. 13.478/02, com as alterações dadas pelas Leis Municipais nº. 13.522/2003 e 13.699/2003, informa ser 'contribuinte da Taxa de Resíduos Sólidos Domiciliares - TRSD o munícipe-usuário dos serviços previstos no artigo 83, conforme definido nesta lei.' Conclui-se que o contribuinte da taxa somente pode ser o usuário, efetivo ou potencial, dos serviços de coleta de resíduos sólidos, restando, assim, patente a ilegitimidade da Caixa Econômica Federal para figurar no polo passivo da presente execução fiscal , uma vez que se encontra na posição de credor a fiduciária do imóvel, não usufruindo, ainda que em potencial, dos serviços prestados pelo Município exequente. 6. Precedentes desta Corte: AC 00552627620094036182, DESEMBARGADORA FEDERAL CONSUELO YOSHIDA, TRF3 - SEXTA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:28/06/2013. FONTE REPUBLICACAO; AC 00263466120114036182, DESEMBARGADORA FEDERAL ALDA BASTO, TRF3 - QUARTA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:21/03/2013.FONTE REPUBLICACAO. 7. Apelação desprovida." (AC 0038037-43.2009.4.03.6182, Relatora Desembargadora Federal Cecília Marcondes, Terceira Turma, j. 17/10/2013, D.E 25/10/2013) "PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. TAXA DE RESÍDUOS SÓLIDOS DOMICILIARES. CAIXA ECONÔMICA FEDERAL. ILEGITIMIDADE. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA . I. In casu, a CEF é proprietária do imóvel, porém na condição de credora fiduciária , nos termos do previsto na Lei 9.514/1997. II. Havendo disposição de Lei atribuindo responsabilidade pelo pagamento de tributos que recaiam sobre o imóvel ao devedor fiduciante (Lei 9.514/1997, §8º do artigo 27), verifica-se a exceção prevista no artigo 123 do CTN, sendo a CEF ilegítima para figurar no pólo passivo da execução fiscal. III. Acrescente-se que, de acordo com o previsto no artigo 86 da Lei Municipal 13.478/2002, 'É contribuinte da Taxa de Resíduos Sólidos Domiciliares - TRSD o munícipe-usuário dos serviços previstos no artigo 83, conforme definido nesta lei'. Assim, o contribuinte da taxa somente pode ser o usuário, efetivo ou potencial, dos serviços de coleta de resíduos sólidos, e não a CEF, credora fiduciária do imóvel, conforme consignado pelo Juízo. IV. Apelação desprovida." (AC 0026346-61.2011.4.03.6182, Relatora Desembargadora Federal Alda Basto, Quarta Turma, j. 07/03/2013, D.E. 21/03/2013) Destarte, e à vista da especialidade do regramento previsto na Lei nº 9.514/97, não deve prevalecer eventual argumento de ofensa à disposição constitucional contida na alínea "a" do inciso III do artigo 146 da Constituição Federal, que preceitua que: "Art. 146. Cabe à lei complementar: (...) III - estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre: a) definição de tributos e de suas espécies, bem como, em relação aos impostos discriminados nesta Constituição, a dos respectivos fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes; (...)." (g.n.) Ante o exposto, nego provimento à apelação. É como voto.
DECLARAÇÃO DE VOTO
Apelação interposta pelo Município de Campo Limpo Paulista contra sentença que, em sede de embargos à execução fiscal, julgou-os procedentes para reconhecer a ausência de responsabilidade da CEF.
A eminente Relatora votou no sentido de negar provimento à apelação por entender que a empresa pública não deve figurar no polo passivo da execução fiscal, eis que é credora fiduciária do imóvel objeto da cobrança do crédito tributário. Divirjo, todavia.
Não assiste razão à empresa pública.
Estabelecem os artigos 22 e 23, parágrafo único, da Lei n.º 9.514/97, que dispõe sobre o Sistema de Financiamento Imobiliário e institui a alienação fiduciária de coisa imóvel:
Art. 22. A alienação fiduciária regulada por esta Lei é o negócio jurídico pelo qual o devedor, ou fiduciante, com o escopo de garantia, contrata a transferência ao credor, ou fiduciário, da propriedade resolúvel de coisa imóvel.
Art. 23. Constitui-se a propriedade fiduciária de coisa imóvel mediante registro, no competente Registro de Imóveis, do contrato que lhe serve de título.
Parágrafo único. Com a constituição da propriedade fiduciária, dá-se o desdobramento da posse, tornando-se o fiduciante possuidor direto e o fiduciário possuidor indireto da coisa imóvel.
Por sua vez, o artigo 34 do Código Tributário Nacional estabelece:
Art. 34. Contribuinte do imposto é o proprietário do imóvel, o titular do seu domínio útil, ou seu possuidor a qualquer título. (grifamos)
No caso concreto, observa-se que, conforme mencionado pela relatora, o imóvel foi alienado fiduciariamente à Caixa Econômica Federal, em consequência, tem legitimidade para figurar no polo passivo da execução fiscal originária. Outrossim, a Constituição Federal confere aos municípios a competência para a instituição da exação objeto da ação originária:
Art. 156. Compete aos municípios instituir impostos sobre:
I - propriedade predial territorial urbana;
De outra parte, encontra-se assim redigido o artigo 32 do Código Tributário Nacional:
Art. 32. O imposto, de competência dos Municípios, sobre a propriedade predial e territorial urbana tem como fato gerador a propriedade, o domínio útil ou a posse de bem imóvel por natureza ou por acessão física, como definido na lei civil, localizado na zona urbana do Município.
Ademais, o Superior Tribunal de Justiça já decidiu que incumbe ao município a definição do sujeito passivo do tributo em discussão. Tal entendimento encontra-se sedimentado no que dispõe a Súmula n.º 399 do Superior Tribunal de Justiça, verbis: Cabe à legislação municipal estabelecer o sujeito passivo do IPTU. Nesse sentido, cabe salientar o seguinte julgado, no qual o citado verbete é destacado:
"TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. IPTU. OMISSÃO NÃO CONFIGURADA. LEGITIMIDADE PASSIVA. SÚMULA 399/STJ. REEXAME DE MATÉRIA FÁTICA. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. ACÓRDÃO FUNDAMENTADO EM DIREITO LOCAL. SÚMULA 280/STF. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
(AgRg no Ag 1173853/MG, 2009/0061660-5, rel. Min. TEORI ALBINO ZAVASCKI, PRIMEIRA TURMA, Julg.: 23/11/2010, v.u., DJe 29/11/2010)
Desse modo, cabe ao município eleger o sujeito passivo e, nesse contexto, insta frisar, como alegado, que, na disposição contida no artigo 9º da Lei n.º 6989/66 do município recorrente, foi definido quem é o contribuinte do IPTU. Confira-se:
"Art. 9º. Contribuinte do imposto é o proprietário do imóvel, o titular do seu domínio útil ou o seu possuidor a qualquer título".
Bem assim, não se aplicam ao caso as disposições do § 8º do artigo 27 da citada Lei n.º 9.514/97:
"Art. 27. Uma vez consolidada a propriedade em seu nome, o fiduciário, no prazo de trinta dias, contados da data do registro de que trata o § 7º do artigo anterior, promoverá público leilão para a alienação do imóvel.
(...)
§ 8º Responde o fiduciante pelo pagamento dos impostos, taxas, contribuições condominiais e quaisquer outros encargos que recaiam ou venham a recair sobre o imóvel, cuja posse tenha sido transferida para o fiduciário, nos termos deste artigo, até a data em que o fiduciário vier a ser imitido na posse".
A responsabilização do devedor fiduciante, prevista no dispositivo anteriormente referido, pelos tributos que recaiam ou venham a recair sobre o imóvel, cuja posse tenha sido transferida por meio de alienação fiduciária, não exclui a do credor fiduciário pelo IPTU, já que constitui convenção particular, como alega o município agravante, e, sob esse aspecto, não pode ser oposta a terceiros. Tal entendimento encontra supedâneo no que dispõe expressamente o artigo 123 do Código Tributário Nacional, in verbis:
"Art. 123. Salvo disposições de lei em contrário, as convenções particulares, relativas à responsabilidade pelo pagamento de tributos, não podem ser opostas à Fazenda Pública, para modificar a definição legal do sujeito passivo das obrigações tributárias correspondentes".
Saliente-se que a Lei n.º 9.514/97, nesse dispositivo, estabelece regras concernentes às relações entre o credor e o devedor (contratantes) e não se afigura apta a modificar a definição do sujeito passivo do IPTU. As determinações veiculadas na referida norma não configuram a exceção prevista na expressão Salvo disposição de lei em contrário, conforme previsto na legislação tributária mencionada (CTN, art. 123), a qual é direcionada à competência legislativa determinada ao respectivo ente tributante, isto é, o município, como anteriormente explicitado (art. 156, inciso I, da Lei Maior; art. 32 do CTN). Destaque-se ainda que, nos termos da alínea "a" do inciso III do artigo 146 da Carta Magna, cabe à lei complementar estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, inclusive em relação aos contribuintes.
Assim, merece reforma o decisum.
Ante o exposto, DOU PROVIMENTO ao apelo para julgar improcedentes os embargos à execução fiscal e determinar o prosseguimento da cobrança. Inverto o ônus da sucumbência, tal como fixado pelo juízo de primeiro grau.
André Nabarrete
Desembargador Federal
EMENTA
EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. IPTU. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. IMÓVEL. RESPONSABILIDADE DO DEVEDOR FIDUCIANTE.
1. A alienação fiduciária de bem imóvel é a operação de financiamento através da qual o devedor/fiduciante, visando a garantia de determinada obrigação frente ao credor/fiduciário, concede a este a propriedade resolúvel de um imóvel, cuja posse fica desdobrada entre o devedor, que passa a ser possuidor direto, e o credor que se torna possuidor indireto do bem.
2. A posse apta a ensejar a incidência do IPTU, somente seria aquela qualificada pelo animus domini, não incidindo sobre a posse exercida de forma precária e que não tem por objeto a efetiva aquisição da propriedade, tal como acontece nos casos do credor fiduciário que, possuindo a posse indireta do imóvel, não tem por objetivo a aquisição definitiva da propriedade do bem.
3. Há disposição de Lei atribuindo a responsabilidade pelo pagamento de tributos que recaiam sobre o imóvel ao devedor fiduciante (Lei 9.514/1997, §8º do artigo 27).
4. Apelação a que se nega provimento.