Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5001009-86.2020.4.03.0000

RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO

AGRAVANTE: MURIELEN STRAMANTINOLI COSTA

Advogado do(a) AGRAVANTE: ANDRE MURILO PARENTE NOGUEIRA - SP222125-A

AGRAVADO: FUNDO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCACAO

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5001009-86.2020.4.03.0000

RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO

AGRAVANTE: MURIELEN STRAMANTINOLI COSTA

Advogado do(a) AGRAVANTE: ANDRE MURILO PARENTE NOGUEIRA - SP222125-A

AGRAVADO: FUNDO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCACAO

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

 

O Exmo. Sr. Desembargador Federal Carlos Francisco (Relator): Cuida-se de agravo de instrumento interposto por MURIELEN STRAMANTINOLI COSTA, em face de decisão que indeferiu o pedido de tutela antecipada, consistente na prorrogação do contrato de financiamento estudantil para o primeiro e segundo semestres de 2020, com a liberação dos valores correspondentes.

Aduz a parte agravante que: necessitou prorrogar seu contrato de financiamento estudantil, porém não conseguiu efetivar a prorrogação sob o argumento de que havia extrapolado o prazo para conclusão do curso; ingressou no curso de Direito na Instituição Toledo de Ensino em 01/2014, mediante financiamento pelo FIES, com duração de 10 semestres; no final de 2016 adoeceu, apresentando quadro depressivo, de ansiedade e pânico, os quais lhe obrigaram a trancar o curso pelo período de um ano, em 2017, suspendendo também o FIES; em 2018 retornou às suas atividades e em 2020 pretende cursar o 5º ano do curso de Direito, o que somente será viável com o aditamento de seu contrato; efetuou a suspensão dos semestres em que esteve afastada por recomendação médica. Ademais, a Lei 10.620/2001, em seu art. 5º, prevê a possibilidade de prorrogação do contrato pelo período de um ano.

Foi proferida decisão que deferiu o pedido de efeito suspensivo pleiteado. O FUNDO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO – FNDE apresentou agravo interno em face da citada decisão.

Apresentada contraminuta.

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 


AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5001009-86.2020.4.03.0000

RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO

AGRAVANTE: MURIELEN STRAMANTINOLI COSTA

Advogado do(a) AGRAVANTE: ANDRE MURILO PARENTE NOGUEIRA - SP222125-A

AGRAVADO: FUNDO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCACAO

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

 

 

O Exmo. Sr. Desembargador Federal Carlos Francisco (Relator): A Constituição Federal, em seus artigos 6º e 205, prevê a educação como um dos direitos sociais fundamentais, verbis:

 

“Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição”.

 

“Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”.

 

A Lei nº 10.260/2001, que dispõe sobre o Fundo de Financiamento ao estudante do Ensino Superior, estabelece, em seu art. 5º, prazo máximo para a fruição do contrato, a saber:

 

“Art. 5° Os financiamentos concedidos com recursos do Fies até o segundo semestre de 2017 e os seus aditamentos observarão o seguinte:

I – prazo: não poderá ser superior à duração regular do curso, abrangendo todo o período em que o Fies custear os encargos educacionais a que se refere o art. 4 o desta Lei, inclusive o período de suspensão temporária, ressalvado o disposto no §3º deste artigo;

(...)

§ 3º Excepcionalmente, por iniciava do estudante, a instituição de ensino à qual esteja vinculado poderá dilatar em até um ano o prazo de utilização de que trata o inciso I do caput, hipótese na qual as condições de amortização permanecerão aquelas definidas no inciso V também do caput”.

 

No caso dos autos, a parte agravante celebrou contrato de abertura de crédito para o financiamento de encargos educacionais ao estudante do ensino superior, no primeiro semestre de 2014.

Foram juntados à ação subjacente diversos extratos do contrato, dos quais se observa que o financiamento teve início no primeiro semestre de 2014, com renovações sucessivas até o segundo semestre de 2016.

Em 04/05/2017, foi solicitada suspensão do contrato de financiamento estudantil, referente ao primeiro semestre de 2017, o que foi deferido, ocorrendo igualmente a suspensão do segundo semestre de 2017 e primeiro semestre de 2018, tendo o contrato voltado a fruir a partir do segundo semestre de 2018, até o segundo semestre de 2019.

Declaração da Instituição Toledo de Ensino – Centro Universitário de Bauru, emitida em 18/11/2019, afirma que a parte agravante é aluna regularmente matriculada no 4º ano do curso de Direito, havendo ingressado no ano de 2014 e cursado regularmente até 2016, sendo que no ano de 2017 trancou a matrícula, tendo retornado às atividades em 2018 e, se aprovada em todas as disciplinas e no Trabalho de Conclusão de Curso, poderá concluir o curso em dezembro de 2020.

Documentos médicos expedidos entre 12/2016 e 01/2018 atestam que a parte autora realizou tratamento psicológico e psiquiátrico, com diagnósticos de transtorno de pânico, transtorno de ansiedade generalizada e transtorno depressivo recorrente, com sintomas graves, necessitando afastar-se de suas atividades.

Verifica-se, portanto, que o contrato celebrado com o FIES teve início no primeiro semestre de 2014, entretanto foi solicitada e concedida a suspensão do financiamento por três semestres, período em que a estudante trancou o curso de Direito, pois necessitou se afastar de suas atividades em razão de patologia.

Observe-se que, levando-se em conta os três semestres em que ocorreu a suspensão solicitada, a parte autora, na realidade, teve nove semestres financiados a partir dos recursos disponibilizados pelo programa FIES.

Ademais, mesmo após o término dos dez semestres inicialmente pactuados, é possível a prorrogação do contrato por mais dois semestres, conforme previsão do art. 5º, §3º, da Lei nº 10.260/2001.

Portanto, em um juízo de cognição sumária, tendo em vista a excepcionalidade do caso concreto, a impossibilidade de a parte agravante permanecer no curso de Direito sem o auxílio do FIES e, ainda, visando à preservação do direito à educação, entendo viável a prorrogação do contrato de financiamento para o primeiro e segundo semestres do ano letivo de 2020.

Confiram-se, nesse sentido, os seguintes julgados desta E. Corte, em situações análogas:

 

“AGRAVO DE INSTRUMENTO. MANDADO DE SEGURANÇA. FIES. PRORROGAÇÃO DO CONTRATO. LEGALIDADE.

1. O Fundo de Financiamento ao estudante do Ensino Superior - FIES - encontra-se regulamentado pela Lei 10.260, de 12 de julho de 2001, que dispõe em seu art. 5º que nos financiamentos concedidos com recursos do fundo o prazo não poderá ser superior à duração regular do curso, abrangendo todo o período em que o Fies custear os encargos educacionais a que se refere o art. 4º desta Lei, inclusive o período de suspensão temporária, ressalvado o disposto no § 3º deste artigo a possibilidade de dilação do prazo contratual por até um ano.

2. O contrato da estudante com o FIES não ultrapassou o limite previsto no citado artigo 5º, com a dilação prevista no respectivo § 3º, pois havia permissão legal para a utilização do FIES pelo período de 13 semestres, considerando a possibilidade de dilação prevista no citado § 3º.

3. Diante da relevância dos argumentos apresentados que indicam a possibilidade de êxito ao final da demanda, bem como por ser fundamentado o temor de dano inerente ao impedimento da estudante frequentar o curso, correta a decisão agravada que concedeu a liminar ora impugnada.

4. Agravo de instrumento não provido”.

(TRF 3ª Região, PRIMEIRA TURMA,  AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 538256 - 0020862-79.2014.4.03.0000, Rel. JUIZ CONVOCADO MÁRCIO MESQUITA, julgado em 05/09/2017, e-DJF3 Judicial 1 DATA:20/09/2017).

                                

“CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. ENSINO SUPERIOR. RENOVAÇÃO DE MATRÍCULA. RECUSA PELA IES. INADIMPLÊNCIA. CONTRATO DE FINANCIAMENTO ESTUDANTIL. FIES. ADITAMENTO CONTRATUAL. PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE. AGRAVO DE INSTRUMENTO NÃO PROVIDO.

1. Cuida-se de agravo de instrumento interposto pelo FNDE contra decisão interlocutória que deferiu a liminar em mandado de segurança no qual objetiva a parte impetrante determinação para que as autoridades impetradas viabilizem a reativação de seu contrato de financiamento pelo FIES, bem como recebam a sua rematrícula no curso de Odontologia, sem qualquer ônus financeiro.

(...)

14. Observa-se que o contrato do FIES firmado entre o FNDE e a estudante prevê: (i) o aumento de seu limite global, dentro do prazo regular ou quando houver dilação do prazo do curso pela IES (cláusula terceira, parágrafo terceiro); (ii) a ampliação do prazo de utilização do crédito estudantil em até 2 (dois) semestres letivos consecutivos, na hipótese prevista no § 3º do art. 5º da Lei nº 10.260/2001, ou seja, por iniciativa da estudante e mediante solicitação de aditamento contratual (cláusula sexta, parágrafo primeiro); (iii) a suspensão do financiamento por até 2 (dois) semestres consecutivos, período em que será considerado como de efetiva utilização, para fins de incidência de juros sobre o valor financiado (cláusula décima sexta).

15. Nos termos do art. 422 do Código Civil, os contratantes são obrigados a observar, tanto na conclusão do contrato quanto em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé. Ademais, consoante o art. 423 do Diploma Civil de 2002, na redação vigente na data da contratação do FIES pela agravada, em contratos de adesão, quando houver cláusulas ambíguas ou contraditórias, há que se adotar a interpretação mais favorável ao aderente.

16. Nesse contexto, devem ser interpretadas em favor da impetrante as cláusulas contratuais do Contrato de Abertura de Crédito para o Financiamento de Encargos Educacionais ao Estudante do Ensino Superior nº 149.404.107, celebrado entre o FNDE e a agravada, por se tratar de contrato de adesão, ensejando dúvida quanto à interpretação do prazo máximo de vigência, ante as possibilidades de dilação e suspensão contratual, contudo, sem previsão contratual clara e objetiva sobre este ponto.

17. Com efeito, o exame da legislação de regência atinente ao FIES também demonstra a relevância de fundamentos da impetração, na medida em que o decurso do prazo de utilização do financiamento constitui impedimento à manutenção do contrato, com ressalva às condições de dilação do financiamento (art. 23, inciso III, da Portaria Normativa nº 15, de 08.07.2011, do Ministério da Educação).

18. Considerando-se que o contrato de financiamento estudantil foi firmado em 05.04.2013, com vigência a partir do primeiro semestre de 2013, bem como que o curso passou a ter duração de cinco anos, diante da alteração da grade curricular pela IES, havendo ainda a possibilidade de suspensão contratual e dilação a pedido da discente, em sede de cognição sumária, entende-se ser cabível a realização dos aditamentos contratuais referentes ao primeiro e ao segundo semestre de 2018, conforme pleiteado pela impetrante. Portanto, está presente a plausibilidade do direito alegado pela estudante, ora agravada.

19. De outra banda, está presente também o periculum in mora, pois o indeferimento do pedido liminar impediria a estudante de obter o aditamento contratual do FIES e a rematrícula no último semestre do curso de Odontologia, acarretando-lhe a perda do semestre letivo, bem como a possibilidade de ter seu nome incluído nos órgãos de proteção ao crédito, uma vez que estava sendo considerada inadimplente pela IES, quanto às mensalidades do primeiro semestre de 2018.

20. Urge salientar que conforme a narrativa da exordial e a documentação acostada aos autos, não se vislumbra tenha agido a aluna impetrante de forma desidiosa ou desinteressada, tendo procurado pelas autoridades impetradas a fim de realizar o aditamento contratual com o programa de financiamento estudantil e sua rematrícula.

21. Pontua-se inexistir, na hipótese, o risco de irreversibilidade da medida, por não se tratar de liminar que esgota o objeto da demanda. Destarte, de rigor a manutenção, por ora, da r. decisão agravada.

22. Agravo de instrumento não provido”.

(TRF 3ª Região, 3ª Turma,  AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 5025266-49.2018.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal CECILIA MARIA PIEDRA MARCONDES, julgado em 06/06/2019, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 12/06/2019).

 

Pelas razões expostas, julgo prejudicado o agravo interno e DOU PROVIMENTO ao agravo de instrumento, para determinar ao FNDE que realize o aditamento do contrato, com prorrogação referente ao primeiro e segundo semestres do ano letivo de 2020, bem como proceda à liberação dos respectivos valores, tomando as providências cabíveis para a realização da operação.

É o voto.

 

 



E M E N T A

 

 

 

AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO À EDUCAÇÃO. FINANCIAMENTO ESTUDANTIL. PRORROGAÇÃO DO CONTRATO. POSSIBILIDADE. SUSPENSÃO PARA TRATAMENTO MÉDICO.

- A Constituição Federal, em seus artigos 6º e 205, prevê a educação como um dos direitos sociais fundamentais. A Lei nº 10.260/2001, que dispõe sobre o Fundo de Financiamento ao estudante do Ensino Superior, estabelece, em seu art. 5º, que o prazo máximo para fruição do contrato não poderá ser superior à duração regular do curso; excepcionalmente, por iniciava do estudante, a instituição de ensino à qual esteja vinculado poderá dilatar em até um ano o mencionado prazo.

- O contrato celebrado com o FIES teve início no primeiro semestre de 2014, entretanto foi solicitada e concedida a suspensão do financiamento por três semestres, período em que a estudante trancou o curso de Direito, pois necessitou se afastar de suas atividades em razão de patologia.

- Observe-se que, levando-se em conta os três semestres em que ocorreu a suspensão solicitada, a parte agravante, na realidade, teve nove semestres financiados a partir dos recursos disponibilizados pelo programa FIES. Ademais, mesmo após o término dos dez semestres inicialmente pactuados, é possível a prorrogação do contrato por mais dois semestres, conforme previsão do art. 5º, §3º, da Lei nº 10.260/2001.

- Em um juízo de cognição sumária, tendo em vista a excepcionalidade do caso concreto, a impossibilidade de a parte agravante permanecer no curso de Direito sem o auxílio do FIES e, ainda, visando à preservação do direito à educação, entendo viável a prorrogação do contrato de financiamento para o primeiro e segundo semestres do ano letivo de 2020.

- Agravo interno prejudicado. Agravo de instrumento provido.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Segunda Turma decidiu, por unanimidade, julgar prejudicado o agravo interno e dar provimento ao agravo de instrumento, para determinar ao FNDE que realize o aditamento do contrato, com prorrogação referente ao primeiro e segundo semestres do ano letivo de 2020, bem como proceda à liberação dos respectivos valores, tomando as providências cabíveis para a realização da operação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.