APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000240-13.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: LUCIANA FERREIRA SILVA
Advogado do(a) APELADO: EDIMAR CAVALCANTE COSTA - SP260302-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000240-13.2018.4.03.9999 RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS APELADO: LUCIANA FERREIRA SILVA Advogado do(a) APELADO: EDIMAR CAVALCANTE COSTA - SP260302-N OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de ação ordinária aforada em 03/11/2009 por Luciana Ferreira Silva contra o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, em que objetiva o restabelecimento do benefício de auxílio doença e sua conversão em aposentadoria por invalidez a partir da alta médica ocorrida em 05/03/2007. A sentença proferida em 24/03/2017 julgou procedente o pedido e concedeu à autora o benefício de aposentadoria por invalidez a partir da cessação do benefício de auxílio-doença, com o pagamento dos valores em atraso acrescidos de correção monetária a juros de mora, a partir da citação, nos termos da Lei nº 11.960/09, condenando o réu ao pagamento de honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor das parcelas vencidas até a sentença (Súm 111/STJ).Foi determinada a imediata implantação do benefício. Sentença não submetida a reexame necessário. Apela o INSS, pugnando pela decretação da nulidade da sentença, em razão da coisa julgada proveniente da ação idêntica anteriormente aforada pela autora, processo nº 2009.63.09.002115-8, com curso perante o Juizado Especial Federal de Mogi das Cruzes, na qual reconhecida a improcedência do pedido, por ausência de incapacidade, de forma que acobertada pela coisa julgada material o período anterior a 10/09/2009, pelo que inviável a fixação da data de início do benefício na data da cessação do último auxílio-doença, 05/03/2007. Alega que houve a perda da qualidade de segurada da autora, pois não efetuou qualquer recolhimento após a cessação do benefício de auxílio-doença, com o que não faz jus ao benefício por incapacidade pleiteado, ainda que modificado o estado de saúde após a perícia realizada no JEF, em 06/2009. Com contrarrazões. É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000240-13.2018.4.03.9999 RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS APELADO: LUCIANA FERREIRA SILVA Advogado do(a) APELADO: EDIMAR CAVALCANTE COSTA - SP260302-N OUTROS PARTICIPANTES: V O T O Impõe-se o acolhimento da prejudicial de coisa julgada. Consoante o disposto no artigo 337, §4º, do Código de Processo Civil: "(...) há coisa julgada quando se repete ação que já foi decidida por decisão transitada em julgado.”. A violação à coisa julgada pressupõe a reapreciação de matéria abrangida pelos limites objetivos da coisa julgada material produzida em ação precedente, desde que verificada objetivamente a tríplice identidade entre as demandas. A intangibilidade da coisa julgada assume foros de garantia constitucional e sua violação importa em ofensa à segurança jurídica, por ofensa à decisão definitiva transitada em julgado anteriormente proferida e relativa à mesma relação jurídica na qual coincidem partes, pedido e causa de pedir, nos termos do art. 301, §§ 1º e 2º, do CPC/73, atual art. 337, §§ 1º e 2º do Código de Processo Civil em vigor. No caso sob exame, antes de ajuizada a presente ação perante a Comarca de Suzano/SP, o que se deu em 03/11/2009, a autora já havia proposto outra ação perante o Juizado Especial Federal da Subseção Judiciária de Mogi das Cruzes/SP em 26.03.2009, autuada sob nº 2009.63.09.002115-8, com trânsito em julgado em 28/10/2009, na qual postulou igualmente o restabelecimento do mesmo benefício de auxílio-doença e a concessão de benefício previdenciário de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença. A sentença proferida em 18/09/2009 perante o JEF (fls. 68 – ID 89348379) julgou improcedente o pedido, invocando as conclusões do lado médico pericial, na especialidade de psiquiatria, com base em exame realizado em 29/06/2009, no sentido de não existir incapacidade para o trabalho ou atividade habitual, por não apresentar qualquer transtorno psiquiátrico, sem sintomas típicos de quadro de doença mental. Do cotejo da causa de pedir deduzida nas ações sucessivamente propostas, verifica-se que a incapacidade laboral nelas alegada decorre da mesma incapacidade decorrente de quadro de transtorno mental diagnosticado como psicose não orgânica não especificada (CID – F 29), Constata-se de plano que a sentença ora recorrida, ao condenar o INSS a conceder benefício por incapacidade a partir da alta médica ocorrida em 05/03/2007, se pronunciou acerca da existência de incapacidade laboral em período que já se encontrava acobertado pela coisa julgada material proferida na primeira ação aforada, com trânsito em julgado em 28/10/2009. Ao postular o restabelecimento do beneficio de auxílio-doença, a pretensão deduzida na presente ação constitui repetição parcial daquela objeto da primeira ação proposta, pois os pedidos formulados envolvem o pronunciamento acerca dos mesmos fatos já apreciados na ação anterior, em sede de cognição exauriente, na sentença de mérito nela proferida e que produziu coisa julgada material acerca da matéria. Como se vê, a alegação de agravamento do estado de saúde da autora que permitisse o reconhecimento da causa de pedir diversa da primeira ação envolveria o pronunciamento acerca da existência de incapacidade laboral a partir de 29/10/2009, data, contudo, em que a autora não mais mantinha a qualidade de segurada da Previdência Social. A condição de segurado (obrigatório ou facultativo) decorre da inscrição no regime de previdência pública, cumulada com o recolhimento das contribuições correspondentes. O artigo 15 da Lei nº 8.213/91 dispõe sobre as hipóteses de manutenção da qualidade de segurado, independentemente de contribuições; trata-se do denominado período de graça, durante o qual remanesce o direito a toda a cobertura previdenciária. Confira-se: “Art. 15. Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições: I - sem limite de prazo, quem está em gozo de benefício; II - até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem remuneração; III - até 12 (doze) meses após cessar a segregação, o segurado acometido de doença de segregação compulsória; IV - até 12 (doze) meses após o livramento, o segurado retido ou recluso; V - até 3 (três) meses após o licenciamento, o segurado incorporado às Forças Armadas para prestar serviço militar; VI - até 6 (seis) meses após a cessação das contribuições, o segurado facultativo. § 1º O prazo do inciso II será prorrogado para até 24 (vinte e quatro) meses se o segurado já tiver pago mais de 120 (cento e vinte) contribuições mensais sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado. § 2º Os prazos do inciso II ou do § 1º serão acrescidos de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social. § 3º Durante os prazos deste artigo, o segurado conserva todos os seus direitos perante a Previdência Social." A doutrina e a jurisprudência são pacíficas no sentido de que não flui o período de graça, não perdendo a qualidade de segurado o trabalhador que deixou de contribuir para o RGPS por se encontrar impossibilitado de exercer atividades laborativas em decorrência da sua condição de saúde, e que teve seu benefício de auxílio doença ou aposentadoria por invalidez cessado indevidamente, ou ainda negada a sua concessão, quando comprovadamente se encontrava incapacitado. No que toca à prorrogação do período de graça ao trabalhador desempregado, não obstante a redação do §2º do artigo 15 da Lei nº. 8.213/1991 mencionar a necessidade de registro perante o Ministério do Trabalho e da Previdência Social para tanto, o Superior Tribunal de Justiça, em sede de Incidente de Uniformização de Interpretação de Lei Federal (Pet. 7.115), firmou entendimento no sentido de que a ausência desse registro poderá ser suprida quando outras provas constantes dos autos, inclusive a testemunhal, se revelarem aptas a comprovar a situação de desemprego. A perda da qualidade de segurado está disciplinada no §4º desse dispositivo legal, ocorrendo no dia seguinte ao do término do prazo para recolhimento da contribuição referente ao mês de competência imediatamente posterior ao final dos prazos para manutenção da qualidade de segurado. Depreende-se, assim, que o segurado mantém essa qualidade por mais um mês e meio após o término do período de graça, independente de contribuição, mantendo para si e para os seus dependentes o direito aos benefícios previdenciários. A autora manteve a qualidade de segurada até maio de 2008, considerada a cessação do benefício de auxílio-doença em 05/03/2007. Assim, não havendo prova da existência de incapacidade laboral quando da perda da qualidade de segurada, resulta inviável a manutenção da sentença recorrida, impondo-se o provimento do recurso e a decretação da improcedência do pedido. Inverto o ônus da sucumbência e condeno a parte autora ao pagamento de honorários de advogado que ora fixo em 10% (dez por cento) do valor da causa atualizado, de acordo com o §6º do artigo 85 do Código de Processo Civil/2015, cuja exigibilidade, diante da assistência judiciária gratuita que lhe foi concedida, fica condicionada à hipótese prevista no § 3º do artigo 98 do Código de Processo Civil/2015. Revogo a antecipação de tutela concedida. A questão referente à eventual devolução dos valores recebidos a este título deverá ser analisada e decidida em sede de execução, nos termos do artigo 302, I, e parágrafo único, do CPC/2015, e de acordo com o que restar decidido no julgamento do Tema 692, pelo C. Superior Tribunal de Justiça. Ante o exposto, dou provimento ao recurso de apelação. É o voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ/AUXÍLIO-DOENÇA. QUADRO FÁTICO IDÊNTICO. EXISTÊNCIA DE COISA JULGADA PARCIAL. PERÍODO POSTERIOR. PERDA DA QUALIDADE DE SEGURADA. RECURSO PROVIDO.
1. Consoante o disposto no artigo 337, §4º, do Código de Processo Civil: "(...) há coisa julgada quando se repete ação que já foi decidida por decisão transitada em julgado.”.
2. Ao postular o restabelecimento do beneficio de auxílio-doença, a pretensão deduzida na presente ação constitui repetição parcial daquela objeto da primeira ação proposta, pois os pedidos formulados envolvem o pronunciamento acerca dos mesmos fatos já apreciados na ação anterior, em sede de cognição exauriente, na sentença de mérito nela proferida e que produziu coisa julgada material acerca da matéria.
3. A alegação de agravamento do estado de saúde da autora que permitisse o reconhecimento da causa de pedir diversa da primeira ação envolveria o pronunciamento acerca da existência de incapacidade laboral a partir de 29/10/2009, data, contudo, em que a autora não mais mantinha a qualidade de segurada da Previdência Social.
3. Inversão do ônus da sucumbência. Exigibilidade condicionada à hipótese prevista no artigo 12 da Lei nº 1.060/50. Tutela antecipada revogada.
4. Apelação do INSS provida.