Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001353-93.2017.4.03.6104

RELATOR: Gab. 11 - DES. FED. ANDRÉ NABARRETE

APELANTE: SANMINA-SCI DO BRASIL INTEGRATION LTDA

Advogado do(a) APELANTE: ALEXANDRE LIRA DE OLIVEIRA - SP218857-A

APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 


 

  

APELAÇÃO CÍVEL (1728) Nº 5001353-93.2017.4.03.6104

RELATOR: Gab. 11 - DES. FED. ANDRÉ NABARRETE

APELANTE: SANMINA-SCI DO BRASIL INTEGRATION LTDA

Advogado do(a) APELANTE: ALEXANDRE LIRA DE OLIVEIRA - SP218857-A

APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL, UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

 

Apelação interposta por Sanmina-Sci do Brasil Integration Ltda. contra sentença que, em sede de mandado de segurança, reconheceu a ilegitimidade passiva da autoridade coatora e extinguiu o processo sem resolução do mérito, na forma do artigo 485, inciso VI, do Código de Processo Civil (Id 1393216).

 

Aduz (Id 1393223) que:

 

a) a sentença é nula, porquanto não observados os princípios da cooperação, do amplo contraditório e ampla defesa e da primazia da resolução do mérito, conforme disposto nos artigos 317 e 339 do CPC;

 

b) no mandado de segurança, a autoridade coatora não é aquela que editou o ato normativo, mas quem tem o dever funcional de responder pelo cumprimento da norma, isto é, aplicar-lhe e garantir o seu cumprimento. No caso, o Regimento Interno da Secretaria da Receita Federal atribui às alfândegas a competência para registro e fiscalização dos processos de importação, especialmente quanto à apuração dos tributos incidentes na operação;

 

c) o artigo 3º, § 2º, da Lei 9.716/98 não guarda relação com o artigo 237 da Constituição, que atribui ao Ministério da Fazenda a função de controle e fiscalização do comércio exterior e o reajuste dos valores devidos a título de taxa SISCOMEX, pois o exercício da competência tributária quanto à instituição e majoração dos tributos, é exclusivamente exercido pelo legislativo (artigos 145 a 149,150 e 151, da CF);

 

d) o artigo 97, § 2º, do Código Tributário Nacional admite que a tão somente a atualização monetária do valor da base de cálculo do tributo seja efetuada por ato infralegal. Assim, observa-se que a majoração da taxa de utilização do SISCOMEX promovida pela Portaria MF nº 257/2011 é ilegal;

 

e) em contrariedade ao estabelecido no artigo 3º, §2º, da Lei n.º 9.716/98, a Portaria Ministerial n.º 257/11, editada para reajustar o valor da taxa, não demonstrou qual foi a variação dos custos de operação e dos investimentos no SISCOMEX;

 

f) reconhecida a ilegalidade da majoração perpetrada pela Portaria MF n.º 257/2011, requer-se o deferimento do direito de restituição/compensação dos valores indevidamente recolhidos nos cinco anos anteriores a impetração do mandamus, na forma dos artigos 165, inciso I, 168, 170 e 170-A, do CTN.

 

Em contrarrazões (Id 1393227), a União requer o desprovimento do recurso.

 

O Parquet entendeu ausente o interesse institucional apto a justificar a sua intervenção e se manifestou pelo prosseguimento do feito (Id 1477759).

 

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 


APELAÇÃO CÍVEL (1728) Nº 5001353-93.2017.4.03.6104

RELATOR: Gab. 11 - DES. FED. ANDRÉ NABARRETE

APELANTE: SANMINA-SCI DO BRASIL INTEGRATION LTDA

Advogado do(a) APELANTE: ALEXANDRE LIRA DE OLIVEIRA - SP218857-A

APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL, UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

V O T O

 

 

I - Dos fatos

 

Mandado de segurança impetrado por Sanmina-Sci do Brasil Integration Ltda. contra ato praticado pelo Inspetor Chefe da Alfândega do Porto de Santos/SP, com vista ao afastamento da majoração da taxa SISCOMEX instituída pela Portaria MF n.º 257/2011, bem como o reconhecimento do direito à restituição dos valores pagos indevidamente.

 

II – Da ilegitimidade da parte

 

Dispõe o artigo 6º, § 3º, da Lei n.º 12.016/09:

 

Art. 6º  A petição inicial, que deverá preencher os requisitos estabelecidos pela lei processual, será apresentada em 2 (duas) vias com os documentos que instruírem a primeira reproduzidos na segunda e indicará, além da autoridade coatora, a pessoa jurídica que esta integra, à qual se acha vinculada ou da qual exerce atribuições. 

(...)

§ 3º Considera-se autoridade coatora aquela que tenha praticado o ato impugnado ou da qual emane a ordem para a sua prática. [destaquei]

 

Conforme ensina Hugo de Brito Machado (in Mandado de Segurança em Matéria Tributária, 8ª edição, 2009, p.80, São Paulo: Dialética): a autoridade coatora no mandado de segurança é sempre aquela que, direta ou indiretamente, é responsável pela prática do ato impugnado. No caso dos autos é o Inspetor Chefe da Alfândega a autoridade responsável pela exigência da taxa SISCOMEX. Confira-se o entendimento dessa corte: AC 5002243-92.2018.4.03.6105, Rel. Des. Fed. Johonson Di Salvo, Sexta Turma, j. 02.12.2019, Intimação via sistema em 06.12.2019; AC 5001980-52.2017.4.03.6119, Rel. Des. Fed. Cecilia Marcondes, Terceira Turma, j. 25.10.2019, e - DJF3 Judicial 1 de 03.11.2019 e AC 5003010-33.2018.4.03.6105, Rel. Des. Fed. Diva Malerbi, j. 26.04.2019, Intimação via sistema em 03.05.2019.

 

Assim, em atenção do princípio da primazia do mérito, afasto a preliminar de nulidade da sentença e reconheço a legitimidade passiva da autoridade coatora apontada. Passo, portanto, à análise do mérito, nos termos do artigo 1.013, §3º, inciso I, do CPC, porquanto existentes informações suficientes para o julgamento do feito.

 

III - Da taxa SISCOMEX

 

A taxa de utilização do sistema integrado de comércio exterior – SISCOMEX foi instituída pelo artigo 3º da Lei n. º 9.716/98, nos seguintes termos:

 

Art. 3º. Fica instituída a Taxa de Utilização do Sistema Integrado de Comércio Exterior - SISCOMEX, administrada pela Secretaria da Receita Federal do Ministério da Fazenda.

§ 1º A taxa a que se refere este artigo será devida no Registro da Declaração de Importação, à razão de:               

I - R$ 30,00 (trinta reais) por Declaração de Importação;

II - R$ 10,00 (dez reais) para cada adição de mercadorias à Declaração de Importação, observado limite fixado pela Secretaria da Receita Federal.

§ 2º Os valores de que trata o parágrafo anterior poderão ser reajustados, anualmente, mediante ato do Ministro de Estado da Fazenda, conforme a variação dos custos de operação e dos investimentos no SISCOMEX.

§ 3º Aplicam-se à cobrança da taxa de que trata este artigo as normas referentes ao Imposto de Importação.

§ 4o  O produto da arrecadação da taxa a que se refere este artigo fica vinculado ao Fundo Especial de Desenvolvimento e Aperfeiçoamento das Atividades de Fiscalização - FUNDAF, instituído pelo art. 6º do Decreto-Lei no 1.437, de 17 de dezembro de 1975.

§ 5º O disposto neste artigo aplica-se em relação às importações registradas a partir de 1o de janeiro de 1999. [destaquei]

 

De início, ressalte-se que já foi analisado pelo Supremo Tribunal Federal o tema atinente à validade da taxa SISCOMEX nos moldes em que instituída pela Lei n.º 9.716/98, verbis:

 

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. TAXA SISCOMEX. MAJORAÇÃO. PORTARIA. DELEGAÇÃO. ARTIGO 3º, § 2º, LEI Nº 9.716/98. AUSÊNCIA DE BALIZAS MÍNIMAS DEFINIDAS EM LEI. PRINCÍPIO DA LEGALIDADE. VIOLAÇÃO. ATUALIZAÇÃO. ÍNDICES OFICIAIS. POSSIBILIDADE.

1. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal tem acompanhado um movimento de maior flexibilização do Princípio da Legalidade em matéria de delegação legislativa, desde que o legislador estabeleça o desenho mínimo que evite o arbítrio.

2. Diante dos parâmetros já traçados na jurisprudência da Corte, a delegação contida no art. 3º, § 2º, da Lei nº 9.716/98 restou incompleta ou defeituosa, pois o legislador não estabeleceu o desenho mínimo que evitasse o arbítrio fiscal.

3. Esse entendimento não conduz a invalidade da taxa SISCOMEX, tampouco impede que o Poder Executivo atualize os valores previamente fixados na lei, de acordo com os índices oficiais, conforme amplamente aceito na jurisprudência da Corte.

4. Agravo regimental não provido.

5. Não se aplica ao caso dos autos a majoração dos honorários prevista no art. 85, § 11, do novo Código de Processo Civil, uma vez que não houve o arbitramento de honorários sucumbenciais.

(RE 1.095.001 AgR, Rel.  Min. Dias Toffoli, Segunda Turma, j. 06.03.2018, DJe-103 de 28.05.2018, destaquei).

 

Considerada a validade da taxa, passa-se ao exame da Portaria MF nº 257/11 e da IN RFB n.º 1.158/2011, que estabeleceram a alteração dos valores desse tributo. Transcreve-se o teor das normas em debate:

 

Portaria MF n.º 257/2011

Art. 1º Reajustar a Taxa de Utilização do Sistema Integrado de Comércio Exterior (SISCOMEX), devida no Registro da Declaração de Importação (DI), de que trata o parágrafo 1º do artigo 3º da Lei nº 9.716, de 1998, nos seguintes valores:

I - R$ 185,00 (cento e oitenta e cinco reais) por DI;

II - R$ 29,50 (vinte e nove reais e cinquenta centavos) para cada adição de mercadorias à DI, observados os limites fixados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil (RFB).

Art. 2º Esta Portaria entra em vigor na data de sua publicação. [destaquei]

 

IN RFB n.º 1.158/2011

Art. 1º O art. 13 da Instrução Normativa SRF nº 680, de 2 de outubro de 2006, passa a vigorar com a seguinte redação:

"Art. 13. A Taxa de Utilização do Siscomex será devida no ato do registro da DI à razão de:

I - R$ 185,00 (cento e oitenta e cinco reais) por DI;

II - R$ 29,50 (vinte e nove reais e cinquenta centavos) para cada adição de mercadoria à DI, observados os seguintes limites:

a) até a 2ª adição - R$ 29,50;

b) da 3ª à 5ª - R$ 23,60;

c) da 6ª à 10ª - R$ 17,70;

d) da 11ª à 20ª - R$ 11,80;

e) da 21ª à 50ª - R$ 5,90; e

f) a partir da 51ª - R$ 2,95. [destaquei]

 

Do ponto de vista da constitucionalidade, assim dispõe o artigo 150, inciso I, da CF/88, verbis:

 

Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

I - Exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça; [destaquei]

 

Dessa forma, vedada a majoração por meio de norma infralegal, é de rigor o afastamento da Portaria MF nº 257/11 e da IN RFB n.º 1.158/2011. Nesse sentido:

 

1. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. 2. DIREITO TRIBUTÁRIO. 3. TAXA DE UTILIZAÇÃO DO SISTEMA INTEGRADO DE COMÉRCIO EXTERIOR (SISCOMEX). (...) 4. A jurisprudência desta Corte consagrou entendimento no sentido de reconhecer a inconstitucionalidade da majoração da Taxa de Utilização do SISCOMEX por ato normativo infralegal, mas sem, contudo, impedir que o Poder Executivo atualize os valores fixados em lei para a referida taxa em percentual não superior aos índices oficiais de correção monetária. 5. Ausência de argumentos capazes de infirmar a decisão agravada. 6. Agravo regimental a que se nega provimento. 7. Devida majoração da verba honorária procedida pela decisão agravada. Nova majoração em 20% do valor da verba honorária fixada na origem.

 (RE 1130979 AgR, Rel.  Min. Gilmar Mendes, Segunda Turma, j. 22.03.2019, DJe-064 de 01.04.2019, destaquei).

 

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. REITERAÇÃO DA TESE DO RECURSO INADMITIDO. SUBSISTÊNCIA DA DECISÃO AGRAVADA. TAXA DE UTILIZAÇÃO DO SISCOMEX. MAJORAÇÃO POR PORTARIA DO MINISTÉRIO DA FAZENDA. IMPOSSIBILIDADE. AGRAVO A QUE SE NEGA PROVIMENTO. I - As razões do agravo regimental são inaptas para desconstituir os fundamentos da decisão agravada, que, por isso, se mantêm hígidos. II – É inconstitucional a majoração da taxa de utilização do Sistema Integrado de Comércio Exterior - SISCOMEX, por meio de portaria do Ministério da Fazenda. Precedentes. III - Agravo regimental a que se nega provimento.

(RE 1122085 AgR, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, Segunda Turma, j. 30.11.2018, DJe-262 de 06.12.2018, destaquei).

 

O Supremo Tribunal Federal reafirmou seu entendimento sobre o tema, no julgamento do Recurso Extraordinário n. º 1.258.934, representativo da controvérsia:

 

Recurso extraordinário. Tributário. Taxa de utilização do Sistema Integrado de Comércio Exterior (SISCOMEX). Majoração da base de cálculo por portaria ministerial. Delegação legislativa. Artigo 3º, § 2º, da Lei nº 9.716/1998. Princípio da legalidade. Ausência de balizas mínimas definidas em lei. Atualização. Índices oficiais. Possibilidade. Existência de repercussão geral. Reafirmação da jurisprudência da Corte sobre o tema.

(RE 1258934 RG, Rel. Min. Dias Toffoli, j. 09.04.2020, processo eletrônico DJe-102 de 27.04.2020).

 

Ressalte-se que, como firmado pela jurisprudência daquela corte, não é vedado o reajuste da taxa, isto é, a atualização monetária do valor exigido, o que inclusive está previsto no artigo 97, § 2º, do Código Tributário Nacional, verbis:

 

Art. 97. Somente a lei pode estabelecer:

(...)

§ 2º Não constitui majoração de tributo, para os fins do disposto no inciso II deste artigo, a atualização do valor monetário da respectiva base de cálculo.

 

Assim, tem-se permitida a atualização da taxa SISCOMEX por meio da aplicação dos índices oficiais. Conforme entendimento firmado no julgamento do Recurso Extraordinário n.º 1.111.866, de relatoria do Ministro Dias Toffoli, a variação da inflação medida pelo INPC, no período de 01 de janeiro de 1999 a 30 de abril de 2011, foi de 131,60%, o qual deve ser o índice de reajuste a ser aplicado.  Nesse mesmo sentido: TRF 3ª Região, 4ª Turma, ApReeNec 5025833-16.2018.4.03.6100, Rel. Des. Fed. Monica Nobre, j. 09.12.2019, Intimação via sistema de 16.12.2019; RemNecCiv n.º 5008189-48.2018.4.03.6104, Rel. Des. Fed. Marcelo Saraiva, j. 19.12.2019, e - DJF3 Judicial 1 de 09.01.2020 e TRF 4ª Região, ApReeNec n.º 5003256-77.2016.4.04.7202, Primeira Turma, Rel. Maria de Fátima Freitas Labarrère, j. 05.05.2017.

 

Reconhecida a ilegalidade da majoração, passo à análise do pedido de a restituição dos valores indevidamente recolhidos.

 

IV – Da restituição

 

a) Do prazo prescricional

 

A questão relativa à contagem de prazo prescricional dos tributos sujeitos a lançamento por homologação foi analisada pelo Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Especial nº 1.269.570/MG, de acordo com o entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal na análise do Recurso Extraordinário nº 566.621/RS, ao entendimento de que a repetição ou compensação de indébitos, a partir da vigência da Lei Complementar n.º 118/05, deve ser efetuada em até cinco anos a partir do recolhimento indevido.

 

b) Da comprovação do recolhimento

 

A questão da comprovação para fins de compensação tributária no âmbito do mandado de segurança já foi objeto de análise pela Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp 1.365.095/SP e do REsp 1.715.256/SP, sob o rito dos recursos repetitivos, o qual concluiu que basta a demonstração da qualidade de contribuinte em relação ao tributo alegadamente pago de forma indevida. Dessa forma, os valores efetivamente a serem compensados somente serão apurados na seara administrativa, momento em que devem ser apresentados todos os documentos pertinentes ao recolhimento a maior. Em outras palavras, para o deferimento do pleito compensatório requerido judicialmente não se faz necessária juntada dos comprovantes de pagamento.

 

c) Da compensação

 

Conforme entendimento do Superior Tribunal de Justiça exarado no Recurso Especial n.º 1.137.738/SP, representativo da controvérsia, submetido ao regime de julgamento previsto pelo artigo 543-C do Código de Processo Civil de 1973, no tocante à compensação deve ser aplicada a lei vigente à época da propositura da demanda, verbis:

 

TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ART. 543-C, DO CPC. COMPENSAÇÃO. TRIBUTÁRIA. SUCESSIVAS MODIFICAÇÕES LEGISLATIVAS. LEI 8.383/91. LEI 9.430/96. LEI 10.637/02. REGIME JURÍDICO VIGENTE À ÉPOCA DA PROPOSITURA DA DEMANDA. LEGISLAÇÃO SUPERVENIENTE. INAPLICABILIDADE EM SEDE DE RECURSO ESPECIAL. ART. 170-A DO CTN. AUSÊNCIA DE INTERESSE RECURSAL. HONORÁRIOS. VALOR DA CAUSA OU DA CONDENAÇÃO. MAJORAÇÃO. SÚMULA 07 DO STJ. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC NÃO CONFIGURADA.

1. A compensação, posto modalidade extintiva do crédito tributário (artigo 156, do CTN), exsurge quando o sujeito passivo da obrigação tributária é, ao mesmo tempo, credor e devedor do erário público, sendo mister, para sua concretização, autorização por lei específica e créditos líquidos e certos, vencidos e vincendos, do contribuinte para com a Fazenda Pública (artigo 170, do CTN).

2. A Lei 8.383, de 30 de dezembro de 1991, ato normativo que, pela vez primeira, versou o instituto da compensação na seara tributária, autorizou-a apenas entre tributos da mesma espécie, sem exigir prévia autorização da Secretaria da Receita Federal (artigo 66).

3. Outrossim, a Lei 9.430, de 27 de dezembro de 1996, na Seção intitulada "Restituição e compensação de Tributos e Contribuições", determina que a utilização dos créditos do contribuinte e a quitação de seus débitos serão efetuadas em procedimentos internos à Secretaria da Receita Federal (artigo 73, caput), para efeito do disposto no artigo 7º, do Decreto-Lei 2.287/86.

4. A redação original do artigo 74, da Lei 9.430/96, dispõe: "Observado o disposto no artigo anterior, a Secretaria da Receita Federal, atendendo a requerimento do contribuinte, poderá autorizar a utilização de créditos a serem a ele restituídos ou ressarcidos para a quitação de quaisquer tributos e contribuições sob sua administração".

5. Consectariamente, a autorização da Secretaria da Receita Federal constituía pressuposto para a compensação pretendida pelo contribuinte, sob a égide da redação primitiva do artigo 74, da Lei 9.430/96, em se tratando de tributos sob a administração do aludido órgão público, compensáveis entre si.

6. A Lei 10.637, de 30 de dezembro de 2002 (regime jurídico atualmente em vigor) sedimentou a desnecessidade de equivalência da espécie dos tributos compensáveis, na esteira da Lei 9.430/96, a qual não mais albergava esta limitação.

7. Em consequência, após o advento do referido diploma legal, tratando-se de tributos arrecadados e administrados pela Secretaria da Receita Federal, tornou-se possível a compensação tributária, independentemente do destino de suas respectivas arrecadações, mediante a entrega, pelo contribuinte, de declaração na qual constem informações acerca dos créditos utilizados e respectivos débitos compensados, termo a quo a partir do qual se considera extinto o crédito tributário, sob condição resolutória de sua ulterior homologação, que se deve operar no prazo de 5 (cinco) anos.

8. Deveras, com o advento da Lei Complementar 104, de 10 de janeiro de 2001, que acrescentou o artigo 170-A ao Código Tributário Nacional, agregou-se mais um requisito à compensação tributária a saber: "Art. 170-A. É vedada a compensação mediante o aproveitamento de tributo, objeto de contestação judicial pelo sujeito passivo, antes do trânsito em julgado da respectiva decisão judicial."

9. Entrementes, a Primeira Seção desta Corte consolidou o entendimento de que, em se tratando de compensação tributária, deve ser considerado o regime jurídico vigente à época do ajuizamento da demanda, não podendo ser a causa julgada à luz do direito superveniente, tendo em vista o inarredável requisito do prequestionamento, viabilizador do conhecimento do apelo extremo, ressalvando-se o direito de o contribuinte proceder à compensação dos créditos pela via administrativa, em conformidade com as normas posteriores, desde que atendidos os requisitos próprios (EREsp 488992/MG).

(...)

17. Recurso especial parcialmente conhecido e parcialmente provido, apenas para reconhecer o direito da recorrente à compensação tributária, nos termos da Lei 9.430/96. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução STJ 08/2008.

(REsp 1137738/SP, Rel. Min. Luiz Fux, Primeira Seção, julgado em 09.12.2009, DJe 01.02.2010, destaquei)

 

No caso, impetrado o mandamus em 28.06.2017, deve ser aplicada a Lei nº 10.637/2002, com as limitações previstas na Lei nº 11.457/2007, as quais estabelecem que a compensação dar-se-á com débitos relativos a quaisquer tributos e contribuições administrados pela Secretaria da Receita Federal, à exceção das contribuições sociais previstas nas alíneas "a", "b" e "c" do parágrafo único do artigo 11 da Lei nº 8.112/91 (artigo 26, parágrafo único, da Lei nº 11.457/2007).

 

Quanto ao artigo 170-A do Código Tributário Nacional, a matéria foi decidida pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento dos Recursos Especiais n.º 1.164.452/MG e n.º 1.167.039/DF, representativos da controvérsia, o qual fixou a orientação no sentido de que aquele dispositivo deve ser aplicado tão somente às demandas propostas após sua entrada em vigor, que se deu com a Lei Complementar n.º 104/2001, mesmo na hipótese de o tributo apresentar vício de constitucionalidade reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal.

 

d) Dos consectários legais

 

Quanto à correção monetária, saliento que se trata de mecanismo de recomposição da desvalorização da moeda que visa a preservar o poder aquisitivo original. Dessa forma, ela é devida nas ações de repetição de indébito tributário e deve ser efetuada com base no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, aprovado pela Resolução nº 267/2013 do Conselho da Justiça Federal (STJ, AgRg no REsp 1171912/MG, Primeira Turma, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, j. 03.05.2012, DJe 10.05.2012).

 

No que se refere aos juros de mora, o Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no Recurso Especial n.º 1.111.175/SP, representativo da controvérsia, submetido ao regime de julgamento previsto pelo artigo 543-C do Código de Processo Civil de 1973, no sentido de que nas hipóteses em que a decisão ainda não transitou em julgado, como é o caso dos autos, incide apenas a taxa SELIC, que embute em seu cálculo juros e correção monetária (STJ, REsp 1.111.175/SP, Primeira Seção, Rel. Min. Denise Arruda, j. 10.06.2009, DJe 01.07.2009).

 

Por fim, as questões relativas ao demais artigos suscitados no recurso e em contrarrazões, quais sejam, os artigos 5º, inciso XXXIII, 37, 145 a 149-A, 150, inciso I,  e 151, 167da CF, 317 e 339 do CPC, 123, 224, 225, 295 e 307 do Regimento Interno da Secretaria da Receita Federal (Portaria MF nº 587/2010, 77, 79 e 96 do CTN, 4° da Lei 9.716/98, 50 da Lei nº 9.784/99, 2º da Lei nº 4.717/65, 6º do Decreto-Lei no 1.437/75, 11 e 13 da Instrução Normativa SRF nº 680/2006, 3º do Decreto nº 660/1992,  4º da LC n.º 118/05, 1º da Portaria MF/MICT, bem como o Decreto n° 660/1992, Decreto no 7.496/2011 e  Decreto nº 1.707/95, além das Notas Técnicas Conjunta COTEC/COPOL/COANA de nº 02/2001 e 03/2011 e das Súmulas 269 e 271 do STF, não têm condão de alterar esse entendimento pelos motivos já apontados.

 

V – Do dispositivo

 

Ante o exposto, dou provimento à apelação para reformar a sentença e afastar a ilegitimidade passiva, bem como, nos termos do artigo 1.013, §1º, inciso I, do CPC, concedo a ordem para determinar a utilização do INPC como índice de reajuste da taxa SISCOMEX e condenar a União à compensação tributária, na forma explicitada. Sem honorários, na forma do artigo 25 da Lei n.º 12.016/09. Custas ex vi legis.

 

É como voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 


 

E M E N T A

TRIBUTÁRIO. APELAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA. TAXA SISCOMEX. LEGITIMIDADE PASSIVA DO INSPETOR-CHEFE DA ALFÂNDEGA. PORTARIA MF nº 257/11 E IN RFB n.º 1.158/2011. MAJORAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. RESTITUIÇÃO DOS VALORES RECOLHIDOS INDEVIDAMENTE. RECURSO PROVIDO.

- O Inspetor Chefe da Alfândega  é a autoridade que detém a competência para praticar o ato de lançamento do tributo e a aplicação da norma relativa à exigência da taxa SISCOMEX, razão pela qual deve ser reconhecida a sua legitimidade passiva, nos termos do artigo 6º, §3º, da Lei n.º 12.016/09.

- A validade da taxa SISCOMEX, na forma da Lei n.º 9.716/98, foi reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal (RE 1.095.001 AgR, Rel.  Min. Dias Toffoli, Segunda Turma, j. 06.03.2018, DJe-103 de 28.05.2018).

- É vedada a majoração de tributo por meio de norma infralegal, razão pela qual é de rigor o afastamento da Portaria MF nº 257/11 e da IN RFB n.º 1.158/2011, conforme entendimento firmado no julgamento do Recurso Extraordinário n. º 1.258.934, representativo da controvérsia.

- É permitida a atualização da taxa SISCOMEX por meio da aplicação dos índices oficiais. Conforme entendimento firmado no julgamento do Recurso Extraordinário n.º 1.111.866, de relatoria do Ministro Dias Toffoli, deve ser aplicada a variação da inflação medida pelo INPC no período de 01 de janeiro de 1999 a 30 de abril de 2011 foi de 131,60%, e este deve ser o índice de reajuste a ser aplicado.  Precedentes.

- A questão relativa à contagem de prazo prescricional dos tributos sujeitos a lançamento por homologação foi analisada pelo Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Especial nº 1.269.570/MG, de acordo com o entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal na análise do Recurso Extraordinário nº 566.621/RS, ao entendimento de que a repetição ou compensação de indébitos, a partir da vigência da Lei Complementar n.º 118/05, deve ser efetuada em até cinco anos a partir do recolhimento indevido.

- A possibilidade de compensação tributária no âmbito do mandado de segurança já foi objeto de análise pela Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp 1.365.095/SP e do REsp 1.715.256/SP, sob o rito dos recursos repetitivos, o qual concluiu que basta a demonstração da qualidade de contribuinte em relação ao tributo alegadamente pago de forma indevida. Dessa forma, os valores efetivamente a serem compensados somente serão apurados na seara administrativa, momento em que devem ser apresentados todos os documentos pertinentes ao recolhimento a maior.

- Conforme entendimento do Superior Tribunal de Justiça exarado no Recurso Especial n.º 1.137.738/SP, representativo da controvérsia, submetido ao regime de julgamento previsto pelo artigo 543-C do Código de Processo Civil de 1973, no tocante à compensação deve ser aplicada a lei vigente à época da propositura da demanda.

- Quanto ao artigo 170-A do Código Tributário Nacional, a matéria foi decidida pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento dos Recursos Especiais n.º 1.164.452/MG e n.º 1.167.039/DF, representativos da controvérsia, o qual fixou a orientação no sentido de que aquele dispositivo deve ser aplicado tão somente às demandas propostas após sua entrada em vigor, que se deu com a Lei Complementar n.º 104/2001, mesmo na hipótese de o tributo apresentar vício de constitucionalidade reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal.

- Quanto à correção monetária, saliento que se trata de mecanismo de recomposição da desvalorização da moeda que visa a preservar o poder aquisitivo original. Dessa forma, ela é devida nas ações de repetição de indébito tributário e deve ser efetuada com base no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, aprovado pela Resolução nº 267/2013 do Conselho da Justiça Federal (STJ, AgRg no REsp 1171912/MG, Primeira Turma, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, j. 03.05.2012, DJe 10.05.2012).

- No que se refere aos juros de mora, o Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no Recurso Especial n.º 1.111.175/SP, representativo da controvérsia, submetido ao regime de julgamento previsto pelo artigo 543-C do Código de Processo Civil de 1973, no sentido de que nas hipóteses em que a decisão ainda não transitou em julgado, como é o caso dos autos, incide apenas a taxa SELIC, que embute em seu cálculo juros e correção monetária (STJ, REsp 1.111.175/SP, Primeira Seção, Rel. Min. Denise Arruda, j. 10.06.2009, DJe 01.07.2009, destaquei).

 - Apelação provida.

 

 

 

 

 


  ACÓRDÃO
 
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, A Quarta Turma, à unanimidade, decidiu dar provimento à apelação para reformar a sentença e afastar a ilegitimidade passiva, bem como, nos termos do artigo 1.013, §1º, inciso I, do CPC, concedo a ordem para determinar a utilização do INPC como índice de reajuste da taxa SISCOMEX e condenar a União à compensação tributária, na forma explicitada. Sem honorários, na forma do artigo 25 da Lei n.º 12.016/09. Custas ex vi legis, nos termos do voto do Des. Fed. ANDRÉ NABARRETE (Relator), com quem votaram os Des. Fed. MARLI FERREIRA e MARCELO SARAIVA. Ausente, justificadamente, a Des. Fed. MÔNICA NOBRE. , nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.