APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0016201-28.2017.4.03.9999
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: DIONISIO GOMES DO NASCIMENTO
Advogado do(a) APELANTE: DHAIANNY CANEDO BARROS FERRAZ - SP197054-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0016201-28.2017.4.03.9999 RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO APELANTE: DIONISIO GOMES DO NASCIMENTO Advogado do(a) APELANTE: DHAIANNY CANEDO BARROS FERRAZ - SP197054-N APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR): Trata-se de apelações interpostas por DIONÍSIO GOMES DO NASCIMENTO e pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando o pagamento dos valores devidos, referentes à revisão do benefício nos termos do art. 29, II, da Lei nº 8.213/91, conforme acordo celebrado nos autos da Ação Civil Pública nº 0002320-59.2012.4.03.6183. A r. sentença (ID 105254752 - Pág. 100/104) reconheceu a prescrição das parcelas do benefício NB 516.108.598-0 e condenou o INSS a “pagar o valor referente aos NBs 528.091.831.4 e 538.510.008-7 à parte autora decorrente da diferença entre o que foi pago e o que deveria ter sido pago nos termos do art. 29, inciso II da Lei n° 8.213/91 em relação ao benefício de que é titular, no valor de R$ 9.662,78”. Honorários advocatícios fixados em 10% da soma das prestações vencidas até a sentença, nos termos da Súmula 111 do STJ. Em razões recursais (ID 105254752 - Pág. 108/116), a parte autora sustenta inexistir prescrição, ao fundamento de que “são devidas as parcelas vencidas no quinquênio anterior à edição do Memorando-Circular Conjunto nº 21/DIRBEN/PFEINSS”. Postula a nulidade ou a reforma da sentença, para que seja “julgada totalmente procedente a demanda para revisar os benefícios da Parte Autora, condenando a Autarquia ao pagamento dos valores em atraso nos termos da inicial”. Prequestiona a matéria. Por sua vez, o INSS pugna pela reforma do decisum, eis que, no seu entender, há coisa julgada, uma vez que os pagamentos que a parte autora pugna decorrem de acordo celebrado na Ação Civil Pública nº 0002320-59.2012.4.03.6183. Acrescenta que “o valor pretendido é inexigível, porque o crédito que possui só vence em 2020. Logo, ausente um dos pressupostos para a cobrança da suposta dívida”. Prequestiona a matéria (ID 105254752 - Pág. 124/129). Contrarrazões apenas do demandante (ID 105254752 - Pág. 135/148). Devidamente processados os recursos, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal. É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0016201-28.2017.4.03.9999 RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO APELANTE: DIONISIO GOMES DO NASCIMENTO Advogado do(a) APELANTE: DHAIANNY CANEDO BARROS FERRAZ - SP197054-N APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR): Inicialmente, patente a ausência de interesse processual, posto ser desnecessário provimento jurisdicional a respeito da questão trazida a juízo. Verifica-se que a presente demanda foi ajuizada em 18.07.2014, posteriormente à formação, em 05.09.2012, da coisa julgada material de natureza coletiva nos autos da Ação Civil Pública autuada sob n.º 0002320-59.2012.4.03.6183, que favoreceu todos os beneficiários de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença, concedidos após a vigência da Lei n.º 9.876/99, bem como pensões por morte decorrente destes, a fim de que lhes fosse revista a renda mensal inicial com a aplicação da forma de cálculo nos estritos termos do artigo 29, inciso II, da Lei n.º 8.213/91, com a redação dada pela Lei n.º 9.876/99, nos casos em que não se adotou a média aritmética simples dos maiores salários-de-contribuição correspondentes a 80% (oitenta por cento) do período contributivo. Na tutela dos direitos coletivos, verifica-se que o legislador pátrio adotou o critério da coisa julgada secundum eventum litis, conforme regras estabelecidas no Código de Defesa do Consumidor: “Art. 103. Nas ações coletivas de que trata este código, a sentença fará coisa julgada: I - erga omnes, exceto se o pedido for julgado improcedente por insuficiência de provas, hipótese em que qualquer legitimado poderá intentar outra ação, com idêntico fundamento valendo-se de nova prova, na hipótese do inciso I do parágrafo único do art. 81; II - ultra partes, mas limitadamente ao grupo, categoria ou classe, salvo improcedência por insuficiência de provas, nos termos do inciso anterior, quando se tratar da hipótese prevista no inciso II do parágrafo único do art. 81; III - erga omnes, apenas no caso de procedência do pedido, para beneficiar todas as vítimas e seus sucessores, na hipótese do inciso III do parágrafo único do art. 81. § 1° Os efeitos da coisa julgada previstos nos incisos I e II não prejudicarão interesses e direitos individuais dos integrantes da coletividade, do grupo, categoria ou classe. § 2° Na hipótese prevista no inciso III, em caso de improcedência do pedido, os interessados que não tiverem intervindo no processo como litisconsortes poderão propor ação de indenização a título individual. § 3° Os efeitos da coisa julgada de que cuida o art. 16, combinado com o art. 13 da Lei n° 7.347, de 24 de julho de 1985, não prejudicarão as ações de indenização por danos pessoalmente sofridos, propostas individualmente ou na forma prevista neste código, mas, se procedente o pedido, beneficiarão as vítimas e seus sucessores, que poderão proceder à liquidação e à execução, nos termos dos arts. 96 a 99. § 4º Aplica-se o disposto no parágrafo anterior à sentença penal condenatória. Art. 104. As ações coletivas, previstas nos incisos I e II e do parágrafo único do art. 81, não induzem litispendência para as ações individuais, mas os efeitos da coisa julgada erga omnes ou ultra partes a que aludem os incisos II e III do artigo anterior não beneficiarão os autores das ações individuais, se não for requerida sua suspensão no prazo de trinta dias, a contar da ciência nos autos do ajuizamento da ação coletiva.” Quanto ao ponto, leciona Ada Pellegrini Grinover: “[...] No tocante à demanda que envolve a tutela de direitos difusos e coletivos, indivisíveis por natureza, a coisa julgada não pode senão atuar erga omnes. A satisfação do interesse de um dos membros da coletividade significa inelutavelmente a satisfação dos interesses de todos os outros; assim como a negação do interesse de um indica a mesma negação para todos os outros. Mas essa coisa julgada erga omnes pode ter um temperamento, como ocorre em alguns países ibero-americanos: em caso de rejeição da demanda coletiva, por insuficiência de provas, a sentença não faz coisa julgada, e ação idêntica pode ser reproposta com base em provas novas (por outro legitimado, segundo a doutrina de Portugal e Costa Rica – esta sobre o Projeto –, ou até pelo mesmo legitimado, segundo a doutrina brasileira). […] É no campo da coisa julgada nos processos coletivos em defesa de direitos individuais homogêneos que as posições dos países de civil law se bifurcam vistosamente. De um lado, os países ibero-americanos – com exceção da Colômbia, de Portugal e da Província Argentina de Catamarca –, que adotam a técnica da coisa julgada secundum eventum litis. […] Levando em consideração a falta de informação e de conscientização a respeito de seus direitos de grandes parcelas da população, a dificuldade de comunicação, a distância e a precariedade dos meios de transporte, a dificuldade de acesso à justiça, as barreiras para a contratação de um advogado, esses países (com exceção da Colômbia e de Portugal) descartam seja o opt in, seja o opt out, seguindo linha completamente diferente da supratraçada: a linha da coisa julgada secundum eventum litis, só para beneficiar, mas não para prejudicar os membros do grupo. Ou seja, a coisa julgada, no plano coletivo, atua erga omnes, tanto em caso de acolhimento como de rejeição da demanda, impedindo que novo processo coletivo seja intentado por qualquer legitimado. Mas, no plano das pretensões individuais, a coisa julgada favorável pode ser imediatamente aproveitada, passando-se à liquidação e execução da sentença, enquanto a coisa julgada desfavorável não impede ações individuais, a título pessoal, dos membros do grupo. [...]” (in Código Brasileiro de Defesa do Consumidor comentado pelos autores do anteprojeto: direito material e processo coletivo.12. ed. rev. atual. reformulada. Rio de Janeiro: Forense, 2019. Titulo III - Da Defesa do Consumidor em Juízo, Processo Coletivo e Processo Individual, III – Direito Processual Coletivo, 4.2.7, 4.2.8 e 4.2.8.4) Assim, tem-se que, a depender do resultado da demanda coletiva, poderão ou não ser intentadas novas ações de natureza coletiva ou individual. Disto decorre que o ajuizamento de ação de natureza coletiva não obsta que os titulares dos respectivos interesses e direitos proponham demandas individuais. Ajuizadas previamente ou no curso da ação coletiva, os autores das ações individuais poderão optar por (1) requerer a suspensão de sua tramitação, a fim de que lhes seja estendida a solução proferida na demanda coletiva, ou (2) prosseguir individualmente, situação em que não poderão ser beneficiados por eventual solução favorável da demanda coletiva. Contudo, uma vez formada a coisa julgada material coletiva de procedência, seus efeitos são erga omnes, isto é, aplicam-se a todos os integrantes da coletividade então representada. Assim, resta vedada a incursão judicial individualizada, de natureza cognitiva, relacionada àquele direito demandado de forma coletiva, dado que todos os indivíduos se sujeitam ao quanto decidido, definitivamente, na ação coletiva. Cabe aos indivíduos, conforme o caso, promover a execução individual do julgado coletivo. Entender-se de forma diversa esvaziaria não só a norma jurídica, como a própria proteção coletiva de direitos, de sua finalidade. Desta sorte, nada há a decidir no caso concreto, eis que a parte autora, no momento da propositura desta ação individual, já tinha seu direito reconhecido judicialmente, encontrando-se, todavia, submetida aos efeitos erga omnes da coisa julgada material de natureza coletiva, em toda sua extensão, inclusive quanto ao cronograma estabelecido e ao termo inicial do prazo prescricional. Nesse sentido, cito o seguinte precedente: “PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA PREVIDENCIÁRIO CONVERTIDO EM APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. REVISÃO DE BENEFÍCIO. ART. 29, II, DA LEI Nº 8.213/91. AJUIZAMENTO DA AÇÃO INDIVIDUAL POSTERIORMENTE AO TRÂNSITO EM JULGADO DA AÇÃO CIVIL PÚBLICA Nº 0002320-59.2012.4.03.6183. CARÊNCIA DA AÇÃO POR FALTA DE INTERESSE DE AGIR. CONSECTÁRIOS LEGAIS. - Na hipótese, o objeto é a revisão do benefício de auxílio-doença previdenciário convertido em aposentadoria por invalidez, com a exclusão dos 20% menores salários-de-contribuição em observância ao art. 29, II, da Lei nº 8.213/91. - Homologação, por sentença, do acordo celebrado nos autos da Ação Civil Pública nº 0002320-59.2012.4.03.6183/SP, transitada em julgado em 05/09/2012, cujo objeto compreende a revisão dos benefícios previdenciários nos termos do Art. 29, II, da Lei 8.213/91. - No caso dos autos, a parte autora é carecedora da ação, por ter ajuizado o feito, posteriormente ao trânsito em julgado da Ação Civil Pública nº 0002320-59.2012.4.03.6183, sendo, de rigor, a extinção do processo, sem resolução do mérito, nos termos do art. 485, VI, do CPC (Lei nº 13.105/15). - Honorários advocatícios majorados ante a sucumbência recursal, observando-se o limite legal, nos termos do §§ 2º e 11 do art. 85 do CPC/2015. - Extinção do processo, sem julgamento do mérito. -Apelação da parte autora prejudicada.” (TRF3, 9ª Turma, ApCiv 00023262020194039999, relator Desembargador Federal Gilberto Jordan, Dje 19.06.2019) Por conseguinte, condeno a parte autora no ressarcimento das despesas processuais eventualmente desembolsadas pela autarquia, bem como nos honorários advocatícios, os quais arbitro em 10% (dez por cento) do valor atualizado da causa, ficando a exigibilidade suspensa por 5 (cinco) anos, desde que inalterada a situação de insuficiência de recursos que fundamentou a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, a teor do disposto nos arts. 11, §2º, e 12, ambos da Lei nº 1.060/50, reproduzidos pelo §3º do art. 98 do CPC. Ante o exposto, de ofício, julgo extinto o processo, sem resolução de mérito, a teor dos artigos 267, VI, do CPC/1973 e 485, VI do CPC/2015, condenando o demandante nas verbas de sucumbência, com dever de pagamento suspenso, restando prejudicadas as apelações interpostas por ele e pelo INSS. É como voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO DE BENEFÍCIO. ART. 29, II, DA LEI Nº 8.213/91. COBRANÇA DE VALOR DECORRENTE DE TRANSAÇÃO CELEBRADA NO BOJO DE AÇÃO CIVIL PÚBLICA. EFEITO ERGA OMNES DA COISA JULGADA MATERIAL COLETIVA DE PROCEDÊNCIA. AJUIZAMENTO DE AÇÃO INDIVIDUAL POSTERIOR AO TRÂNSITO EM JULGADO. AUSÊNCIA DE INTERESSE PROCESSUAL. OCORRÊNCIA. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO. VERBA HONORÁRIA. GRATUIDADE DA JUSTIÇA. DEVER DE PAGAMENTO SUSPENSO. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA E DO INSS PREJUDICADAS.
1 - Ausência de interesse processual, posto ser desnecessário provimento jurisdicional a respeito da questão trazida a juízo.
2 - Verifica-se que a presente demanda foi ajuizada, posteriormente à formação, em 05.09.2012, da coisa julgada material de natureza coletiva nos autos da Ação Civil Pública autuada sob n.º 0002320-59.2012.4.03.6183, que favoreceu todos os beneficiários de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença, concedidos após a vigência da Lei n.º 9.876/99, bem como pensões por morte decorrente destes, a fim de que lhes fosse revista a renda mensal inicial com a aplicação da forma de cálculo nos estritos termos do artigo 29, inciso II, da Lei n.º 8.213/91, com a redação dada pela Lei n.º 9.876/99, nos casos em que não se adotou a média aritmética simples dos maiores salários-de-contribuição correspondentes a 80% (oitenta por cento) do período contributivo.
3 - Na tutela dos direitos coletivos, verifica-se que o legislador pátrio adotou o critério da coisa julgada secundum eventum litis, conforme regras estabelecidas no Código de Defesa do Consumidor (artigos 103 e 104).
4 - Tem-se que, a depender do resultado da demanda coletiva, poderão ou não ser intentadas novas ações de natureza coletiva ou individual. Disto decorre que o ajuizamento de ação de natureza coletiva não obsta que os titulares dos respectivos interesses e direitos proponham demandas individuais.
5 - Ajuizadas previamente ou no curso da ação coletiva, os autores das ações individuais poderão optar por (1) requerer a suspensão de sua tramitação, a fim de que lhes seja estendida a solução proferida na demanda coletiva, ou (2) prosseguir individualmente, situação em que não poderão ser beneficiados por eventual solução favorável da demanda coletiva.
6 - Contudo, uma vez formada a coisa julgada material coletiva de procedência, seus efeitos são erga omnes, isto é, aplicam-se a todos os integrantes da coletividade então representada. Assim, resta vedada a incursão judicial individualizada, de natureza cognitiva, relacionada àquele direito demandado de forma coletiva, dado que todos os indivíduos se sujeitam ao quanto decidido, definitivamente, na ação coletiva. Cabe aos indivíduos, conforme o caso, promover a execução individual do julgado coletivo. Entender-se de forma diversa esvaziaria não só a norma jurídica, como a própria proteção coletiva de direitos, de sua finalidade.
7 - Nada há a decidir no caso concreto, eis que a parte autora, no momento da propositura desta ação individual, já tinha seu direito reconhecido judicialmente, encontrando-se, todavia, submetida aos efeitos erga omnes da coisa julgada material de natureza coletiva, em toda sua extensão, inclusive quanto ao cronograma estabelecido e ao termo inicial do prazo prescricional.
8 - Condenação da parte autora no ressarcimento das despesas processuais eventualmente desembolsadas pela autarquia, bem como nos honorários advocatícios, arbitrados em 10% (dez por cento) do valor atualizado da causa, ficando a exigibilidade suspensa por 5 (cinco) anos, desde que inalterada a situação de insuficiência de recursos que fundamentou a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, a teor do disposto nos arts. 11, §2º, e 12, ambos da Lei nº 1.060/50, reproduzidos pelo §3º do art. 98 do CPC.
9 - De ofício, extinção do processo, sem resolução de mérito, ante a ausência de interesse processual. Apelações da parte autora e do INSS prejudicadas.