Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 0032928-67.2014.4.03.9999

RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: MARIA INEZ DA SILVA GONCALVES

Advogado do(a) APELADO: LUIS AFONSO FLORES BISELLI - MS12305-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 0032928-67.2014.4.03.9999

RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

APELADO: MARIA INEZ DA SILVA GONCALVES

Advogado do(a) APELADO: LUIS AFONSO FLORES BISELLI - MS12305-A

 

 

 

R E L A T Ó R I O

 

 

A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (RELATORA): Trata-se de apelação interposta pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS em face da sentença que julgou procedente o pedido de concessão do benefício de aposentadoria por idade de trabalhador rural, condenando-o a pagar o benefício, verbis:

“ISSO POSTO, com fundamento no art. 487, I, do CPC, julgo procedente o pedido formulado na inicial, e o faço para condenar o INSS - Instituto Nacional do Seguro Social a implementar, em até 30 (trinta) dias após a intimação desta sentença, o benefício de aposentadoria rural por idade ao requerente, cujos valores são devidos desde data do requerimento administrativo (dia 29/10/2015 - f. 125), no valor de 01 (um) salário mínimo mensal. Sobre os valores retroativos incidirá correção monetária pelo INPC (art. 41-A da Lei 8.213/91 e STJ, REsp 1.495.146), desde as respectivas competências das prestações em atraso, e acréscimo de juros de mora segundo índice oficial de remuneração da caderneta de poupança, consoante art. 1º-F da Lei 9.494/97, a partir da citação (art. 240 do CPC) e até a data da expedição do precatório/RPV (Súmula Vinculante 17; STF no RE 579.431; STJ no REsp 1.495.146). Outrossim, considerando que estão presentes os requisitos autorizadores, donde a probabilidade do direito decorre da certeza jurídica oriunda da procedência do pedido (fumus boni iuris), a urgência deriva da natureza alimentar da verba em questão (periculum in mora) e o óbice da irreversibilidade do provimento fica superado pela necessidade de prestigiar, com prevalência, a dignidade da pessoa humana em seu mínimo existencial, concedo o pedido de tutela provisória de urgência satisfativa (art. 300 do CPC), para que o benefício seja implementado de imediato, no prazo ora definido, independente do trânsito em julgado. Oficie-se ao órgão do INSS responsável pela implantação. Condeno o requerido ao pagamento de honorários advocatícios em favor do patrono da autora em 10% (dez por cento) sobre as parcelas vencidas até a data da prolação da sentença (art. 85, § 3º, I, CPC), ante a simplicidade da causa (art. 85, § 2º, IV, CPC) e em observância ao contido na Súmula n. 111 do STJ. Condeno, ainda, a autarquia requerida ao pagamento das custas e despesas processuais. Ressalto que nas ações em trâmite na Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul não há, na atualidade, previsão de isenção de custas para o INSS, diante da norma local. Ao revés, atualmente vige a Lei Estadual n. 3.779/09, que prevê expressamente o pagamento de custas pelo INSS (art. 24, § 1º). Decorrido o prazo para recurso voluntário das partes, remetam-se os autos ao TRF da 3ª Região em razão da iliquidez da condenação (art. 496 do CPC). Publique-se. Registre-se. Intimem-se.”

O recorrente pede a reforma da sentença, em síntese, sob o fundamento da  não comprovação dos requisitos necessários à concessão do benefício pleiteado.

Regularmente processado o feito,  os autos subiram a este Eg. Tribunal.

É O RELATÓRIO.

 

 


APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 0032928-67.2014.4.03.9999

RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

APELADO: MARIA INEZ DA SILVA GONCALVES

Advogado do(a) APELADO: LUIS AFONSO FLORES BISELLI - MS12305-A

 

 

 

V O T O

 

 

A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (RELATORA): A sentença recorrida foi proferida sob a égide do Novo Código de Processo Civil, que afasta a submissão da sentença proferida contra a União e suas respectivas autarquias e fundações de direito público ao reexame necessário quando a condenação imposta for inferior a 1.000 (mil) salários mínimos (art. 496, I c.c. § 3º, I, do CPC/2015). Desta forma, a hipótese dos autos não demanda reexame necessário.

 A parte autora ajuizou a presente ação pretendendo a concessão da aposentadoria por idade rural, prevista no artigo 48, §§1º e 2º, da Lei nº 8.213/91, in verbis:

"Art. 48. A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se mulher.

§ 1º Os limites fixados no caput são reduzidos para sessenta e cinquenta e cinco anos no caso de trabalhadores rurais, respectivamente homens e mulheres, referidos na alínea "a" do inciso I, na alínea "g" do inciso V e nos incisos VI e VII do art. 11.

§ 2o Para os efeitos do disposto no § 1o deste artigo, o trabalhador rural deve comprovar o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido, computado o período a que se referem os incisos III a VIII do § 9o do art. 11 desta Lei. (Redação dada pela Lei nº 11.718, de 2008)"

Para a obtenção da aposentadoria por idade, deve o requerente comprovar o preenchimento dos seguintes requisitos: (i) idade mínima e (ii) efetivo exercício da atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao implemento da idade ou ao requerimento do benefício, por tempo igual ao da carência exigida para a sua concessão, sendo imperioso observar o disposto nos artigos 142 e 143, ambos da Lei nº 8.213/91.

Feitas essas considerações, no caso concreto, a idade mínima exigida para a obtenção do benefício restou comprovada pela documentação trazida aos autos, onde consta que a parte autora nasceu em 25/07/1949 , implementando o requisito etário em  2004.

Segundo a inicial, a autora  nasceu e se criou na zona rural. Desde criança, com aproximadamente 10 anos de idade começou a trabalhar na lavoura, em companhia de seus pais que também eram lavradores. A autora sempre trabalhou como lavradora, em regime de economia familiar, no cultivo de mantimentos, tais como: arroz, milho, feijão, mandioca, etc. em varias fazendas da região, onde laborou por mais de 30 anos.

Para a comprovação do exercício da atividade rural, a parte autora apresentou os seguintes documentos: sua CTPS (ID 134536569, pg.10/ 13 ) com  um vínculo  de 01/04/2003 a 30/05/2003 e a  CTPS do seu companheiro (ID 134536569, pg. 14/23).

Embora a autora afirme que o vínculo constante de sua CTPS é de natureza rural,  depreende-se do  seu CNIS que  a atividade foi classificada como coletor de lixo domiciliar (ID 134536572, pg.5), não constituindo início de prova material do labor rural.

Por outro lado,  dúvidas não subsistem sobre a possibilidade de extensão da qualificação de lavrador de um cônjuge ao outro constante de documento apresentado, para fins de comprovação da atividade campesina, que indique, por exemplo, o marido como trabalhador rural.

Todavia, é possível a  extensão da qualificação de lavrador em documento de terceiro, considerado  familiar próximo,  apenas quando se tratar de hipótese de agricultura de subsistência em que o labor é exercido  em regime de economia familiar, o que não é a hipótese dos autos, considerando que os contratos de trabalho anotados na CTPS de seu companheiro são personalíssimos, não estendendo a ela a condição de rural por ele ostentada.

A  parte autora deveria ter comprovado o labor rural, mesmo que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao implemento da idade , ao longo de, ao menos, 138 meses, conforme determinação contida no art. 142 da Lei nº 8.213/91.

Considerando que o conjunto probatório foi insuficiente à comprovação da atividade rural pelo período previsto em lei, seria o caso de se julgar improcedente a ação, não tendo a parte autora se desincumbido do ônus probatório que lhe cabe, ex vi do art. 373, I, do CPC/2015.

Entretanto, o entendimento consolidado pelo C. STJ, em julgado proferido sob a sistemática de recursos repetitivos, conforme art. 543-C, do CPC/1973 é no sentido de que a ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem resolução do mérito propiciando a parte autora intentar novamente a ação caso reúna os elementos necessários.

Por oportuno, transcrevo:

"DIREITO PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. ART. 543-C DO CPC. RESOLUÇÃO No. 8/STJ. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. AUSÊNCIA DE PROVA MATERIAL APTA A COMPROVAR O EXERCÍCIO DA ATIVIDADE RURAL. CARÊNCIA DE PRESSUPOSTO DE CONSTITUIÇÃO E DESENVOLVIMENTO VÁLIDO DO PROCESSO. EXTINÇÃO DO FEITO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO, DE MODO QUE A AÇÃO PODE SER REPROPOSTA, DISPONDO A PARTE DOS ELEMENTOS NECESSÁRIOS PARA COMPROVAR O SEU DIREITO. RECURSO ESPECIAL DO INSS DESPROVIDO.

1. Tradicionalmente, o Direito Previdenciário se vale da processualística civil para regular os seus procedimentos, entretanto, não se deve perder de vista as peculiaridades das demandas previdenciárias, que justificam a flexibilização da rígida metodologia civilista, levando-se em conta os cânones constitucionais atinentes à Seguridade Social, que tem como base o contexto social adverso em que se inserem os que buscam judicialmente os benefícios previdenciários.

2. As normas previdenciárias devem ser interpretadas de modo a favorecer os valores morais da Constituição Federal/1988, que prima pela proteção do Trabalhador Segurado da Previdência Social, motivo pelo qual os pleitos previdenciários devem ser julgados no sentido de amparar a parte hipossuficiente e que, por esse motivo, possui proteção legal que lhe garante a flexibilização dos rígidos institutos processuais. Assim, deve-se procurar encontrar na hermenêutica previdenciária a solução que mais se aproxime do caráter social da Carta Magna, a fim de que as normas processuais não venham a obstar a concretude do direito fundamental à prestação previdenciária a que faz jus o segurado.

3. Assim como ocorre no Direito Sancionador, em que se afastam as regras da processualística civil em razão do especial garantismo conferido por suas normas ao indivíduo, deve-se dar prioridade ao princípio da busca da verdade real, diante do interesse social que envolve essas demandas.

4. A concessão de benefício devido ao trabalhador rural configura direito subjetivo individual garantido constitucionalmente, tendo a CF/88 dado primazia à função social do RGPS ao erigir como direito fundamental de segunda geração o acesso à Previdência do Regime Geral; sendo certo que o trabalhador rural, durante o período de transição, encontra-se constitucionalmente dispensado do recolhimento das contribuições, visando à universalidade da cobertura previdenciária e a inclusão de contingentes desassistidos por meio de distribuição de renda pela via da assistência social.

5. A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa.

6. Recurso Especial do INSS desprovido". (REsp 1352721/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, CORTE ESPECIAL, julgado em 16/12/2015, DJe 28/04/2016).

Ausente conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, impõe-se reconhecer a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, com a extinção sem resolução do mérito e a consequente possibilidade de a parte autora intentar novamente a ação, caso reúna os elementos necessários a tal iniciativa.

Revogo a tutela antecipada, determinando que a eventual devolução dos valores recebidos a este título seja analisada e decidida em sede de execução, nos termos do artigo 302, I, e parágrafo único, do CPC/2015, e de acordo com o que restar decidido no julgamento do Tema 692, pelo C. Superior Tribunal de Justiça.

Inverto, assim, o ônus da sucumbência, condenando a parte autora no ressarcimento das despesas processuais eventualmente desembolsadas pela autarquia, bem como nos honorários advocatícios, que ficam arbitrados em 10% (dez por cento) do valor atualizado da causa, ficando suspensa a exigibilidade, nos termos do disposto nos artigos 11, §2º e 12, ambos da Lei nº 1.060/50, e §3º do artigo 98 do CPC, já que deu causa à extinção do processo sem resolução do mérito.

Ante o exposto,  não conheço da remessa oficial, de ofício, extingo o processo sem resolução de mérito e julgo prejudicada a apelação do INSS.

É COMO VOTO.

/gabiv/.soliveir.



E M E N T A

 

PREVIDENCIÁRIO: APOSENTADORIA POR IDADE. TRABALHADOR RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL INSUFICIENTE. EXTINÇÃO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO. RESP REPETITIVO 1352721/SP. TUTELA ANTECIPADA. ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA.

1. A sentença recorrida foi proferida sob a égide do Novo Código de Processo Civil, que afasta a submissão da sentença proferida contra a União e suas respectivas autarquias e fundações de direito público ao reexame necessário quando a condenação imposta for inferior a 1.000 (mil) salários mínimos (art. 496, I c.c. § 3º, I, do CPC/2015). Desta forma, a hipótese dos autos não demanda reexame necessário.

2. Para a comprovação do exercício da atividade rural, a parte autora apresentou os seguintes documentos: sua CTPS (ID 134536569, pg.10/ 13 ) com  um vínculo  de 01/04/2003 a 30/05/2003 e a  CTPS do seu companheiro (ID 134536569, pg. 14/23).

3. Embora a autora afirme que o vínculo constante de sua CTPS é de natureza rural,  depreende-se do  seu CNIS que  a atividade foi classificada como coletor de lixo domiciliar (ID 134536572, pg.5), não constituindo início de prova material do labor rural.

4. Por outro lado,  dúvidas não subsistem sobre a possibilidade de extensão da qualificação de lavrador de um cônjuge ao outro constante de documento apresentado, para fins de comprovação da atividade campesina, que indique, por exemplo, o marido como trabalhador rural.

5. Todavia, é possível a  extensão da qualificação de lavrador em documento de terceiro, considerado  familiar próximo,  apenas quando se tratar de hipótese de agricultura de subsistência em que o labor é exercido  em regime de economia familiar, o que não é a hipótese dos autos, considerando que os contratos de trabalho anotados na CTPS de seu companheiro são personalíssimos, não estendendo a ela a condição de rural por ele ostentada.

6. A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem resolução do mérito e a consequente possibilidade de a parte autora  intentar novamente a ação, caso reúna os elementos necessários a tal iniciativa.

7. Parte  autora condenada no pagamento das despesas processuais e dos honorários advocatícios, observados os benefícios da assistência judiciária gratuita (arts. 11, §2º, e 12, ambos da Lei 1.060/50, reproduzidos pelo §3º do art. 98 do CPC), já que deu causa à extinção do processo sem resolução do mérito.

8 - Revogados os efeitos da tutela antecipada (recurso representativo de controvérsia - REsp nº 1.401.560/M. Repetibilidade dos valores recebidos pela parte autora em virtude de tutela de urgência concedida, a ser vindicada nestes próprios autos, após regular liquidação.

9 -   Remessa oficial não conhecida. De ofício, processo extinto sem resolução do mérito. Prejudicada a apelação do INSS.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu não conhecer da remessa oficial, extinguir, de ofício, o processo sem resolução de mérito e julgar prejudicada a apelação do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.