Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0002980-03.2012.4.03.6135

RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES

APELANTE: GISLENE IARA SOUZA SILVA ALVES, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

Advogado do(a) APELANTE: RENATO PEREIRA DIAS - SP209980-A

APELADO: GISLENE IARA SOUZA SILVA ALVES, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

Advogado do(a) APELADO: RENATO PEREIRA DIAS - SP209980-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0002980-03.2012.4.03.6135

RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES

APELANTE: GISLENE IARA SOUZA SILVA ALVES, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

Advogado do(a) APELANTE: RENATO PEREIRA DIAS - SP209980-A

APELADO: GISLENE IARA SOUZA SILVA ALVES, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

Advogado do(a) APELADO: RENATO PEREIRA DIAS - SP209980-A

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R E L A T Ó R I O

 

Trata-se de ação objetivando a concessão de benefício previdenciário de aposentadoria por invalidez ou auxílio doença.

O feito foi originariamente distribuído, em 19/09/2006, ao Juizado Especial de Caraguatatuba/SP, que declinou da competência em razão do valor da causa, remetendo-se os autos ao Juízo Estadual. Em 17/04/2007 foi concedida a antecipação da tutela. Com a criação e instalação da Vara Federal de Caraguatatuba, o Juízo do Estado declinou da competência e o feito foi novamente redistribuído, em 26/04/2012.

A sentença prolatada em 10/08/2015, julgou procedente o pedido para manter o benefício de auxílio-doença. Ratificou a tutela antecipada concedida pelo Juízo do Estado. Observou que em razão da concessão da tutela, o benefício foi pago administrativamente e não há valores em atraso (histórico de credito- fls.348/355.pdf). Honorários advocatícios fixados em R$3.000,00.  

Sentença não submetida ao reexame necessário.

Apela o INSS requerendo, preliminarmente, sejam os autos convertidos em diligência para que seja realizada nova perícia, com a apresentação de exames atuais que comprovem o atual quadro clínico da autora, tendo em vista as perícias judiciais divergentes. Requer seja fixado termo final do benefício ou permitir que a autarquia convoque a apelada para nova perícia e, se constatada a capacidade laboral que possa cessar o benefício.

 Apela a parte autora requerendo a reforma da sentença para que lhe seja concedido o benefício de aposentadoria por invalidez, alegando para tanto que está total e permanentemente incapacitada para o exercício de atividades laborativas.

Sem contrarrazões pelas partes, subiram os autos a esta Corte.

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 


DECLARAÇÃO DE VOTO

A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA: A par do respeito e da admiração que nutro pelo Ilustre Relator, dele divirjo, em parte.

Os benefícios por incapacidade, previstos na Lei nº 8.213/91, destinam-se aos segurados que, após o cumprimento da carência de 12 (doze) meses (artigo 25, inciso I), sejam acometidos por incapacidade laboral: (i) incapacidade total e definitiva para qualquer atividade laborativa, no caso de aposentadoria por invalidez (artigo 42), ou (ii) incapacidade para a atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos, no caso de auxílio-doença (artigo 59).

No tocante ao auxílio-doença, especificamente, vale destacar que se trata de um benefício provisório, que cessa com o término da incapacidade, no caso de ser temporária, ou com a reabilitação do segurado para outra atividade que lhe garanta a subsistência, se a incapacidade for definitiva para a atividade habitual, podendo, ainda, ser convertido em aposentadoria por invalidez, caso o segurado venha a ser considerado insusceptível de reabilitação.

Em relação à carência, nos termos do artigo 26, inciso II, da Lei nº 8.213/91, dela está dispensado o requerente nos casos em que a incapacidade é decorrente de acidente de qualquer natureza ou causa, de doença profissional ou do trabalho, ou ainda das doenças e afecções elencadas no artigo 151 da mesma lei.

Como se vê, para a obtenção dos benefícios por incapacidade, deve o requerente comprovar o preenchimento dos seguintes requisitos: (i) qualidade de segurado, (ii) cumprimento da carência, quando for o caso, e (iii) incapacidade laboral.

No caso dos autos, o exame realizado pelo perito oficial em 30/09/2010, constatou que a parte autora, pedagoga, idade atual de 50 anos, está incapacitada definitivamente para o trabalho, como se vê do laudo constante de fls. 246/256:

"Todos os elementos periciais existentes e observados por este trabalho pericial estabelecem, e formatam induvidosa certeza intrínseca que, desde o seu adoecimento, esta autora apresenta transtorno comportamental recorrente e diabete severa insulinodependente em evolução grave e sinais de retinopatia diabética (cegueria insipiente).

Há de ser observado que a diabete na raça negra seja das mais difíceis de controlar.

Já apresenta debilidade de visão pela destruição diabética universal de sua micro circulação.

De primeiro vem a perda da visão e de segundo (às vezes concomitantemente) advém a insuficiência renal (ainda não investigada clinicamente).

Assim, todos os elementos periciais garantem a certeza intrínseca deste Perito que esteja a autora inapta para o seu antigo labor como o era e para qualquer outro, já que necessita de auxílio de terceiros e deve ser aposentada por invalidez. " (fl. 255)

Ora, se o perito oficial constatou a incapacidade total e permanente para o trabalho, a idade da parte autora não pode ser utilizada como justificativa para afastar a aposentadoria por invalidez e conceder, em seu lugar, o auxílio-doença, até porque o INSS pode, caso verifique a recuperação da sua capacidade laborativa, cessar o benefício, na forma prevista no artigo 101 da Lei nº 8.213/91.

Assim, ainda que o magistrado não esteja adstrito às conclusões do laudo pericial, conforme dispõem o artigo 436 do CPC/1973 e o artigo 479 do CPC/2015, estas devem ser consideradas, por se tratar de prova técnica, elaborada por profissional da confiança do Juízo e equidistante das partes.

O laudo em questão foi realizado por profissional habilitado, equidistante das partes, capacitado, especializado em perícia médica, e de confiança do r. Juízo, cuja conclusão encontra-se lançada de forma objetiva e fundamentada, não havendo que se falar em realização de nova perícia judicial.

Outrossim, o laudo pericial atendeu às necessidades do caso concreto, possibilitando concluir que o perito realizou minucioso exame clínico, respondendo aos quesitos formulados. Além disso, levou em consideração, para formação de seu convencimento, a documentação médica colacionada aos autos.

Desse modo, demonstrada, através do laudo elaborado pelo perito judicial, a incapacidade total e permanente para o exercício da atividade laboral, é possível conceder a aposentadoria por invalidez, até porque preenchidos os demais requisitos legais.

Restou incontroverso, nos autos, que a parte autora é segurada da Previdência Social e cumpriu a carência de 12 (doze) contribuições, exigida pelo artigo 25, inciso I, da Lei nº 8.213/91, como se vê dos documentos de fls. 315/316 (extrato CNIS).

Tanto é assim que o próprio INSS, como se depreende desses documentos, já lhe havia concedido o auxílio-doença no período de 15/10/2004 a 11/02/2005 e de 01/07/2005 a 31/03/2006.

A presente ação foi ajuizada em 16/04/2007.

O termo inicial do benefício, em regra, deveria ser fixado à data do requerimento administrativo ou, na sua ausência, à data da citação (Súmula nº 576/STJ) ou, ainda, na hipótese de auxílio-doença cessado indevidamente, no dia seguinte ao da cessação indevida do benefício.

No caso, o termo inicial do benefício é fixado em 01/04/2016 (fl. 326),  dia seguinte ao da cessação do auxílio-doença.

Os valores recebidos desde 18/04/2007 por força de decisão que, nestes autos, antecipou os efeitos da tutela para a imediata implantação do auxílio-doença, deverão ser descontados do montante devido.

Acompanho o voto do Relator, na parte em que nega provimento ao apelo do INSS e dá parcial provimento à remessa oficial, para alterar os critérios de juros de mora e correção monetária.

Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO ao apelo do INSS e DOU PARCIAL PROVIMENTO à remessa oficial, nos termos do voto do Relator, e dele divergindo no tocante ao benefício devido, DOU PROVIMENTO ao apelo da parte autora, para condenar o Instituto-réu a conceder-lhe a APOSENTADORIA POR INVALIDEZ, nos termos dos artigos 42 e 44 da Lei nº 8213/91, a partir de 01/04/2006 (fl. 326),  dia seguinte ao da cessação do auxílio-doença, descontados, do montante devido, os valores recebidos por força de decisão que, nestes autos, antecipou os efeitos da tutela.

É COMO VOTO.

/gabivi/asato


APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0002980-03.2012.4.03.6135

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V O T O

 

 

Considerando que a sentença foi proferida sob a égide do Código de Processo Civil de 1973, passo ao exame da admissibilidade da remessa oficial prevista no seu artigo 475.

Embora não seja possível, de plano, aferir-se o valor exato da condenação, pode-se concluir, pelo termo inicial do benefício (31/03/2006 - data da cessação), seu valor aproximado e a data da sentença (10/08/2015), que o valor total da condenação ultrapassará a importância de 60 (sessenta) salários mínimos estabelecida no § 2º.

Assim, conheço da remessa oficial tida por ocorrida.

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço dos recursos de apelação.

A Lei nº 8.213/91, no artigo 42, estabelece os requisitos necessários para a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez, quais sejam: qualidade de segurado, cumprimento da carência, quando exigida, e moléstia incapacitante e insuscetível de reabilitação para atividade que lhe garanta a subsistência. O auxílio-doença, por sua vez, tem seus pressupostos previstos nos artigos 59 a 63 da Lei nº 8.213/91, sendo concedido nos casos de incapacidade temporária.

É dizer: a incapacidade total e permanente para o exercício de atividade que garanta a subsistência enseja a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez; a incapacidade total e temporária para o exercício de atividade que garanta a subsistência justifica a concessão do benefício de auxílio-doença e a incapacidade parcial e temporária somente legitima a concessão do benefício de auxílio-doença se impossibilitar o exercício do labor ou da atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias pelo segurado.

A condição de segurado (obrigatório ou facultativo), requisito para a concessão dos benefícios por incapacidade, decorre da inscrição no regime de previdência pública, cumulada com o recolhimento das contribuições correspondentes.

O artigo 15 da Lei nº 8.213/91 dispõe sobre as hipóteses de manutenção da qualidade de segurado, independentemente de contribuições; trata-se do denominado período de graça, durante o qual remanesce o direito a toda a cobertura previdenciária. Confira-se: 

“Art. 15. Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:

I - sem limite de prazo, quem está em gozo de benefício;

II - até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem remuneração;

III - até 12 (doze) meses após cessar a segregação, o segurado acometido de doença de segregação compulsória;

IV - até 12 (doze) meses após o livramento, o segurado retido ou recluso;

 

V - até 3 (três) meses após o licenciamento, o segurado incorporado às Forças Armadas para prestar serviço militar;

VI - até 6 (seis) meses após a cessação das contribuições, o segurado facultativo.

 

§ 1º O prazo do inciso II será prorrogado para até 24 (vinte e quatro) meses se o segurado já tiver pago mais de 120 (cento e vinte) contribuições mensais sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado.

§ 2º Os prazos do inciso II ou do § 1º serão acrescidos de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.

§ 3º Durante os prazos deste artigo, o segurado conserva todos os seus direitos perante a Previdência Social."

 A doutrina e a jurisprudência são pacíficas no sentido de que não flui o período de graça, não perdendo a qualidade de segurado o trabalhador que deixou de contribuir para o RGPS por se encontrar impossibilitado de exercer atividades laborativas em decorrência da sua condição de saúde, e que teve seu benefício de auxílio doença ou aposentadoria por invalidez cessado indevidamente, ou ainda negada a sua concessão, quando comprovadamente se encontrava incapacitado.

No que toca à prorrogação do período de graça ao trabalhador desempregado, não obstante a redação do §2º do artigo 15 da Lei nº. 8.213/1991 mencionar a necessidade de registro perante o Ministério do Trabalho e da Previdência Social para tanto, o Superior Tribunal de Justiça, em sede de Incidente de Uniformização de Interpretação de Lei Federal (Pet. 7.115), firmou entendimento no sentido de que a ausência desse registro poderá ser suprida quando outras provas constantes dos autos, inclusive a testemunhal, se revelarem aptas a comprovar a situação de desemprego.

A perda da qualidade de segurado está disciplinada no §4º desse dispositivo legal, ocorrendo no dia seguinte ao do término do prazo para recolhimento da contribuição referente ao mês de competência imediatamente posterior ao final dos prazos para manutenção da qualidade de segurado.

Depreende-se, assim, que o segurado mantém essa qualidade por mais um mês e meio após o término do período de graça, independente de contribuição, mantendo para si e para os seus dependentes o direito aos benefícios previdenciários.

Anote-se que a eventual inadimplência das obrigações trabalhistas e previdenciárias acerca do tempo trabalhado como empregado deve ser imputada ao empregador, responsável tributário, conforme preconizado na alínea a do inciso I do artigo 30 da Lei nº 8.213/91, não sendo cabível a punição do empregado urbano pela ausência de recolhimentos, computando-se, assim, o período laborado para fins de verificação da qualidade de segurado.

Quanto à carência, a redação original do artigo 25, inciso I, da Lei de Benefícios exige o cumprimento de 12 (doze) contribuições mensais para a concessão de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença, in verbis: "Art. 25. A concessão das prestações pecuniárias do Regime Geral de Previdência Social depende dos seguintes períodos de carência, ressalvado o disposto no art. 26:I - auxílio-doença e aposentadoria por invalidez: 12 (doze) contribuições mensais;".

Na hipótese de perda da qualidade de segurado, o parágrafo único do  artigo 24 da mencionada lei previa que as contribuições anteriores a essa data só seriam computadas para efeito de carência depois que o segurado contasse, a partir da nova filiação à Previdência Social, com, no mínimo, 1/3 (um terço) do número de contribuições exigidas para o cumprimento da carência definida para o benefício a ser requerido.

Tal disposição foi revogada pela Medida Provisória nº 739/2016, de 07 de julho de 2016, que incluiu o parágrafo único no artigo 27 da Lei nº 8.213/91, dispondo que “No caso de perda da qualidade de segurado, para efeito de carência para a concessão dos benefícios de auxílio-doença, de aposentadoria por invalidez e de salário-maternidade, o segurado deverá contar, a partir da nova filiação à Previdência Social, com os períodos previstos nos incisos I e III do caput do art. 25”.

Todavia, essa norma não foi convertida em lei dentro do prazo de 120 dias (05 de novembro de 2016), tendo perdido a eficácia com efeitos retroativos à data da edição, nos termos do §3º do artigo 62 da Constituição Federal de 1988, voltando, portanto, a viger a norma anterior.

Anote-se que não tendo sido editado o decreto legislativo previsto no mencionado §3º, apenas as relações jurídicas constituídas e decorrentes de atos praticados sob a sua vigência conservar-se-ão por ela regidas, conforme disposto no §11 do mesmo artigo 62 da Lei Maior.

Em 06 de janeiro de 2017, entrou em vigor a Medida Provisória nº 767/2017, que novamente revogou o parágrafo único do artigo 24, disciplinando a matéria por meio da inclusão do artigo 27-A na Lei nº 8.213/91, repetindo o texto da Medida Provisória nº 739/2016.

Convertida na Lei nº 13.457/2017, a norma do art. 27-A foi modificada para exigir o recolhimento de metade das contribuições exigidas para a carência dos benefícios por incapacidade (para todos os segurados) e do salário-maternidade (para as seguradas contribuinte individual e facultativa).

 Na sequência, houve nova alteração do texto do artigo 27-A pela Medida Provisória nº 871/2019, de 18 de janeiro de 2019, que retomou a necessidade do cumprimento dos períodos integrais de carência previstos nos incisos I, III e IV do caput do art. 25. Por fim, convertida na Lei nº 13.846, de 2019, houve o restabelecimento da exigência da metade das contribuições, conforme anteriormente fixado na Lei nº 13.457/2017.

Em resumo, na hipótese de perda da qualidade de segurado, para readquirir a carência necessária para fins da concessão dos benefícios de auxílio-doença, e de aposentadoria por invalidez, o segurado deverá, quando da data do requerimento administrativo, ter vertido: I) até 05/01/2017, 4 contribuições; II) de 06/01/2017 a 26/06/2017 (MP 767/2017), 12 contribuições; III) 27/06/2017 a 17/01/2019 (Lei 13.457/2017), 6 contribuições; IV) de 18/01/2019 a 17/06/2019 (MP 871/2019), 12 contribuições; e V) a partir de 18/06/2019, 6 contribuições.

No caso dos autos, a parte autora, auxiliar de desenvolvimento infantil, 40 anos na data da terceira perícia, afirma ser portadora de diabetes e depressão, estando incapacitada para o trabalho.

A sentença de primeiro grau julgou procedente o pedido com base no laudo pericial, realizado em 30/09/2010, que atestou a incapacidade da autora. Confira-se:

“O primeiro laudo pericial efetuado em 28/10/2008, relata que a autora é portadora de depressão pós -parto e diabete mellitus tipo 1, estando na data da perícia, apta para o seu trabalho, conforme teor do laudo pericial (fls. 220/222). Já a segunda perícia judicial, realizada em 30/09/2010, verifico que todas as informações prestadas foram efetuadas pela sua genitora e não pela própria parte autora: ‘Todas as respostas foram dadas pela mãe que às vezes perguntava à Autora. Não é isso? E a Autora respondia com meneios de cabeça. Por toda a Perícia a Autora se manteve silente e olhando para as próprias mãos que ficavam dobrando e desdobrando um lenço. De permeio apresentava choro contido e limpava suas lágrimas com seu lenço’ (declaração do perito judicial - fls. 264, 267 e 270). Conclui o i. perito que a autora apresenta ‘transtorno comportamental recorrente e diabete severa insulinodependente em evolução grave e sinais de retinopatia diabética (cegueira insipiente)'.”

A perícia médica realizada no JEF de Caraguatatuba, em 27/10/2006 (ID 89959291- fls.25/28 pdf), atesta com base no exame clínico, e documentos médicos apresentados, que a autora é portadora de psicose puerperal (CID 10 F53.1). Segundo relato da autora e genitora há 2 anos e meio, aos 7 meses de gestação, desenvolveu quadro febril, com vômitos, e descompensação do diabetes melitus. Teve de ser internada. Durante a gestação, a mãe notou o surgimento de comportamento bizarro: por exemplo, a pericianda só realizava suas atividades domésticas na escuridão. Muito desatenta, precisava ser intensamente estimulada para realizar qualquer atividade. Quando o filho da autora nasceu, apresentava descuido e intensa irritação ao lidar com ele. Tinha fortes ideias de agredi-lo. Iniciou fluoxetina há 2 meses, sob prescrição de clinico, ainda sem resultado. Iniciará tratamento psiquiátrico em um mês. Ao exame clínico a pericianda comparece com a mãe. Contado cordial, porém retraído. Consciente, parcialmente desorientada no tempo. Atenção preservada, polarizada ao examinador. Sem sinais de distúrbios da senso percepção. Pensamento agregado, sem alterações de curso ou conteúdo. Humor tendendo à depressão. Apresenta certo distanciamento em relação aos sintomas que relata. Iniciativa prejudicada. Conclui pela incapacidade total e temporária para as atividades laborais.

O segundo laudo pericial médico (ID 89959250 – fls.238/240 pdf) elaborado em 28/10/2008, atesta com base no exame clínico (autora não apresentou exames recentes) que a pericianda apresenta-se em bom estado geral, corada, hidratada, anictérica, eupneica, discreta hiperemia facial. Aparelho respiratório: murmúrio vesicular presente sem ruídos adventícios. Aparelho cardiovascular: ritmo cardíaco regular 2 tempos sem sopros. Pressão arterial: 120x70 mmHg. Abdome: flácido, ruídos hidroaéreos presentes, sem visceromegalias. Neurológico: consciente, contactuante, sem déficit motor. Extremidades: sem edema, sem cianose, sem sinais de trombose venosa profunda. Pele: sem alterações. Conclui pela ausência de incapacidade.

A terceira perícia judicial médica (ID 89959250 – fls.274/282 pdf) realizada em 30/09/2010, atesta com base no exame clínico, exames laboratoriais e atestado médico que a autora é portadora de transtorno comportamental recorrente e diabete severa insulinodependente em evolução grave e sinais de retinopatia diabética (cegueira insipiente). Ao exame clínico constata que: “Reclamante apresenta-se à Perícia com aspecto bem dormida, asseada, vestes limpas, adequado cuidada higiênico, muito triste e sem qualquer sorriso durante todo o Trabalho Pericial. (*)= Todas as respostas foram dadas pela mãe que às vezes perguntava à Autora: Não é isso? E a Autora respondia com meneios de cabeça. Por toda a Pericia a Autora se manteve silente e olhando para as próprias mãos que ficavam dobrando e desdobrando um lenço. De permeio apresentava choro contido e limpava suas lágrimas com seu lenço. Chegou no horário. Estabeleceu contato interpessoal contido com o Perito. Esteve sempre atenta; mas nunca se expressou além de meneios de cabeça e monossilabos. Mesmo ao se exigir atenção espontânea provocada manteve a postura silente. Assim, foi impossível avaliar a memória de fixação e a memória da evocação, mas a mãe aceitava como verdade seus meneios responsivos. Humor estável e absolutamente depressivo. Avaliação do nível mental dentro dos limites da normalidade. A mãe da Autora referiu que a Autora dorme bem. No interregno da Perícia, entre as 08h45 e 10h10, a Autora saiu da sala por 02 vezes para vomitar.”  Conclui pela incapacidade total e definitiva para qualquer tipo de labor.

O laudo pericial foi elaborado com boa técnica e forneceu ao Juízo os elementos necessários à análise da demanda. Não se vislumbram no laudo as inconsistências alegadas. Não obstante o laudo realizado em 28/10/2008 seja divergente dos demais laudos, observa-se do conjunto probatório juntado aos autos, que a incapacidade da parte autora deriva de patologia de natureza evolutiva, cujos sintomas iniciaram-se por volta de 04/2005 (fls.127,151/152 pdf), sendo desnecessária a realização de novo laudo.

O restante do conjunto probatório juntado aos autos, embora demonstre a existência da doença, não é apto a comprovar a alegada incapacidade total e permanente.

Nota-se ainda, que os documentos médicos acostados aos autos, também não comprovam a alegada deficiência ou incapacidade de longo prazo, apenas a existência da patologia.

Nesse passo, apesar do laudo pericial afirmar a incapacidade total e permanente a requerente ainda é jovem, possui atualmente 49 anos, estando inserida em faixa etária ainda propícia à produtividade e ao desempenho profissional, sendo inviável a concessão da aposentadoria por invalidez.

O INSS, por sua vez, não logrou trazer quaisquer elementos aptos a ilidir a prova produzida pelo autor e a conclusão da perícia judicial, limitando-se a reafirmar a inexistência de incapacidade com base no laudo médico produzido na esfera administrativa, cuja presunção de veracidade não é absoluta.

O extrato do sistema Dataprev (fls.347.pdf) indica a existência de vínculos empregatícios mantido pela autora nos períodos de 11/12/1986 a 10/06/1987; 08/02/1990 a 21/02/1990; 04/06/1990 a 03/08/1991; 23/12/1991 a 29/05/1992; 01/06/1992 a 15/03/1995; 07/03/1995 a 29/08/1995 e de 01/09/1995 (sem data de saída, sendo a última remuneração em 11/2003); recolhimentos como contribuinte individual em  09/2004; esteve em gozo de benefício de auxílio doença nos períodos de 15/10/2004 a 11/02/2005 e de 01/07/2005 a 08/2013, restando comprovada a carência e a qualidade de segurado.

Assim, constatada a qualidade de segurado, o cumprimento da carência e a existência de incapacidade laboral total e temporária, com restrição para a atividade habitual, de rigor a concessão/manutenção do auxílio doença.

Quanto ao termo final do benefício, desnecessária declaração dessa natureza pelo Poder Judiciário. O art. 101 da Lei de Benefícios determina que o segurado em gozo de auxílio-doença deve se submeter a exame médico a cargo da Previdência periodicamente, ante o caráter temporário do benefício. Trata-se, portanto, de obrigação do INSS realizar o exame, assim como é prerrogativa legal do Instituto deliberar pela manutenção ou cessação do benefício após a realização de nova perícia.

No que tange aos critérios de atualização do débito, verifico que a sentença desborda do entendimento firmado pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no RE nº 870.947, tema de repercussão geral nº 810, em 20.09.2017, Relator Ministro Luiz Fux.

Assim, as parcelas vencidas deverão ser atualizadas monetariamente e acrescidas de juros de mora pelos índices constantes do Manual de Orientação para a elaboração de Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta, observando-se, em relação à correção monetária, a aplicação do IPCA-e em substituição à TR – Taxa Referencial.

Anoto que os embargos de declaração opostos perante o STF que objetivavam a modulação dos efeitos da decisão supra, para fins de atribuição de eficácia prospectiva, foram rejeitados no julgamento realizado em 03.10.2019.

Deixo de majorar os honorários de advogado fixados na sentença, considerando que o recurso foi interposto na vigência do Código de Processo Civil /1973, não aplicando a ele as normas dos §§ 1º a 11º do artigo 85 do CPC/2015, inclusive no que pertine à sucumbência recursal (Enunciado Administrativo nº 7/STJ).

Ante o exposto, conheço da remessa oficial e dou-lhe parcial provimento para fixar os critérios de atualização do débito e nego provimento à apelação do INSS e da parte autora, nos termos da fundamentação.

É o voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 


E M E N T A

PREVIDENCIÁRIO - CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR INVALIDEZ OU AUXÍLIO-DOENÇA - INCAPACIDADE TOTAL E PERMANENTE - DEMAIS REQUISITOS PREENCHIDOS - TERMO INICIAL DO BENEFÍCIO - JUROS DE MORA E CORREÇÃO MONETÁRIA - HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS - APELO DO INSS DESPROVIDO - REMESSA OFICIAL PARCIALMENTE PROVIDA - APELO DA PARTE AUTORA PROVIDO - SENTENÇA REFORMADA, EM PARTE.

1. Considerando o valor do benefício e o lapso temporal desde a sua concessão, o montante da condenação excede a 60 (sessenta) salários mínimos, limite previsto no artigo 475, parágrafo 2º, do CPC/1973, razão pela qual a r. sentença está sujeita ao reexame necessário.

2. Os benefícios por incapacidade, previstos na Lei nº 8.213/91, destinam-se aos segurados que, após o cumprimento da carência de 12 (doze) meses (art. 25, I), sejam acometidos por incapacidade laboral: (i) incapacidade total e definitiva para qualquer atividade laborativa, no caso de aposentadoria por invalidez (art. 42), ou (ii) incapacidade para a atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos, no caso de auxílio-doença (art. 59). Assim, para a obtenção dos benefícios por incapacidade, deve o requerente comprovar o preenchimento dos seguintes requisitos: (i) qualidade de segurado, (ii) cumprimento da carência, quando for o caso, e (iii) incapacidade laboral.

3. No caso dos autos, o exame realizado pelo perito oficial em 30/09/2010, constatou que a parte autora, pedagoga, idade atual de 50 anos, está incapacitada definitivamente para o trabalho, como se vê do laudo oficial.

4. Se o perito oficial constatou a incapacidade total e permanente para o trabalho, a idade da parte autora não pode ser utilizada como justificativa para afastar a aposentadoria por invalidez e conceder, em seu lugar, o auxílio-doença, até porque o INSS pode, caso verifique a recuperação da sua capacidade laborativa, cessar o benefício, na forma prevista no artigo 101 da Lei nº 8.213/91.

5. Ainda que o magistrado não esteja adstrito às conclusões do laudo pericial, conforme dispõem os artigos 436 do CPC/73 e artigo 479 do CPC/2015, estas devem ser consideradas, por se tratar de prova técnica, elaborada por profissional da confiança do Juízo e equidistante das partes.

6. O laudo em questão foi realizado por profissional habilitado, equidistante das partes, capacitado, especializado em perícia médica, e de confiança do r. Juízo, cuja conclusão encontra-se lançada de forma objetiva e fundamentada, não havendo que falar em realização de nova perícia judicial. Atendeu, ademais, às necessidades do caso concreto, possibilitando concluir que o perito realizou minucioso exame clínico, respondendo aos quesitos formulados, e levou em consideração, para formação de seu convencimento, a documentação médica colacionada aos autos.

7. Demonstrada, através do laudo elaborado pelo perito judicial, a incapacidade total e permanente para o exercício da atividade laboral, é possível conceder a aposentadoria por invalidez, até porque preenchidos os demais requisitos legais.

8. Também comprovado, nos autos, que a parte autora é segurada da Previdência Social e cumpriu a carência de 12 (doze) contribuições, exigida pelo artigo 25, inciso I, da Lei nº 8.213/91.

9. O termo inicial do benefício, em regra, deveria ser fixado à data do requerimento administrativo ou, na sua ausência, à data da citação (Súmula nº 576/STJ) ou, ainda, na hipótese de auxílio-doença cessado indevidamente, no dia seguinte ao da cessação indevida do benefício.

10. No caso, o termo inicial do benefício é fixado em 01/04/2016 (fl. 326),  dia seguinte ao da cessação do auxílio-doença.

11. Os valores recebidos desde 18/04/2007 por força de decisão que, nestes autos, antecipou os efeitos da tutela para a imediata implantação do auxílio-doença, deverão ser descontados do montante devido.

12. Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, devem ser aplicados os índices previstos no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, aprovado pelo Conselho da Justiça Federal, à exceção da correção monetária a partir de julho de 2009, período em que deve ser observado o Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial - IPCA-e, critério estabelecido pelo Pleno do Egrégio Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento do Recurso Extraordinário nº 870.947/SE, realizado em 20/09/2017, na sistemática de Repercussão Geral, e confirmado em 03/10/2019, com a rejeição dos embargos de declaração opostos pelo INSS.

13. Se a sentença determinou a aplicação de critérios de juros de mora e correção monetária diversos, ou, ainda, se ela deixou de estabelecer os índices a serem observados, pode esta Corte alterá-los ou fixá-los, inclusive de ofício, para adequar o julgado ao entendimento pacificado nos Tribunais Superiores.

14. Apelo do INSS desprovido. Remessa oficial parcialmente provida. Apelo da parte autora provido. Sentença reformada, em parte.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, prosseguindo NO JULGAMENTO, A SÉTIMA TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO AO APELO DO INSS E DAR PARCIAL PROVIMENTO À REMESSA OFICIAL, E, POR MAIORIA, DAR PROVIMENTO AO APELO DA PARTE AUTORA, NOS TERMOS DO VOTO DA DES. FEDERAL INÊS VIRGÍNIA, COM QUEM VOTARAM O DES. FEDERAL TORU YAMAMOTO E O DES. FEDERAL NEWTON DE LUCCA, VENCIDOS O RELATOR E O DES. FEDERAL CARLOS DELGADO QUE NEGAVAM PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA. LAVRARÁ O ACÓRDÃO A DES. FEDERAL INÊS VIRGÍNIA , nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.