Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0014339-22.2017.4.03.9999

RELATOR: Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA LEILA PAIVA

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: REGINA CELIA RANIERO FAUSTINO

Advogado do(a) APELADO: DANIELA ALVES DE LIMA - SP189982-N

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0014339-22.2017.4.03.9999

RELATOR: Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA LEILA PAIVA

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

APELADO: REGINA CELIA RANIERO FAUSTINO

Advogado do(a) APELADO: DANIELA ALVES DE LIMA - SP189982-N

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

R E L A T Ó R I O

A Excelentíssima Senhora Juíza Federal convocada Leila Paiva (Relatora):

Trata-se de embargos de declaração opostos pelo INSS em face de acórdão proferido pela E. Nona Turma desta Egrégia Corte que, por unanimidade, negou provimento ao apelo por ele interposto.

A ementa do v. acórdão encontra-se lavrada nos seguintes termos (ID 90289917 - Pág. 136):

PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. ATIVIDADE LABORATIVA. INCAPACIDADE RECONHECIDA. ESTADO DE NECESSIDADE. SUPRESSÃO DOS VALORES NO PERÍODO LABORADO. RESPEITO À COISA JULGADA. IMPOSSIBILIDADE.

A execução deve limitar-se aos exatos termos do título que a suporta, não se admitindo modificá-los ou mesmo neles inovar, em respeito à coisa julgada.

É defeso o debate, em sede de embargos à execução, de matérias passíveis de suscitação na fase cognitiva, bem como reavivar temáticas sobre as quais se operou a coisa julgada.

A permanência da autora no exercício das atividades laborativas, para o provimento das suas necessidades básicas, por si só não impede a concessão do benefício vindicado, razão pela qual não há se falar em desconto do período no qual a parte embargada manteve vínculo empregatício.

Apelo autárquico improvido.

 

Aponta a existência de omissão, contradição e obscuridade no acórdão embargado no tocante ao necessário expurgo do período em que o segurado laborou durante o benefício concedido, por ocasião da apuração dos valores em atraso. Aduz ainda que estes vícios se verificam também em relação à correção monetária, uma vez que a pretensão executória, neste ponto, viola a coisa julgada, já que o título judicial expressamente prevê a incidência da TR.

Requer o acolhimento dos embargos de declaração para que sejam sanados os vícios apontados e para que lhes sejam atribuídos efeitos infringentes.

Prequestiona a matéria para efeito de interposição de recurso à instância superior.

Intimada, a parte contrária não apresentou a impugnação aos presentes embargos de declaração.

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0014339-22.2017.4.03.9999

RELATOR: Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA LEILA PAIVA

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

APELADO: REGINA CELIA RANIERO FAUSTINO

Advogado do(a) APELADO: DANIELA ALVES DE LIMA - SP189982-N

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

V O T O

A Excelentíssima Senhora Juíza Federal convocada Leila Paiva (Relatora):

O recurso apresentado pelo INSS tem por fito a declaração do v. acórdão em dois pontos.

1. Inicialmente, no que concerne à pretensão do INSS em proceder aos descontos de valores no período em que segurado laborou concomitantemente com o benefício previdenciário concedido, o C. STJ, em 24/06/2020, ao julgar os Recursos Especiais nºs. 1786590/SP e 1788700, em sede de repercussão geral, fixou a seguinte tese: “ No período entre o indeferimento administrativo e a efetiva implantação de auxílio-doença ou de aposentadoria por invalidez, mediante decisão judicial, o segurado do RPGS tem direito ao recebimento conjunto das rendas do trabalho exercido, ainda que incompatível com sua incapacidade laboral, e do respectivo benefício previdenciário pago retroativamente” (Tema 1013).

Neste ponto, nada há para ser sanado no v. acórdão objurgado.

É que os embargos de declaração são cabíveis para esclarecer obscuridade, eliminar contradição, corrigir erro material ou suprir omissão de ponto ou questão sobre a qual o magistrado não se manifestou de ofício ou a requerimento das partes, nos termos do artigo 1.022 do Código de Processo Civil de 2015.

No caso em tela, é plenamente possível aferir-se o exato alcance do acórdão embargado e de seus fundamentos. Não há ponto omisso, obscuro ou contraditório no julgado, que apreciou as questões suscitadas, no apelo, de forma satisfatória ao julgamento, mediante apreciação da disciplina normativa incidente à hipótese.

Em verdade, denota-se a pretensão de reapreciação da matéria e o inconformismo com o resultado do julgamento, não passíveis de análise por meio dos embargos de declaração.

Com efeito, é de se atentar que o acolhimento de teses desfavoráveis à parte embargante não configura quaisquer das hipóteses do artigo 1.022 do Código de Processo Civil de 2015, pois é fruto da manifestação do princípio do livre convencimento do julgador.

A propósito, já decidiu o C. STJ que "como o descontentamento da parte não se insere dentre os requisitos viabilizadores dos embargos declaratórios, impende a rejeição do recurso manejado com a mera pretensão de reexame da causa." (EDREsp nº 547.235, 1ª Turma, Rel. Min. José Delgado, j. 05/8/2004, v. u., DJ 20/9/2004, p. 190).

Nesse sentido, a discordância da parte embargante deve ser ventilada pela via recursal adequada.

De outra parte, ainda que os embargos de declaração tenham como propósito o prequestionamento da matéria, faz-se imprescindível, para o acolhimento do recurso, que se constate a existência de qualquer dos vícios previstos no artigo 1.022 do Código de Processo Civil de 2015, sem o que se torna inviável seu acolhimento. Nesse quadro, a título ilustrativo, consulte-se o seguinte precedente: EDcl nos EDcl no REsp 1107543/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, Primeira Seção, julgado em 26/10/2011, DJe 18/11/2011.

Outrossim, é de se registrar que o art. 1.025 do Código de Processo Civil/2015 dispõe, para fins de prequestionamento, que são considerados incluídos no acórdão os elementos que o embargante suscitou ainda que os declaratórios sejam inadmitidos ou rejeitados, "caso o tribunal superior considere existentes erro, omissão, contradição ou obscuridade".

Em conclusão, das considerações procedidas, constata-se que mediante alegação de omissão, contradição e obscuridade, o embargante atua no sentido de manifestar seu inconformismo, almejando efeito modificativo ao julgado, pretensão esta que não se ajusta aos estreitos limites de atuação do presente recurso, o qual se destina apenas à correção dos vícios apontados no art. 1022, incisos I, II e III, do Código de Processo Civil/2015.

2. Noutro ponto, entretanto, em relação à argumentação trazida pelo INSS quanto à correção monetária, os embargos de declaração serão excepcionalmente utilizados como instrumento processual para se efetuar o necessário ajuste na pretensão executória, em decorrência das teses fixadas pelo TEMA 810/STF e pelo TEMA 905/STJ, frisando que tudo o que atinge a coisa julgada pode e deve ser conhecido a qualquer tempo, não se sujeitando à preclusão, ainda que, no caso, represente inovação recursal.

Aliás, o ajuste na pretensão executória, por ofender a coisa julgada, caberia até mesmo ser feita de ofício, por se tratar de questão de ordem pública.

Verifica-se que a questão acerca desta afronta foi argumentada pelo INSS por ocasião da oposição dos embargos à execução (ID 90289917 – Pág.11).

E, embora não se antevejam os vícios relacionados nos presentes embargos de declaração, conforme já decidido por esta e. Nona Turma, cumpre ponderar que a jurisprudência evoluiu para admitir o recurso também como mecanismo de ajustamento de decisões judiciais às deliberações retiradas em sede de recursos repetitivos, em atenção aos princípios constitucionais da celeridade e razoável duração do processo.

Nesse sentido, o posicionamento do C. Superior Tribunal de Justiça:

"ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. EXIGIBILIDADE DA DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS POR FORÇA DE DECISÃO JUDICIAL POSTERIORMENTE MODIFICADA. ENTENDIMENTO FIRMADO PELA PRIMEIRA SEÇÃO NO JULGAMENTO DO RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA 1.401.560/MT. RESSALVA DO PONTO DE VISTA DO RELATOR. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO ACOLHIDOS, COM EFEITOS INFRINGENTES, PARA DETERMINAR A DEVOLUÇÃO DOS VALORES PERCEBIDOS, EM RAZÃO DA REVOGAÇÃO DA TUTELA ANTECIPADA. 1. A teor do disposto no art. 535, incisos I e II do CPC, os Embargos de Declaração destinam-se a suprir omissão, afastar obscuridade ou eliminar contradição existente no julgado. 2. É possível a concessão de efeitos infringentes aos Aclaratórios no caso em que, conforme seja a deficiência a ser corrigida, seu suprimento acarrete, inevitavelmente, a modificação do julgado recorrido, conforme reverberam abalizada doutrina e jurisprudência atuais (EDcl na AR 2.510/SP, Rel. Min. ADILSON VIEIRA MACABU, Dje 16.06.2011; Edcl no AgRg no Ag 1.214.723/MG, Rel. Min. TEORI ALBINO ZAVASCKI, Dje 10.06.2011; Edcl nos Edcl nos Edcl no AgRg nos Edcl no Ag 1.316.589/RS, Rel. Min. SIDNEI BENETI, Dje 17.06.2011, dentre outros). 3. Esta Corte Superior de Justiça tem admitido, excepcionalmente, que o Recurso Aclaratório possa servir também para amoldar o julgado à superveniente orientação jurisprudencial desta Corte, quando adotada em regime de recursos repetitivos, em atenção à instrumentalidade das formas, de modo a garantir a celeridade e a eficácia da prestação jurisdicional e a reverência ao pronunciamento majoritário (...)".

(EDAGRESP 201200785435, Primeira Turma, Relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, DJE DATA:04/03/2016)

No caso concreto, a pretensão executória não está observando a coisa julgada quanto à correção monetária dos valores em atraso.

Com efeito, o Colendo Supremo Tribunal Federal pacificou o assunto relativo ao regime de atualização monetária aplicável no julgamento do Recurso Extraordinário nº 870.947/SE (Tema 810), submetido à repercussão geral, julgado em 29/09/2017, cuja ementa foi assim redigida, in verbis:

DIREITO CONSTITUCIONAL. REGIME DE ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA E JUROS MORATÓRIOS INCIDENTE SOBRE CONDENAÇÕES JUDICIAIS DA FAZENDA PÚBLICA. ART. 1º-F DA LEI Nº 9.494/97 COM A REDAÇÃO DADA PELA LEI Nº 11.960/09. IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DA UTILIZAÇÃO DO ÍNDICE DE REMUNERAÇÃO DA CADERNETA DE POUPANÇA COMO CRITÉRIO DE CORREÇÃO MONETÁRIA. VIOLAÇÃO AO DIREITO FUNDAMENTAL DE PROPRIEDADE (CRFB, ART. 5º, XXII). INADEQUAÇÃO MANIFESTA ENTRE MEIOS E FINS. INCONSTITUCIONALIDADE DA UTILIZAÇÃO DO RENDIMENTO DA CADERNETA DE POUPANÇA COMO ÍNDICE DEFINIDOR DOS JUROS MORATÓRIOS DE CONDENAÇÕES IMPOSTAS À FAZENDA PÚBLICA, QUANDO ORIUNDAS DE RELAÇÕES JURÍDICO-TRIBUTÁRIAS. DISCRIMINAÇÃO ARBITRÁRIA E VIOLAÇÃO À ISONOMIA ENTRE DEVEDOR PÚBLICO E DEVEDOR PRIVADO (CRFB, ART. 5º, CAPUT). RECURSO EXTRAORDINÁRIO PARCIALMENTE PROVIDO. 1. O princípio constitucional da isonomia (CRFB, art. 5º, caput), no seu núcleo essencial, revela que o art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que disciplina os juros moratórios aplicáveis a condenações da Fazenda Pública, é inconstitucional ao incidir sobre débitos oriundos de relação jurídico-tributária, os quais devem observar os mesmos juros de mora pelos quais a Fazenda Pública remunera seu crédito; nas hipóteses de relação jurídica diversa da tributária, a fixação dos juros moratórios segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança é constitucional, permanecendo hígido, nesta extensão, o disposto legal supramencionado. 2. O direito fundamental de propriedade (CRFB, art. 5º, XXII) repugna o disposto no art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, porquanto a atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança não se qualifica como medida adequada a capturar a variação de preços da economia, sendo inidônea a promover os fins a que se destina. 3. A correção monetária tem como escopo preservar o poder aquisitivo da moeda diante da sua desvalorização nominal provocada pela inflação. É que a moeda fiduciária, enquanto instrumento de troca, só tem valor na medida em que capaz de ser transformada em bens e serviços. A inflação, por representar o aumento persistente e generalizado do nível de preços, distorce, no tempo, a correspondência entre valores real e nominal (cf. MANKIW, N.G. Macroeconomia. Rio de Janeiro, LTC 2010, p. 94; DORNBUSH, R.; FISCHER, S. e STARTZ, R. Macroeconomia. São Paulo: McGraw-Hill do Brasil, 2009, p. 10; BLANCHARD, O. Macroeconomia. São Paulo: Prentice Hall, 2006, p. 29). 4. A correção monetária e a inflação, posto fenômenos econômicos conexos, exigem, por imperativo de adequação lógica, que os instrumentos destinados a realizar a primeira sejam capazes de capturar a segunda, razão pela qual os índices de correção monetária devem consubstanciar autênticos índices de preços. 5. Recurso extraordinário parcialmente provido.

(RE 870947, Relator Ministro LUIZ FUX, Tribunal Pleno, julgado em 20/09/2017, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-262 DIVULG 17-11-2017 PUBLIC 20-11-2017)

 

O precedente, transitado em julgado em 03/03/2020, reconheceu a inconstitucionalidade do art. 1º-F da Lei 9.494/1997, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009, no ponto em que fixa a utilização da taxa referencial (TR) para a atualização de condenações não tributárias impostas à Fazenda Pública, substituindo-a pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo Especial (IPCA-E) para fins de correção monetária a partir de 30/06/2009, firmando, assim, duas teses, a saber:

1) O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que disciplina os juros moratórios aplicáveis a condenações da Fazenda Pública, é inconstitucional ao incidir sobre débitos oriundos de relação jurídico-tributária, aos quais devem ser aplicados os mesmos juros de mora pelos quais a Fazenda Pública remunera seu crédito tributário, em respeito ao princípio constitucional da isonomia (CRFB, art. 5º, caput); quanto às condenações oriundas de relação jurídica não-tributária, a fixação dos juros moratórios segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança é constitucional, permanecendo hígido, nesta extensão, o disposto no art. 1º-F da Lei nº 9.494/97 com a redação dada pela Lei nº 11.960/09; e

2) O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que disciplina a atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança, revela-se inconstitucional ao impor restrição desproporcional ao direito de propriedade (CRFB, art. 5º, XXII), uma vez que não se qualifica como medida adequada a capturar a variação de preços da economia, sendo inidônea a promover os fins a que se destina".

 

Com relação ao índice substitutivo, prevaleceu o r. voto condutor do acórdão, prolatado pelo e. Ministro Relator Luiz Fux, nos seguintes termos:

A fim de evitar qualquer lacuna sobre o tema e com o propósito de guardar coerência e uniformidade com o que decidido pelo Supremo Tribunal Federal ao julgar a questão de ordem nas ADIs nº 4.357 e 4.425, entendo que devam ser idênticos os critérios para a correção monetária de precatórios e de condenações judiciais da Fazenda Pública. Naquela oportunidade, a Corte assentou que, após 25.03.2015, todos os créditos inscritos em precatórios deverão ser corrigidos pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial (IPCA-E). Nesse exato sentido, voto pela aplicação do aludido índice a todas as condenações judiciais impostas à Fazenda Pública, qualquer que seja o ente federativo de que se cuide.

Ressalte-se que a não modulação de efeitos pelo Colendo STF acerca do Tema 810, resultou, na prática, na necessidade de conferir interpretação teleológica à aplicação do precedente aos casos concretos.

Nesse sentido, o Colendo Superior Tribunal de Justiça na sessão de 22/02/2018, ao julgar o Recurso Especial nº 1.495.146/MG, referente ao Tema 905, submetido ao regime dos recursos repetitivos, procedeu à fixação de parâmetros, expressos nos seguintes termos:

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. SUBMISSÃO À REGRA PREVISTA NO ENUNCIADO ADMINISTRATIVO 02/STJ. DISCUSSÃO SOBRE A APLICAÇÃO DO ART. 1º-F DA LEI 9.494/97 (COM REDAÇÃO DADA PELA LEI 11.960/2009) ÀS CONDENAÇÕES IMPOSTAS À FAZENDA PÚBLICA. CASO CONCRETO QUE É RELATIVO A INDÉBITO TRIBUTÁRIO.

'TESES JURÍDICAS FIXADAS.

1. Correção monetária: o art. 1º-F da Lei 9.494/97 (com redação dada pela Lei 11.960/2009), para fins de correção monetária, não é aplicável nas condenações judiciais impostas à Fazenda Pública, independentemente de sua natureza.

1.1 Impossibilidade de fixação apriorística da taxa de correção monetária.

No presente julgamento, o estabelecimento de índices que devem ser aplicados a título de correção monetária não implica pré-fixação (ou fixação apriorística) de taxa de atualização monetária. Do contrário, a decisão baseia-se em índices que, atualmente, refletem a correção monetária ocorrida no período correspondente. Nesse contexto, em relação às situações futuras, a aplicação dos índices em comento, sobretudo o INPC e o IPCA-E, é legítima enquanto tais índices sejam capazes de captar o fenômeno inflacionário.

1.2 Não cabimento de modulação dos efeitos da decisão.

A modulação dos efeitos da decisão que declarou inconstitucional a atualização monetária dos débitos da Fazenda Pública com base no índice oficial de remuneração da caderneta de poupança, no âmbito do Supremo Tribunal Federal, objetivou reconhecer a validade dos precatórios expedidos ou pagos até 25 de março de 2015, impedindo, desse modo, a rediscussão do débito baseada na aplicação de índices diversos. Assim, mostra-se descabida a modulação em relação aos casos em que não ocorreu expedição ou pagamento de precatório.

2. Juros de mora: o art. 1º-F da Lei 9.494/97 (com redação dada pela Lei 11.960/2009), na parte em que estabelece a incidência de juros de mora nos débitos da Fazenda Pública com base no índice oficial de remuneração da caderneta de poupança, aplica-se às condenações impostas à Fazenda Pública, excepcionadas as condenações oriundas de relação jurídico-tributária.

3. Índices aplicáveis a depender da natureza da condenação.

3.1 Condenações judiciais de natureza administrativa em geral.

...

3.1.1 Condenações judiciais referentes a servidores e empregados públicos.

...

3.1.2 Condenações judiciais referentes a desapropriações diretas e indiretas.

...

3.2 Condenações judiciais de natureza previdenciária.

As condenações impostas à Fazenda Pública de natureza previdenciária sujeitam-se à incidência do INPC, para fins de correção monetária, no que se refere ao período posterior à vigência da Lei 11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei 8.213/91. Quanto aos juros de mora, incidem segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança (art. 1º-F da Lei 9.494/97, com redação dada pela Lei n. 11.960/2009).

3.3 Condenações judiciais de natureza tributária.

...

4. Preservação da coisa julgada.

Não obstante os índices estabelecidos para atualização monetária e compensação da mora, de acordo com a natureza da condenação imposta à Fazenda Pública, cumpre ressalvar eventual coisa julgada que tenha determinado a aplicação de índices diversos, cuja constitucionalidade/legalidade há de ser aferida no caso concreto.'

SOLUÇÃO DO CASO CONCRETO.

5. Em se tratando de dívida de natureza tributária, não é possível a incidência do art. 1º-F da Lei 9.494/97 (com redação dada pela Lei 11.960/2009) - nem para atualização monetária nem para compensação da mora -, razão pela qual não se justifica a reforma do acórdão recorrido.

6. Recurso especial não provido. Acórdão sujeito ao regime previsto no art. 1.036 e seguintes do CPC/2015, c/c o art. 256-N e seguintes do RISTJ.

(REsp 1495146, Relator: Min. Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, julgado em 22-02-2018, publicado em 02-03-2018)

Destaque-se, portanto, que a efetiva aplicação do Tema 810 do C. STF, com a orientação firmada pelo Tema 905 do C. STJ, é direcionada, estritamente, pelo conteúdo do título exequendo sobre o qual recaiu a coisa julgada.

Ao compulsar os autos, verifica-se que o título judicial transitou em julgado em 08/06/2015 (ID 90289917 – Pág. 38), após a rejeição dos embargos de declaração (ID 90289917 – Pág. 36) e o não provimento do agravo interno (ID 90289917 – Pág. 32) , ambos opostos pelo INSS e o parcial provimento de seu apelo apenas quanto à redução da multa diária, de modo que se consolidou, no tocante à concessão do benefício e ao pagamento dos valores em atraso, nos seguintes termos (ID 90289917 – Pág.22):

“...julgo PROCEDENTE o pedido formulado por REGINA CELIA RANJERO FAUSTINO, neste processo de n° 9786-65, determinando ao INSS o restabelecimento do auxílio-doença, desde a cessação administrativa, 17 de maio de 2012, e sua conversão em aposentadoria por invalidez a contar do laudo de fls. 115/6, 2 de outubro de 2013. Quanto à correção monetária, destaque-se que deve ser aplicada nos termos das súmulas de n° 148 do Egrégio Superior Tribunal de Justiça e de n° 8 do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, e de acordo com o Manual de Orientações e Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, aprovado pela Resolução no 134, de 21 de dezembro de 2010, do Conselho da Justiça Federal.”

A exequente, por ocasião da impugnação aos embargos à execução (ID 90289917 – Pág. 57), assume, de modo explícito, a utilização do INPC em seu cálculo, o que resulta em total afronta ao que está consignado no título judicial que, expressamente, determina a aplicação dos preceitos contábeis estabelecidos pela Resolução 134/10, dentre eles o da utilização da TR na atualização dos valores atrasados.

Porém, em que pese haver a afronta à coisa julgada, a análise quanto ao excesso no valor da pretensão executória resta prejudicado, uma vez que o INSS deixou de apresentar o cálculo pelo valor que reputa devido mediante a utilização da TR como fator de correção monetária.

Nesse passo, os embargos à execução devem ser julgados parcialmente procedentes para reconhecer a afronta à coisa julgada, anulando-se a sentença que determinou o prosseguimento da execução pelo insubsistente cálculo apresentado pelo exequente, cabendo ao juízo da execução determinar a remessa dos autos ao seu Contador Judicial para que elabore nova conta nos exatos termos do título judicial, observando-se, no tocante a correção monetária, os preceitos contábeis fixados pela Resolução nº 134/10 do CJF.

Caberá ainda ao juízo de origem converter o procedimento da execução para o de cumprimento de sentença, com vistas a ajustá-lo ao CPC/2015, submetendo o cálculo elaborado por seu expert judicial ao crivo do contraditório.

Em face da necessidade de ajuste na pretensão executória, não cabe condenação da exequente no pagamento dos honorários advocatícios, até porque o INSS não trouxe cálculo hábil para ajustá-lo de imediato.

Ante o exposto, em homenagem ao princípio da fidelidade, acolho os embargos de declaração opostos pelo INSS, com caráter infringente, para julgar parcialmente procedentes os embargos à execução e decretar a nulidade da sentença por afronta à coisa julgada, determinando o prosseguimento da pretensão executória pelo rito do cumprimento de sentença, mediante a elaboração de novo cálculo, observando-se as diretrizes fixadas pela Resolução 134/10, inclusive no tocante à aplicação da TR como fator de atualização dos valores em atraso.

É o voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. HIPÓTESES DO ARTIGO 1.022 DO CPC/2015. ERRO MATERIAL, OMISSÃO, CONTRADIÇÃO, OBSCURIDADE. NÃO CONFIGURAÇÃO. PERÍODO LABORADO CONCOMITANTEMENTE AO BENEFÍCIO CONCEDIDO. REDISCUSSÃO DO MÉRITO DO ACÓRDÃO EMBARGADO QUANTO AOS INAPROPRIADOS DESCONTOS. TEMA 1013/STJ. CONSTATADA A OFENSA À COISA JULGADA. TR. RESOLUÇÃO 134/10 DO CJF. INDEVIDA APLICAÇÃO DO INPC. TEMA 810/STF. TEMA 905/STJ. EMBARGOS À EXECUÇÃO PARCIALMENTE PROCEDENTES. SENTENÇA ANULADA. AJUSTE NA PRETENSÃO EXECUTÓRIA. ELABORAÇÃO DE NOVO CÁLCULO: SUBMISSÃO AO CRIVO DO CONTRADITÓRIO. EXECUÇÃO CONVERTIDA EM CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. EXCEPCIONAL CARÁTER INFRINGENTE DOS ACOLHIDOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO.

- É plenamente possível aferir-se o exato alcance do acórdão embargado e de seus fundamentos. Não há erro material, ponto omisso, obscuro ou contraditório no julgado em relação à pretensão da autarquia em proceder aos descontos de valores no período em que o segurado laborou concomitantemente com o benefício previdenciário concedido, sendo certo que a questão já se encontra pacificada no C. STJ, que em em 24/06/2020, ao julgar os Recursos Especiais nºs. 1786590/SP e 1788700, em sede de repercussão geral, fixou a seguinte tese: “No período entre o indeferimento administrativo e a efetiva implantação de auxílio-doença ou de aposentadoria por invalidez, mediante decisão judicial, o segurado do RPGS tem direito ao recebimento conjunto das rendas do trabalho exercido, ainda que incompatível com sua incapacidade laboral, e do respectivo benefício previdenciário pago retroativamente” (Tema 1013). Neste ponto, nada há para ser sanado no v. acórdão objurgado.

- O questionamento do acórdão pelo embargante aponta para típico e autêntico inconformismo com a decisão, contrariedade que não enseja o acolhimento do presente recurso, uma vez que ausentes quaisquer dos vícios elencados no artigo 1.022 do Código de Processo Civil de 2015. Embargos revestidos de nítido caráter infringente, objetivando discutir o conteúdo jurídico do acórdão.

- Ainda que os embargos tenham como propósito o prequestionamento da matéria, faz-se imprescindível, para o acolhimento do recurso, que se verifique a existência de quaisquer dos vícios descritos no artigo 1.022 do CPC/2015. Precedentes do STJ.

- Em relação à argumentação trazida pelo INSS quanto à ofensa à coisa julgada, no tocante não utilização da TR na correção monetária mediante a aplicação das diretrizes fixadas pela Resolução nº 134/10 pelo CJF (questão inclusive a ser conhecida de ofício), comporta acolher os embargos de declaração por ele opostos para promover o necessário ajuste da pretensão executória aos exatos termos do título judicial. E, embora não se antevejam os vícios relacionados nos presentes embargos de declaração, conforme já decidido por esta e. Nona Turma, cumpre ponderar que a jurisprudência evoluiu para admiti-los, também, como mecanismo de ajustamento de decisões judiciais às deliberações retiradas em sede de recursos repetitivos, em atenção aos princípios constitucionais da celeridade e razoável duração do processo (EDAGRESP 201200785435, Primeira Turma, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, DJE 04/03/2016).

- O C. STF julgou o Recurso Extraordinário nº 870.947/SE (Tema 810), transitado em julgado em 03/03/2020, e reconheceu a inconstitucionalidade do art. 1º-F da Lei 9.494/1997, com a redação dada pela Lei 11.960/2009, no ponto em que fixa a utilização da taxa referencial (TR) para a atualização de condenações não-tributárias impostas à Fazenda pública, substituindo-a pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo Especial (IPCA-E) para fins de correção monetária a partir de 30/06/2009.

- A não modulação de efeitos pelo Colendo STF cristalizou o Tema 810, e resultou, na prática, na necessidade de conferir interpretação teleológica a sua aplicação aos casos concretos.

- O Colendo STJ ao julgar o Recurso Especial nº 1495146/MG, em 22/02/2018, referente ao Tema 905, submetido ao regime dos recursos repetitivos, procedeu à fixação de parâmetros.

- Em síntese, o que determina a aplicação do Tema 810 do C. STF, com a orientação firmada pelo Tema 905 do C. STJ, é o conteúdo do título exequendo sobre o qual recaiu a coisa julgada.

- A exequente, por ocasião da impugnação aos embargos à execução, assumiu a aplicação do INPC em seu cálculo, o que resulta em total afronta ao que está consignado no título judicial que, expressamente determina a aplicação dos preceitos contábeis estabelecidos pela Resolução 134/10, dentre eles o da utilização da TR na atualização dos valores atrasados.

- Em que pese haver a afronta à coisa julgada, a análise quanto ao excesso no valor da pretensão executória resta prejudicado, uma vez que o INSS deixou de apresentar o cálculo pelo valor que reputa devido mediante a utilização da TR como fator de correção monetária.

- Embargos à execução parcialmente julgados procedentes para reconhecer a afronta à coisa julgada, anulando-se a sentença que determinou o prosseguimento da execução pelo insubsistente cálculo apresentado pela exequente, cabendo ao juízo de origem determinar a remessa dos autos ao seu Contador Judicial para que elabore nova conta nos exatos termos do título judicial, observando-se, no tocante a correção monetária, os preceitos contábeis fixados pela Resolução nº 134/10 do CJF.

- Caberá ainda ao juízo de origem converter o procedimento da execução para o de cumprimento de sentença, com vistas a ajustá-lo ao CPC/2015, submetendo o cálculo elaborado por seu expert judicial ao crivo do contraditório.

- Em face da necessidade de ajuste na pretensão executória, não cabe condenação da exequente no pagamento dos honorários advocatícios, até porque o INSS não trouxe cálculo hábil para ajustá-la de imediato.

- Em homenagem ao princípio da fidelidade, acolhidos os embargos de declaração opostos pelo INSS, com excepcionalíssimo caráter infringente, para julgar parcialmente procedentes os embargos à execução e decretar a nulidade da sentença por afronta à coisa julgada, determinando o prosseguimento da pretensão executória pelo rito do cumprimento de sentença, mediante a elaboração de novo cálculo, observando-se as diretrizes fixadas pela Resolução 134/10, inclusive no tocante à aplicação da TR como fator de atualização dos valores em atraso.

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por unanimidade, decidiu acolher os embargos de declaração, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.