Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0002440-54.2012.4.03.6102

RELATOR: Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA

APELANTE: VALDIR DONIZETE TORTOL

Advogado do(a) APELANTE: ALFREDO ADEMIR DOS SANTOS - SP287306-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

Advogado do(a) APELADO: LIZANDRA LEITE BARBOSA MARIANO - SP172115-N

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0002440-54.2012.4.03.6102

RELATOR: Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA

APELANTE: VALDIR DONIZETE TORTOL

Advogado do(a) APELANTE: ALFREDO ADEMIR DOS SANTOS - SP287306-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

Advogado do(a) APELADO: LIZANDRA LEITE BARBOSA MARIANO - SP172115-N

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

R E L A T Ó R I O

 

 

 

O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON DE LUCCA (RELATOR): Trata-se de ação ajuizada em 19/3/12 em face do INSS - Instituto Nacional do Seguro Social, visando à concessão da aposentadoria especial desde a data do requerimento administrativo formulado em 17/11/11, mediante o reconhecimento do caráter especial das exercidas nos períodos de 1º/7/75 a 1º/2/78, 22/6/83 a 1º/11/84, 22/5/79 a 1º/10/80, 5/11/84 a 1º/2/88, 4/4/88 a 17/6/88 e 20/6/88 até a presente data(fls. 12). Pleiteia, ainda, a antecipação dos efeitos da tutela.

Foram deferidos à parte autora os benefícios da assistência judiciária gratuita.

O Juízo a quo julgou parcialmente procedente o pedido, para reconhecer o caráter especial das atividades exercidas nos períodos de 20/6/88 a 5/3/97 e 19/11/03 a 17/11/11. “Sem condenação ao pagamento de honorários advocatícios, por força da reciprocidade na sucumbência” (fls. 158 vº).

Inconformada, apelou a parte autora, pleiteando a condenação do INSS ao pagamento da aposentadoria especial a partir da data do requerimento administrativo formulado em 17/11/11. Caso não seja esse o entendimento, requer “a realização de perícia técnica na empresa Louis Dreyfus Commodities Agroindustrial S/A, unidade de Bebedouro/SP, a fim de constatar a exposição do Recorrente aos fatores de risco...” (fls. 173).

Com contrarrazões, subiram os autos a esta E. Corte.

Considerando que o autor foi servidor público da Prefeitura Municipal de Bebedouro/SP, contribuindo para o Regime Próprio da Previdência Social, nos períodos de 1º/7/75 a 1º/2/78 e 22/6/83 a 1º/11/84, foi determinada a intimação das partes para se manifestarem sobre a eventual ilegitimidade passiva ad causam do INSS no tocante ao pedido de reconhecimento do caráter especial das atividades exercidas, sendo que apenas a parte autora se manifestou (fls. 187/192).

É o breve relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 

 


APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0002440-54.2012.4.03.6102

RELATOR: Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA

APELANTE: VALDIR DONIZETE TORTOL

Advogado do(a) APELANTE: ALFREDO ADEMIR DOS SANTOS - SP287306-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

Advogado do(a) APELADO: LIZANDRA LEITE BARBOSA MARIANO - SP172115-N

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

 

 

 

O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON DE LUCCA (RELATOR): Inicialmente, analiso a legitimidade passiva do INSS no tocante ao pedido de reconhecimento do caráter especial das atividades exercidas nos períodos de 1º/7/75 a 1º/2/78 e 22/6/83 a 1º/11/84.

Conforme a certidão de fls. 53, datada de 11/1/11, o demandante laborou na Prefeitura Municipal de Bebedouro/SP, "submetido a Lei Estatutária (2693/97)" (fls. 53).

Sobre o reconhecimento de tempo de serviço exercido no Regime Próprio de Previdência Social observam os juristas Daniel Machado da Rocha e José Paulo Baltazar Junior, na obra "Comentários à Lei de Benefícios da Previdência Social", que "[n]ão é o fato de a Lei de Benefícios disciplinar as normas gerais da contagem recíproca que torna o INSS responsável pela obrigação de certificar o tempo de vinculação do segurado nos outros regimes previdenciários. Com efeito, a simples reflexão sobre a existência de regimes previdenciários distintos induz a conclusão de que cada regime deverá certificar o tempo no qual o interessado esteve nele filiado, pois somente quem possui os assentos funcionais é que poderá promover a apuração do tempo de serviço público, sendo procedida a contagem recíproca apenas no momento em que o interessado requer o benefício, no regime em que será deferido, nos termos do disposto no art. 99 da Lei de Benefícios. Assim, não cabe ao INSS reconhecer o tempo de serviço ou de contribuição prestado em outros regimes" (14ª edição, São Paulo: Atlas, 2016, p. 523, grifos meus).

Diante do exposto, se ao INSS é vedado reconhecer tempo de serviço prestado em outros regimes, também não cabe a ele manifestar-se a respeito de sua especialidade, motivo pelo qual deve ser extinto o processo sem julgamento do mérito no tocante ao pedido de reconhecimento do caráter especial das atividades exercidas em regime estatutário nos mencionados períodos, por ilegitimidade passiva ad causam.

Passo ao exame do mérito.

No que se refere ao reconhecimento da atividade especial, a jurisprudência é pacífica no sentido de que deve ser aplicada a lei vigente à época em que exercido o trabalho, à luz do princípio tempus regit actum (Recurso Especial Representativo de Controvérsia nº 1.310.034-PR).

Quanto aos meios de comprovação do exercício da atividade em condições especiais, até 28/4/95, bastava a constatação de que o segurado exercia uma das atividades constantes dos anexos dos Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79. O rol dos referidos anexos é considerado meramente exemplificativo (Súmula nº 198 do extinto TFR).

Com a edição da Lei nº 9.032/95, a partir de 29/4/95 passou-se a exigir por meio de formulário específico a comprovação da efetiva exposição ao agente nocivo perante o Instituto Nacional do Seguro Social.

A Medida Provisória nº 1.523 de 11/10/96, a qual foi convertida na Lei nº 9.528 de 10/12/97, ao incluir o § 1º ao art. 58 da Lei nº 8.213/91, dispôs sobre a necessidade da comprovação da efetiva sujeição do segurado a agentes nocivos à saúde do segurado por meio de laudo técnico, motivo pelo qual considerava necessária a apresentação de tal documento a partir de 11/10/96.

No entanto, a fim de não dificultar ainda mais o oferecimento da prestação jurisdicional, passei a adotar o posicionamento no sentido de exigir a apresentação de laudo técnico somente a partir 6/3/97, data da publicação do Decreto nº 2.172, de 5/3/97, que aprovou o Regulamento dos Benefícios da Previdência Social. Nesse sentido, quadra mencionar os precedentes do C. Superior Tribunal de Justiça: Incidente de Uniformização de Jurisprudência, Petição nº 9.194/PR, Relator Ministro Arnaldo Esteves Lima, 1ª Seção, j. em 28/5/14, v.u., DJe 2/6/14; AgRg no AREsp. nº 228.590, Relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, 1ª Turma, j. em 18/3/14, v.u., DJe 1º/4/14; bem como o acórdão proferido pela Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais no julgamento do Pedido de Uniformização de Interpretação de Lei Federal nº 0024288-60.2004.4.03.6302, Relator para Acórdão Juiz Federal Gláucio Ferreira Maciel Gonçalves, j. 14/2/14, DOU 14/2/14.

Por fim, observo que o art. 58 da Lei nº 8.213/91, com a redação dada pela Medida Provisória nº 1.523 de 11/10/96, a qual foi convertida na Lei nº 9.528 de 10/12/97, em seu § 4º, instituiu o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), sendo que, com a edição do Decreto nº 4.032/01, o qual alterou a redação dos §§ 2º e 6º e inseriu o § 8º ao art. 68 do Decreto nº 3048/99, passou-se a admitir o referido PPP para a comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos. Ademais, verifico que, com o advento do Decreto nº 8.123/13, o referido artigo assim dispôs:

 

"Art. 68.

(...)

§ 3º A comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos será feita mediante formulário emitido pela empresa ou seu preposto, com base em laudo técnico de condições ambientais do trabalho expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho.

(...)

§ 8º A empresa deverá elaborar e manter atualizado o perfil profissiográfico do trabalhador, contemplando as atividades desenvolvidas durante o período laboral, documento que a ele deverá ser fornecido, por cópia autêntica, no prazo de trinta dias da rescisão do seu contrato de trabalho, sob pena de sujeição às sanções previstas na legislação aplicável.

§ 9º Considera-se perfil profissiográfico, para os efeitos do § 8º, o documento com o histórico laboral do trabalhador, segundo modelo instituído pelo INSS, que, entre outras informações, deve conter o resultado das avaliações ambientais, o nome dos responsáveis pela monitoração biológica e das avaliações ambientais, os resultados de monitoração biológica e os dados administrativos correspondentes.

(...)"

 

Devo salientar também que o laudo (ou PPP) não contemporâneo ao exercício das atividades não impede a comprovação de sua natureza especial, desde que não tenha havido alteração expressiva no ambiente de trabalho.

Ademais, se em data posterior ao trabalho realizado foi constatada a presença de agentes nocivos, é de bom senso imaginar que a sujeição dos trabalhadores à insalubridade não era menor à época do labor, haja vista os avanços tecnológicos e a evolução da segurança do trabalho que certamente sobrevieram com o passar do tempo.

Quadra ressaltar, por oportuno, que o PPP é o formulário padronizado, redigido e fornecido pela própria autarquia, sendo que no referido documento não consta campo específico indagando sobre a habitualidade e permanência da exposição do trabalhador ao agente nocivo, diferentemente do que ocorria nos anteriores formulários SB-40, DIRBEN 8030 ou DSS 8030, nos quais tal questionamento encontrava-se de forma expressa e com campo próprio para aposição da informação. Dessa forma, não me parece razoável que a deficiência contida no PPP possa prejudicar o segurado e deixar de reconhecer a especialidade da atividade à míngua de informação expressa com relação à habitualidade e permanência.

Vale ressaltar que o uso de equipamentos de proteção individual - EPI não é suficiente para descaracterizar a especialidade da atividade, a não ser que comprovada a real efetividade do aparelho na neutralização do agente nocivo, sendo que, em se tratando, especificamente, do agente ruído, não há, no momento, equipamento capaz de neutralizar a nocividade gerada pelo referido agente agressivo, conforme o julgamento realizado, em sessão de 4/12/14, pelo Plenário do C. Supremo Tribunal Federal, na Repercussão Geral reconhecida no Recurso Extraordinário com Agravo nº 664.335/SC, de Relatoria do E. Ministro Luiz Fux.

Observo, ainda, que a informação registrada pelo empregador no Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) sobre a eficácia do EPI não tem o condão de descaracterizar a sujeição do segurado aos agentes nocivos. Conforme tratado na decisão proferida pelo C. STF na Repercussão Geral acima mencionada, a legislação previdenciária criou, com relação à aposentadoria especial, uma sistemática na qual é colocado a cargo do empregador o dever de elaborar laudo técnico voltado a determinar os fatores de risco existentes no ambiente de trabalho, ficando o Ministério da Previdência Social responsável por fiscalizar a regularidade do referido laudo. Ao mesmo tempo, autoriza-se que o empregador obtenha benefício tributário caso apresente simples declaração no sentido de que existiu o fornecimento de EPI eficaz ao empregado.

Notório que o sistema criado pela legislação é falho e incapaz de promover a real comprovação de que o empregado esteve, de fato, absolutamente protegido contra o fator de risco. A respeito, é precisa a observação do E. Ministro Luís Roberto Barroso, ao sustentar que "considerar que a declaração, por parte do empregador, acerca do fornecimento de EPI eficaz consiste em condição suficiente para afastar a aposentadoria especial, e, como será desenvolvido adiante, para obter relevante isenção tributária, cria incentivos econômicos contrários ao cumprimento dessas normas" (Normas Regulamentadoras relacionadas à Segurança do Trabalho).

Exata, ainda, a manifestação do E. Ministro Marco Aurélio, ao invocar o princípio da primazia da realidade, segundo o qual uma verdade formal não pode se sobrepor aos fatos que realmente ocorrem - sobretudo em hipótese na qual a declaração formal é prestada com objetivos econômicos.

Logo, se a legislação previdenciária cria situação que resulta, na prática, na inexistência de dados confiáveis sobre a eficácia ou não do EPI, não se pode impor ao segurado - que não concorre para a elaboração do laudo, nem para sua fiscalização - o dever de fazer prova da ineficácia do equipamento de proteção que lhe foi fornecido. Caberá, portanto, ao INSS o ônus de provar que o trabalhador foi totalmente protegido contra a situação de risco, pois não se pode impor ao empregado - que labora em condições nocivas à sua saúde - a obrigação de suportar individualmente os riscos inerentes à atividade produtiva perigosa, cujos benefícios são compartilhados por toda a sociedade.

Ressalto, adicionalmente, que a Corte Suprema, ao apreciar a Repercussão Geral acima mencionada, afastou a alegação, suscitada pelo INSS, de ausência de prévia fonte de custeio para o direito à aposentadoria especial. O E. Relator, em seu voto, deixou bem explicitada a regra que se deve adotar ao afirmar: "Destarte, não há ofensa ao princípio da preservação do equilíbrio financeiro e atuarial, pois existe a previsão na própria sistemática da aposentadoria especial da figura do incentivo (art. 22, II e § 3º, Lei n.º 8.212/91), que, por si só, não consubstancia a concessão do benefício sem a correspondente fonte de custeio (art. 195, § 5º, CRFB/88). Corroborando o supra esposado, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal considera que o art. 195, § 5º, da CRFB/88, contém norma dirigida ao legislador ordinário, disposição inexigível quando se tratar de benefício criado diretamente pela própria constituição".

Quanto à aposentadoria especial, em atenção ao princípio tempus regit actum, o benefício deve ser disciplinado pela lei vigente à época em que implementados os requisitos para a sua concessão, devendo ser observadas as disposições do art. 57 da Lei nº 8.213/91.

Cumpre ressaltar que, no cálculo do salário de benefício da aposentadoria especial, não há a incidência do fator previdenciário, tendo em vista o disposto no inc. II do art. 29 da Lei nº 8.213/91.

 

Passo à análise do caso concreto.

 

Inicialmente, deixo de analisar os períodos de 20/6/88 a 5/3/97 e 19/11/03 a 17/11/11, à míngua de recurso da autarquia.

Passo, então, à análise da especialidade dos períodos de 5/11/84 a 1º/2/88, 4/4/88 a 17/6/88 e 6/3/97 a 18/11/03.

 

1) Período: 5/11/84 a 1º/2/88.

Empresa: Citrícula Brasileira Ltda.

Atividades/funções: Torneiro mecânico.

Agente(s) nocivo(s): Enquadramento por categoria profissional até 28/4/95.

Enquadramento legal: Código 2.5.3 do Decreto nº 83.080/79.

Prova: CTPS (fls. 23).

Conclusão: Ficou devidamente comprovado nos autos o exercício de atividade especial no período de 5/11/84 a 1º/2/88, por enquadramento na categoria profissional.

 

2) Período: 4/4/88 a 17/6/88.

Empresa: Instel Instalações Industriais Ltda.

Atividades/funções: Torneiro mecânico.

Agente(s) nocivo(s): Enquadramento por categoria profissional até 28/4/95.

Enquadramento legal: Código 2.5.3 do Decreto nº 83.080/79.

Prova: CTPS (fls. 26).

Conclusão: Ficou devidamente comprovado nos autos o exercício de atividade especial no período de 4/4/88 a 17/6/88, por enquadramento na categoria profissional.

 

3) Período: 6/3/97 a 18/11/03.

Empresa: Louis Dreyfus Commodities Agroindustrial S/A.

Atividades/funções: Mecânico de manutenção.

Agente(s) nocivo(s): Graxa, óleo lubrificante e fumos metálicos.

Enquadramento legal: Código 1.2.11 do Decreto nº 53.831/64 e código 1.2.10 do Decreto nº 83.080/79 (hidrocarbonetos). Código 1.2.9 do Decreto nº 53.831/64 e código 1.2.11 do Decreto n.º 83.080/79 (fumos metálicos).

Prova: Perfil Profissiográfico Previdenciário – PPP (fls. 57/59) datado de 24/3/11.

Conclusão: Ficou devidamente comprovado nos autos o exercício de atividade especial no período de 6/3/97 a 18/11/03, em decorrência da exposição, de forma habitual e permanente, a agentes químicos. Cumpre observar que a ausência de indicação no PPP de responsável técnico ambiental no período anterior a 1º/7/08 não pode prejudicar o empregado que trabalhou sob condições nocivas. Outrossim, se as condições do ambiente de trabalho tendem a se aprimorar com a evolução tecnológica e da segurança do trabalho, supõe-se que em tempos pretéritos a situação era mais prejudicial ou, quando menos, igual à constatada na data da realização da perícia.

 

De acordo com a Circular nº 15 de 08/09/1994 do próprio INSS, as funções de ferramenteiro, torneiro-mecânico, fresador e retificador de ferramentas, exercidas em indústrias metalúrgicas, devem ser enquadradas como atividades especiais, nos termos do código 2.5.3 do Anexo II do Decreto nº 83.080/79. Neste sentido, transcrevo o seguinte julgado, in verbis:

 

"EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO. OCORRÊNCIA. EFEITOS INFRINGENTES. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. ATIVIDADE ESPECIAL. FRESADOR FERRAMENTEIRO. RECONHECIMENTO. CONCESSÃO.

(...)

- Da análise da documentação trazida pelo autor e do processo administrativo, juntados aos autos, verifica-se a presença do formulário SB-40, onde consta que o autor exerceu atividade profissional de fresador ferramenteiro, junto à indústria metalúrgica, em que esteve exposto, de modo habitual e permanente, à poeira metálica desprendida das operações e produtos químicos, tais como óleo de corte e óleo solúvel, enquadrada como especial nos códigos 2.5.1 e 2.5.3 do anexo II do Decreto nº 83.080/79.

- A própria autarquia previdenciária, através da Circular nº 15, de 08.09.1994, determina o enquadramento das funções de ferramenteiro, torneiro-mecânico, fresador e retificador de ferramentas, exercidas em indústrias metalúrgicas, no código 2.5.3 do anexo II Decreto nº 83.080/79.

- Desnecessidade de laudo pericial para a comprovação das condições da atividade insalubre do trabalho, salvo no tocante aos agentes físicos ruído e calor, no período anterior à Lei nº 9.528/97, ante a inexistência de previsão legal.

(...)

- Embargos de declaração acolhidos com efeitos infringentes. Remessa oficial e apelação do INSS parcialmente providas. Apelação do autor provida."

(Embargos de declaração em AC nº 2002.61.26.011114-2, Décima Turma, Rel. Des. Fed. Diva Malerbi, v.u., j. 10/11/09, DJe 18/11/09, grifos meus)

 

Cito, ainda, precedente do Conselho de Recursos da Previdência Social:

 

"As funções exercidas como TORNEIRO MECANICO, FERRAMENTEIRO E FRESADOR, a própria Autarquia, por meio da Circular nº 15, expedida em 08/09/1994, determinou o enquadramento dessas funções, além das de retificador de ferramentas, exercidas em indústrias metalúrgicas, no código 2.5.3 do Anexo II do Decreto no 83.079/80."

(Conselho de Recursos da Previdência Social, Proc. nº 44232.066769/2014-46, 13ª Junta de Recursos, Rel. Cons. Priscila Conceição Felix, v.u., j. 17/07/14)

 

Em se tratando de agentes químicos, impende salientar que a constatação dos mesmos deve ser realizada mediante avaliação qualitativa e não quantitativa, bastando a exposição do segurado aos referidos agentes para configurar a especialidade do labor.

Neste sentido, colaciono a jurisprudência abaixo transcrita, in verbis:

 

"PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS INFRINGENTES. ATIVIDADE ESPECIAL. AGENTES QUÍMICOS NOCIVOS. AVALIAÇÃO QUALITATIVA.

Os riscos ocupacionais gerados pela exposição a agentes químicos são constatados a partir da avaliação qualitativa; não requerem análise quantitativa da concentração ou intensidade máxima a que submetido o trabalhador."

(TRF4, EINF nº 5000295-67.2010.404.7108/RS, Terceira Seção, Rel. Des. Fed. Luiz Carlos de Castro Lugon, j. 11/12/14, v.u., DE 4/2/15, grifos meus)

 

"PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. REQUISITOS PREENCHIDOS. CONCESSÃO.

(...)

6. Os riscos ocupacionais gerados pela exposição a agentes químicos são constatados a partir da avaliação qualitativa; não requerem análise quantitativa da concentração ou intensidade máxima a que submetido o trabalhador.

(...)

10. Comprovando o exercício da atividade especial por mais de 25 anos, o segurado faz jus à concessão da aposentadoria especial, nos termos do artigo 57, caput, e § 1º, da lei 8.213, de 24-07-1991, observado, ainda, o disposto art. 18, I, 'd', c/c 29, II, da LB, a contar da data do requerimento administrativo."

(TRF4, AC nº 0009337-15.2015.4.04.9999/RS, Quinta Turma, Rel. Juiz Federal Convocado José Antonio Savaris, j. 25/8/15, v.u., DE 2/9/15, grifos meus)

 

No que se refere à aposentadoria, verifico que a “COMUNICAÇÃO DE DECISÃO” acostada a fls. 20 revela que o autor formulou requerimento administrativo de aposentadoria especial em 17/11/11 (NB 46/155.447.690-6), sendo que o mesmo foi indeferido por estar “recebendo benefício no âmbito da Seguridade Social sob n.º 152.819.388-9, desde 19/08/2011”.

Conforme a alegação do próprio demandante e a consulta realizada no Sistema Único de Previdência Social juntada a fls. 83, o autor recebe, desde 19/8/11, o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição (NB 42/152.819.388-9).

No entanto, somando-se os períodos especiais reconhecidos nos presentes autos até a data do requerimento administrativo realizado em 19/8/11, perfaz o autor mais de 25 anos de atividade especial, motivo pelo qual faz jus à concessão da aposentadoria especial.

Cumpre ressaltar que não se trata, in casu, de desaposentação, a qual é vedada, conforme a decisão do C. Supremo Tribunal Federal no histórico julgamento da Repercussão Geral reconhecida no Recurso Extraordinário nº 661.256, uma vez que o INSS, em 19/8/11, já deveria ter concedido na esfera administrativa a aposentadoria especial, por ser mais benéfica ao autor. Observo que tal entendimento veio a ser expressamente consagrado no art. 621, da Instrução Normativa INSS/PRES nº 45, de 06 de agosto de 2010, in verbis: "O INSS deve conceder o melhor benefício a que o segurado fizer jus, cabendo ao servidor orientar nesse sentido." Tão justo e salutar é esse dispositivo transcrito que ele foi ratificado pela posterior Instrução Normativa INSS-PRES nº 77, de 21 de janeiro de 2015, conforme a redação constante do seu art. 687, absolutamente idêntica à desse art. 621, inteiramente descumprido pela autarquia.

Tendo em vista a concessão da aposentadoria especial, a análise da especialidade do período de 22/5/79 a 1º/10/80 fica prejudicada.

O termo inicial da aposentadoria especial deve ser fixado a partir de 17/11/11, conforme requerido pela própria parte autora.

Com relação aos índices de atualização monetária e taxa de juros, devem ser observados os posicionamentos firmados na Repercussão Geral no Recurso Extraordinário nº 870.947 (Tema 810) e no Recurso Especial Repetitivo nº 1.492.221 (Tema 905), adotando-se, dessa forma, o IPCA-E nos processos relativos a benefício assistencial e o INPC nos feitos previdenciários. Quadra ressaltar haver constado expressamente do voto do Recurso Repetitivo que “a adoção do INPC não configura afronta ao que foi decidido pelo Supremo Tribunal Federal, em sede de repercussão geral (RE 870.947/SE). Isso porque, naquela ocasião, determinou-se a aplicação do IPCA-E para fins de correção monetária de benefício de prestação continuada (BPC), o qual se trata de benefício de natureza assistencial, previsto na Lei 8.742/93. Assim, é imperioso concluir que o INPC, previsto no art. 41-A da Lei 8.213/91, abrange apenas a correção monetária dos benefícios de natureza previdenciária.” Outrossim, como bem observou o E. Desembargador Federal João Batista Pinto Silveira: “Importante ter presente, para a adequada compreensão do eventual impacto sobre os créditos dos segurados, que os índices em referência – INPC e IPCA-E tiveram variação muito próxima no período de julho de 2009 (data em que começou a vigorar a TR) e até setembro de 2019, quando julgados os embargos de declaração no RE 870947 pelo STF (IPCA-E: 76,77%; INPC 75,11), de forma que a adoção de um ou outro índice nas decisões judiciais já proferidas não produzirá diferenças significativas sobre o valor da condenação.” (TRF-4ª Região, AI nº 5035720-27.2019.4.04.0000/PR, 6ª Turma, v.u., j. 16/10/19).

A taxa de juros deve incidir de acordo com a remuneração das cadernetas de poupança (art. 1º-F da Lei nº 9.494/97 com a redação dada pela Lei nº 11.960/09), conforme determinado na Repercussão Geral no Recurso Extraordinário nº 870.947 (Tema 810) e no Recurso Especial Repetitivo nº 1.492.221 (Tema 905).

A verba honorária fixada à razão de 10% sobre o valor da condenação remunera condignamente o serviço profissional prestado, nos termos do art. 20 do CPC/73 e precedentes desta Oitava Turma.

No que se refere à sua base de cálculo, considerando que o direito pleiteado pela parte autora foi reconhecido somente no Tribunal, passo a adotar o posicionamento do C. STJ de que os honorários devem incidir até o julgamento do recurso nesta Corte, in verbis: "Nos termos da Súmula n. 111 do Superior Tribunal de Justiça, o marco final da verba honorária deve ser o decisum no qual o direito do segurado foi reconhecido, que no caso corresponde ao acórdão proferido pelo Tribunal a quo." (AgRg no Recurso Especial nº 1.557.782-SP, 2ª Turma, Relator Ministro Mauro Campbell Marques, j. em 17/12/15, v.u., DJe 18/12/15).

Considerando que a sentença tornou-se pública, ainda, sob a égide do CPC/73, entendo não ser possível a aplicação do art. 85 do novo Estatuto Processual Civil, sob pena de afronta ao princípio da segurança jurídica, consoante autorizada doutrina a respeito da matéria e Enunciado nº 7 do C. STJ: "Somente nos recursos interpostos contra decisão publicada a partir de 18 de março de 2016 será possível o arbitramento de honorários sucumbenciais recursais, na forma do art. 85, §11, do NCPC."

Ante o exposto, de ofício, julgo extinto o processo sem julgamento de mérito no tocante ao pedido de reconhecimento do caráter especial das atividades exercidas nos períodos de 1º/7/75 a 1º/2/78 e 22/6/83 a 1º/11/84 e dou parcial provimento à apelação da parte autora para reconhecer o caráter especial das atividades exercidas nos períodos de 5/11/84 a 1º/2/88, 4/4/88 a 17/6/88 e 6/3/97 a 18/11/03, bem como condenar o INSS ao pagamento da aposentadoria especial a partir de 17/11/11, acrescida de correção monetária, juros e honorários advocatícios na forma acima indicada.

É o meu voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

PROCESSUAL CIVIL. ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM. PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE ESPECIAL. ENQUADRAMENTO POR CATEGORIA PROFISSIONAL. AGENTES QUÍMICOS. APOSENTADORIA ESPECIAL. TERMO A QUO. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.

I- In casu, se ao INSS é vedado reconhecer tempo de serviço prestado em outros regimes, também não cabe a ele manifestar-se a respeito de sua especialidade, motivo pelo qual deve ser extinto o processo sem julgamento do mérito no tocante ao pedido de reconhecimento do caráter especial das atividades exercidas em regime estatutário nos períodos de 1º/7/75 a 1º/2/78 e 22/6/83 a 1º/11/84, por ilegitimidade passiva ad causam.

II- No que se refere ao reconhecimento da atividade especial, a jurisprudência é pacífica no sentido de que deve ser aplicada a lei vigente à época em que exercido o trabalho, à luz do princípio tempus regit actum.

III- Em se tratando de agentes químicos, impende salientar que a constatação dos mesmos deve ser realizada mediante avaliação qualitativa e não quantitativa, bastando a exposição do segurado aos referidos agentes para configurar a especialidade do labor.

IV- A documentação apresentada permite o reconhecimento da atividade especial em parte dos períodos especiais.

V- Com relação à aposentadoria especial, houve o cumprimento dos requisitos previstos no art. 57 da Lei nº 8.213/91.

VI- O termo inicial da aposentadoria especial deve ser fixado a partir de 17/11/11, conforme requerido pela própria parte autora.

VII- Com relação aos índices de atualização monetária e taxa de juros, devem ser observados os posicionamentos firmados na Repercussão Geral no Recurso Extraordinário nº 870.947 (Tema 810) e no Recurso Especial Repetitivo nº 1.492.221 (Tema 905), adotando-se, dessa forma, o IPCA-E nos processos relativos a benefício assistencial e o INPC nos feitos previdenciários. A taxa de juros deve incidir de acordo com a remuneração das cadernetas de poupança (art. 1º-F da Lei nº 9.494/97 com a redação dada pela Lei nº 11.960/09), conforme determinado na Repercussão Geral no Recurso Extraordinário nº 870.947 (Tema 810) e no Recurso Especial Repetitivo nº 1.492.221 (Tema 905).

VIII- A verba honorária fixada à razão de 10% sobre o valor da condenação remunera condignamente o serviço profissional prestado. No que se refere à sua base de cálculo, considerando que o direito pleiteado pela parte autora foi reconhecido somente no Tribunal, adota-se o posicionamento do C. STJ de que os honorários devem incidir até o julgamento do recurso nesta Corte, in verbis: "Nos termos da Súmula n. 111 do Superior Tribunal de Justiça, o marco final da verba honorária deve ser o decisum no qual o direito do segurado foi reconhecido, que no caso corresponde ao acórdão proferido pelo Tribunal a quo." (AgRg no Recurso Especial nº 1.557.782-SP, 2ª Turma, Relator Ministro Mauro Campbell Marques, j. em 17/12/15, v.u., DJe 18/12/15). Considerando que a sentença tornou-se pública, ainda, sob a égide do CPC/73, entende-se não ser possível a aplicação do art. 85 do novo Estatuto Processual Civil, sob pena de afronta ao princípio da segurança jurídica, consoante autorizada doutrina a respeito da matéria e Enunciado nº 7 do C. STJ: "Somente nos recursos interpostos contra decisão publicada a partir de 18 de março de 2016 será possível o arbitramento de honorários sucumbenciais recursais, na forma do art. 85, §11, do NCPC."

IX- Processo parcialmente extinto sem julgamento de mérito ex officio. Apelação da parte autora parcialmente provida.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por unanimidade, decidiu, de ofício, julgar parcialmente extinto o processo, sem julgamento de mérito, e dar parcial provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.