APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001208-03.2018.4.03.6104
RELATOR: Gab. 12 - DES. FED. MARLI FERREIRA
APELANTE: GAL COMERCIO, IMPORTAÇÃO E EXPORTAÇÃO LTDA
Advogado do(a) APELANTE: GUILHERME MANIER CARNEIRO MONTEIRO - SP395292-A
APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001208-03.2018.4.03.6104 RELATOR: Gab. 12 - DES. FED. MARLI FERREIRA APELANTE: GAL COMERCIO, IMPORTAÇÃO E EXPORTAÇÃO LTDA Advogados do(a) APELANTE: GLAUCIO PELLEGRINO GROTTOLI - SP162609-A, GUILHERME AUGUSTO ABDALLA ROSINHA - SP306482-A APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O A Excelentíssima Desembargadora Federal MARLI FERREIRA (Relatora): Trata-se de mandado de segurança em que busca, a impetrante, o afastamento da cobrança da Taxa SISCOMEX na forma majorada pela Portaria MF nº 257/11, bem como o reconhecimento do seu direito à respectiva restituição/compensação. O MM Juízo a quo julgou improcedendo o pedido, denegando a segurança. Irresignada, apelou a impetrante, pugnando pela reforma da sentença, reproduzindo, em apertada síntese, os argumentos expendidos à inicial. Com contrarrazões, onde a União requereu a manutenção da r. sentença ou, alternativamente, o reconhecimento da prescrição quinquenal, subiram os autos a esta Corte. O Ministério Público Federal, não vislumbrando interesse público a demandar a sua intervenção, opinou pelo regular prosseguimento do feito. É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001208-03.2018.4.03.6104 RELATOR: Gab. 12 - DES. FED. MARLI FERREIRA APELANTE: GAL COMERCIO, IMPORTAÇÃO E EXPORTAÇÃO LTDA Advogados do(a) APELANTE: GLAUCIO PELLEGRINO GROTTOLI - SP162609-A, GUILHERME AUGUSTO ABDALLA ROSINHA - SP306482-A APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL OUTROS PARTICIPANTES: V O T O A Excelentíssima Desembargadora Federal MARLI FERREIRA (Relatora): O recurso merece provimento. Inicialmente, cumpre anotar que a instituição da Taxa de Utilização do Sistema Integrado de Comércio Exterior - SISCOMEX - deriva exatamente do poder de polícia vazado nos precisos termos do disposto nos artigos 77 e 78 do Código Tributário Nacional, verbis: "Art. 77. As taxas cobradas pela União, pelos Estados, pelo Distrito Federal ou pelos Municípios, no âmbito de suas respectivas atribuições, têm como fato gerador o exercício regular do poder de polícia, ou a utilização, efetiva ou potencial, de serviço público específico e divisível, prestado ao contribuinte ou posto à sua disposição.Parágrafo único. A taxa não pode ter base de cálculo ou fato gerador idênticos aos que correspondam a imposto nem ser calculada em função do capital das empresas." "Art. 78. Considera-se poder de polícia atividade da administração pública que, limitando ou disciplinando direito, interêsse ou liberdade, regula a prática de ato ou abstenção de fato, em razão de intêresse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranqüilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos.Parágrafo único. Considera-se regular o exercício do poder de polícia quando desempenhado pelo órgão competente nos limites da lei aplicável, com observância do processo legal e, tratando-se de atividade que a lei tenha como discricionária, sem abuso ou desvio de poder." Assim, na esteira desta dinâmica foi editada a Lei nº 9.716, de 26/11/1998, que, entre outras providências, deu nova redação aos artigos 1º, 2º, 3º e 4º do Decreto-Lei nº 1.578, de 11/10/77, que dispõe sobre o Imposto de Exportação. e cujo artigo 3º assim fixou, verbis: "Art. 3º Fica instituída a Taxa de Utilização do Sistema Integrado de Comércio Exterior - SISCOMEX, administrada pela Secretaria da Receita Federal do Ministério da Fazenda. § 1º A taxa a que se refere este artigo será devida no Registro da Declaração de Importação, à razão de: (Vide Medida Provisória nº 320, 2006) I - R$ 30,00 (trinta reais) por Declaração de Importação; II - R$ 10,00 (dez reais) para cada adição de mercadorias à Declaração de Importação, observado limite fixado pela Secretaria da Receita Federal. § 2º Os valores de que trata o parágrafo anterior poderão ser reajustados, anualmente, mediante ato do Ministro de Estado da Fazenda, conforme a variação dos custos de operação e dos investimentos no SISCOMEX. § 3º Aplicam-se à cobrança da taxa de que trata este artigo as normas referentes ao Imposto de Importação. § 4º O produto da arrecadação da taxa a que se refere este artigo fica vinculado ao Fundo Especial de Desenvolvimento e Aperfeiçoamento das Atividades de Fiscalização - FUNDAF, instituído pelo art. 6º do Decreto-Lei no 1.437, de 17 de dezembro de 1975. § 5º O disposto neste artigo aplica-se em relação às importações registradas a partir de 1º de janeiro de 1999." Por seu turno, o Ministério da Fazenda, dentro do múnus que lhe compete, editou a Portaria MF nº 257, de 20/05/2011, cujo artigo 1º assim dispôs, verbis: "Art. 1º Reajustar a Taxa de Utilização do Sistema Integrado de Comércio Exterior (SISCOMEX), devida no Registro da Declaração de Importação (DI), de que trata o parágrafo 1º do artigo 3º da Lei Nº 9.716, de 1998, nos seguintes valores: I - R$ 185,00 (cento e oitenta e cinco reais) por DI; II - R$ 29,50 (vinte e nove reais e cinquenta centavos) para cada adição de mercadorias à DI, observados os limites fixados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil (RFB)." E ainda a Instrução Normativa RFB nº 1.158, de 24/05/2011, artigo 1º verbis: "Art. 1º O art. 13 da Instrução Normativa SRF nº 680, de 2 de outubro de 2006, passa a vigorar com a seguinte redação: 'Art. 13. A Taxa de Utilização do Siscomex será devida no ato do registro da DI à razão de: I - R$ 185,00 (cento e oitenta e cinco reais) por DI; II - R$ 29,50 (vinte e nove reais e cinquenta centavos) para cada adição de mercadoria à DI, observados os seguintes limites: a) até a 2ª adição - R$ 29,50; b) da 3ª à 5ª - R$ 23,60; c) da 6ª à 10ª - R$ 17,70; d) da 11ª à 20ª - R$ 11,80;e) da 21ª à 50ª - R$ 5,90; e f)a partir da 51ª - R$ 2,95 (...) .' (NR)" Nesse diapasão, não se vislumbrava, até aqui, a ilegalidade apontada pela impetrante, uma vez que o próprio texto da lei de regência, a Lei nº 9.716/98, em seu artigo 3º, § 2º, expressamente delegou ao Ministro da Fazenda, por ato próprio, a faculdade de estabelecer o competente reajuste da indigitada Taxa, respeitada a anualidade. Assim, dentro do âmbito normativo que lhe assiste, e ainda amparado pelo disposto no artigo 237 da Carta Maior, que confere ao Ministério da Fazenda a fiscalização e o controle sobre o comércio exterior, essenciais à defesa dos interesses fazendários nacionais, restava afastada qualquer possibilidade de vício a acoimar a atividade típica levada a efeito pela administração fazendária e ora, aqui, atacada. Todavia, o E. Supremo Tribunal Federal, em julgado de 2018, declarou, in casu, a inconstitucionalidade da delegação de competência tributária, verbis: "Agravo regimental no recurso extraordinário. Taxa SISCOMEX. Majoração. Portaria. Delegação. Artigo 3º, § 2º, Lei nº 9.716/98. Ausência de balizas mínimas definidas em lei. Princípio da Legalidade. Violação. Atualização. Índices oficiais. Possibilidade. 1. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal tem acompanhado um movimento de maior flexibilização do Princípio da Legalidade em matéria de delegação legislativa, desde que o legislador estabeleça o desenho mínimo que evite o arbítrio. 2. Diante dos parâmetros já traçados na jurisprudência da Corte, a delegação contida no art. 3º, § 2º, da Lei nº 9.716/98 restou incompleta ou defeituosa, pois o legislador não estabeleceu o desenho mínimo que evitasse o arbítrio fiscal. 3. Esse entendimento não conduz a invalidade da taxa SISCOMEX, tampouco impede que o Poder Executivo atualize os valores previamente fixados na lei, de acordo com os índices oficiais, conforme amplamente aceito na jurisprudência da Corte. 4. Agravo regimental não provido. 5. Não se aplica ao caso dos autos a majoração dos honorários prevista no art. 85, § 11, do novo Código de Processo Civil, uma vez que não houve o arbitramento de honorários sucumbenciais." (RE 1.095.001 AgR/SC, Relator Ministro DIA TOFFOLI, Segunda Turma, j. 06/03/2018, Dje 28/05/2018) Em igual compasso, o seguinte aresto da Primeira Turma da Excelsa Corte, verbis: "DIREITO TRIBUTÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. TAXA DE UTILIZAÇÃO DO SISCOMEX. MAJORAÇÃO POR PORTARIA DO MINISTÉRIO DA FAZENDA. AFRONTA À LEGALIDADE TRIBUTÁRIA. AGRAVO REGIMENTAL PROVIDO. 1. É inconstitucional a majoração de alíquotas da Taxa de Utilização do SISCOMEX por ato normativo infralegal. Não obstante a lei que instituiu o tributo tenha permitido o reajuste dos valores pelo Poder Executivo, o Legislativo não fixou balizas mínimas e máximas para uma eventual delegação tributária. 2. Conforme previsto no art. 150, I, da Constituição, somente lei em sentido estrito é instrumento hábil para a criação e majoração de tributos. A Legalidade Tributária é, portanto, verdadeiro direito fundamental dos contribuintes, que não admite flexibilização em hipóteses que não estejam constitucionalmente previstas. 3. Agravo regimental a que se dá provimento tão somente para permitir o processamento do recurso extraordinário." (RE 959.274 AgR/SC, Relatora Ministra ROSA WEBER, Primeira Turma, j. 29/08/2017, Dje 13/10/2017) No mesmo andar é o entendimento desta C. Turma Julgadora: RemNecCiv 5008189-48.2018.4.03.6104/SP, Relator Desembargador Federal MARCELO MESQUITA SARAIVA, j. 19/12/2019, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 09/01/2020, e ApReeNec 5025833-16.2018.4.03.6100/SP, Relatora Desembargadora Federal MONICA AUTRAN MACHADO NOBRE, j. 09/12/2019, Intimação via sistema DATA: 16/12/2019. Observa-se, por oportuno, conforme bem assinalado pela MMª Desembargadora Federal MÔNICA NOBRE, no acima referido julgado, que, uma vez afastada a majoração da Taxa de Utilização do Sistema Integrado de Comércio Exterior – SISCOMEX -, promovida pela Portaria MF nº 257/2011, "(...) Nos termos em que explicitado no RE 1.111.866, a variação da inflação medida pelo INPC no período de 01 de janeiro de 1999 a 30 de abril de 2001 foi de 131,60%, e este deve ser o índice de reajuste a ser aplicado, ao menos por ora. Dessa forma, enquanto não sobrevier novo ato Executivo fixando os novos valores da taxa Siscomex, é possível apenas sua correção pelo índice oficial da inflação (ficando restrita a legalidade à exigência do reajuste de 131,60%, correspondente à variação de preços, medida pelo INPC, entre janeiro de 1999 e abril de 2011)." Adira-se, a final, que o próprio Ministério da Fazenda, por intermédio da Coordenação-Geral de Representação Judicial da Fazenda Nacional, emitiu a Nota SEI nº 73/2018/CRJ/PGACET/PGFN-MF, de 12/11/2018, onde se registra a aprovação de proposta de inclusão em lista de dispensa de contestar e/ou recorrer, por parte da União Federal, da questão ora posta a exame, atinente ao reajuste promovido pela indigitada Portaria MF nº 257/2011, dos valores referentes à Taxa SISCOMEX. Ante o exposto, dou provimento à apelação, concedendo a segurança para afastar a cobrança da referida taxa na forma majorada pela indigitada Portaria MF nº 257/2011, e autorizando a respectiva restituição/compensação, considerando o critério aqui explicitado (variação do INPC do período), observado o lustro prescricional e na forma da legislação de regência. É como voto.
E M E N T A
CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO. ADUANEIRO. TAXA SISCOMEX. LEI Nº 9.716/98. MAJORAÇÃO POR FORÇA DA PORTARIA MF 257/11 E IN RFB Nº 1.158/11. AFRONTA À LEGALIDADE TRIBUTÁRIA.
1. Sobre a matéria, anota-se que a instituição da Taxa de Utilização do Sistema Integrado de Comércio Exterior - SISCOMEX - deriva do poder de polícia vazado nos exatos termos do disposto nos artigos 77 e 78 do Código Tributário Nacional.
2. Nesse diapasão, não se vislumbrava, até recentemente, a ilegalidade apontada pela impetrante, uma vez que o próprio texto da lei de regência, a Lei nº 9.716/98, em seu artigo 3º, § 2º, expressamente delegou ao Ministro da Fazenda, por ato próprio, a faculdade de estabelecer o competente reajuste da indigitada Taxa, respeitada a anualidade.
3. Todavia, o E. Supremo Tribunal Federal, em julgado de 2018, declarou, in casu, a inconstitucionalidade da delegação de competência tributária, assinalando que "diante dos parâmetros já traçados na jurisprudência da Corte, a delegação contida no art. 3º, § 2º, da Lei nº 9.716/98 restou incompleta ou defeituosa, pois o legislador não estabeleceu o desenho mínimo que evitasse o arbítrio fiscal." (RE 1.095.001 AgR/SC, Relator Ministro DIA TOFFOLI, Segunda Turma, j. 06/03/2018, Dje 28/05/2018). Em igual compasso a Primeira Turma daquela Excelsa Corte, no RE 959.274 AgR/SC, Relatora Ministra ROSA WEBER, Primeira Turma, j. 29/08/2017, Dje 13/10/2017.
4. No mesmo andar é o entendimento desta C. Turma Julgadora: RemNecCiv 5008189-48.2018.4.03.6104/SP, Relator Desembargador Federal MARCELO MESQUITA SARAIVA, j. 19/12/2019, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 09/01/2020, e ApReeNec 5025833-16.2018.4.03.6100/SP, Relatora Desembargadora Federal MONICA AUTRAN MACHADO NOBRE, j. 09/12/2019, Intimação via sistema DATA: 16/12/2019.
5. Observa-se, por oportuno, conforme bem assinalado pela MMª Desembargadora Federal MÔNICA NOBRE, no acima referido julgado, que, uma vez afastada a majoração da Taxa de Utilização do Sistema Integrado de Comércio Exterior – SISCOMEX -, promovida pela Portaria MF nº 257/2011, "(...) Nos termos em que explicitado no RE 1.111.866, a variação da inflação medida pelo INPC no período de 01 de janeiro de 1999 a 30 de abril de 2001 foi de 131,60%, e este deve ser o índice de reajuste a ser aplicado, ao menos por ora. Dessa forma, enquanto não sobrevier novo ato Executivo fixando os novos valores da taxa Siscomex, é possível apenas sua correção pelo índice oficial da inflação (ficando restrita a legalidade à exigência do reajuste de 131,60%, correspondente à variação de preços, medida pelo INPC, entre janeiro de 1999 e abril de 2011)."
6. Adira-se, a final, que o próprio Ministério da Fazenda, por intermédio da Coordenação-Geral de Representação Judicial da Fazenda Nacional, emitiu a Nota SEI nº 73/2018/CRJ/PGACET/PGFN-MF, de 12/11/2018, onde se registra a aprovação de proposta de inclusão em lista de dispensa de contestar e/ou recorrer, por parte da União Federal, da questão ora posta a exame, atinente ao reajuste promovido pela indigitada Portaria MF nº 257/2011, dos valores referentes à Taxa SISCOMEX.
7. Apelação a que se dá provimento no sentido de conceder a segurança para afastar a cobrança da referida taxa, na forma majorada pela indigitada Portaria MF nº 257/2011, e autorizando-se a respectiva restituição/compensação, considerando o critério aqui explicitado (variação do INPC do período), observado o lustro prescricional e na forma da legislação de regência.