Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000176-69.2018.4.03.6004

RELATOR: Gab. 10 - DES. FED. ANTONIO CEDENHO

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZACAO E REFORMA AGRARIA - INCRA

APELADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000176-69.2018.4.03.6004

RELATOR: Gab. 10 - DES. FED. ANTONIO CEDENHO

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZACAO E REFORMA AGRARIA - INCRA

 

APELADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

 

 

Trata-se de ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público Federal em face do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária - Incra e Instituto do Meio Ambiente de Mato Grosso do Sul – Imasul, a fim de obrigar os réus a exigir e realizar Estudos de Impacto Ambiental nos Projetos de Assentamentos Taquaral, Tamarineiro I, Tamarineiro II, Paiolzinho, Urucum, Mato Grande, São Gabriel e 72, implantados nos municípios de Corumbá/MS e Ladário/MS, bem como exigir e promover o licenciamento ambiental dos referidos projetos como um empreendimento único.

Em síntese, esclarece o autor que, com o advento da Resolução CONAMA n. 458/2013, deixou-se de exigir licenças prévias (LP), de instalação e operação (LIO), assim como os estudos ambientais necessários a cada um dos projetos de assentamento, sendo o procedimento de licenciamento exigido somente quando requerido pelo beneficiário do lote, individual ou coletivamente.

Sustenta o Ministério Público Federal que a interpretação dada pelos réus da Resolução CONAMA n. 458/2013, no contexto em que se desenvolvem suas atividades, é claramente inconstitucional, uma vez que a resolução em tela deixa claro que os beneficiários do programa de assentamento rural deverão ser apoiados pelo Poder Público para a implementação do licenciamento ambiental.

O Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária - Incra ofereceu contestação (ID 107718577) e salientou que a revogação da regularização (LP e LIO) não causa qualquer prejuízo, dano ou insegurança ao meio ambiente, pois toda regularização das áreas de interesse ambiental são feitas atualmente, de forma obrigatória, no Cadastro Ambiental Rural (CAR), inclusive com maior rigor, precisão e detalhamento.

O Instituto do Meio Ambiente de Mato Grosso do Sul – Imasul apresentou contestação (ID 107718593) e sustentou que não há mais a exigência de elaboração de estudos e licenciamentos ambientais em projetos de assentamento para reforma agrária, tendo em vista o advento da Resolução CONAMA n. 458/2013.

A r. sentença julgou procedentes os pedidos e reconheceu a inconstitucionalidade (em caráter difuso e incidental) e a ilegalidade da Resolução CONAMA n. 458/2013, por entender que o ato exorbitou o poder regulamentar ao restringir, demasiadamente, o âmbito normativo do artigo 10 da Lei n. 6.938/1981 e do artigo 17 da Lei n. 8.629/1993.

Inconformado, o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária - Incra interpôs recurso de apelação (ID 107718638), argumentando, em síntese, a não existência de direito adquirido pelos beneficiários dos lotes da reforma agrária aos regramentos constituídos pelas normas da Resolução CONAMA n. 387/2006 e a impossibilidade de controle de constitucionalidade em relação à Resolução CONAMA n. 458/2013.

O Ministério Público Federal ofereceu parecer (ID 131305983) e opinou pelo desprovimento do recurso de apelação, salientando que a Resolução CONAMA n. 458/2013 é objeto de Ação Direta de Inconstitucionalidade, proposta pela Procuradoria-Geral da República (ADI 5547), tendo em vista a violação das regras constitucionais e legais de obrigatoriedade do licenciamento, tais como: art. 225, § 1º, IV, da Constituição da República; art. 10 da Lei n. 6.938/1981; Anexo 1 da Resolução CONAMA n. 237/1997.

O Instituto do Meio Ambiente de Mato Grosso do Sul – Imasul informou que, em decorrência do julgamento pelo Supremo Tribunal Federal da Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 9.262, o Imasul passou a ser representado judicialmente pela Procuradoria-Geral do Estado do Mato Grosso do Sul.

A Procuradoria-Geral do Estado do Mato Grosso do Sul se manifestou nos autos e não se opôs ao julgamento virtual do recurso de apelação (ID 140963285), declarando que o Instituto de Meio Ambiente de Mato Grosso do Sul – Imasul passou a ser representado judicialmente pela Procuradoria-Geral do Estado, que receberá as futuras intimações por meio de malote digital (sistema e-Saj).

Com contrarrazões, os autos subiram a esta E. Corte.

É o breve relatório.

Passo a decidir.

 

 

 

 

 


APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000176-69.2018.4.03.6004

RELATOR: Gab. 10 - DES. FED. ANTONIO CEDENHO

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZACAO E REFORMA AGRARIA - INCRA

 

APELADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

 

 

 

Inicialmente, necessário mencionar que o Instituto do Meio Ambiente de Mato Grosso do Sul – Imasul passou a ser representado judicialmente pela Procuradoria-Geral do Estado do Mato Grosso do Sul, conforme o disposto no Decreto Estadual do Mato Grosso do Sul n. 15.475/2020 e na Resolução PGE/MS/ N. 297, de 24 de julho de 2020.

Ressalta-se que a Procuradoria-Geral do Estado do Mato Grosso do Sul se manifestou nos autos, representando o Instituto de Meio Ambiente de Mato Grosso do Sul – Imasul, e não se opôs ao julgamento virtual do recurso de apelação (ID 140963285).

No caso em comento, cumpre destacar que o artigo 225 da Carta Maior atesta que todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações:

 

Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

§ 1º Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público:

I - preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas;

II - preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético;

III - definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção;

IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade;

V - controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente;

VI - promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio ambiente;

VII - proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade.

 

Conforme o artigo 225, § 1º, IV, da Carta Maior, incumbe ao Poder Público exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade.

Por sua vez, a Resolução CONAMA n. 458/2013 foi editada a fim de estabelecer procedimentos para o licenciamento ambiental, em assentamentos de reforma agrária, consoante o seu artigo 1º:

 

Art. 1º Esta Resolução estabelece procedimentos para o licenciamento ambiental de atividades agrossilvipastoris e de empreendimentos de infraestrutura, passíveis de licenciamento, realizados em assentamentos de reforma agrária.

 

Sobreleva consignar, no entanto, que o artigo 17 da Lei n. 8.629/1993, que regulamenta os dispositivos constitucionais relativos à reforma agrária, prevê a necessidade de estudos prévios sobre a potencialidade do uso de recursos naturais:

 

Art. 17.  O assentamento de trabalhadores rurais deverá ser realizado em terras economicamente úteis, de preferência na região por eles habitada, observado o seguinte:

I - a obtenção de terras rurais destinadas à implantação de projetos de assentamento integrantes do programa de reforma agrária será precedida de estudo sobre a viabilidade econômica e a potencialidade de uso dos recursos naturais;                      

II - os beneficiários dos projetos de que trata o inciso I manifestarão sua concordância com as condições de obtenção das terras destinadas à implantação dos projetos de assentamento, inclusive quanto ao preço a ser pago pelo órgão federal executor do programa de reforma agrária e com relação aos recursos naturais;  (Destacamos)

 

Ademais, o artigo 10 da Lei n. 6.938/1981, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, exige para atividades consideradas efetiva ou potencialmente poluidoras, bem como capazes, sob qualquer forma, de causar degradação ambiental, requisição de licença ambiental:

 

Art. 10.  A construção, instalação, ampliação e funcionamento de estabelecimentos e atividades utilizadores de recursos ambientais, efetiva ou potencialmente poluidores ou capazes, sob qualquer forma, de causar degradação ambiental dependerão de prévio licenciamento ambiental.   

 

Além disso, o artigo 7º da Lei Complementar n.º 140 de 2011 estipula que é ação administrativa da União promover o licenciamento ambiental de empreendimentos e atividades, localizados ou desenvolvidos em unidades de conservação instituídas pela União:

 

Art. 7o  São ações administrativas da União: 

XIV - promover o licenciamento ambiental de empreendimentos e atividades

a) localizados ou desenvolvidos conjuntamente no Brasil e em país limítrofe; 

b) localizados ou desenvolvidos no mar territorial, na plataforma continental ou na zona econômica exclusiva; 

c) localizados ou desenvolvidos em terras indígenas; 

d) localizados ou desenvolvidos em unidades de conservação instituídas pela União, exceto em Áreas de Proteção Ambiental (APAs); (Destacamos)

 

Tendo em vista o potencial impacto ambiental causado pelos projetos de assentamentos da reforma agrária, o Conselho Nacional do Meio Ambiente editou a Resolução n. 387/2006, estabelecendo o procedimento de licenciamento ambiental para tais projetos.

Posteriormente, o Conselho Nacional do Meio Ambiente editou a Resolução n. 458/2013, que revogou a Resolução CONAMA n. 387/2006, e estabeleceu procedimentos para licenciamento ambiental de atividades agrossilvipastoris e de empreendimentos de infraestrutura, passíveis de licenciamento, realizados em assentamentos de reforma agrária.

Conforme o artigo 3º da Resolução CONAMA n. 458/2013, o procedimento de licenciamento passou a depender de requerimento individual ou coletivo dos beneficiários do programa de reforma agrária:

 

Art. 3º O licenciamento ambiental das atividades agrossilvipastoris e dos empreendimentos de infraestrutura, passíveis de licenciamento, em assentamentos de reforma agrária, será realizado pelo órgão ambiental competente.

§ 1o Os empreendimentos de infraestrutura e as atividades agrossilvipastoris serão licenciados mediante procedimentos simplificados constituídos pelos órgãos ambientais considerando como referência o contido no Anexo.

§ 2o O procedimento de licenciamento simplificado deverá ser requerido:

I - pelos beneficiários do programa de reforma agrária responsáveis pelas atividades agrossilvipastoris, individual ou coletivamente, com apoio do poder público; e

II - pelo responsável pelo empreendimento de infraestrutura.

§ 3o As atividades eventuais ou de baixo impacto ambiental, conforme definido no art. 2o desta Resolução, independem das licenças a que se refere este artigo.

§ 4o Caso o órgão ambiental competente identifique potencial impacto ambiental significativo deverá exigir o procedimento ordinário de licenciamento.

 

A esse respeito, oportuno transcrever os argumentos do Ministério Público Federal (ID 131305983):

 

A Resolução CONAMA n. 387/2006, supostamente revogada, atribuía ao órgão executor do Projeto de Assentamentos de Reforma o requerimento de Licença Précia (sic) e Licença de Instalação e Operação junto ao órgão ambiental competente, admitindo procedimento simplificado mediante decisão fundamentada em parecer técnico, considerando, entre outros critérios, a localização em termos de ecossistema, a disponibilidade hídrica, a proximidade de unidades de conservação, terras indígenas, áreas remanescentes dos quilombos e outros espaços territoriais protegidos, o número de famílias a serem assentadas, a dimensão do Projeto e das parcelas e a base tecnológica de produção (art. 4º, caput).

Ademais, a Resolução de 2006 previa, em seu artigo 5º, um processo de licenciamento ambiental único, levando em consideração a possibilidade de efeitos cumulativos e sinérgicos. Com efeito, a Resolução CONAMA 458/2013 desconstrói a concepção do “projeto de assentamento de reforma agrária” como empreendimento único composto de vários atos ajustados ao mesmo fim, desconsidera o conceito previsto na própria resolução, e até o que o próprio INCRA entende por projeto de assentamento. (Destacamos)

 

Ressalta-se que o art. 225, § 1º, inciso IV, da Constituição Federal, é expresso ao determinar que toda atividade que tiver potencial de degradação do meio ambiente deverá ser objeto de licenciamento ambiental.

Constata-se que a Resolução CONAMA n. 458/2013, ao fragmentar o licenciamento ambiental para assentamentos de reforma agrária e determinar como regra a realização de licenciamento simplificado, violou os princípios da prevenção e da vedação de retrocesso ambiental, assim como a exigência de estudo de impacto ambiental para atividades potencialmente poluidoras, consoante o art. 225, § 1º, inciso IV, da Carta Maior.

Vale trazer à baila a r. sentença (ID 107718623):

 

Dessa feita, a Resolução CONAMA 458/2013 exorbitou do poder regulamentar, ao restringir demasiadamente o âmbito normativo da Lei 6.938/1981, artigo 10; e da Lei 8.629/1993, artigo 17.

A fragmentação e postergação do licenciamento ambiental, decorrentes da resolução em questão, vilipendiam de forma significativa o âmbito de proteção legal e constitucional do meio ambiente, por: i) desconsiderarem o impacto ambiental global do projeto de assentamento que, obviamente, não é a resultante da simples soma dos potenciais impactos causados pela atividade a ser desenvolvida por cada assentado ou pelas obras de infraestrutura; e ii) afrontarem o Princípio Constitucional da Prevenção Ambiental, o qual impõe a realização de estudos e licenciamento ambientais prévios como forma de evitar ou reduzir os potenciais danos causados por determinada atividade ou empreendimento.

Aliás, não desconheço o conteúdo discricionário quanto ao objeto e à motivação do ato normativo em espeque. Contudo, este acabou por transbordar dos parâmetros de legalidade em termos de proporcionalidade, razoabilidade e adequação, o que torna imperativo o presente controle judicial para adequá-lo às balizas constitucionais e legais estabelecidas para a proteção ambiental. (Destacamos)

 

Cabe destacar a importância do licenciamento ambiental para avaliar a compatibilidade do projeto de assentamento com unidades de conservação e sua zona de amortecimento, assim como as áreas de relevante interesse para conservação do meio ambiente, permitindo ampla participação de todos os interessados.

O Supremo Tribunal Federal, no julgamento da ADI n. 1.086/SC, declarou inconstitucional a norma que afastou a regra do art. 225, § 1º, IV, da Carta Maior, no caso de áreas de florestamento ou reflorestamento para fins empresariais:

 

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ARTIGO 182, § 3º, DA CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DE SANTA CATARINA. ESTUDO DE IMPACTO AMBIENTAL. CONTRARIEDADE AO ARTIGO 225, § 1º, IV, DA CARTA DA REPÚBLICA. A norma impugnada, ao dispensar a elaboração de estudo prévio de impacto ambiental no caso de áreas de florestamento ou reflorestamento para fins empresariais, cria exceção incompatível com o disposto no mencionado inciso IV do § 1º do artigo 225 da Constituição Federal. Ação julgada procedente, para declarar a inconstitucionalidade do dispositivo constitucional catarinense sob enfoque. (Destacamos)

 

Ademais, não deve prosperar a alegação do apelante de que o Cadastro Ambiental Rural (CAR) supriria o licenciamento ambiental, uma vez que “o Cadastro já implica em sua previsão a proteção encartada pela Constituição, ao estabelecer, desde logo, a resguarda das áreas de Reserva Legal, bem como de Proteção Permanente, entre outros.” 

De acordo com o art. 29 da Lei n. 12.651/12, o Cadastro Ambiental Rural é um registro público eletrônico de âmbito nacional, obrigatório para todos os imóveis rurais, a fim de integrar as informações ambientais das propriedades e posses rurais, compondo base de dados para controle, monitoramento, planejamento ambiental e econômico e combate ao desmatamento:

 

Art. 29. É criado o Cadastro Ambiental Rural– CAR, no âmbito do Sistema Nacional de Informação sobre Meio Ambiente – Sinima, registro público eletrônico de âmbito nacional, obrigatório para todos os imóveis rurais, com a finalidade de integrar as informações ambientais das propriedades e posses rurais, compondo base de dados para controle, monitoramento, planejamento ambiental e econômico e combate ao desmatamento.

 

Por sua vez, o licenciamento ambiental consiste em um instrumento para a concretização do postulado ambiental da prevenção, sendo requisito para toda atividade que tiver potencial de degradação do meio ambiente, conforme o art. 225 da Constituição Federal.

Transcrevo, por pertinente, a r. sentença:

 

Também não merece guarida a tese de que, com a inscrição da propriedade no Cadastro Ambiental Rural – CAR, criado pelo atual Código Florestal (Lei 12.651/2012), teria havido a regularização dos assentamentos para reforma agrária.

Tal cadastro não substitui o licenciamento ambiental, sendo considerado como sistema de controle e registro dos imóveis rurais, ou seja, como reforço à proteção ambiental. Frise-se que a lei não lhe confere o poder de regularizar questões inerentes ao licenciamento ambiental (Lei 12.651/2012, artigo 29). (Destacamos)

 

Comprova-se, por conseguinte, a obrigação de exigir e de realizar estudos de impacto ambiental nos Projetos de Assentamentos Taquaral, Tamarineiro I, Tamarineiro II, Paiolzinho, Urucum, Mato Grande, São Gabriel e 72, bem como de exigir e de promover o licenciamento ambiental nos referidos projetos, como um empreendimento único.

Ante todo o exposto, nego provimento ao recurso de apelação.

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

 

PROCESSO CIVIL. DIREITO AMBIENTAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. RESOLUÇÃO CONAMA N. 458/2013. PROJETOS DE ASSENTAMENTO E COLONIZAÇÃO. ESTUDO PRÉVIO DE IMPACTO AMBIENTAL. ARTIGO 225 DA CARTA MAIOR. NECESSIDADE. RECURSO DE APELAÇÃO DESPROVIDO.

1. Trata-se de ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público Federal em face do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária - Incra e Instituto do Meio Ambiente de Mato Grosso do Sul – Imasul, a fim de obrigar os réus a exigir e realizar Estudos de Impacto Ambiental nos Projetos de Assentamentos Taquaral, Tamarineiro I, Tamarineiro II, Paiolzinho, Urucum, Mato Grande, São Gabriel e 72, implantados nos municípios de Corumbá/MS e Ladário/MS, bem como exigir e promover o licenciamento ambiental dos referidos projetos como um empreendimento único.

2. Em síntese, esclarece o autor que, com o advento da Resolução CONAMA n. 458/2013, deixou-se de exigir licenças prévias (LP), de instalação e operação (LIO), assim como os estudos ambientais necessários a cada um dos projetos de assentamento, sendo o procedimento de licenciamento exigido somente quando requerido pelo beneficiário do lote, individual ou coletivamente.

3. Sustenta o Ministério Público Federal que a interpretação dada pelos réus da Resolução CONAMA n. 458/2013, no contexto em que se desenvolvem suas atividades, é claramente inconstitucional, uma vez que a resolução em tela deixa claro que os beneficiários do programa de assentamento rural deverão ser apoiados pelo Poder Público para a implementação do licenciamento ambiental.

4. Conforme o artigo 225, § 1º, IV, da Carta Maior, incumbe ao Poder Público exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade.

5. O artigo 10 da Lei n. 6.938/1981, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, exige para atividades consideradas efetiva ou potencialmente poluidoras, bem como capazes, sob qualquer forma, de causar degradação ambiental, requisição de licença ambiental.

6. Cabe destacar a importância do licenciamento ambiental para avaliar a compatibilidade do projeto de assentamento com unidades de conservação e sua zona de amortecimento, assim como as áreas de relevante interesse para conservação do meio ambiente, permitindo ampla participação de todos os interessados.

7. O Supremo Tribunal Federal, no julgamento da ADI n. 1.086/SC, declarou inconstitucional a norma que afastou a regra do art. 225, § 1º, IV, da Carta Maior, no caso de áreas de florestamento ou reflorestamento para fins empresariais.

8. De acordo com o art. 29 da Lei n. 12.651/12, o Cadastro Ambiental Rural é um registro público eletrônico de âmbito nacional, obrigatório para todos os imóveis rurais, a fim de integrar as informações ambientais das propriedades e posses rurais, compondo base de dados para controle, monitoramento, planejamento ambiental e econômico e combate ao desmatamento.

9. Por sua vez, o licenciamento ambiental consiste em um instrumento para a concretização do postulado ambiental da prevenção, sendo requisito para toda atividade que tiver potencial de degradação do meio ambiente, conforme o art. 225 da Constituição Federal.

10. Recurso de apelação desprovido.

 

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Terceira Turma, por unanimidade, negou provimento à apelação., nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.