APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000702-52.2014.4.03.6137
RELATOR: Gab. 07 - DES. FED. NERY JÚNIOR
APELANTE: AGENCIA NACIONAL DE ENERGIA ELETRICA - ANEEL, MUNICIPIO DE PAULICEIA
Advogado do(a) APELANTE: EDNA MARIA BARBOSA SANTOS - SP240436-A
Advogado do(a) APELANTE: ANTONIO JOSE RISSETE JUNIOR - SP253564
APELADO: ELEKTRO REDES S/A, AGENCIA NACIONAL DE ENERGIA ELETRICA - ANEEL, MUNICIPIO DE PAULICEIA
Advogado do(a) APELADO: JACK IZUMI OKADA - SP90393-A
Advogado do(a) APELADO: EDNA MARIA BARBOSA SANTOS - SP240436-A
Advogado do(a) APELADO: ANTONIO JOSE RISSETE JUNIOR - SP253564
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000702-52.2014.4.03.6137 RELATOR: Gab. 07 - DES. FED. NERY JÚNIOR APELANTE: AGENCIA NACIONAL DE ENERGIA ELETRICA - ANEEL, MUNICIPIO DE PAULICEIA Advogado do(a) APELANTE: EDNA MARIA BARBOSA SANTOS - SP240436-A APELADO: ELEKTRO REDES S/A, AGENCIA NACIONAL DE ENERGIA ELETRICA - ANEEL, MUNICIPIO DE PAULICEIA Advogado do(a) APELADO: JACK IZUMI OKADA - SP90393-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Cuidam-se de remessa necessária e apelações interpostas pelo Município de Paulicéia e pela ANEEL contra sentença proferida no bojo desta ação ordinária, que julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais para declarar a suspensão do dever do Município autor de assumir a gestão e os ativos de iluminação pública até a data de 18/06/2016 (6 meses a contar da data da prolação deste decisum). A presente ação ordinária de preceito cominatório, cumulada com pedido de antecipação dos efeitos da tutela, foi proposta pelo Município de Paulicéia/SP em face da ANEEL e da Elektro Eletricidade e Serviços S.A. objetivando que as rés sejam impedidas de dar cumprimento ao art. 218 da Resolução Normativa ANEEL nº 414/2010, que determina que as distribuidoras devam transferir o sistema de iluminação pública registrado como Ativo Imobilizado em Serviço (AIS) à pessoa jurídica de direito público competente até 31/12/2014. Aduz que tal dispositivo transgride a hierarquia das normas por afrontar a Lei n° 9.427/1996, bem como o Decreto n° 41.019/1957, em relação ao regramento do serviço de energia elétrica, e também os artigos22, 29, 30, inciso V, 84, inciso IV, da Constituição Federal ao impor ao Município um ônus que ele teria opção de não assumir, por não ter legislado no sentido de ter interesse na assunção de tais serviços. Deferida a liminar para o fim de desobrigar o Município de PAULICÉIA ao cumprimento do disposto no art. 218, da Resolução Normativa n° 414/2010 da ANEEL e, como decorrência, devendo manter o pagamento da tarifa B4b, ou valor correspondente, até o julgamento da lide, após regular instrução processual (ID 89868875, fls. 44/47). Contra esta decisão, o autor interpôs agravo de instrumento, não conhecido pelo órgão fracionário (ID 89868902, fl. 70). Regularmente processado o feito, sobreveio sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos veiculados na inicial para declarar a suspensão do dever do Município autora de assumir a gestão e os ativos de iluminação pública até a data de 18/06/2016 (6 meses contados da presente data),momento a partir do qual deverá obrigatoriamente assumir a gestão serviço de iluminação pública e, apenas se lhe aprouver, nos termos da fundamentação, os ativos (equipamentos)atualmente em posse da concessionária. Custas e honorários advocatícios suportados igualmente pelas partes, dada a sucumbência recíproca. Ainda, o juízo de origem condenou a ré ANEEL ao pagamento de honorários em favor das outras duas partes, ao fundamento de que a autarquia federal deu causa à demanda com a normativa ora afastada, e fixou, para tanto, o percentual de 20% sobre o valor atualizado da causa, “a ser rateado na mesma proporção entre a Municipalidade autora e a concessionária ré”. Opostos embargos de declaração pela Elektro, rejeitados na origem (ID 89868902, fls. 39/43). Novos embargos opostos pela concessionária, não conhecidos (fl. 53/54). Incidente de impugnação ao valor da causa formulado pela Elektro, acolhidos parcialmente, para reduzir o valor da causa para R$ 100.000,00 (cem mil reais). Irresignado, o Município de Paulicéia interpôs apelação, alegando, em síntese, a ilegalidade do art. 218 da Resolução nº 414/2010, a falta de competência da agência apelada para regular os serviços de energia elétrica, aduzindo que é de responsabilidade do Poder Concedente, União Federal, através de lei federal e não por Resolução o ônus operacional e financeiro ao assumir o encargo relativo aos gastos oriundos da transferência dos ativos. a) a determinação de transferência dos ativos de serviço de iluminação pública ao recorrente importa em afronta ao art. 14, V da Lei nº 9.427/96, na medida em que constituem bens privados da Elektro e estes somente são reversíveis ao Poder Concedente ao final do prazo de concessão; b) inconstitucionalidade e ilegalidade do art. 218 da Resolução Normativa ANEEL 414/2010 por ofensa ao princípio federativo da autonomia municipal e ao princípio da legalidade; c) falta de competência da agência apelada para regular os serviços de energia elétrica; d) somente através de lei ordinária se poderia atribuir a responsabilidade civil aos Municípios, de sorte que a ANEEL, ao editar as Resoluções Normativas nº 414/10, 479/12 e 587/13, obrigando os entes locais a prestar, diretamente, os serviços de iluminação pública, exorbitou de sua competência. Requer a concessão de tutela antecipada a fim de desobrigar o Município de Paulicéia ao cumprimento do art. 218 da Instrução Normativa ANEEL nº 414/10, com redação alterada pelas Instruções Normativas nº 479/12 e 587/13. Contrarrazões da Elektro (ID 89868902, fl. 73/87). Por sua vez, apela a ANEEL alegando, em síntese, que a gestão do serviço de iluminação pública é atribuição constitucional do Município e que a ANEEL, ao determinar a transferência dos ativos de iluminação pública, nada mais fez do que assegurar a regularidade e continuidade na prestação dos serviços de iluminação pública. Aduz que a edição da Resoluções Normativas nº 414/10, 479/12 estão alinhadas com o art. 5º, §2º do Decreto nº 41.019/1957, e não configuram usurpação de competência por parte da ANEEL, ao contrário, a autarquia recorrente agiu no estrito cumprimento de seu dever institucional. Argumenta que, ao transferir os ativos de iluminação pública aos Municípios, a ANEEL assegurou a regularidade e continuidade na prestação deste tipo de serviço, cuja titularidade, pertence aos entes locais. Acrescenta que, “por estarem atrelados a uma finalidade pública, que é a prestação do serviço em caráter contínuo, tais bens vinculados à prestação do serviço estão completamente sujeitos à disciplina estabelecida pelo titular do serviço, ou seja o Poder Concedente”. Requer a reforma da sentença e a condenação do Município autor ao pagamento da verba sucumbencial. Com contrarrazões do Município de Paulicéia (ID 89868902, fls. 113/120), subiram os autos a esta E. Corte. É o relatório.
Advogado do(a) APELADO: EDNA MARIA BARBOSA SANTOS - SP240436-A
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000702-52.2014.4.03.6137 RELATOR: Gab. 07 - DES. FED. NERY JÚNIOR APELANTE: AGENCIA NACIONAL DE ENERGIA ELETRICA - ANEEL, MUNICIPIO DE PAULICEIA Advogado do(a) APELANTE: EDNA MARIA BARBOSA SANTOS - SP240436-A APELADO: ELEKTRO REDES S/A, AGENCIA NACIONAL DE ENERGIA ELETRICA - ANEEL, MUNICIPIO DE PAULICEIA Advogado do(a) APELADO: JACK IZUMI OKADA - SP90393-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O cerne da controvérsia diz respeito à possibilidade ou não de afastamento do art. 218 da Resolução Normativa nº 414/10 da ANEEL, editada pelas Resoluções 479/2013 e 587/2013, na espécie, ante a aventada ilegalidade e inconstitucionalidade deste comando normativo. Ausentes alegações preliminares, passo ao exame do mérito. A r. sentença não comporta reparos. Vejamos. Inicialmente, cumpre mencionar que a competência para explorar os serviços e instalações de energia elétrica é exclusiva da União Federal, que pode exercê-la por intermédio de uma empresa concessionária ou permissionária, nos moldes do art. 21, XII, "b", da Constituição Federal. Dentro dessa competência, insere-se o dever de manutenção, ampliação e modernização dos pontos de iluminação pública. "Art. 21: Compete à União: (...) XII - explorar, diretamente ou mediante autorização, concessão ou permissão: b) os serviços e instalações de energia elétrica e o aproveitamento energético dos cursos de água, em articulação com os Estados onde se situam os potenciais hidroenergéticos; (...)" Acrescente-se que o art. 30, V da Carta Política estabelece a competência dos Municípios para regulamentar a organização e a prestação dos serviços públicos de interesse local, diretamente ou sob o regime de concessão. Tal dispositivo deve ser interpretado em consonância com o art. 20, XII, "b", tendo em vista o caráter complementar das normas constitucionais e o interesse público envolvido, a saber, o serviço de iluminação pública nas cidades. Insta ressaltar que a Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) é autarquia sob regime especial e tem por finalidade “regular e fiscalizar a produção, transmissão e comercialização de energia elétrica, em conformidade com as políticas e diretrizes do governo federal”, nos termos do art. 2º, da Lei nº 9.427/96. Enquanto agência reguladora, a ANEEL detém apenas o poder de editar normas eminentemente técnicas (resoluções), para regular e fiscalizar as atividades que lhe são afetas. Trata-se de exercício do poder regulatório e não o regulamentar tradicional, eis que a atribuição legal se restringe à edição de normas técnicas ligadas ao funcionamento do serviço público no âmbito de atuação do órgão. Nesse contexto, a ANEEL editou a Resolução Normativa nº 414/2010, posteriormente alterada pela Resolução Normativa nº 479/2012, que estabelece as condições gerais de fornecimento de energia elétrica e, dentre elas, a transferência do serviço de iluminação pública, registrado como Ativo Imobilizado em Serviço (AIS) à pessoa jurídica de direito público competente, vejamos: “Art. 218. A distribuidora deve transferir o sistema de iluminação pública registrado como Ativo Imobilizado em Serviço - AIS à pessoa jurídica de direito público competente. § 1o A transferência à pessoa jurídica de direito público competente deve ser realizada sem ônus, observados os procedimentos técnicos e contábeis para a transferência estabelecidos em resolução específica. § 2o Até que as instalações de iluminação pública sejam transferidas, devem ser observadas as seguintes condições: I - o ponto de entrega se situará no bulbo da lâmpada; II - a distribuidora é responsável apenas pela execução e custeio dos serviços de operação e manutenção; e III - a tarifa aplicável ao fornecimento de energia elétrica para iluminação pública é a tarifa B4b. §3o A distribuidora deve atender às solicitações da pessoa jurídica de direito público competente quanto ao estabelecimento de cronograma para transferência dos ativos, desde que observado o prazo limite de 31 de janeiro de 2014. § 4o Salvo hipótese prevista no § 3o, a distribuidora deve observar os seguintes prazos máximos: I - até 14 de março de 2011: elaboração de plano de repasse às pessoas jurídicas de direito público competente dos ativos referidos no caput e das minutas dos aditivos aos respectivos contratos de fornecimento de energia elétrica em vigor; II - até 1o de julho de 2012: encaminhamento da proposta da distribuidora à pessoa jurídica de direito público competente, com as respectivas minutas dos termos contratuais a serem firmados e com relatório detalhando o AIS, por município, e apresentando, se for o caso, o relatório que demonstre e comprove a constituição desses ativos com os Recursos Vinculados à Obrigações Vinculadas ao Serviço Público (Obrigações Especiais); III - até 1o de março de 2013: encaminhamento à ANEEL do relatório conclusivo do resultado das negociações, por município, e o seu cronograma de implementação; IV - até 30 de setembro de 2013: encaminhamento à ANEEL do relatório de acompanhamento da transferência de ativos, objeto das negociações, por município; V - até 31 de janeiro de 2014: conclusão da transferência dos ativos; e VI - até 1o de março de 2014: encaminhamento à ANEEL do relatório final da transferência de ativos, por município. § 5o A partir da transferência dos ativos ou do vencimento do prazo definido no inciso V do § 4o, em cada município, aplica-se integralmente o disposto na Seção X do Capítulo II, não ensejando quaisquer pleitos compensatórios relacionados ao equilíbrio econômico-financeiro, sem prejuízo das sanções cabíveis caso a transferência não tenha se realizado por motivos de responsabilidade da distribuidora." (grifos). Sobreleva anotar que o exercício do poder regulador não é absoluto, pois encontra limites estabelecidos pelo poder constituinte originário, notadamente, no princípio da legalidade, inserto no art. 5º, II da CF/88. Com efeito, a previsão constitucional inserta do art. 149-A ("Os Municípios e o Distrito Federal poderão instituir contribuição, na forma das respectivas leis, para o custeio do serviço de iluminação pública, observado o disposto no art. 150, I e III."), incluído pela Emenda Constitucional nº 39, de 2002, reforça o entendimento de que compete ao Município a prestação do serviço de iluminação pública e, embora detenha a competência para instituir a contribuição respectiva, não lhe obriga a aceitar a transferência compulsória do Ativo Imobilizado em Serviço, tampouco afasta a observância do princípio da legalidade (art. 5º, II, CF). Na hipótese, a ANEEL, ao editar a Resolução nº 414/2010, seguida da Resolução nº 479/2012 e, posteriormente, pela Resolução nº 587/2013, extrapolou de sua competência, criando normas sobre a transferência de AIS, não previstas em lei infraconstitucional, transbordando dos limites de sua função delegada. Outrossim, as resoluções, enquanto ato normativo derivado e inferior à lei federal, não podem inovar no ordenamento jurídico, nem alterar a competência constitucionalmente estabelecida e já definida na Lei Maior (nesse sentido, já decidiu o C. STF no julgamento do ARE 641904 PR). Confiram-se os seguintes precedentes desta Corte Regional (grifei): “DIREITO ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL. REMESSA OFICIAL. APELAÇÃO. PERDA DO OBJETO. SEPARAÇÃO DOS PODERES. ILEGITIMIDADE PASSIVA. TRANSFERÊNCIA DO SISTEMA DE ILUMINAÇÃO PÚBLICA REGISTRADO COMO ATIVO IMOBILIZADO EM SERVIÇO (AIS) AO MUNICÍPIO. ATO NORMATIVO. EXTRAPOLAÇÃO DO PODER REGULAMENTAR. PRINCÍPIO DA LEGALIDADE. APELAÇÃO E REMESSA OFICIAL NÃO PROVIDAS. 1. Não há falar em perda superveniente do objeto da ação, o que acarretaria falta de interesse processual da parte autora, pois o simples fato de o município ter procedido à assinatura do contrato de fornecimento de energia elétrica não implica dizer que há concordância com seus termos, tanto que o ente público não desistiu da ação até o momento. 2. Igualmente não há falar em violação ao princípio da separação dos poderes, pois ao Judiciário é dado o dever de analisar a legalidade dos atos administrativos. 3. Também não procede a arguição de ilegitimidade passiva, pois o artigo 218 da Resolução Normativa n. 414/2010, com alteração dada pela Resolução Normativa n. 479/2012, prevê o dever da distribuidora de transferir o sistema de iluminação pública à pessoa jurídica competente. 4. O artigo 218 da Resolução Normativa n. 414/2010, com alteração dada pela Resolução Normativa n. 479/2012, dispõe que a distribuidora deve transferir o sistema de iluminação pública registrado como Ativo Imobilizado em Serviço - AIS a pessoa jurídica de direito público competente. 5. Referida norma, na prática, tem como finalidade transferir aos municípios a responsabilidade das empresas distribuidoras de energia elétrica no que tange à manutenção, ampliação e modernização dos pontos de iluminação pública da cidade. 6. De fato, o artigo 30, V, da Constituição Federal, permite concluir que o serviço de iluminação pública se inclui na competência do município. No entanto, o fato de o município poder instituir contribuição para o custeio do serviço de iluminação pública, nos termos do artigo 149-A, da Constituição Federal, não lhe obriga a aceitar a transferência compulsória do Ativo Imobilizado em Serviço, tampouco afasta a observância do princípio da legalidade (art. 5º, II, CF). 7. Com efeito, ao estabelecer referida transferência de deveres, a ANEEL violou a autonomia municipal assegurada no artigo 18, da Constituição Federal, uma vez que, a princípio, estabeleceu-lhe nova obrigação. 8. E o artigo 175, da Constituição Federal, estabelece que a prestação de serviços públicos deve ocorrer, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, "na forma da lei". Assim, não é possível que uma resolução - ato normativo inferior à lei - trate dessa questão. 9. A transferência dos ativos necessários à prestação do serviço de iluminação pública deveria ter sido disciplinada por lei, e, portanto, verifica-se que a ANEEL desbordou de seu poder regulamentar ao editar a Resolução nº 414/2010. 10. Ainda, uma questão importante considerada pela jurisprudência deste Tribunal Regional Federal a fim de afastar a obrigatoriedade de os municípios aceitarem a transferência dos ativos de iluminação pública : diz respeito à capacidade de os entes municipais, especialmente aqueles de pequeno porte, administrarem os equipamentos necessários à iluminação dos logradouros, o que ao fim poderia acabar gerando uma considerável deficiência na prestação do serviço público, atentando contra os princípios administrativos . 11. A realização de manutenção dos equipamentos - braço, luminária, relé e reator, como indica a CPFL, exige a contratação de pessoal especializado, bem como a aquisição de materiais próprios, o que demanda certo planejamento financeiro e orçamentário, ainda mais em municípios em que a arrecadação a princípio não suportaria tais dispêndios, como provavelmente é o caso do município de São José do Barreiro, cuja população é de pouco mais de 5.000 habitantes. 12. Apelação e remessa oficial não providas. (TRF 3ª Região, 3ª Turma, ApReeNec - APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO - 5000282-77.2018.4.03.6118, Rel. Desembargador Federal ANTONIO CARLOS CEDENHO, julgado em 25/07/2019, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 31/07/2019) “PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA DE OMISSÃO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO REJEITADOS. 1. É cediço que os embargos de declaração têm cabimento apenas quando a decisão atacada contiver vícios de omissão, obscuridade ou contradição, vale dizer, não podem ser opostos para sanar o inconformismo da parte. 2. O aresto embargado abordou a questão de forma suficientemente clara, nos limites da controvérsia, não restando vício a ser sanado. 3. O julgado consignou expressamente, com fundamento na legislação e na jurisprudência desta Corte, que a transferência dos ativos necessários à prestação do serviço de iluminação pública deveria ter sido disciplinada por lei, e, portanto, verifica-se que a ANEEL desbordou de seu poder regulamentar ao editar a Resolução nº 414/2010, tendo a ANEEL violado a autonomia municipal assegurada no art. 18 da CF, vez que, a princípio, estabeleceu nova obrigação ao Município. 4. Recurso que visa engendrar rediscussão sobre o mérito da causa, o que não é permitido em sede de embargos declaratórios. 5. Ainda que o propósito seja o de prequestionar matérias, faz-se imprescindível, para o acolhimento do recurso, a constatação de efetiva ocorrência de omissão, contradição, obscuridade ou erro material, inocorrentes na espécie. 6. Embargos de declaração rejeitados. (TRF 3ª Região, 3ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5000258-98.2017.4.03.6113, Rel. Desembargador Federal NELTON AGNALDO MORAES DOS SANTOS, julgado em 22/03/2019, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 27/03/2019) Além disso, ao estabelecer a indevida transferência de deveres, a ANEEL violou o princípio do pacto federativo, especificamente quanto à autonomia municipal, prevista no art. 18 da Carta Política. Por fim, cumpre mencionar que a jurisprudência desta E. Corte firmou entendimento no sentido da suspensão da eficácia do art. 218 da Resolução Normativa da ANEEL nº 414/2010. Confiram-se: “PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. AGRAVO LEGAL. ART. 557, § 1º, CPC. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO ORDINÁRIA. SERVIÇOS DE ILUMINAÇÃO PÚBLICA. COMPETÊNCIA DOS MUNICÍPIOS. TRANSFERÊNCIA DE ATIVOS . VIOLAÇÃO DE AUTONOMIA DO MUNICÍPIO. AGRAVO DESPROVIDO. - É firme o entendimento no sentido da possibilidade do relator, a teor do disposto no artigo 557 do Código de Processo Civil, decidir monocraticamente o mérito do recurso, aplicando o direito à espécie, amparado em súmula ou jurisprudência dominante do Tribunal ou dos Tribunais Superiores. - A Lei nº 9.427/1996 disciplina o regime das concessões de serviços públicos de energia elétrica e institui a Agência Nacional de energia elétrica - ANEEL, vinculada ao Ministério de Minas e energia , para "regular e fiscalizar a produção, transmissão, distribuição e comercialização de energia elétrica , em conformidade com as políticas e diretrizes do governo federal" (art. 2º). - No exercício de seu poder regulamentar, a ANEEL expediu a Resolução Normativa 414/2010, cujo art. 218, com a redação dada pela Resolução Normativa 479/2012. - Ao prever a transferência do sistema de iluminação pública à pessoa jurídica de direito público competente - que, no caso em análise, é o Município, a ANEEL extrapolou seu poder regulamentar, além de ferir a autonomia municipal assegurada no art. 18 da CF, uma vez que, a princípio, estabelece novos deveres e obrigações ao Município. - Nos termos dos arts. 30, V e 149-A da Constituição Federal, o serviço de iluminação pública possui interesse local, cuja prestação incumbe ao Município, diretamente ou sob o regime de concessão ou permissão, de modo a possibilitar ao ente político instituir a contribuição para o custeio do serviço de iluminação pública. - Não se pode olvidar que o art. 175 da CF estabelece que a prestação de serviços públicos deve ser feita nos termos da lei, não sendo suficiente, portanto, o estabelecimento de transferência de ativos ao Poder Público Municipal mediante ato normativo expedido por agência reguladora, como no caso em análise. - A jurisprudência desta Corte Regional firmou entendimento no sentido da suspensão da eficácia do artigo 218 da Resolução Normativa da ANEEL nº 414/2010. Precedentes. - As razões recursais não contrapõem tais fundamentos a ponto de demonstrar o desacerto do decisum, limitando-se a reproduzir argumento visando à rediscussão da matéria nele contida. - Agravo desprovido. (TRF 3ª Região, SEXTA TURMA, AI 0022028-83.2013.4.03.0000, Rel. DESEMBARGADORA FEDERAL DIVA MALERBI, julgado em 30/07/2015, e-DJF3 Judicial 1 DATA:07/08/2015) “PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO. ART. 218 DA RESOLUÇÃO 414/2010. ANEEL. TRANSFERÊNCIA DO SISTEMA DE ILUMINAÇÃO PÚBLICA PARA O MUNICÍPIO. NECESSIDADE DE LEI ESPECÍFICA. APELAÇÕES IMPROVIDAS. - Ao prever a transferência do sistema de iluminação pública à pessoa jurídica de direito público competente - no caso, o Município de Adolfo/SP, a ANEEL extrapolou seu poder regulamentar, estabelecendo novas obrigações ao Município, violando, por conseguinte, a autonomia municipal assegurada pelo artigo 18 da Constituição Federal. - Da análise do artigo 175 da Constituição Federal, verifica-se que a prestação de serviços públicos deve ser feita nos termos de lei. Por esta razão, não poderia um ato normativo infralegal, no caso uma Resolução Normativa, transferir o sistema de iluminação pública para o Município, devendo, para tanto, ser instituída uma lei específica. - Há de ser mantida a sentença que reconheceu o direito invocado, declarou a ilegalidade da Resolução Normativa nº 414/2010 da ANEEL e determinou que as partes requeridas se abstenham de praticar quaisquer atos tendentes a transferir o sistema de iluminação pública registrado como Ativo Imobilizado em Serviço (AIS) para o município autor com fulcro na referida resolução. - Igualmente, destaco que não prospera a alegação da COMPANHIA NACIONAL DE ENERGIA ELÉTRICA no sentido de que há falta de interesse de agir, já que os ativos de iluminação pública já foram transferidos ao município recorrido em 2010, porquanto tal afirmação fundamenta-se em simples comunicação unilateral da apelante (fls. 367/369) e em contrato de fornecimento de energia elétrica firmado em maio de 2013, à luz da Resolução da ANEEL cuja ilegalidade ora se reconhece. - Ainda que assim não fosse, o objeto da presente ação pode ser facilmente delimitado e consiste no pedido de declaração de ilegalidade do art. 218 da Resolução nº 414/2010 da ANEEL, afastando-se os efeitos da mesma. Mesmo que o apelado tenha utilizado o termo "desobrigando o recebimento", resta claro que, caso o recebimento já tenha se operado, o reconhecimento da ilegalidade da referida resolução importaria o desfazimento da transferência . - Recursos improvidos.” (TRF 3ª Região, QUARTA TURMA, AC 0001971-25.2014.4.03.6106, Rel. DESEMBARGADORA FEDERAL MÔNICA NOBRE, julgado em 23/09/2015, e-DJF3 Judicial 1 DATA:06/10/2015) Prosseguindo, resta plausível o pleito direcionado à concessão da tutela antecipada. Com efeito, o acolhimento da referida pretensão reclama a presença conjunta e concomitante da plausibilidade do direito alegado (fumus boni iuris) e da situação objetiva de perigo (periculum in mora). Ou seja, além da excepcionalidade da situação, deve-se demonstrar também a possibilidade de êxito do recurso, sob pena de se revelar inviável o acolhimento do pleito de concessão de efeito suspensivo. No presente caso, a r. sentença apenas declarou a suspensão do dever do Município de Paulicéia/SP de assumir a gestão e os ativos de iluminação pública até a data de 18/06/2016 (6 meses contados da data da prolação da sentença, ou seja, a partir de 18/12/2015), prazo que já se exauriu, o que ensejou o dever obrigacional do autor em assumir tal gestão, incluindo os ativos. Defiro, portanto, os efeitos da tutela antecipada para desobrigar o Município de Paulicéia/SP de cumprir o comando inserto no art. 218 da Resolução Normativa ANEEL nº 414/2010 e, como decorrência, de manter o pagamento da tarifa B4b, ou o valor correspondente. Condeno, ainda, os corréus ao pagamento de honorários advocatícios no importe de 10% do valor da causa, devidamente corrigidos e divididos, igualmente, entre a ANEEL e a Elektro. Ante ao exposto, defiro a tutela antecipada em benefício do autor, dou provimento à remessa oficial e à apelação do Município de Paulicéia/SP para suspender a eficácia do art. 218 da Resolução Normativa ANEEL nº 414/2010 (alterada pelo art. 124 da Resolução Normativa nº479/2012) e desobrigar o autor a adquirir a propriedade dos Ativos Imobilizados em Serviço da concessionária e distribuidora Elektro Redes S.A. e nego provimento à apelação da ANEEL. É COMO VOTO.
Advogado do(a) APELADO: EDNA MARIA BARBOSA SANTOS - SP240436-A
E M E N T A
DIREITO ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL. SERVIÇO DE ILUMINAÇÃO PÚBLICA. TRANSFERÊNCIA DE ATIVO IMOBILIZADO EM SERVIÇO. RESOLUÇÃO NORMATIVA ANEEL 414/2010. ART. 218. DECLARAÇÃO DE ILEGALIDADE MANTIDA. PRECEDENTES. ABUSO DO PODER REGULAMENTAR. TUTELA ANTECIPADA DEFERIDA. CONDENAÇÃO DA ANEEL E DA ELEKTRO EM HONORÁRIOS. REMESSA OFICIAL E APELAÇÃO DO MUNICÍPIO AUTOR PROVIDA E APELAÇÃO DA ANEEL IMPROVIDA.
1. O cerne da controvérsia diz respeito à possibilidade ou não de afastamento do art. 218 da Resolução Normativa nº 414/10 da ANEEL, editada pelas Resoluções 479/2013 e 587/2013, na espécie, ante a aventada ilegalidade e inconstitucionalidade deste comando normativo.
2. A competência da União prevista no art. 21, XII, "b" da CF/88 (legislar, diretamente ou por meio de concessão ou permissão, sobre serviços e instalações de energia elétrica) não exclui a competência dos Municípios regulamentada no art. 30, V da CF/88 (organizar e prestar, diretamente ou por meio de concessão ou permissão, os serviços públicos de interesse local), mas se completam na medida em que o constituinte originário designou a cada ente federativo.
3. Enquanto agência reguladora, a ANEEL detém apenas o poder de editar normas eminentemente técnicas (resoluções), para regular e fiscalizar as atividades que lhe são afetas. Trata-se de exercício do poder regulatório e não o regulamentar tradicional, eis que a atribuição legal se restringe à edição de normas técnicas ligadas ao funcionamento do serviço público no âmbito de atuação do órgão.
4. Com efeito, a previsão constitucional inserta do art. 149-A ("Os Municípios e o Distrito Federal poderão instituir contribuição, na forma das respectivas leis, para o custeio do serviço de iluminação pública, observado o disposto no art. 150, I e III."), incluído pela Emenda Constitucional nº 39, de 2002, reforça o entendimento de que compete ao Município a prestação do serviço de iluminação pública e, embora detenha a competência para instituir a contribuição respectiva, não lhe obriga a aceitar a transferência compulsória do Ativo Imobilizado em Serviço, tampouco afasta a observância do princípio da legalidade (art. 5º, II, CF).
5. Na hipótese, a ANEEL, ao editar a Resolução nº 414/2010, seguida da Resolução nº 479/2012 e, posteriormente, pela Resolução nº 587/2013, extrapolou de sua competência, criando normas sobre a transferência de AIS, não previstas em lei infraconstitucional, transbordando dos limites de sua função delegada.
6. Outrossim, as resoluções, enquanto ato normativo derivado e inferior à lei federal, não podem inovar no ordenamento jurídico, nem alterar a competência constitucionalmente estabelecida e já definida na Lei Maior (nesse sentido, já decidiu o C. STF no julgamento do ARE 641904 PR).
7. Além disso, ao estabelecer a indevida transferência de deveres, a ANEEL violou o princípio do pacto federativo, especificamente quanto à autonomia municipal, prevista no art. 18 da Carta Política.
8. Por fim, cumpre mencionar que a jurisprudência desta E. Corte firmou entendimento no sentido da suspensão da eficácia do art. 218 da Resolução Normativa da ANEEL nº 414/2010 (precedentes: ApCiv 5000258-98.2017.4.03.6113, Rel. Desembargador Federal NELTON AGNALDO MORAES DOS SANTOS, TERCEIRA TURMA, julgado em 22/03/2019, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 27/03/2019; ApReeNec - APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO - 5000282-77.2018.4.03.6118, Rel. Desembargador Federal ANTONIO CARLOS CEDENHO, TERCEIRA TURMA, julgado em 25/07/2019, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 31/07/2019).
9. No presente caso, a r. sentença apenas declarou a suspensão do dever do Município de Paulicéia/SP de assumir a gestão e os ativos de iluminação pública até a data de 18/06/2016 (6 meses contados da data da prolação da sentença, ou seja, a partir de 18/12/2015), prazo que já se exauriu, o que ensejou o dever obrigacional do autor em assumir tal gestão, incluindo os ativos. Tutela antecipada deferida para desobrigar o Município de Paulicéia/SP de cumprir o comando inserto no art. 218 da Resolução Normativa ANEEL nº 414/2010 e, como decorrência, de manter o pagamento da tarifa B4b, ou o valor correspondente.
10. Condenação dos corréus ao pagamento de honorários advocatícios no importe de 10% do valor da causa, devidamente corrigidos e divididos, igualmente, entre a ANEEL e a Elektro Redes S.A.
9. Apelação e remessa oficial do Município autor providas e apelação da ANEEL improvida.