Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000539-50.2010.4.03.6125

RELATOR: Gab. 07 - DES. FED. NERY JÚNIOR

APELANTE: UNIÃO FEDERAL, ANDRE LUCIO DE CASTRO, CASSIO APARECIDO BENTO DE FREITAS, EDUARDO CESAR DITAO, LOURIVAL ALVES DE SOUZA, MARIO LUCIANO ROSA, MOISES PEREIRA

Advogados do(a) APELANTE: ALEXANDRE CADEU BERNARDES - SP125204-A, ANDRE LUIZ ORTIZ MINICHIELLO - SP184587-A
Advogado do(a) APELANTE: ALEXANDRE CADEU BERNARDES - SP125204-A
Advogado do(a) APELANTE: ALEXANDRE CADEU BERNARDES - SP125204-A
Advogados do(a) APELANTE: ALEXANDRE CADEU BERNARDES - SP125204-A, ANDRE LUIZ ORTIZ MINICHIELLO - SP184587-A
Advogados do(a) APELANTE: ELIEZER PEREIRA MARTINS - SP168735-A, ALEXANDRE CADEU BERNARDES - SP125204-A
Advogado do(a) APELANTE: ALEXANDRE CADEU BERNARDES - SP125204-A

APELADO: EDSON ANGELO GARDENAL CABRERA, CESAR RODRIGUES MACEDO, APARECIDO CABRAL DE OLIVEIRA, MOISES PEREIRA, CASSIO APARECIDO BENTO DE FREITAS, LOURIVAL ALVES DE SOUZA, MARIO LUCIANO ROSA, ANDRE LUCIO DE CASTRO, EDUARDO CESAR DITAO, MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP, UNIÃO FEDERAL

Advogado do(a) APELADO: MARCOS DAUBER - PR31278-A
Advogado do(a) APELADO: MARCOS DAUBER - PR31278-A
Advogado do(a) APELADO: MARCOS DAUBER - PR31278-A
Advogado do(a) APELADO: ALEXANDRE CADEU BERNARDES - SP125204-A
Advogado do(a) APELADO: ALEXANDRE CADEU BERNARDES - SP125204-A
Advogados do(a) APELADO: ANDRE LUIZ ORTIZ MINICHIELLO - SP184587-A, ALEXANDRE CADEU BERNARDES - SP125204-A
Advogados do(a) APELADO: ELIEZER PEREIRA MARTINS - SP168735-A, ALEXANDRE CADEU BERNARDES - SP125204-A
Advogados do(a) APELADO: ANDRE LUIZ ORTIZ MINICHIELLO - SP184587-A, ALEXANDRE CADEU BERNARDES - SP125204-A
Advogado do(a) APELADO: ALEXANDRE CADEU BERNARDES - SP125204-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000539-50.2010.4.03.6125

RELATOR: Gab. 07 - DES. FED. NERY JÚNIOR

APELANTE: UNIAO FEDERAL, ANDRE LUCIO DE CASTRO, CASSIO APARECIDO BENTO DE FREITAS, EDUARDO CESAR DITAO, LOURIVAL ALVES DE SOUZA, MARIO LUCIANO ROSA, MOISES PEREIRA

Advogados do(a) APELANTE: ALEXANDRE CADEU BERNARDES - SP125204-A, ANDRE LUIZ ORTIZ MINICHIELLO - SP184587-A
Advogado do(a) APELANTE: ALEXANDRE CADEU BERNARDES - SP125204-A
Advogado do(a) APELANTE: ALEXANDRE CADEU BERNARDES - SP125204-A
Advogados do(a) APELANTE: ALEXANDRE CADEU BERNARDES - SP125204-A, ANDRE LUIZ ORTIZ MINICHIELLO - SP184587-A
Advogado do(a) APELANTE: ALEXANDRE CADEU BERNARDES - SP125204-A
Advogado do(a) APELANTE: ALEXANDRE CADEU BERNARDES - SP125204-A

APELADO: EDSON ANGELO GARDENAL CABRERA, CESAR RODRIGUES MACEDO, APARECIDO CABRAL DE OLIVEIRA, MOISES PEREIRA, CASSIO APARECIDO BENTO DE FREITAS, LOURIVAL ALVES DE SOUZA, MARIO LUCIANO ROSA, ANDRE LUCIO DE CASTRO, EDUARDO CESAR DITAO, MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP, UNIAO FEDERAL

Advogado do(a) APELADO: MARCOS DAUBER - PR31278-A
Advogado do(a) APELADO: MARCOS DAUBER - PR31278-A
Advogado do(a) APELADO: MARCOS DAUBER - PR31278-A
Advogado do(a) APELADO: ALEXANDRE CADEU BERNARDES - SP125204-A
Advogado do(a) APELADO: ALEXANDRE CADEU BERNARDES - SP125204-A
Advogados do(a) APELADO: ANDRE LUIZ ORTIZ MINICHIELLO - SP184587-A, ALEXANDRE CADEU BERNARDES - SP125204-A
Advogado do(a) APELADO: ALEXANDRE CADEU BERNARDES - SP125204-A
Advogados do(a) APELADO: ANDRE LUIZ ORTIZ MINICHIELLO - SP184587-A, ALEXANDRE CADEU BERNARDES - SP125204-A
Advogado do(a) APELADO: ALEXANDRE CADEU BERNARDES - SP125204-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

Tratam-se de remessa oficial, tida por submetida, e apelações interpostas por Moisés Pereira, Mário Luciano Rosa, Cássio Aparecido Bento de Freitas, Eduardo César Ditão, André Lúcio de Castro e Lourival Alves de Souza contra sentença proferida no bojo desta ação civil pública, que julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais, para condenar os réus ao pagamento de multa civil, nos termos do art. 12, I e III da Lei nº 8.429/92.

A presente ação civil pública de improbidade administrativa foi proposta pelo Ministério Público Federal em face de Moisés Pereira, Mário Luciano Rosa, Cássio Aparecido Bento de Freitas, Eduardo César Ditão, André Lúcio de Castro e Lourival Alves de Souza, objetivando a condenação pela prática de ato ímprobo descrito no arts. 9º, caput e 11, ambos da Lei nº 8.429/92, e fixação das sanções previstas no art. 12, ­­I e III deste diploma legal, bem como no pagamento de indenização pelos danos morais causados à imagem da União.

Depreende-se da inicial que a propositura desta ação foi subsidiada por elementos de provas colhidos nos inquéritos policiais nº 2005.61.11.001350-4 e nº 2007.61.25.002045-9, os quais integram o Procedimento Administrativo nº 1.34.024.000047/2008-27, autuado em 18/03/2008, no âmbito da Procuradoria da República no Município de Ourinhos/SP.

Tais inquéritos resultaram na Operação Veredas, executada pelo Departamento de Polícia Federal mediante interceptações telefônicas judicialmente autorizadas nos autos nº 2005.61.25.001057-7(representação penal) e transcritas nos autos nº 2007.61.25.003689-3 (medidas assecuratórias), para a apuração da conduta de policiais rodoviários federais em exercício na base de Ourinhos/SP (situada no km 345 da rodovia BR-153), tendo em vista o envolvimento destes em desvios e apropriação de mercadorias de origem estrangeira, ocorridos em março de 2005.

Conforme ressaltado no relatório do parecer ministerial, esta operação apresentou algumas linhas de investigação, limitando-se a presente demanda ao relacionamento dos referidos agentes públicos com representantes da empresa de transportes interestadual Viação Garcia Ltda.

Narra a inicial que os demandados, no período compreendido entre 2006 a 2007 (data da deflagração da operação policial), associaram-se em quadrilha para a prática de atos ímprobos para favorecer a referida transportadora em detrimento das empresas concorrentes, valendo-se os policiais rodoviários federais da natureza do cargo público que exerciam.

Ressalta que as apontadas irregularidades foram apuradas por meio de conversas telefônicas interceptadas que demonstrariam a cooptação destes agentes públicos por representantes da Viação Garcia para fins de ingerência indevida no serviço público, em troca de vantagens indevidas, tais como a concessão de equipamentos (cadeiras, materiais de construção e de informática), passagens de ônibus como cortesia e custeio de churrasco de fim de ano.

A liminar de indisponibilidade de bens foi indeferida (fl. 05/13, ID 64158402) e a inicial foi recebida. Contra esta decisão os réus Edson Ângelo Gardenal Cabrera, Cesar Rodrigues Macedo e Aparecido Cabral de Oliveira requereram ao juízo a quo a devolução do prazo integral, bem como a prerrogativa do prazo em dobro (nos termos do art. 191 do CPC/73), pelo fato de que os autos se encontravam em carga à AGU. O juízo singular entendeu por tornar prejudicado tal pedido, porquanto não juntada a carta precatória expedida para a Subseção Judiciária de Londrina/PR e, portanto, “ainda não teve início o prazo para contestação” (fl. 78, ID 64158402).

Igualmente, os réus André Lucio de Castro e Lourival Alves de Souza requereram a devolução do prazo, ante a indisponibilidade dos autos, devido à inspeção da Corregedoria, e a contagem do prazo em dobro, em razão da pluralidade de réus com procuradores distintos. De igual forma, o juízo a quo indeferiu os pleitos defensivos, pelos motivos anteriormente delineados.

Nesta ocasião, os demandados Edson Ângelo Gardenal Cabrera, Cesar Rodrigues Macedo e Aparecido Cabral de Oliveira opuseram embargos de declaração, rejeitados na origem (fls. 140/142, ID 64158402). Irresignados, os aludidos demandados agravaram de instrumento, tendo sido negado o seguimento por decisão do juízo ad quem (fl. 25, ID 64158403). Posteriormente, foi devidamente certificado o respectivo trânsito em julgado em 10/02/2012, conforme certidão de fl. 26 dos autos eletrônicos.

A União foi incluída nesta demanda na qualidade de assistente listisconsorcial ativo (decisão de fls. 28/30, ID 64158403).

Regularmente processado o feito, sobreveio sentença (fls. 168/187, ID 64158405), que julgou parcialmente procedente a pretensão formulada na inicial, nos termos do art. 487, I do CPC/15, para condenar os réus:

a) Moisés Pereira e Cássio Aparecido Bento de Freitas ao pagamento de multa civil fixada em duas vezes o valor da remuneração mensal atualmente percebida por eles;

b) Mário Luciano Rosa, Eduardo César Ditão, André Lúcio de Castro e Lourival Alves de Souza ao pagamento de multa civil fixada no valor de uma remuneração mensal atualmente percebida por eles;

c) Edson Ângelo Gardenal Cabrera, César Rodrigues Macedo e Aparecido Cabral de Oliveira ao pagamento de multa civil fixada em R$ 10.000,00 para cada um.

Ainda, a sentença determinou que o valor da multa fixada deverá ser atualizado monetariamente e acrescidos de juros no percentual de 1% ao mês, a partir desta data, até o efetivo pagamento. Sem condenação em honorários advocatícios, na forma do art. 18 da Lei nº 7.347/85 e do entendimento jurisprudencial da 1ª Seção do STJ, exarado no julgamento do AgRg no AREsp 21.466/RJ, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 13/08/2013, DJe 22/08/2013). Custas e despesas processuais a cargo dos requeridos, na forma da lei.

Através de cota ministerial de fl. 189 dos autos eletrônicos (ID 64158405), o Parquet Federal manifestou que a r. sentença, embora não tenha contemplado na totalidade os pedidos iniciais, considerou como razoável e proporcional a fixação da reprimenda, motivo pelo qual deixou de interpor recurso.

Intimados da sentença, os réus Edson Ângelo Gardenal, César Rodrigues Macedo e Aparecido Cabral de Oliveira informaram não ter interesse na interposição do recurso de apelação, ante a alegação de comprovação do pagamento do valor da condenação e pugnaram pela extinção do feito, nos termos do art. 924, II do CPC/150 com a baixa de seus nomes junto ao cartório distribuidor (ID 64158405: petição de fls. 190/191, Guias de Depósito Judicial à Ordem da Justiça Federal às fls. 192/194 e comprovantes de transação bancária de fls. 195/197).

Opostos embargos de declaração pelos corréus Moisés Pereira, Mário Luciano Rosa, Cássio Aparecido Bento de Freitas, Eduardo César Ditão, André Lúcio de Castro e Lourival Alves de Souza, estes foram rejeitados na origem (fls. 217/224, ID 64158405).

Irresignados, os réus Moisés Pereira, Mário Luciano Rosa, Cássio Aparecido Bento de Freitas, Eduardo César Ditão, André Lúcio de Castro e Lourival Alves de Souza interpuseram a presente apelação (fls. 227/265, ID 64158405), alegando, em síntese:

a) a invalidade da interceptação telefônica;

b) a violação do sigilo dos autos do Processo nº 0000150-36.2008.4.03.6125, por terceiros (no caso, Estefano Boiko Junior e José Pereira dos Santos, este último gerente de relações institucionais da Viação Motta, direcionado a “induzir a testemunha usando interceptações telefônicas de que dispunha naquele   momento”), o que acarretou a nulidade da prova; e 

c) a inocorrência do imputado ato de improbidade administrativa, ante a ausência de lastro probatório ou de dolo, bem como, pela configuração de fato atípico no tocante ao recebimento de passagens de cortesia, tendo em vista que o art. 10, §1º, II do Decreto nº 4.081/2002 (Código de Conduta de Alta Administração Federal) considera brindes aqueles que não ultrapassem o valor de R$ 100,00 (cem reais);

d) o trânsito em julgado da sentença penal, proferida nos autos da Ação Penal nº 0000150-36.2008.403.6125, que julgou improcedente a pretensão punitiva, em relação aos mesmos fatos, objeto desta demanda, autoriza a reforma da sentença cível, em observância ao postulado da independência de instâncias.

Com contrarrazões do MPF (fls. 48/69, ID 64158406) e da União Federal (fls. 34/46, ID 64158406).

Posteriormente, os corréus André Lúcio de Castro e Lourival Alves de Souza interpuseram novo recurso de apelação (fls. 267/271, ID 64158405), alegando, em síntese, a ausência de demonstração do ato de improbidade administrativa a ensejar a condenação dos recorrentes, ante a inexistência de favorecimento da empresa Garcia e da concessão de benefícios.

Argumentam que as solicitações de passagens nunca extrapolaram ao limite do tolerável para a aceitação de “brindes” - reguladas por Lei Nacional que prevê a possibilidade de até R$ 100,00 aos agentes públicos federais -, e as fiscalizações realizadas na própria empresa Garcia comprovam a inexistência de benefícios à referida empresa. Pugnam pela absolvição dos recorrentes.

Subsidiariamente, pleiteiam o reajuste da multa civil considerando-se o valor da remuneração dos apelantes ao tempo dos fatos e não o salário atual.

Com contrarrazões do MPF (fls. 48/69, ID 64158406) e da União Federal (fls. 34/46, ID 64158406).

Por sua vez, a União Federal interpôs recurso de apelação (fls. 278/288, ID 64158405), pugnando pela condenação de todos os corréus ao pagamento de indenização pelos danos morais causados à União, “no valor a ser fixado por Vossas Excelências” e a fixação de honorários advocatícios em seu favor.

Os réus Moisés Pereira, Mário Luciano Rosa, Cássio Aparecido Bento de Freitas, Eduardo César Ditão, André Lúcio de Castro e Lourival Alves de Souza manifestaram pela ausência de necessidade de apresentação de contrarrazões (fl. 14, ID 64158406).

Com contrarrazões dos demandados Edson Ângelo Gardenal Cabrera, César Rodrigues Macedo e Aparecido Cabral de Oliveira (ID 64158406, fls. 16/32).

Parecer ministerial pelo conhecimento e provimento da remessa oficial, tida por interposta; pelo conhecimento e desprovimento das apelações defensivas e pelo conhecimento e provimento do apelo da União (ID 89942867).

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 


APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000539-50.2010.4.03.6125

RELATOR: Gab. 07 - DES. FED. NERY JÚNIOR

APELANTE: UNIAO FEDERAL, ANDRE LUCIO DE CASTRO, CASSIO APARECIDO BENTO DE FREITAS, EDUARDO CESAR DITAO, LOURIVAL ALVES DE SOUZA, MARIO LUCIANO ROSA, MOISES PEREIRA

Advogados do(a) APELANTE: ALEXANDRE CADEU BERNARDES - SP125204-A, ANDRE LUIZ ORTIZ MINICHIELLO - SP184587-A
Advogado do(a) APELANTE: ALEXANDRE CADEU BERNARDES - SP125204-A
Advogado do(a) APELANTE: ALEXANDRE CADEU BERNARDES - SP125204-A
Advogados do(a) APELANTE: ALEXANDRE CADEU BERNARDES - SP125204-A, ANDRE LUIZ ORTIZ MINICHIELLO - SP184587-A
Advogado do(a) APELANTE: ALEXANDRE CADEU BERNARDES - SP125204-A
Advogado do(a) APELANTE: ALEXANDRE CADEU BERNARDES - SP125204-A

APELADO: EDSON ANGELO GARDENAL CABRERA, CESAR RODRIGUES MACEDO, APARECIDO CABRAL DE OLIVEIRA, MOISES PEREIRA, CASSIO APARECIDO BENTO DE FREITAS, LOURIVAL ALVES DE SOUZA, MARIO LUCIANO ROSA, ANDRE LUCIO DE CASTRO, EDUARDO CESAR DITAO, MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP, UNIAO FEDERAL

Advogado do(a) APELADO: MARCOS DAUBER - PR31278-A
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Advogado do(a) APELADO: MARCOS DAUBER - PR31278-A
Advogado do(a) APELADO: ALEXANDRE CADEU BERNARDES - SP125204-A
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Advogados do(a) APELADO: ANDRE LUIZ ORTIZ MINICHIELLO - SP184587-A, ALEXANDRE CADEU BERNARDES - SP125204-A
Advogado do(a) APELADO: ALEXANDRE CADEU BERNARDES - SP125204-A
Advogados do(a) APELADO: ANDRE LUIZ ORTIZ MINICHIELLO - SP184587-A, ALEXANDRE CADEU BERNARDES - SP125204-A
Advogado do(a) APELADO: ALEXANDRE CADEU BERNARDES - SP125204-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

O cerne da controvérsia versa sobre as seguintes teses: a) invalidade da interceptação telefônica; b) a violação do sigilo dos autos do Processo nº 0000150-36.2008.4.03.6125; c) configuração ou não da prática de atos de improbidade administrativa pelos recorrentes; d) possibilidade de reforma da sentença para julgar improcedentes os pedidos formulados na inicial, com amparo na sentença penal, proferida na Ação Penal nº 0000150-36.2008.403.6125, que absolveu os réus; e) proporcionalidade na aplicação da multa; f) possibilidade de condenação dos réus na reparação civil por danos morais à União.

Cumpre asseverar submeter-se ao duplo grau de jurisdição obrigatório a sentença que conclui pela carência da ação ou improcedência do pedido ou de parte do pedido deduzido em sede de ação civil pública, por força da aplicação analógica da regra contida no art. 19 da Lei nº 4.717/65. Nesse sentido, destaco os seguintes precedentes: AgInt no REsp 1379659/DF, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 28/03/2017, DJe 18/04/2017; AGRESP 201001846488, HERMAN BENJAMIN, STJ - SEGUNDA TURMA, DJE DATA:25/04/2011.

Primeiramente, resta manifestamente inadmissível a interposição da segunda apelação pela defesa dos réus André Lúcio de Castro e Lourival Alves de Souza (fls. 267/271, ID 64158405), tendo em vista a configuração da preclusão consumativa.

Compulsando os autos, verifico a juntada do substabelecimento pelo patrono dos demandados, Dr. André Luiz Ortiz Minichiello (OAB/SP 184.587), ora peticionante da segunda apelação, em favor do advogado Alexandre Cadeu Bernardes (OAB/SP 125.204), em 29/04/2016 (fls. 164/165 dos autos eletrônicos – ID 64158405), ora subscritor da primeira apelação, anteriormente à prolação da sentença em 19/12/2016, publicada no DJe em 24/03/2017 (certidão de fl. 189, ID 64158405).

Portanto, incabível à parte interpor dois recursos contra a mesma decisão, ainda que obedecido o prazo legal. Interposto o primeiro recurso, opera-se a preclusão consumativa, independentemente do resultado obtido, ante a manifesta inadmissibilidade recursal.

Isto posto, não conheço do segundo recurso de apelação interposto às fls. 267/271, ID 64158405.

Passo ao exame das alegações preliminares: a vinculação da sentença penal absolutória ao juízo cível, a invalidade da interceptação telefônica e a violação do sigilo dos autos do Processo nº 0000150-36.2008.4.03.6125.

I. Da alegada vinculação da sentença penal absolutória ao juízo cível:

Cumpre asseverar, de plano, que as investigações realizadas na Operação Veredas resultaram na propositura da Ação Penal nº 0000150-36.2008.4.03.6125, e esta serviu como desdobramento da presente Ação de Improbidade Administrativa.

Insta mencionar que o atual Código de Processo Civil de 2015 admitiu a utilização de prova emprestada de outro processo, à luz do contraditório:

“Art. 372: O juiz poderá admitir a utilização da prova produzida em outro processo, atribuindo-lhe o valor que considerar adequado, observado o contraditório”.

No presente feito, identifico as mesmas partes e a idêntica causa de pedir comparativamente à aludida ação penal, bem como, constato a observância devida do contraditório nas fases de conhecimento, instrução e julgamento.

Sobreleva anotar que o art. 37, §4º da Constituição Federal consagra o princípio da independência de instâncias administrativa, cível e criminal, também delineado no art. 12 da Lei nº 8.429/92, senão vejamos:

“Art. 37: A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:   

§4º: Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível.”

“Art. 12: Independentemente das sanções penais, civis e administrativas previstas na legislação específica, está o responsável pelo ato de improbidade sujeito às seguintes cominações, que podem ser aplicadas isolada ou cumulativamente, de acordo com a gravidade do fato:  (...)”   

No entanto, cabe ressaltar que o legislador infraconstitucional elencou duas exceções à regra geral da independência de instâncias, a saber: a absolvição no juízo criminal por inexistência do fato ou negativa da autoria enseja o afastamento da responsabilidade civil e administrativa do servidor. Estas hipóteses estão consagradas no art. 386, I, II, IV e V, todos do CPP, no art. 935 do CC/02 e no art. 126 da Lei nº 8.112/90, in verbis:

“Art. 386.  O juiz absolverá o réu, mencionando a causa na parte dispositiva, desde que reconheça:

I - estar provada a inexistência do fato;

II – não haver prova da existência do fato;

(...)

IV –  estar provado que o réu não concorreu para a infração penal;

V – não existir prova de ter o réu concorrido para a infração penal.”        

“Art. 935. A responsabilidade civil é independente da criminal, não se podendo questionar mais sobre a existência do fato, ou sobre quem seja o seu autor, quando estas questões se acharem decididas no juízo criminal.”

“Art. 126.  A responsabilidade administrativa do servidor será afastada no caso de absolvição criminal que negue a existência do fato ou sua autoria.”

Acrescente-se que o legislador não vedou a possibilidade de propositura da respectiva ação civil nos casos em que não for reconhecida a inexistência material do fato, vejamos:

“Art. 66.  Não obstante a sentença absolutória no juízo criminal, a ação civil poderá ser proposta quando não tiver sido, categoricamente, reconhecida a inexistência material do fato.”

Nesse viés, pacífica a jurisprudência do STJ a respaldar o entendimento da desvinculação de instâncias quando a sentença penal de absolvição se ampara na falta de provas. Confiram-se os seguintes precedentes:

“DIREITO SANCIONADOR. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ACP POR IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. FASE ADMISSIONAL DA LIDE. RECEBIMENTO DA PETIÇÃO INICIAL. AS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS FORAM UNÂNIMES EM CONSTATAR QUE A LIDE POSSUI OS ELEMENTOS NECESSÁRIOS PARA QUE SEJA AO MENOS PROCESSADA. INOCORRÊNCIA DE VIOLAÇÃO DO ART. 10 DA LEI 8.429/1992. AGRAVO INTERNO DOS IMPLICADOS DESPROVIDO.

1. Cinge-se a controvérsia em exercer controle de legalidade acerca da fase de admissão das ações de improbidade. Insurge-se a parte agravante contra a decisão que confirmou o acórdão do TJ/RS, este que chancelou a decisão de Primeiro Grau, à qual recebeu a petição inicial e determinou o processamento da ação de improbidade.

2. As Ações Civis Públicas de Improbidade Administrativa, por possuírem o peculiar caráter sancionador estatal, assemelham-se às ações penais e exigem, dessa maneira, um quarto elemento para o preenchimento das condições da ação - e consequente viabilidade da pretensão do autor: a justa causa, correspondente a um lastro mínimo de provas que comprovem a prática da conduta ímproba (materialidade) e indícios de autoria do imputado.

3. Na espécie, o Tribunal de origem, com base no acervo fático-probatório que se represou no caderno processual - gize-se, impermeável a modificações em sede de recorribilidade extraordinária -, atestou que o processamento da causa de origem deveria ser mantido, uma vez que a absolvição penal frente aos acusados por conduta ímproba se deu por falta de provas, o que não exclui a averiguação da improbidade administrativa.

4. Aduziu a Corte Gaúcha que, tratando-se de absolvição por falta de provas na esfera penal, ela não vincula o juízo cível, havendo necessidade de um aprofundamento da prova acerca desse fato, o que pode conduzir a uma solução diversa. De todo modo, isso é exatamente o mérito da demanda cível, o que deverá ser objeto de oportuno pronunciamento do juízo de 1o. grau e deste colegiado (fls. 371/373).

5. Ao que se dessume da fundamentação expendida pela Corte de origem, não ocorreu violação alguma do art. 17, § 8o. da Lei 8.429/1992, pois, de acordo com a moldura fática adveniente do aresto de origem, a espécie conta com elementos indiciários suficientes para sua aferição pelo Poder Judiciário em processamento da lide sancionadora.

6. Agravo Interno dos Implicados desprovido.”

(AgInt no AREsp 1277389/RS, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 25/05/2020, DJe 28/05/2020)

“PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL. CONTRATAÇÃO DIRETA DE PRESTADOR DE SERVIÇOS. FUNDAMENTAÇÃO DAS DECISÕES JUDICIAIS. INDEPENDÊNCIA ENTRE AS ESFERAS PENAL E CÍVEL. REQUISITOS PARA A DISPENSA DO PROCESSO LICITATÓRIO NÃO DEMONSTRADOS. ELEMENTO SUBJETIVO EVIDENCIADO. SÚMULA 7/STJ. REVISÃO DAS PENALIDADES. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO.

1. O Tribunal de origem dirimiu, fundamentadamente, as questões que lhe foram submetidas, apreciando integralmente a controvérsia posta nos autos, não se podendo, ademais, confundir julgamento desfavorável ao interesse da parte com negativa ou ausência de prestação jurisdicional.

2. As esferas cível, administrativa e penal são independentes, com exceção dos casos de absolvição, no processo criminal, por afirmada inexistência do fato ou inocorrência de autoria, o que não se verifica na hipótese, uma vez que, nos termos em que estabelecida pela instância ordinária, a improcedência da ação penal deu-se em razão de as circunstâncias fáticas não constituírem infração penal, hipótese que não tem interferência na jurisdição civil.

(...)

9. Agravo interno não provido.”

(AgInt nos EDcl no REsp 1451163/PR, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 20/04/2020, DJe 24/04/2020)

“AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PENAL. HOMICÍDIO CULPOSO NO TRÂNSITO. PRESCRIÇÃO RETROATIVA. DECLARADA PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. AUSÊNCIA DE INTERESSE RECURSAL. DECISÃO MONOCRÁTICA MANTIDA. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.

1. Nos termos da jurisprudência consolidada pela Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, uma vez extinta a punibilidade do acusado pela prescrição da pretensão punitiva, ficam afastados todos os efeitos jurídicos da condenação, não havendo interesse recursal apto a justificar a interposição de recurso para discutir eventual absolvição penal.

2. A decisão penal extintiva da punibilidade pela prescrição em nada afetará eventuais discussões que estejam em curso no âmbito cível, competindo àquele juízo formular livremente a sua convicção, tendo em vista a regra da independência entre as instâncias penal, cível e administrativa.

3. Agravo regimental desprovido.”

(AgRg no AREsp 1397738/RS, Rel. Ministra LAURITA VAZ, SEXTA TURMA, julgado em 17/10/2019, DJe 28/10/2019)

Desse modo, o pleito direcionado à reforma da sentença, com amparo na sentença absolutória penal, não merece guarida, porquanto não decidido na esfera cível sobre a inexistência do fato ou da autoria, mas, tão somente, sobre a ausência de provas suficientes da prática dos crimes de quadrilha ou bando, corrupção passiva e ativa, motivo pelo qual, o Colegiado aplicou o princípio do in dubio pro reu em benefício dos acusados.

Afasto, portanto, a aludida preliminar.

II. Da suposta nulidade das interceptações telefônicas:

Embora não vincule a esfera cível, a sentença penal se amparou em elementos de provas colhidos nos mesmos Inquéritos Policiais, cujas peças serviram de provas no presente feito – IP nº 2005.61.11.001350-4 e IP nº 2007.61.25.002045-9 -, os quais, por sua vez, integraram o Procedimento Administrativo - PA nº 1.34.024.000047/2008-27, autuado em 18/03/2008, no âmbito da Procuradoria da República no Município de Ourinhos/SP.

É firme o entendimento jurisprudencial do STJ no sentido de que as provas colhidas no inquisitório podem servir como subsídio a amparar a propositura da Ação de Improbidade Administrativa. Confira-se:

“PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO NO RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA. IMPETRAÇÃO CONTRA DECISÃO DO JUIZ CRIMINAL QUE DEFERIU O COMPARTILHAMENTO DA PROVA PRODUZIDA NO INQUÉRITO POLICIAL PARA FIM DE INSTRUÇÃO DE AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES. CONTRADITÓRIO DIFERIDO. INDEPENDÊNCIA DAS ESFERAS PENAL, CÍVEL E ADMINISTRATIVA.

1. Hipótese em que o impetrante se insurge contra decisão do juiz criminal que, após homologado o arquivamento do inquérito policial, deferiu o compartilhamento das provas produzidas para fim de instrução de ação cível de improbidade administrativa.

2. "É firme o entendimento jurisprudencial deste Sodalício no sentido da possibilidade de utilização, na seara cível, para fins de apuração de improbidade administrativa, de prova produzida na esfera penal." (AgRg no REsp 1714914/RS, Rel. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, Sexta Turma, julgado em 27/02/2018, DJe 08/03/2018).

3. O uso da prova emprestada estará sujeito à efetivação do contraditório no foro em que a prova vier a ser utilizada. Precedentes.

4. Agravo interno não provido.

(AgInt no RMS 61.408/RJ, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 11/05/2020, DJe 13/05/2020)

Plausível, portanto, o compartilhamento de provas produzidas na esfera penal para fins de apuração de atos de improbidade administrativa.

Na hipótese, o juízo a quo entendeu pela ausência de nulidade nas interceptações telefônicas, amparado no quanto decidido na esfera penal, cuja decisão foi mantida pela Quinta Turma do STJ, em sede de Habeas Corpus, a qual considerou legítimas as interceptações. Confira-se trecho da sentença:

“A legalidade da interceptação telefônica concretizada nos autos da Operação Veredas já passou pelo crivo da Quinta Turma do STJ, que na análise dos mesmos argumentos aqui apresentados pelos corréus, considerou legítimas as interceptações telefônicas e que fundamentam o pedido inicial de reconhecimento de ato classificado como de improbidade administrativa, inclusive quanto às sucessivas prorrogações das escutas telefônicas. O habeas corpus que questionava a legalidade das interceptações foi negado, como se vê da ementa abaixo:

‘HABEAS CORPUS. CORRUPÇÃO ATIVA, QUADRILHA E CONCORRÊNCIA DESLEAL (ARTIGOS 333 E 288, AMBOS DO CÓDIGO PENAL, E ARTIGO 195, INCISO III, DA LEI 9.279/1996). INTERCEPTAÇÕES TELEFÔNICAS. DECISÕES JUDICIAIS FUNDAMENTADAS.

1. O sigilo das comunicações telefônicas é garantido no inciso XII do artigo 5º da Constituição Federal, e para que haja o seu afastamento exige-se ordem judicial que, também por determinação constitucional, precisa ser fundamentada (artigo 93, inciso IX, da Carta Magna).

2. O artigo 5º da Lei 9.296/1996, ao tratar da manifestação judicial sobre o pedido de interceptação telefônica, preceitua que "a decisão será fundamentada, sob pena de nulidade, indicando também a forma de execução da diligência, que não poderá exceder o prazo de quinze dias, renovável por igual tempo uma vez comprovada a indispensabilidade do meio de prova".

3. Do teor das decisões judiciais anexadas aos autos, percebe-se, com clareza, que a interceptação telefônica foi inicialmente autorizada ante as dificuldades encontradas para apurar os ilícitos que estariam sendo praticados, notadamente pela hesitação da Polícia Federal de Marília em proceder às investigações necessárias, tendo sido prolongada no tempo em face do conteúdo das conversas monitoradas, que indicariam a existência de complexa quadrilha que estaria cometendo diversos ilícitos.

4. Não procede a alegação de que as decisões judiciais na espécie constituiriam meras reproduções umas das outras, uma vez que a autoridade judicial sempre fundamentou as interceptações nos elementos de informação colhidos em investigações ou monitoramentos prévios, demonstrando, efetivamente, a indispensabilidade da medida para a correta identificação de todos os agentes envolvidos, mormente em razão da perpetuação no tempo das atividades supostamente criminosas, conforme externado em detalhes nos relatórios da autoridade policial.

5. Ainda que o Juízo Federal tenha se reportado a provimentos judiciais anteriores para motivar algumas das prorrogações das escutas, o certo é que subsistindo as razões para a autorização das interceptações, como ocorreu no caso - tendo em vista a própria natureza e modus operandi dos delitos investigados -, inexistem óbices a que o magistrado remeta os seus fundamentos a prévias manifestações proferidas no feito.

INTERCEPTAÇÕES TELEFÔNICAS. PRORROGAÇÕES SUCESSIVAS. DILIGÊNCIAS QUE ULTRAPASSAM O LIMITE DE 30 (TRINTA) DIAS PREVISTO NO ARTIGO 5º DA LEI 9.296/1996. POSSIBILIDADE DE VÁRIAS RENOVAÇÕES. EXISTÊNCIA DE DECISÕES FUNDAMENTADAS. ILICITUDE NÃO CARACTERIZADA. DENEGAÇÃO DA ORDEM.

1. Apesar de no artigo 5º da Lei 9.296/1996 se prever o prazo máximo de 15 (quinze) dias para a interceptação telefônica, renovável por mais 15 (quinze), não há qualquer restrição ao número de prorrogações possíveis, exigindo-se apenas que haja decisão fundamentando a dilatação do período. Doutrina. Precedentes.

2. Na hipótese em apreço, consoante os pronunciamentos judiciais referentes à quebra de sigilo das comunicações telefônicas constantes dos autos, vê-se que a prorrogação das interceptações sempre foi devidamente fundamentada, justificando-se, essencialmente, nas informações coletadas pela autoridade policial em monitoramentos anteriores, não havendo que se falar, assim, em ausência de motivação concreta a embasar a extensão da medida, tampouco em ofensa ao princípio da proporcionalidade.

3. Ordem denegada.’

(HC 134.015/SP, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 16/06/2011, DJe 13/03/2012)

O relator do HC, ministro Jorge Mussi, ao analisar os 36 pronunciamentos judiciais anexados aos autos, verificou que os magistrados que permitiram as escutas telefônicas indicaram as razoes da indispensabilidade da medida de maneira adequada e suficiente. E reconheceu que a excepcionalidade da interceptação foi justificada pelas dificuldades encontradas para apurar os ilícitos que estariam sendo praticados, tendo sido prolongada no tempo em virtude do conteúdo das conversas monitoradas, que indicariam a existência de complexa quadrilha que estaria cometendo diversos ilícitos.”

Verifica-se que tanto o Habeas Corpus nº 134.045/SP como a Ação Penal nº 0000150-36.2008.4.03.6125/SP mantiveram a sentença penal no ponto em que considerou a legalidade das interceptações telefônicas e transitaram em julgado, respectivamente, em 25/04/2012 e em 08/11/2016, conforme consulta processual no site do STJ.

Conforme decidido na ação penal, não se verificou a existência de vícios insanáveis que possam macular a decisão que deferiu as interceptações telefônicas, devido à sua imprescindibilidade para a colheita de provas, à luz do art. 2º, II da Lei nº 9.296/96. Confira-se trecho do decisum:

Preliminar

Da nulidade das interceptações telefônicas

A defesa dos réus arguiu a nulidade das interceptações telefônicas que motivaram a denúncia, vez que estariam contaminadas por vícios insanáveis consistentes nas diversas prorrogações da diligência sem a devida fundamentação e na manipulação das conversas constantes dos relatórios de degravação.

No que diz respeito às prorrogações das interceptações de comunicações telefônicas, a Lei nº 9.296/96 autoriza que a medida seja renovada. Ainda que o art. 5º desse diploma legal determine que a interceptação não poderá exceder o prazo de 15 (quinze) dias, renovável por igual período, prevalece na doutrina e na jurisprudência a possibilidade de várias renovações da diligência, desde que fundamentadas e que a complexidade do caso concreto o exija.

No presente caso, não verifico qualquer mácula ou deficiência nas decisões de prorrogação exaradas pelo Juízo a quo. Como bem observou a sentença alvo dos presentes recursos, "todas as interceptações telefônicas realizadas durante as investigações receberam a devida autorização judicial, proferida de maneira fundamentada, salientando sua necessidade para o deslinde dos crimes frete aos indícios já colhidos." (fls. 4814/4815).

A utilização de interceptação telefônica em casos semelhantes a este é recorrente e, de fato, necessária, pois o alto grau de cautela adotado por associações criminosas exige a utilização de métodos de investigação diferentes dos tradicionais, o que atende ao disposto no art. 2º, II, da Lei nº 9.296/96.

O caso concreto reflete, de forma clássica, aquelas situações em que a medida excepcional da interceptação das comunicações telefônicas mostra-se imprescindível para a colheita da prova. As prorrogações, a seu turno, foram concretamente fundamentadas e justificaram-se em razão da complexidade do caso. O período pelo qual se estendeu a manutenção da quebra alinha-se à gravidade dos fatos e à magnitude da atuação do grupo investigado, o que tornou imprescindível a sua prorrogação.

(...)

Quanto à suposta manipulação dos relatórios de degravação, a defesa alega que "a interpretação efetivada pela Polícia Federal não merece qualquer credibilidade por ter sido efetuada por policiais despreparados e sem qualquer conhecimento da legislação afeta à matéria" (fls. 4876 e 4887). Observo que não há nos autos qualquer elemento a indicar a má-fé ou o despreparo dos policiais. Como bem ressaltou o Juízo a quo, "a atuação de policiais federais no decurso de investigações possui a presunção de legalidade, dotados seus atos e certificações de fé publica, necessitando de provas contundentes para seu afastamento". Assim, cumpria à defesa o ônus de provar a existência de manipulação ou falta de preparo por parte dos agentes policiais que procederam às interceptações telefônicas (CPP, art. 156). Portanto, não há fundamento para invalidar-se a diligência.

Quanto às alegadas divergências entre as degravações feitas pela equipe da Polícia Federal e a apresentada pelo laudo pericial (fls. 2595/2634), friso que, ainda que existissem, isso não invalidaria o uso dessas interceptações para fins probatórios, pois as partes tiveram amplo acesso aos áudios originais.

Portanto, afasto a preliminar de nulidade da interceptação das comunicações telefônicas.”

Igualmente, as prorrogações encontram respaldo na jurisprudência da Corte Superior, na medida em que observada a devida fundamentação, tal como verificado na espécie. Colho precedentes do STJ (grifei):

“PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA. SUCESSIVAS RENOVAÇÕES. POSSIBILIDADE. FUNDAMENTAÇÃO . ENTENDIMENTO FIRMADO NO STJ. SÚMULA 83/STJ. AGRAVO NÃO PROVIDO.

1. Este Superior Tribunal de Justiça tem o entendimento de que não há óbice legal ao prosseguimento das investigações por meio da interceptação telefônica, se as provas que dela decorrem forem reconhecidamente imprescindíveis ao deslinde da causa e ao indiciamento do maior número de envolvidos na prática delitiva.

2. "Segundo jurisprudência pacífica do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal, o disposto no art. 5º da Lei n. 9.296/1996 não limita a prorrogação da interceptação telefônica a um único período, podendo haver sucessivas renovações, desde que devidamente fundamentadas. (HC 121.212/RJ, Rel. Min. SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, DJe 05/03/2012)

3. Agravo regimental não provido."

(STJ, AgRg no AREsp 188197/SP, 5ª Turma, Rel. Min. Jorge Mussi, j. 25.03.2014, DJe 02.04.2014)

“RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. ARGUIÇÃO DE NULIDADE DO JULGAMENTO DO WRIT ORIGINÁRIO, POR FALTA DE INTIMAÇÃO DO ADVOGADO ACERCA DA DATA DA RESPECTIVA SESSÃO E DAS CONCLUSÕES DO RESPECTIVO ACÓRDÃO. IMPROCEDÊNCIA. PRORROGAÇÃO DAS INTERCEPTAÇÕES TELEFÔNICAS. ILEGALIDADE NÃO CONFIGURADA. INSURGÊNCIA CONTRA A PRISÃO PREVENTIVA. SUPERVENIENTE EXPEDIÇÃO DE ALVARÁ DE SOLTURA EM FAVOR DO ACUSADO. PERDA DO INTERESSE PROCESSUAL. RECURSO ORDINÁRIO PARCIALMENTE PREJUDICADO E, NO MAIS, DESPROVIDO.

1. A teor da orientação desta Corte Superior Tribunal de Justiça, "em razão da natureza célere e urgente do writ e por prescindir de sua inclusão em pauta, não havendo prévio requerimento expresso por parte do advogado do recorrente, não há que se falar em nulidade do julgamento de habeas corpus realizado em sessão cuja data não lhe foi cientificada" (RHC 32.366/RS, 5.ª Turma, Rel. Min. CAMPOS MARQUES (Desembargador convocado do TJ/PR), DJe de 09/11/2012).

2. Não procede o pedido de declaração de nulidade por ausência de intimação do advogado do Paciente acerca das conclusões do acórdão proferido no julgamento do writ originário. Com efeito, mesmo que restasse demonstrado o vício arguido, o que sequer verificou na hipótese, não houve prejuízo à parte, porquanto interposto tempestivamente o presente recurso ordinário.

3. "Persistindo os pressupostos que conduziram à decretação da interceptação telefônica, não há obstáculos para sucessivas prorrogações, desde que devidamente fundamentadas, nem ficam maculadas como ilícitas as provas derivadas da interceptação " (STF, RHC 85.575/SP, 2.ª Turma, Rel. Ministro JOAQUIM BARBOSA, DJ de 16/03/2007).

4. A análise da insurgência contra a prisão preventiva encontra-se prejudicada, em virtude da superveniente expedição de alvará de soltura em favor do Paciente.

5. Recurso ordinário parcialmente prejudicado e, no mais, desprovido."

(STJ, RHC 34134/PE, 5ª Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, j. 21.11.2013, DJe 04.12.2013)

Tampouco procede o argumento de que as decisões judiciais que deferiram a referida medida cautelar constituíram meras reproduções umas das outras, tendo em vista que a fundamentação foi constatada no transcorrer da ação penal, cuja decisão final transitou em julgado.

Desse modo, não há que se falar em nulidade das interceptações telefônicas. Afasto a preliminar.

III. Da alegada violação de sigilo:

Cumpre mencionar que a regra do sigilo dos diálogos interceptados não constitui requisito formal de validade da interceptação telefônica, notadamente quando amparada em decisão concessiva da medida extrema, devidamente fundamentada.

No presente caso, o sigilo foi decretado no procedimento investigatório para fins de resguardo das investigações. O alegado acesso posterior de áudios pelos representantes de duas empresas de transporte de passageiros, consideradas vítimas do evento lesivo, não maculou a colheita das provas, tampouco feriu o sigilo do procedimento investigatório.

Eventual lesão à intimidade pela quebra do sigilo deve ser arguida na via adequada.

Afasto, portanto, a arguida preliminar de nulidade.

Passo ao exame do mérito.

IV. Dos atos de improbidade administrativa:

No mérito, o pleito defensivo tampouco prospera.

O farto conjunto de provas amealhados aos autos, notadamente, as provas testemunhais e os elementos de provas colhidos nos Inquéritos Policiais – IP nº 2005.61.11.001350-4 e IP nº 2007.61.25.002045-9 -, os quais, por sua vez, integraram o Procedimento Administrativo - PA nº 1.34.024.000047/2008-27 -, demonstram, à saciedade, a autoria dos recorrentes e a materialidade dos atos de improbidade administrativa.

Prosseguindo, sustentam os apelantes que não restou comprovado o ato de improbidade administrativa, ante a ausência de lastro probatório ou de dolo, bem como, pela configuração de fato atípico no tocante ao recebimento de passagens de cortesia, tendo em vista que o art. 10, §1º, II do Decreto nº 4.081/2002 (Código de Conduta de Alta Administração Federal) considera brindes aqueles que não ultrapassem o valor de R$ 100,00 (cem reais).

Vejamos a definição de ato de improbidade administrativa, à luz dos arts. 9º e 11 da Lei nº 8.429/92:

“Art. 9° Constitui ato de improbidade administrativa importando enriquecimento ilícito auferir qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão do exercício de cargo, mandato, função, emprego ou atividade nas entidades mencionadas no art. 1° desta lei, e notadamente: (...)”

“Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente:

(...)”

Por sua vez, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça assentou que a caracterização do ato ímprobo por ofensa a princípios da Administração Pública exige, apenas, a demonstração do dolo genérico, sendo dispensável a demonstração da ocorrência de dano para a Administração Pública ou o enriquecimento ilícito. Confiram-se os seguintes precedentes (grifei):

“PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. POSSIBILIDADE DO JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE DO ESPECIAL SER REALIZADO DE FORMA IMPLÍCITA. ELEMENTO SUBJETIVO. CARACTERIZAÇÃO. CARACTERIZAÇÃO DAS IRREGULARIDADES COMO ATOS DE IMPROBIDADE. DESRESPEITO AOS PRINCÍPIOS ADMINISTRATIVOS. FRAUDE À LICITAÇÃO. DANO IN RE IPSA. RESSARCIMENTO AO ERÁRIO. POSSIBILIDADE.

I - O presente feito decorre de ação civil pública por ato de improbidade administrativa proposta pelo Ministério Público do Estado de São Paulo. Por sentença, julgaram-se procedentes os pedidos. A sentença foi reformada pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo para determinar a improcedência em relação um dos réus e apenas parcialmente procedente quanto aos demais.

II - A Corte Especial deste Tribunal já se manifestou no sentido de que o juízo de admissibilidade do especial pode ser realizado de forma implícita, sem necessidade de exposição de motivos. Assim, o exame de mérito recursal já traduz o entendimento de que foram atendidos os requisitos extrínsecos e intrínsecos de sua admissibilidade, inexistindo necessidade de pronunciamento explícito pelo julgador a esse respeito. (EREsp 1.119.820/PI, Relator Ministro Mauro Campbell Marques, Corte Especial, DJe 19/12/2014). No mesmo sentido: AgRg no REsp 1.429.300/SC, relator Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 25/6/2015; AgRg no Ag 1.421.517/AL, relatora Ministra Assusete Magalhães, Segunda Turma, DJe 3/4/2014).

III - Quanto à conduta improba de O. R. J. N., resta evidente que o réu, na qualidade de Prefeito Municipal, chancelou os atos de improbidade administrativa praticados pelos demais réus ao autorizar a licitação sem avaliar os dados iniciais apresentados para a contratação e prestação dos serviços e, posteriormente, ao anuir com o aditamento contratual sem exigir estudo comprobatório das supostas novas necessidades e sem que houvesse prévio empenho de despesa.

IV - O fundamento jurídico adotado pelo Tribunal de origem - de que se pretende a responsabilização objetiva do gestor público - revela-se equivocado, eis que os atos praticados pelo ex-Prefeito corroboraram a fraude à licitação arquitetada pelos demais réus e, assim, também violaram o artigo 11, caput e inciso I, da Lei n. 8.829/92.

V - Diante de tais fundamentos, conclui-se que todo o trâmite do procedimento licitatório Carta Convite n. 66/2005 esteve eivado de nulidades, em razão do conluio existente entre os réus J. L. B., J. A. S. e E. O. e das ilegalidades observadas na conduta de O. R. J. N., em expressa afronta aos princípios basilares da administração pública, especialmente, os referentes à legalidade, impessoalidade e moralidade, bem como a frustação da licitude do processo licitatório.

VI - Não há dúvida da violação dos referidos postulados. Entretanto, deve-se ter em mente que não é qualquer atuação desconforme os parâmetros normativos que caracteriza a improbidade administrativa. É imprescindível a constatação de uma ilegalidade dita qualificada, demonstradora da consciência e vontade de violar princípios da administração pública. Nesse sentido: AgInt no REsp 1560197/RN, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 02/02/2017, DJe 03/03/2017 e REsp 1546443/PB, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 18/10/2016, DJe 25/10/2016.

VII - No presente caso, a consciência e a vontade de se violar postulados da administração pública são extraíveis da clara afronta às normas expressas na Lei n. 8.666/93.

VIII - Oportuno salientar que a atuação em desconformidade com os referidos dispositivos legais caracteriza a improbidade administrativa, nos termos do art. 11 da Lei n. 8.429/92, não se exigindo a comprovação de intenção específica de violar princípios administrativos, sendo suficiente a demonstração do dolo genérico.

Nesse sentido: REsp 1690566/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 16/11/2017, DJe 19/12/2017.

IX - Em seguida, quanto ao enquadramento das condutas de cada um dos réus - O. R. J. N., J. L. B., J. A. S. e E. O. - na tipificação prevista no artigo 10, incisos VIII e IX, da Lei n. 8.492, o acórdão recorrido declarou que o prejuízo ao erário não restou demonstrado, ante a ausência de prova pericial que constatasse a existência de efetivo ajuste de preços entre os réus, afastando a pena de ressarcimento ao erário fixada na decisão de primeiro grau.

X - Entretanto, sem razão o Tribunal a quo, visto que esta Corte Superior possui entendimento no sentido de que, para a caracterização de improbidade administrativa por frustração a licitude de processo de licitação, tipificada no artigo 10, inciso VIII, da Lei n. 8.429/92, o dano apresenta-se presumido. Em outras palavras, verifica-se o dano in re ipsa. Nesse sentido: REsp 728.341/SP, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEGUNDA TURMA, julgado em 14/3/2017, DJe 20/3/2017 e AgInt no AREsp 530.518/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 2/2/2017, DJe 3/3/2017.

XI - Por consequência, queda configurada a prática de improbidade administrativa violadora de lesão ao erário e de princípios da administração pública, nos termos dos artigos 10, incisos VIII e IX, e 11, caput e inciso I, ambos da Lei n. 8.429/92 com relação ao réu O. R. J. N. XII - Quanto aos réus J. L. B., J. A. S. e E. O, acrescenta-se à violação ao artigo 11 da Lei n. 8.429/92 já reconhecida pelo Tribunal a quo, a prática de improbidade administrativa violadora de lesão ao erário, nos termos do artigo 10, incisos VIII e IX, da Lei n. 8.429/92.

XIII - Agravo interno improvido.”

(AgInt no AREsp 1252908/SP, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA TURMA, julgado em 17/10/2018, DJe 12/11/2018)

“ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. CARTA-CONVITE. MODALIDADE DE LICITAÇÃO INADEQUADA. LICITANTE VENCEDORA. QUADRO SOCIETÁRIO. FILHA DO PREFEITO. VIOLAÇÃO AO ART. 11 DA LEI N. 8.429/92. CARACTERIZAÇÃO. PREJUÍZO AO ERÁRIO. DESNECESSIDADE.

1. Trata-se de ação civil pública por ato de improbidade administrativa ajuizada em face de ex-Prefeito e de sociedades empresárias (postos de gasolina) em razão da contratação alegadamente ilegal dos referidos postos pela Municipalidade. A ação é fundada no art. 11 da Lei n. 8.429/92.

2. Nas razões recursais, sustenta o Ministério Público estadual ter havido violação aos arts. 4º, 11 e 21 da Lei n. 8.429/92, uma vez que (i) fere a moralidade administrativa a contratação de empresa cujo quadro societário conta com filha de Prefeito e (ii) está caracterizada a má-fé na espécie, a teor do fracionamento indevido do objeto licitado e dos diversos favorecimentos pessoais ocorridos.

3. Resumidamente, foram os seguintes os argumentos da instância ordinária para afastar o pedido de condenação por improbidade administrativa formulado pelo recorrente com base no art. 11 da Lei n. 8.429/92: (a) realização de licitação prévia para a contratação; (b) inexistência de prejuízo ao erário; e (c) não-comprovação de dolo ou má-fé dos envolvidos. Trechos dos acórdãos recorridos.

4. Como se observa, os fatos estão bem delimitados pela origem no acórdão da apelação, que foi confirmado pelo acórdão dos embargos infringentes, o que está sujeita a exame nesta Corte Superior é a simples qualificação jurídica desse quadro fático-probatório, não sendo aplicável, pois, sua Súmula n. 7.

5. Em primeiro lugar, é de se afastar o argumento (b), retro, porque pacífico no Superior Tribunal de Justiça entendimento segundo o qual, para o enquadramento de condutas no art. 11 da Lei n. 8.429/92, é despicienda a caracterização do dano ao erário e do enriquecimento ilícito. Confiram-se os seguintes precedentes: REsp 1.119.657/MG, Rel. Min. Eliana Calmon, Segunda Turma, DJe 30.9.2009, e REsp 799.094/SP, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, Primeira Turma, DJe 16.9.2008.

(...)

14. Recurso especial provido.”

(REsp 1245765/MG, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 28/06/2011, DJe 03/08/2011)

Conforme apurado no inquisitório, as interceptações telefônicas revelaram que os condenados, funcionários da empresa Viação Garcia Ltda. circularam “tranquilamente” no meio policial, determinando o modus operandi para o fim de prejudicar o exercício da atividade fiscalizatória das empresas de transporte coletivo concorrente.

Por sua vez, os agentes públicos, ao solicitarem a concessão de passagens de ônibus como cortesia, o fornecimento de material de construção e equipamento de informática, além de auxílio financeiro para investir em festa de confraternização de fim de ano, praticaram atos de improbidade administrativa, na medida em que empreenderam uma contrapartida para beneficiar a empresa investigada.

Consta do convênio (fls. 89/100 do Apenso XIX), que uma das atribuições dos policiais rodoviários federais inclui a fiscalização das empresas de transporte coletivo interestadual, a ensejar o impedimento na manutenção de relacionamento pessoal e direto com membros das empresas fiscalizadas.

Inclusive, o relacionamento estreito alimentado pelos recorrentes e funcionários da empresa investigada acarretou o aferimento de benefícios a agentes públicos, o que revela a violação dos princípios da legalidade, impessoalidade e moralidade, além dos deveres de lealdade e honestidade, como bem ressaltado na sentença.

Além disso, a possibilidade prevista no Código de Ética atinente ao recebimento de brindes no limite de R$ 100,00 (cem reais), não impede a configuração de atos ímprobos, notadamente, quando manifesta a contrapartida efetuada pelos policiais direcionada a favorecer a empresa concedente dos benefícios.

De acordo com os elementos colhidos nos autos, notadamente pelos inquéritos policiais, os agentes Moisés Pereira e Cássio Aparecido Bento de Freitas, na qualidade de Chefe e auxiliar direto, respectivamente, da Base da Polícia Rodoviária Federal de Ourinhos, lideraram os demais policiais lotados naquela base na atuação em benefício da empresa Viação Garcia Ltda, mediante fiscalizações em detrimento de outras empresas concorrentes.

Conforme áudio de 11/12/2006, 23:49 (telefone 14-3324-9427), é possível detectar a combinação entre os réus CÁSSIO e Aparecido Cabral e o pessoal da empresa Garcia a respeito de um comando policial objetivando prejudicar as empresas Brasilsul e a Pluma. Tal acordo restou demonstrado no diálogo entabulado entre o aludido policial e seu subordinado Ciliomar, em 19/12/2006, às 10h49min (telefone 14-9161-1264), ocasião em que foi determinado ao segundo “pegar uns ônibus” da Brasilsul, retratando situação de fiscalização e correspondente aplicação de multa, conforme destacado no áudio.

Inclusive, em 19/12/2006, às 21h02min (telefone 14-9161-1264) CÁSSIO pediu a José, policial em plantão na base de Marília, para ligar na base de Ourinhos e pedir para “o pessoal fiscalizar os ônibus”, e este o questiona se seriam os ônibus da Brasilsul, respondendo o auxiliar direto “aquela fiscalização lá”. Conforme telefonema proveniente do número 14-3324-9427, efetuado às 23:27, constata-se que José ligou para Ourinhos e pediu ao policial Ribeiro fiscalizar tal empresa, obtendo como resposta que “Cássio já havia orientado” (fl. 1.301 do Apenso VII).

Destaca-se, ainda, a atuação de CÁSSIO, conforme o último diálogo travado no dia 19/12/2006, às 14h48min, (telefone 14-9161-1264, fl. 1.300 do Apenso VII), na medida em que este determinou que Ciliomar entregasse os convites da confraternização de fim de ano aos representantes da empresa “amiga”, em referência à empresa Garcia, recusando que também fosse convidada a empresa Brasilsul, sob a justificativa de que tal empresa não colaborava com a corporação.

Infere-se das conversas interceptadas que o policial Moisés Pereira solicitou vantagem indevida (passagem de cortesia) diretamente à empresa Garcia, valendo-se de sua ocupação profissional, na qualidade de Inspetor Chefe, lotado na 10ª Delegacia de Polícia Rodoviária Federal, conforme apurado nas ligações do telefone 18.812.0761 às 12h, 12h05min e 12h08min e ligações no telefone 14.9631.1564 às 11h49 e 11h57min).

Relativamente aos corréus Mário Luciano Rosa, Lourival Alves de Souza e André Lúcio de Castro, depreende-se da ligação realizada no telefone nº14.3324.9427, às 0h24min) que estes corréus também solicitaram o referido benefício, logrando a sua obtenção, por intermédio de Aparecido Cabral de Oliveira, então funcionário da empresa Garcia, cabendo-lhes, em troca, o exercício fiscalizatório das empresas concorrentes.

Inclusive, ainda nesta ligação constata-se a cobrança de tal vantagem pelo corréu Mário Luciano Rosa. Corrobora tal constatação, os documentos colacionados no Apenso VII do PA nº 1.34.024.000047/2008-27 que demonstram que o aludido réu já havia solicitado passagens gratuitas à empresa Viação Garcia Ltda. em seu favor e aos membros de sua família.

Conforme ligação telefônica datada de 02/10/2006, às 18h5min (telefone nº 14.3324.9427), uma conversa entabulada entre Sebastião e Macarie (policial rodoviário federal) aponta o oferecimento de passagens de cortesia solicitadas pelo policial Lourival Alves de Souza e a respectiva entrega na base da Polícia Federal de Ourinhos/SP. Outra ligação efetuada no dia 23/02/2007, às 7h55min (no mesmo telefone), em conversa com outro policial denominado Carriel, o aludido réu se compromete a contatar Aparecido Cabral para solicitar as passagens, e este autoriza a emissão de dois bilhetes, conforme ligação feita às 15h43min. No dia seguinte, verifica-se a informação da chegada de um envelope na empresa Garcia endereçado ao corréu LOURIVAL, conforme ligação efetuada às 12h4min (telefone nº 14.9651.9730). Também no Apenso VII do PA nº 1.34.024.000047/2008-27 constatam-se dois documentos apreendidos pela PF contendo pedidos de passagens pelo aludido réu.

Igualmente, o recorrente André Lúcio de Castro solicitou passagens de cortesia a Aparecido Cabral de Oliveira, sendo uma no trajeto Ourinhos a São Paulo e outra no percurso de São Paulo a Ourinhos, conforme ligação realizada no telefone 14.9631.1564, às 9h14min. Constata-se do diálogo travado entre ANDRÉ e sua sogra, em 08/10/2006, às 10h10min, a confirmação de marcação da passagem pelo próprio corréu.

Acrescente-se que os depoimentos colhidos na fase de instrução probatória - notadamente, os testemunhos de Jussandro Sala (fls. 686/689) e André Luiz Farina Lopes (fls. 695/699), então policiais federais que trabalharam na Operação Veredas -, confirmaram, à unanimidade, a solicitação de passagens de cortesia para policiais rodoviários federais e seus parentes às empresas Garcia e Andorinha, perfectibilizando com a imputação atribuída pelo MPF aos réus na inicial, a partir da qual se evidencia o esquema de favorecimento de empresa de transporte interestadual em detrimento de empresas concorrentes, visando a obtenção de vantagens indevidas por agentes públicos.

Destarte, os recorrentes Mário Luciano Rosa, Lourival Alves de Souza e André Lúcio de Castro, confirmaram, em sede de interrogatório judicial, as solicitações de passagens de cortesia, conforme mídia de fls. 632/634, 635/638 e 639/642.

Diante do cotejo dos fatos e provas, é possível concluir pela configuração de dolo na conduta do agente, ante a violação de princípios administrativos, notadamente, o da legalidade e da moralidade, sendo-lhe inescusável o desconhecimento da lei. Nesse sentido, destaco os seguintes precedentes: AgInt no REsp 1701967/RS, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, J. 18/09/2018, DJe 19/02/2019; AgRg no AREsp 20.747/SP, Rel. Min. Benedito Gonçalves, 1ªT, DJe: 23/11/2011; MS 21.715/DF, Rel. Min. Herman Benjamin, 1ª Seção, DJe: 02/02/2017; AgRg no AREsp 73.968/SP, Rel. Min. BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, J. 02/10/2012, DJe 29/10/2012.

Nesse viés, resta patente a configuração da prática de atos de improbidade administrativa, insertos no art. 11 da Lei nº 8.429/92, sendo, de rigor, a manutenção da r. sentença.

V. Do alegado dano moral difuso:

No que pertine ao dano moral coletivo, enquanto categoria autônoma de dano, verifica-se sua previsão legal expressa tanto na Lei da Ação Civil Pública (artigo 1º, caput, da Lei 7.347/85) como na Lei de Defesa do Consumidor (artigo 6º, incisos VI e VII, da Lei 8.078/90).

Ao definir dano moral coletivo, Carlos Arberto Bittar enfatiza que:

" (...) a injusta lesão da esfera moral de uma dada comunidade, ou seja, é a violação antijurídica de um determinado círculo de valores coletivos. Quando se fala em dano moral coletivo, está-se fazendo menção ao fato de que o patrimônio valorativo de uma certa comunidade (maior ou menor), idealmente considerado, foi agredido de maneira absolutamente injustificável do ponto de vista jurídico: quer isso dizer, em última instância, que se feriu a própria cultura em seu aspecto imaterial. Tal como se dá na seara do dano moral individual, aqui também não há que se cogitar de prova da culpa, devendo-se responsabilizar o agente pelo simples fato da violação (damnun in re ipsa)." (in BITTAR, Carlos Alberto. Dano Moral Coletivo. Revista de Direito do Consumidor nº 12. São Paulo: Revista dos Tribunais, out.-dez. 1994, p. 55)

Com efeito, a Lei nº 7.347, de 24 de julho de 1985, que disciplina a ação civil pública, dispõe que a mesma é cabível para apurar a responsabilidade por danos morais e patrimoniais causados a qualquer interesse difuso ou coletivo, sendo certo que a doutrina define o interesse difuso como aquele que abrange número indeterminado de pessoas ligadas por uma circunstância de fato, e interesse coletivo como aquele que diz respeito a um grupo, categoria ou classe de pessoas determináveis, ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica.

Acerca desse tema, é cediço que o dano moral difuso está intrinsecamente ligado à demonstração de que o ato praticado afronta e ultrapassa os limites do tolerável, ou que seja suficiente para produzir insegurança, intranquilidade e relevante alteração extrapatrimonial coletiva. Nesse sentido, destaco os seguintes precedentes: STJ/REsp 1221756/RJ, Rel. Ministro MASSAMI UYEDA, TERCEIRA TURMA, julgado em 02/02/2012, DJe 10/02/2012; TRF3/ApCiv 00351553420074036100, Rel. Des. Federal DIVA MALERBI, SEXTA TURMA, J. 05/09/2019, DJe 19/09/2019; TRF/ApCiv 000011567-80.2007.403.6105, Rel. Des. Federal CONSUELO YOSHIDA, J. 24/10/2013).

Conforme orientação jurisprudencial da Corte Superior, não é todo e qualquer ato de improbidade administrativa que enseja a configuração de dano moral difuso e coletivo, sendo necessário, após o curso da fase instrutória processual, se verificar se o ato ímprobo em análise causa evidente e significativa repercussão no meio social. Além disso, nessa categoria (interesses ou direitos transindividuais), o STJ entende que não se insere o (eventual) dano moral à imagem da Instituição, vejamos:

“PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ENUNCIADO ADMINISTRATIVO N. 3/STJ. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. INDISPONIBILIDADE DE BENS. FUNDAMENTO AUTÔNOMO NÃO IMPUGNADO. SÚMULA 283/STF. REEXAME DE MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA. INADEQUAÇÃO. SÚMULA 7/STJ. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO.

1. O Tribunal de origem, no acórdão recorrido, asseverou que o dano moral difuso e coletivo não é causado por todo e qualquer ato de improbidade administrativa e, na hipótese, é necessário o curso da fase instrutória processual a fim de verificar se o ato ímprobo em análise causa evidente e significativa repercussão no meio social. Nesse sentido, ficou consignado no acórdão recorrido que somente após o contraditório e ampla defesa o Poder Judiciário terá elementos para decidir sobre a ocorrência ou não do alegado dano moral coletivo e, se confirmado, estabelecer o quantum justo e adequado para a indenização (fl. 76 e-STJ).

2. Sobre tais fundamentos, tem-se que o ora agravante não realizou o efetivo combate às conclusões acima consignadas, suficientes, por si só, para manter o acórdão recorrido. Com efeito, a simples reiteração da tese defensiva sem infirmar os fundamentos determinantes do acórdão recorrido enseja a incidência do disposto na Súmula 283/STF: "É inadmissível o recurso extraordinário, quando a decisão recorrida assenta em mais de um fundamento suficiente e o recurso não abrange todos eles." 3. Ademais, a reversão desse entendimento demanda o reexame do conjunto fático-probatório dos autos, o que não é possível em sede de recurso especial, em face do óbice da Súmula 7/STJ.

4. Agravo interno não provido.”

(AgInt no AREsp 1392625/GO, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 23/05/2019, DJe 28/05/2019)

“PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. VIOLAÇÃO A PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. DANO MORAL. LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO. REVISÃO DAS SANÇÕES IMPOSTAS. PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE. REEXAME DE MATÉRIA FÁTICO PROBATÓRIA. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ.

1. O Ministério Público tem legitimidade ad causam para o pedido de reparação por danos morais, na ação civil pública (arts. 127 e 129, III - CF e art. 1º - Lei 7.347/1985), restrita (porém) aos interesses ou direitos difusos e coletivos (transindividuais). Precedente: REsp 637.332/RR, Rel. Min. Luiz Fux - DJ 14/12/2004. Nessa categoria (interesses ou direitos transindividuais) não se insere o (eventual) dano moral à imagem da própria Instituição.

2. O pedido de dano vem fundado na alegação de que o envolvimento dos demandados - Procurador-Geral de Justiça do Estado de Minas Gerais e o Superintendente Administrativo da Procuradoria-Geral de Justiça - nas condutas que lhe (s) foram imputadas (corrupção passiva) teria exposto a imagem da instituição ao descrédito da coletividade.

3. Conquanto a ação imprópria dos demandados, na prática de ato de corrupção no exercício de cargo público, possa suscitar na coletividade a suspeita sobre a atuação da Instituição a que pertencem, pelo rompimento do pressuposto moral de que seus agentes agem dentro da lei e na sua defesa, o eventual prejuízo que daí possa advir não expressa dano coletivo (titulado por pessoas indeterminadas e ligadas por circunstancias de fato) ou difuso: titulado por grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si por uma relação jurídica base (Lei 8.078/1990 - art. 81) .

4. A jurisprudência desta Corte tem reconhecido que, ressalvadas as hipóteses excepcionais, o (re) exame da dosimetria das sanções aplicadas pelo Tribunal de origem, na improbidade administrativa, ao fundamento de desproporcionalidade, em face das balizas do art. 12 da Lei 8.429/92, implica o revolvimento da matéria fático-probatória, que encontra óbice na Súmula 7 - STJ.

5. A mesma compreensão rege (na espécie) a alegação de violação aos arts. 332 do CPC e 72, § 1º, da Lei 9.472/1997, por ter o julgado (supostamente) desconsiderado a gravação de escuta telefônica entre envolvidos e agentes da contravenção, que daria suporte à demonstração do seu envolvimento e, consequentemente, de acolhida do pedido.

6. O acórdão recorrido confirmou a sentença de improcedência, no particular, tendo em consideração todo o arcabouço das provas produzidas, expressas em testemunhos e degravações de escutas telefônicas (nelas inserida gravação referida no recurso). A atuação desta Corte no exame crítico das conclusões a que chegou a Corte de origem representa (ria) novo exame da prova dos autos (Súmula 7/STJ).

7. Agravo regimental desprovido.”

(AgRg no REsp 1337768/MG, Rel. Ministro OLINDO MENEZES (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TRF 1ª REGIÃO), PRIMEIRA TURMA, julgado em 05/11/2015, DJe 19/11/2015)

Colho trecho do voto do Relator Min. Olindo Menezes, no último julgado ementado acima:

“Como asseverou 0 TJ/MG, conquanto a ação imprópria dos demandados, na prática de ato de corrupção no exercício de cargo público, possa suscitar na coletividade a suspeita sobre a atuação da Instituição a que ele pertence, pelo rompimento do pressuposto moral de que seus agentes agem dentro da lei e na sua defesa, o eventual dano que possa daí advir não expressa dano coletivo (titulado por pessoas indeterminadas e ligadas por circunstancias de fato) ou difuso: titulados por grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si por uma relação jurídica-base (Lei 8.078/1990 – art. 81).”

Na espécie, me parece inviável transportar a mensuração desse abalo psíquico no senso da coletividade - o qual, inclusive, deve indubitavelmente ultrapassar o mero dissabor e eventual descontentamento e insatisfação com a atividade administrativa/policial -, para um número indeterminado de sujeitos, quando a própria ofensa cometida pelos agentes se afigura indivisível, salvo comprovação do efetivo prejuízo à coletividade (enriquecimento ilícito), o que, in casu, não restou demonstrado, tal como ressaltado na r. sentença, in verbis:

“Os requeridos, policiais rodoviários federais e particulares, estavam plenamente cientes de suas responsabilidades e das consequências de seus atos. As ligações telefônicas interceptadas deixam clara a atitude imoral que tiveram ao se utilizarem do cargo público para auferir vantagem indevida para si ou para terceiros, prejudicando, com estes atos, a imagem do Poder Público e ferindo os princípios que regem a Administração Pública. Os pedidos formulados pelos agentes aos representantes da Viação Garcia, apesar de não configurarem enriquecimento ilícito, demonstram violação aos princípios constitucionais, especialmente o da moralidade, da impessoalidade e os deveres de honestidade e lealdade. Assim, devem responder na form do artigo 11 cc artigo 12, ambos da LIA.”

Isto posto, mantenho a r. sentença no ponto em que indeferiu o pedido de reparação civil por danos morais difusos à União.

VI. Da pleiteada condenação dos réus em honorários advocatícios:

Quanto a honorários advocatícios, cumpre mencionar a sua inaplicabilidade, em razão do disposto no art. 18 da Lei nº 7.347/1985, aplicável subsidiariamente à ação civil pública, em prestígio ao princípio da simetria e, ainda, considerando a improcedência do pleito da União nesta via recursal.

Nesse sentido, colho precedentes jurisprudenciais da Corte Superior:

“AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. PROCESSUAL CIVIL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS DE SUCUMBÊNCIA EM AÇÃO CIVIL PÚBLICA. SIMETRIA. NÃO CABIMENTO. AUSÊNCIA DE MÁ-FÉ. INTELIGÊNCIA DO ART. 18 DA LEI 7.347/1985. AGRAVO INTERNO DA UNIÃO DESPROVIDO.

1. Prestigiando o princípio da simetria, a previsão constante do art. 18 da Lei 7.347/1985 deve ser interpretada também em favor da parte ré em Ação Civil Pública, de modo a isentá-la dos honorários sucumbenciais, salvo se comprovada a má-fé. Precedentes: AgInt no REsp. 1.531.578/CE, Rel. Min. ASSUSETE MAGALHÃES, DJe 24/11/2017; AgInt no AREsp. 996.192/SP, Rel. Min. BENEDITO GONÇALVES, DJe 30.8.2017; entre outros.

2. Agravo Interno da UNIÃO desprovido.”

(AgInt nos EREsp 1531578/CE, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, CORTE ESPECIAL, julgado em 07/11/2018, DJe 27/11/2018)

"PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 83/STJ. RESERVA DE PLENÁRIO. VIOLAÇÃO. INEXISTÊNCIA. 1. A jurisprudência do STJ é firme no sentido de que, por critério de absoluta simetria, no âmbito da Ação Civil Pública, não cabe a condenação da parte vencida ao pagamento de honorários advocatícios em favor do Ministério Público. 2. Esclareço ainda que inexiste violação à cláusula de reserva de plenário (art. 97 da CF e Súmula Vinculante 10/STF), pois a decisão agravada apenas realizou interpretação sistemática dos dispositivos legais aplicáveis ao caso concreto, com base na jurisprudência do STJ. 3. Agravo Interno não provido."

(AgInt no RESP 873.026/SP, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, J. 22/09/2016, DJE 11/10/2016)

Deixo de condenar a parte vencida em honorários advocatícios, por ser incabível.

Ante o exposto, não conheço da segunda apelação interposta por André Lúcio de Castro e Lourival Alves de Souza, nego provimento à remessa oficial e à primeira apelação dos réus Moisés Pereira, Mário Luciano Rosa, Cássio Aparecido Bento de Freitas, Eduardo César Ditão, André Lúcio de Castro e Lourival Alves de Souza nego provimento à apelação da União Federal, nos termos da fundamentação supra.

É COMO VOTO.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

DIREITO ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. FAVORECIMENTO DE EMPRESA DE TRANSPORTE COLETIVO INTERESTADUAL. ENVOLVIMENTO DE POLICIAIS RODOVIÁRIOS FEDERAIS. PRELIMINARES AFASTADAS. ATOS ÍMPROBOS CONFIGURADOS. SENTENÇA MANTIDA. REMESSA OFICIAL E PRIMEIRA APELAÇÃO DOS RÉUS IMPROVIDAS. SEGUNDA APELAÇÃO NÃO CONHECIDA. PRECLUSÃO CONSUMATIVA. DANOS MORAIS COLETIVOS NÃO CONFIGURADOS. INCABÍVEL CONDENAÇÃO EM HONORÁRIOS. ART. 18 DA LEI nº 7.347/85. PRINCÍPIO DA SIMETRIA. APELAÇÃO DA UNIÃO IMPROVIDA.

01. O cerne da controvérsia versa sobre as seguintes teses: a) invalidade da interceptação telefônica; b) a violação do sigilo dos autos do Processo nº 0000150-36.2008.4.03.6125; c) configuração ou não da prática de atos de improbidade administrativa pelos recorrentes; d) possibilidade de reforma da sentença para julgar improcedentes os pedidos formulados na inicial, com amparo na sentença penal, proferida na Ação Penal nº 0000150-36.2008.403.6125, que absolveu os réus; e) proporcionalidade na aplicação da multa; f) possibilidade de condenação dos réus na reparação civil por danos morais à União.

02. Cumpre asseverar submeter-se ao duplo grau de jurisdição obrigatório a sentença que conclui pela carência da ação ou improcedência do pedido ou de parte do pedido deduzido em sede de ação civil pública, por força da aplicação analógica da regra contida no art. 19 da Lei nº 4.717/65.

03. Primeiramente, resta manifestamente inadmissível a interposição da segunda apelação pela defesa dos réus André Lúcio de Castro e Lourival Alves de Souza (fls. 267/271, ID 64158405), tendo em vista a configuração da preclusão consumativa.

Conforme entendimento jurisprudencial pacífico na Corte Superior, a absolvição no juízo criminal por inexistência do fato ou negativa da autoria enseja o afastamento da responsabilidade civil e administrativa do servidor, não sendo o caso dos autos, eis que a sentença penal absolveu os acusados em virtude da ausência de provas suficientes para a condenação. Preliminar de vinculação de instâncias afastada.

04. Também é firme a orientação jurisprudencial do STJ no sentido da possibilidade de compartilhamento de provas produzidas na esfera penal com o juízo cível, para fins de apuração de improbidade administrativa. Precedente: AgRg no REsp 1714914/RS, Rel. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, Sexta Turma, julgado em 27/02/2018, DJe 08/03/2018. Na espécie, o juízo singular entendeu pela ausência de nulidade das interceptações telefônicas amparado em sentença penal, mantida pela Quinta Turma do STJ, em sede de habeas corpus, que considerou legítimas as interceptações. Além disso, cumpre ressaltar que a sentença penal transitou em julgado, afigurando-se plausível a conclusão de licitude destas provas. Preliminar de nulidade afastada.

05. Cumpre mencionar que a regra do sigilo dos diálogos interceptados não constitui requisito formal de validade da interceptação telefônica, notadamente quando amparada em decisão concessiva da medida extrema, devidamente fundamentada. O compulsar dos autos revela que o sigilo foi decretado no procedimento investigatório para fins de resguardo das investigações. O alegado acesso posterior de áudios pelos representantes de duas empresas de transporte de passageiros, consideradas vítimas do evento lesivo, não maculou a colheita das provas, tampouco feriu o sigilo do procedimento investigatório. Preliminar de violação do sigilo afastada.

06. No mérito, o pleito defensivo tampouco prospera. Isto porque, diante do farto conjunto probatório amealhado aos autos, notadamente pelo inquérito policial e pelas provas testemunhais, restou devidamente demonstrado a autoria, a materialidade e o dolo dos agentes públicos nas práticas de atos ímprobos violadores de princípios da administração. Sobreleva anotar a orientação predominante no STJ segundo a qual aponta que a caracterização do ato ímprobo por ofensa a princípios da Administração Pública exige, apenas, a demonstração do dolo genérico, sendo dispensável a demonstração da ocorrência de dano para a Administração Pública ou o enriquecimento ilícito.

08. Conforme apurado no inquisitório, as interceptações telefônicas revelaram que os condenados, funcionários da empresa Viação Garcia Ltda. circularam “tranquilamente” no meio policial, determinando o modus operandi para o fim de prejudicar o exercício da atividade fiscalizatória das empresas de transporte coletivo concorrente.

09. Por sua vez, os agentes públicos, ao solicitarem a concessão de passagens de ônibus como cortesia, o fornecimento de material de construção e equipamento de informática, além de auxílio financeiro para investir em festa de confraternização de fim de ano, praticaram atos de improbidade administrativa, na medida em que empreenderam uma contrapartida para beneficiar a empresa investigada, através de fiscalizações direcionadas a prejudicar ou desestimular as empresas concorrentes, em especial a Brasilsul e a Pluma, com aplicação de multas indevidas, sob o comando da chefia imediata.

10. Conforme orientação jurisprudencial da Corte Superior, não é todo e qualquer ato de improbidade administrativa que enseja a configuração de dano moral difuso e coletivo, sendo necessário, após o curso da fase instrutória processual, se verificar se o ato ímprobo em análise causa evidente e significativa repercussão no meio social. Além disso, nessa categoria (interesses ou direitos transindividuais), o STJ entende que não se insere o (eventual) dano moral à imagem da Instituição. Precedente: (AgRg no REsp 1337768/MG, Rel. Ministro OLINDO MENEZES (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TRF 1ª REGIÃO), PRIMEIRA TURMA, julgado em 05/11/2015, DJe 19/11/2015). Na espécie, resta inviável transportar a mensuração desse abalo psíquico no senso da coletividade - o qual, inclusive, deve indubitavelmente ultrapassar o mero dissabor e eventual descontentamento e insatisfação com a atividade administrativa/policial -, para um número indeterminado de sujeitos, quando a própria ofensa cometida pelos agentes se afigura indivisível, salvo comprovação do efetivo prejuízo à coletividade (enriquecimento ilícito), o que, in casu, não restou demonstrado.

11. Incabível a condenação dos réus em honorários em favor da União em razão da aplicação subsidiária do art. 18 da Lei nº 7.347/1985 nas ações civis públicas, em prestígio ao princípio da simetria, considerando-se, ainda, a sucumbência da União nesta via recursal.

12. Remessa oficial e primeira apelação dos réus Moisés Pereira, Mário Luciano Rosa, Cássio Aparecido Bento de Freitas, Eduardo César Ditão, André Lúcio de Castro e Lourival Alves de Souza improvidas. Segunda apelação interposta pelos réus André Lúcio de Castro e Lourival Alves de Souza não conhecida. Apelação da União improvida.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Terceira Turma, por unanimidade, não conheceu da segunda apelação interposta por André Lúcio de Castro e Lourival Alves de Souza, negou provimento à remessa oficial e à primeira apelação dos réus Moisés Pereira, Mário Luciano Rosa, Cássio Aparecido Bento de Freitas, Eduardo César Ditão, André Lúcio de Castro e Lourival Alves de Souza e negou provimento à apelação da União Federal, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.