APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0028445-86.2017.4.03.9999
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARIA EDILENE DE OLIVEIRA SILVA
Advogado do(a) APELADO: SERGIO GOMES DE DEUS - SP293185-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0028445-86.2017.4.03.9999 RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS APELADO: MARIA EDILENE DE OLIVEIRA SILVA Advogado do(a) APELADO: SERGIO GOMES DE DEUS - SP293185-N OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de ação objetivando o restabelecimento de benefício de auxílio-doença e sua conversão em aposentadoria por invalidez a partir do requerimento administrativo, 25/01/2016. A sentença proferida em 13/12/2016 ( fls. 84 ID 89275464) julgou procedente o pedido para condenar o INSS a conceder à parte autora o benefício de aposentadoria por invalidez a partir da cessação do benefício de auxílio-doença, com o pagamento dos valores em atraso acrescidos de correção monetária e juros moratórios, além de honorários advocatícios fixados em R$ 880,00. Foi concedida a tutela antecipada para a imediata implantação do benefício. Sentença não submetida a remessa necessária. Apela o INSS, argüindo a preliminar de coisa julgada, proveniente do anterior ajuizamento de ação perante o JEF de Franca/SP, proc. nº 0003046-50.2011.4.03.6318, em que reconhecida a improcedência do pedido versando a concessão do mesmo benefício por incapacidade decorrente da mesma patologia incapacitante afirmada na presente ação, por ter se manifestado no ano de 2012, após a perda da qualidade de segurada considerada a partir da alta médica ocorrida em 31/08/2009, feito com trânsito em julgado em 23/05/2014. No mérito, sustenta o não preenchimento dos requisitos para a concessão da aposentadoria por invalidez, em razão da preexistência da patologia incapacitante à refiliação da autora ao RGPS, ocorrida em 01/05/2014, como segurada facultativa, considerando a incapacidade total reconhecida em 2012. Alega ainda ter a sentença incorrido em julgamento ultra petita ao conceder o benefício a partir da alta médica, quando a inicial veiculou pedido de concessão a partir do requerimento administrativo, 25/01/2016. Com contrarrazões. É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0028445-86.2017.4.03.9999 RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS APELADO: MARIA EDILENE DE OLIVEIRA SILVA Advogado do(a) APELADO: SERGIO GOMES DE DEUS - SP293185-N OUTROS PARTICIPANTES: V O T O Embora não seja possível, de plano, aferir-se o valor exato da condenação, pode-se concluir, pelo termo inicial do benefício (31/08/2009), seu valor aproximado e a data da sentença (13/12/2016), que o valor total da condenação é inferior à importância de 1.000 (mil) salários mínimos estabelecida no inciso I do § 3º do artigo 496 do Código de Processo Civil/2015. Assim, é nítida a inadmissibilidade, na hipótese em tela, da remessa necessária. Inicialmente, afasto a preliminar de coisa julgada. A violação à coisa julgada pressupõe a reapreciação de matéria abrangida pelos limites objetivos da coisa julgada material produzida em ação precedente, desde que verificada objetivamente a tríplice identidade entre as demandas. A intangibilidade da coisa julgada assume foros de garantia constitucional e sua violação importa em ofensa à segurança jurídica, por ofensa à decisão definitiva transitada em julgado anteriormente proferida e relativa à mesma relação jurídica na qual coincidem partes, pedido e causa de pedir, nos termos do art. 301, §§ 1º e 2º, do CPC/73, atual art. 337, §§ 1º e 2º do Código de Processo Civil em vigor. O caráter social do Direito Previdenciário, as questões de saúde que permeiam muitas das ações que versam sobre benefícios previdenciários e assistenciais - cuja melhora ou agravamento provocam a modificação dos fatos - e a variedade dos lapsos temporais que se verificam entre análise administrativa e à apreciação judicial (incluindo os momentos em que são realizadas as perícias médicas e/ou sociais), recomendam uma visão das normas processuais atenta a tais peculiaridades. Nessa perspectiva, a princípio, cada requerimento administrativo inaugura um novo quadro fático e jurídico passível de ensejar o ajuizamento de nova ação judicial, salvo se verificado, de forma patente, que conteúdo do novo requerimento e da nova ação reproduz, integralmente, o conteúdo do requerimento e da ação anteriores. No caso, a autora aforou a presente ação em 26/02/2016, postulando pela concessão de benefício de auxílio-doença a partir do requerimento administrativo, 25/01/2016, com sua conversão em aposentadoria por invalidez, alegando que o agravamento de seu estado de saúde partir do início de 2016, acometida de transtorno afetivo bipolar. Juntou um atestado médico datado de 24/02/2016, segundo o qual se encontra em tratamento psiquiátrico desde 18/07/2014, com diagnóstico de transtorno afetivo bipolar, episódio atual hipomaníaco. O laudo médico pericial (fls. 128 – ID 89275463), exame realizado em 10/05/2016, constatou que a autora, nascida em 02/10/1964, encontrar-se acometida de lúpus eritamatoso sistêmico, doença atualmente não manifestada e para a qual não realiza tratamento, além de transtorno afetivo bipolar, com episódios de hipomania sem controle adequado, mesmo em uso de várias classes de medicamentos, sem prognóstico de melhora, concluindo pela existência de incapacidade total e permanente para as atividades laborais habituais, fixando a data de início da incapacidade em julho/2014. No laudo complementar de fls. 67 do ID 89275464, o perito consignou como data do agravamento da patologia em julho/2014. Não se verifica a tríplice identidade em relação às outras duas ações anteriormente aforadas pela autora perante o JEF da Subseção Judiciária de Franca/SP. Na primeira ação, proc. nº 0003836-51.2010.4.03.6318, o laudo médico pericial, produzido em 04/08/2010, constatou encontrar-se a autora acometida, na ocasião, de quadro de depressão controlada, concluindo pela inexistência de incapacidade para as atividades laborais habituais, com a prolação de sentença de improcedência do pedido. Na segunda ação, aforada em 01/08/2011, proc. nº 0003046-50.2011.4.03.6318, a autora alegou incapacidade em decorrência de distúrbios psiquiátricos recorrentes, em tratamento desde o ano de 2005, apresentando quadro crônico desde a adolescência, com crises de intensidade variável. Postulou a concessão de auxílio-doença e sua conversão em aposentadoria por invalidez. A sentença julgou improcedente o pedido, reconhecendo que, apesar da incapacidade total e temporária reconhecida no laudo pericial, em decorrência de transtorno afetivo bipolar incapacitante, com DII em 26/07/2012, a autora não mantinha a qualidade de segurada na ocasião. Ao que se verifica do conjunto probatório, a autora apresenta quadro de transtorno afetivo bipolar desde a adolescência, alternando episódios de controle da doença e recaídas, de modo a afastar a tríplice identidade entre os feitos, na medida em que diversa a causa de pedir apresentada nas ações anteriores, ante a evidência de agravamento da patologia apresentada, razão pela qual demonstrada a modificação no substrato fático e na causa de pedir versados nas lides sucessivamente propostas. No mérito, a Lei nº 8.213/91, no artigo 42, estabelece os requisitos necessários para a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez, quais sejam: qualidade de segurado, cumprimento da carência, quando exigida, e moléstia incapacitante e insuscetível de reabilitaçãopara atividade que lhe garanta a subsistência. O auxílio-doença, por sua vez, tem seus pressupostos previstos nos artigos 59 a 63 da Lei nº 8.213/91, sendo concedido nos casos de incapacidade temporária. É dizer: a incapacidade total e permanente para o exercício de atividade que garanta a subsistência enseja a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez; a incapacidade total e temporária para o exercício de atividade que garanta a subsistência justifica a concessão do benefício de auxílio-doença e a incapacidade parcial e temporária somente legitima a concessão do benefício de auxílio-doença se impossibilitar o exercício do labor ou da atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias pelo segurado. A filiação ao regime geral da dona de casa se dá como segurada facultativa, nos termos do art. 11, § 1º, I do Decreto nº 3.048/99, uma vez ausente relação de emprego e remuneração que a qualifique como segurada obrigatória da Previdência Social, que a habilita à percepção, além dos benefícios por incapacidade, de aposentadoria por idade ou por tempo de contribuição, salário maternidade, pensão por morte e auxílio-reclusão. No caso dos autos, revelou-se precipitado o diagnóstico de incapacidade total e permanente da autora. Isto porque a autora se refiliou ao RGPS como segurada facultativa, declarando como ocupação a de dona de casa, ocupação em que a frequência e a intensidade no desenvolvimento do trabalho doméstico no âmbito da residência ficam ao seu exclusivo critério. A autora afirmou na inicial incapacidade para a atividade laboral habitual, em decorrência de quadro de transtorno afetivo bipolar. As perícias médicas administrativas realizadas pelo INSS em 07/10/2014 e 10/11/2015 (fls. 49 e 50) constataram a existência de incapacidade laboral temporária da autora em razão de tal patologia, mas não houve a concessão de benefício em razão da preexistência da patologia ao reingresso ao RGPS e por não cumprimento da carência do benefício. De outra parte, os atestados médicos apresentados na segunda ação afirmaram que a autora apresenta quadro de evolução cíclica, tipo transtorno bipolar, no ano de 2005 em fase depressiva moderada, sendo que em 2007 a autora apresentava baixa adesão ao tratamento, mas na ocasião com sintomas sob controle medicamentoso. A resistência da autora a tratamento consta também da perícia administrativa de 07/10/2014, fls. 49 ID 89275463, constando do histórico que a autora que esteve em tratamento psiquiátrico no Ambulatório da Saúde Mental de 13/08/2013 a 21/06/2014, tendo sido encaminhada para internação psiquiátrica, mas não aceitou. Não obstante as conclusões do laudo pericial quanto à existência de incapacidade total e permanente da autora para as atividades habituais, o conjunto probatório demonstrou a existência de incapacidade total e temporária. Conforme se infere do conjunto probatório coligido nas três ações aforadas, a autora apresenta patologia psiquiátrica, quadro clínico ainda em evolução e com perspectiva de alteração em razão do acompanhamento médico e tratamento medicamentoso a que vem se submetendo, de forma que a existência de limitação funcional decorrente de tal patologia não se encontra consolidada, inviabilizando seja reconhecida como causadora de incapacidade total e permanente. Ademais, consta que a autora tem se mostrado refratária a internação Uma vez demonstrada a existência de incapacidade total e temporária, de rigor a concessão do benefício de auxílio doença à autora, pois não restou afastada a possibilidade de recuperação da capacidade laboral e, nesse passo, cabe à parte autora aderir ao tratamento médico adequado e ao processo de recuperação com seriedade e constância, favorecendo o seu êxito. O artigo 479 do Código de Processo Civil (artigo 436 do CPC/73) dispõe que o juiz não está adstrito às conclusões do laudo pericial, facultando-lhe, sob a luz do princípio do livre convencimento motivado, decidir de maneira diversa, constituindo entendimento jurisprudencial assente no C. Superior Tribunal de Justiça que, "para a concessão da aposentadoria por invalidez, o magistrado não está vinculado à prova pericial e pode concluir pela incapacidade laboral levando em conta os aspectos socioeconômicos, profissionais e culturais do segurado" (STJ, AgRg no AREsp 103.056/MG, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, DJe de 02/08/2013). Portanto, depreende-se do conjunto probatório, que a parte autora faz jus ao benefício previdenciário de auxílio-doença, com DIB na data do requerimento administrativo, 25/01/2016, nos termos da súmula n. 576 do STJ. No que tange aos critérios de atualização do débito, por tratar-se de consectários legais, revestidos de natureza de ordem pública, são passíveis de correção de ofício, conforme precedentes do Superior Tribunal de Justiça: "PROCESSUAL CIVIL. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. ART. 1º-F DA LEI N. 9.494/97. APLICAÇÃO IMEDIATA. ART. 5º DA LEI N. 11.960/09. DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE PARCIAL POR ARRASTAMENTO (ADIN 4.357/DF). ÍNDICE DE CORREÇÃO MONETÁRIA APLICÁVEL: IPCA. JULGAMENTO DE ADI NO STF. SOBRESTAMENTO. INDEFERIMENTO. ..................... 5. A correção monetária e os juros de mora, como consectários legais da condenação principal, possuem natureza de ordem pública e podem ser analisados até mesmo de ofício, bastando que a matéria tenha sido debatida na Corte de origem. Logo, não há falar em reformatio in pejus. .......................................... (AgRg no AREsp 288026/MG, Segunda Turma, Rel. Min. Humberto Martins, DJe 20/02/2014) "PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. OBSERVÂNCIA DA CORREÇÃO MONETÁRIA EM SEDE DE REEXAME NECESSÁRIO. NÃO OCORRÊNCIA DE VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DO NON REFORMATIO IN PEJUS E DA INÉRCIA DA JURISDIÇÃO. MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA QUE NÃO DEPENDE DE RECURSO VOLUNTÁRIO PARA A CORTE ESTADUAL. 1. A correção monetária, assim como os juros de mora, incide sobre o objeto da condenação judicial e não se prende a pedido feito em primeira instância ou a recurso voluntário dirigido à Corte estadual. É matéria de ordem pública, cognoscível de ofício em sede de reexame necessário, máxime quando a sentença afirma a sua incidência, mas não disciplina expressamente o termo inicial dessa obrigação acessória. 2. A explicitação do momento em que a correção monetária deverá incidir no caso concreto feita em sede de reexame de ofício não caracteriza reformatio in pejus contra a Fazenda Pública estadual, tampouco ofende o princípio da inércia da jurisdição. 3. Agravo regimental não provido." (AgRg no REsp 1291244/RJ, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 26/02/2013, DJe 05/03/2013) Assim, corrijo a sentença, e estabeleço que as parcelas vencidas deverão ser corrigidas monetariamente e acrescidas de juros de mora pelos índices constantes do Manual de Orientação para a elaboração de Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta, observando-se, em relação à correção monetária, a aplicação do IPCA-e em substituição à TR - Taxa Referencial, consoante decidido pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no RE nº 870.947, tema de repercussão geral nº 810, em 20.09.2017, Relator Ministro Luiz Fux. Nesse passo, acresço que os embargos de declaração opostos perante o STF contra tal julgado tem por objetivo único a modulação dos seus efeitos para atribuição de eficácia prospectiva, pelo que o excepcional efeito suspensivo concedido por meio da decisão proferida em 24.09.2018 e publicada no DJE de 25.09.2018, surtirá efeitos apenas no tocante à definição do termo inicial da incidência do IPCA-e, que deverá ser observado quando da liquidação do julgado. Quanto aos honorários advocatícios, entendo que a parte autora sucumbiu de parte mínima do pedido, razão pela qual, com fulcro no parágrafo único do artigo 86 do Código de Processo Civil/2015, condeno o INSS ao pagamento de honorários de advogado fixados em 10% do valor da condenação, consoante o entendimento desta Turma e o disposto §§ 2º e 3º do artigo 85 do Código de Processo Civil/2015, considerando as parcelas vencidas até a data da sentença, nos termos da Súmula nº 111 do Superior Tribunal de Justiça. Diante do exposto, de ofício, fixo os critérios de atualização do débito, rejeito a preliminar e, no mérito, DOU PARCIAL PROVIMENTO à apelação. Por fim, considerando o caráter alimentar das prestações reclamadas e que os recursos aos Tribunais Superiores não são dotados de efeito suspensivo (art. 995 CPC/2015), determino, com apoio nos artigos 300 e 497 do CPC/2015, a imediata implantação do benefício ora concedido, com renda mensal inicial - RMI a ser apurada pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS. É o voto.
DECLARAÇÃO DE VOTO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA: A par do respeito e da admiração que nutro pelo Ilustre Relator, dele divirjo, em parte.
Os benefícios por incapacidade, previstos na Lei nº 8.213/91, destinam-se aos segurados que, após o cumprimento da carência de 12 (doze) meses (artigo 25, inciso I), sejam acometidos por incapacidade laboral: (i) incapacidade total e definitiva para qualquer atividade laborativa, no caso de aposentadoria por invalidez (artigo 42), ou (ii) incapacidade para a atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos, no caso de auxílio-doença (artigo 59).
No tocante ao auxílio-doença, especificamente, vale destacar que se trata de um benefício provisório, que cessa com o término da incapacidade, no caso de ser temporária, ou com a reabilitação do segurado para outra atividade que lhe garanta a subsistência, se a incapacidade for definitiva para a atividade habitual, podendo, ainda, ser convertido em aposentadoria por invalidez, caso o segurado venha a ser considerado insusceptível de reabilitação.
Em relação à carência, nos termos do artigo 26, inciso II, da Lei nº 8.213/91, dela está dispensado o requerente nos casos em que a incapacidade é decorrente de acidente de qualquer natureza ou causa, de doença profissional ou do trabalho, ou ainda das doenças e afecções elencadas no artigo 151 da mesma lei.
Como se vê, para a obtenção dos benefícios por incapacidade, deve o requerente comprovar o preenchimento dos seguintes requisitos: (i) qualidade de segurado, (ii) cumprimento da carência, quando for o caso, e (iii) incapacidade laboral.
No caso, o exame médico realizado em 10/05/2016 pelo perito judicial constatou que a parte autora, sapateira, idade atual de 55 anos, é portadora de Transtorno bipolar e Lúpus eritematoso sistêmico, estando incapacitada de forma total e permanente para o trabalho, desde julho de 2014, como se vê do laudo oficial constante de fls. 127/133, complementado à fl. 236:
"14. Se temporária, qual o tratamento adequado para que a parte autora recupere a condição de trabalho?
Resposta: Prejudicado, incapacidade permanente." (fl. 132)
Como se vê, de acordo com o perito judicial, não há possibilidade de recuperação da capacidade laboral da parte autora, de modo que se revela irrelevante, no caso, o fato de ela ter se recusado a se submeter a tratamento psiquiátrico, pois este poderia ajudá-la talvez nas atividades diárias ou no convívio social, mas não recuperaria a sua capacidade laboral, que é o que nos interessa nestes autos.
Assim, ainda que o magistrado não esteja adstrito às conclusões do laudo pericial, conforme dispõem o artigo 436 do CPC/1973 e o artigo 479 do CPC/2015, estas devem ser consideradas, por se tratar de prova técnica, elaborada por profissional da confiança do Juízo e equidistante das partes.
O laudo em questão foi realizado por profissional habilitado, equidistante das partes, capacitado, especializado em perícia médica, e de confiança do r. Juízo, cuja conclusão encontra-se lançada de forma objetiva e fundamentada, não havendo que se falar em realização de nova perícia judicial.
Outrossim, o laudo pericial atendeu às necessidades do caso concreto, possibilitando concluir que o perito realizou minucioso exame clínico, respondendo aos quesitos formulados. Além disso, levou em consideração, para formação de seu convencimento, a documentação médica colacionada aos autos.
Desse modo, demonstrada, através do laudo elaborado pelo perito judicial, a incapacidade total e permanente para o exercício da atividade laboral, é possível conceder a aposentadoria por invalidez, até porque preenchidos os demais requisitos legais.
E, mantida a total procedência da ação, os honorários advocatícios deverão ser suportados pelo INSS, como fixados na sentença.
Presentes os requisitos - verossimilhança das alegações, conforme exposto na sentença, e o perigo da demora, o qual decorre da natureza alimentar do benefício -, confirmo a tutela anteriormente concedida.
Acompanho o voto do Relator, na parte em que rejeita a preliminar, fixa o termo inicial do benefício à data do requerimento administrativo e determina, de ofício, a alteração de juros de mora e correção monetária.
Ante o exposto, REJEITO a preliminar e DETERMINO, DE OFÍCIO, a alteração de juros de mora e correção monetária, nos termos do voto do Ilustre Relator, e, dele divergindo para manter a concessão da aposentadoria por invalidez e a fixação dos honorários advocatícios, como na sentença, bem como para confirmar a tutela anteriormente deferida, DOU PARCIAL PROVIMENTO ao apelo, em menor extensão, apenas para fixar o termo inicial do benefício em 25/01/2016, data do requerimento administrativo.
É COMO VOTO.
/gabivi/asato
E M E N T A
APELAÇÃO CÍVEL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ INCAPACIDADE LABORAL TOTAL E TEMPORÁRIA. AUXÍLIO-DOENÇA CABÍVEL. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. MANUAL DE CÁLCULOS NA JUSTIÇA FEDERAL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. SUCUMBÊNCIA MÍNIMA DA PARTE AUTORA. TUTELA ANTECIPADA. IMPLANTAÇÃO IMEDIATA DO BENEFÍCIO. PRELIMINAR DE COISA JULGADA AFASTADA.
1. Afastada a preliminar de coisa julgada. O conjunto probatório demonstrou que a autora apresenta quadro de transtorno afetivo bipolar desde a adolescência, alternando episódios de controle da doença e recaídas, de modo a afastar a tríplice identidade entre os feitos, na medida em que diversa a causa de pedir apresentada nas ações anteriores, ante a evidência de agravamento da patologia apresentada, razão pela qual demonstrada a modificação no substrato fático e na causa de pedir versados nas lides sucessivamente propostas.
2. A Lei nº 8.213/91, no artigo 42, estabelece os requisitos necessários para a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez, quais sejam: qualidade de segurado, cumprimento da carência, quando exigida, e moléstia incapacitante e insuscetível de reabilitação para atividade que lhe garanta a subsistência. O auxílio-doença, por sua vez, tem seus pressupostos previstos nos artigos 59 a 63 da Lei nº 8.213/91, sendo concedido nos casos de incapacidade temporária.
3. Não obstante o entendimento proferido na sentença, no sentido da existência de incapacidade total e permanente da autora para as atividades habituais, o conjunto probatório demonstrou a existência de incapacidade total e temporária, pois segundo o conjunto probatório coligido nas três ações aforadas, a autora apresenta patologia psiquiátrica, quadro clínico ainda em evolução e com perspectiva de alteração em razão do acompanhamento médico e tratamento medicamentoso a que vem se submetendo, de forma que a existência de limitação funcional decorrente de tal patologia não se encontra consolidada, inviabilizando seja reconhecida como causadora de incapacidade total e permanente.
4. Uma vez demonstrada a existência de incapacidade total e temporária, de rigor a concessão do benefício de auxílio doença à autora, pois não restou afastada a possibilidade de recuperação da capacidade laboral e, nesse passo, cabe à parte autora aderir ao tratamento médico adequado e ao processo de recuperação com seriedade e constância, favorecendo o seu êxito. Inviável a concessão de aposentadoria por invalidez. Ausência de incapacidade total e permanente.
5. Juros e correção monetária pelos índices constantes do Manual de Orientação para a elaboração de Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta, observando-se, em relação à correção monetária, a aplicação do IPCA-e em substituição à TR - Taxa Referencial, consoante decidido pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no RE nº 870.947, tema de repercussão geral nº 810, em 20.09.2017, Relator Ministro Luiz Fux, observado quanto a este o termo inicial a ser fixado pela Suprema Corte no julgamento dos embargos de declaração.
6. Quanto aos honorários advocatícios, a parte autora sucumbiu de parte mínima do pedido, razão pela qual, com fulcro no parágrafo único do artigo 86 do Código de Processo Civil/2015, condeno o INSS ao pagamento de honorários de advogado fixados em 10% do valor da condenação, consoante o entendimento desta Turma e o disposto §§ 2º e 3º do artigo 85 do Código de Processo Civil/2015, considerando as parcelas vencidas até a data da sentença, nos termos da Súmula nº 111 do Superior Tribunal de Justiça.
7. Preliminar rejeitada. No mérito, apelação parcialmente provida. Tutela antecipada concedida.